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sexta-feira, 4 de julho de 2025

Viagem de Angola ao Brasil – Projeto marítimo a relembrar a escravatura, em Dez 2025 Eu já o tentei há quase 51 anos,de S. Tomé ao Brasil, custou-me 38 dias à deriva numa frágl piroga – De meados de Outubro a Nov. de 1975 -Apresentei a exposição dessa aventura em 1999, no Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa e, em S. Tomé, em Julho de 2015, no Centro Cultural Português,

                                        Jorge Trabulo Marques - Jornalista

Foi noticiado pelo jornal Téla Nón/Rádio ONU, que “ a viagem tem uma duração de 21 dias, com partida a 1 de dezembro de 2025. A travessia no Atlântico durará sete dias, seguidos de sete dias de permanência em Angola e a viagem de regresso por outros sete dias.


Eu já o tentei há quase 51 anos,de S. Tomé ao Brasil, custou-me 38 dias à deriva numa frágl piroga – De meados de Outubro a Nov. de 1975 -Apresentei a exposição dessa aventura em 1999, no Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa e, em S. Tomé, em Julho de 2015, no Centro Cultural Português, https://canoasdomar.blogspot.com/2015/07/em-s-tome-encerramento-da-exposicao.html


Refere que “A Grande Travessia” é um projeto inédito sobre retomar a antiga rota marítima de tráfico de africanos vendidos como escravos; jornada deve inaugurar novo marco de cooperação cultural, turística e económica entre ambos os países.

Mais de 2 mil pessoas vão cruzar o Atlântico a bordo de um navio, em dezembro deste ano, numa viagem que pretende refazer a rota do tráfico de pessoas escravizadas e promover a reflexão sobre a escravatura.
O projeto “A Grande Travessia” pretende fretar um navio de cruzeiro, com partida de Santos, parando no Rio de Janeiro e Salvador, antes de seguir rumo a Luanda, capital de Angola.

VIAGEM ALTAMENTE SIMBÓLICA
Dagoberto José Fonseca, antropólogo responsável pelo projeto, afirma que é a primeira vez que uma população que se autoidentifica oriunda de Angola, regressa ao continente africano nessa condição.- Revelação feita, em 21 de Março, no Dia Internacional em Memória das Vítimas da Escravatura e do Comércio Transatlântico de Escravos,

O grupo escolheu a viagem marítima por ser altamente simbólica em relação ao tráfico de milhões de pessoas escravizadas entre os séculos 15 e 19.

A MINHA TENTATIVA DE ATRAVESSAR O OCEANO ATLÂNTICO NUMA PIROGA PELA ROTA DA ESCRAVATURA CUSTOU-ME 38 LOGOS E DRAMÁTICOS DIAS

Mas antes dessa tentativa, fiz outras travessias - De. Tomé ao Principe, em 3 dias

Em breve resumo, sim, direi que sou autor de várias travessias em pequenas pirogas primitivas, nos mares do Golfo da Guiné, por força de muitos treinos, sempre que me era possível, de praia em praia, nas frágeis canoas dos corajosos pecadores de S. Tomé, aos quais desejo aqui expressar um abraço de reconhecimento e de admiração, não apenas pela dureza e risco das suas vidas, em que se expõem, sempre que partem para o mar, como também pelos ensinamentos que me prestaram, já que foram eles os meus melhores mestres.

Depois de me sentir, suficientemente preparado, que simplesmente a empreender as habituas saídas de canoa, na praia Maria Emília ou ir dali até à Fortaleza S. Jerónimo, na piroga que ali comparara a um velho pescador por 200$00, decidi fazer um teste um pouco mais ousado - Indo de canoa, desde a Baía Ana de Chaves, até à praia de Anambô, local onde se encontra o padrão que assinala a chegada dos primeiros navegadores portugueses,


( 

E, um mês depois, aí estava eu, tal como aqueles intrépidos navegadores, e à semelhança dos arrojados pescadores destas maravilhosas ilhas, quando o tornado os arrasta para o desconhecido, a desafiar a vastidão do mar , num simples madeiro de ocá escavado: -

Larguei à meia-noite, clandestinamente, pois sabia que, se pedisse autorização, esta me seria recusada, dada a perigosidade da viagem, levando comigo apenas uma rudimentar bússola para me orientar. No regresso de avião a S. Tomé, fui preso pela PIDE,

por suspeita de me querer ir juntar ao movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe, no Gabão, o que não era o caso. Levei três dias e enfrentei dois tornados. À segunda noite adormeci e voltei-me com a canoa em pleno alto mar. Esta era minúscula e vivi um verdadeiro drama para me salvar, debatendo-me como extrema dificuldade no meio do sorvedouro denegrido das águas.

Cinco anos depois, numa piroga um pouco maior, fiz a ligação de São Tomé à Nigéria. Uma vez mais parti, sem dar a conhecer os meus propósitos, ao começo da noite, servindo-me apenas de uma simples bússola. Ao cabo de 13 dias chegava a uma praia ao sul deste país africano, tendo sido detido durante 17 dias por suspeita de espionagem, após o que fui repatriado para Portugal.

Os jornais nigerianos destacaram em primeira página o feito. Os objetivos destas travessias visavam demonstrar a possibilidade de antigos povos africanos terem povoado as ilhas, situadas no Golfo da Guiné, muito antes dos outros navegadores, ali terem chegado, contrariamente ao que defendem as teses coloniais, que dizem que as ilhas estavam completamente desabitadas

Regressado a São Tomé, ainda no mesmo ano, e já com São Tomé e Príncipe independente, tentei empreender a travessia ao Brasil, com o propósito reforçar a minha tese, evocar a rota da escravatura através da grande corrente equatorial e contribuir para a moralização de futuros náufragos, à semelhança de Alan Bombard.

Segundo este investigador e navegador solitário, a maioria das vítimas morre por inação, mais por perda de confiança e desespero, do que propriamente por falta de recursos, que o próprio mar pode oferecer. Era justamente o que eu também pretendia demonstrar -

Navegando num meio tão primitivo e precário, levando apenas alimentos para uma parte do percurso e servindo-me, unicamente, de uma simples bússola, sem qualquer meio de comunicar com o exterior, tinha, pois, como intenção, colocar-me nas mesmas condições que muitos milhares de seres humanos que, todos os anos, ficam completamente desprotegidos e entregues a si próprios – Porém, quis o destino que fosse mesmo esta a situação que acabasse por viver.

A canoa foi carregada num pesqueiro americano para ser largada, na corrente equatorial, um pouco a sul de Ano Bom. Porém, à chegada a esta ilha, o comandante propôs-me abandonar a canoa e ficar a trabalhar a bordo, alegando que a mesma estorvava e que a aventura era muito arriscada.

Na impossibilidade de ser levado para a dita corrente, decidi-me pelo regresso a São Tomé para tentar a viagem noutra oportunidade. Foi então que uma violenta tempestade, me surpreendeu em plena noite, tendo perdido a maior parte dos viveres, os remos e outros apetrechos.

Ao sabor das vagas, num simples madeiro escavado, é difícil imaginar pior situação. Mesmo assim, com a canoa completamente desgovernada, não cruzei os braços e nunca me dei por vencido. Peguei num dos mastros e coloquei-o de través para garantir algum equilíbrio. Um dos bidões foi amarrado a uma corda e largado para servir de âncora flutuante.

No dia seguinte improvisei um remo com um dos barrotes do estrado da canoa e pedaços da cobertura, a fim de conseguir dar alguma orientação. Mas de pouco me haveria de valer, face à fúria dos constantes tornados. Como boia de salvação, utilizei o resto do estrado e adaptei-lhe um pequeno colchão de ar – Frágil recurso para forças tão descomunais!

Foram momentos de extrema aflição, que me pareceram verdadeiras eternidades, durante 38 longos e difíceis dias, 24 dos quais a beber água do mar e das chuvas, e duas semanas sem alimentos que não fosse algum peixe que ia apanhando( e quando acontecia) ou ave que, entretanto, pousando, sacrificava. Enfrentando tempestades, sucessivas, incluindo ataques de tubarões. Ainda cheguei a pescar alguns de pequeno porte, enquanto tive anzóis. Mas, até estes, mais tarde, me haveriam de faltar.

Acabei por ser arrastado pelas correntes até à Ilha de Fernando Pó, já no limiar da minha resistência física, onde fui tomado por espião, algemado e preso numa cela de alta segurança, a mando do então Presidente Macias Nguema, após o que fui repatriado para Portugal, tal como me acontecera na Nigéria. Mas, agora, graças a uma pequena mensagem que levava do então jovem Governo de São Tomé e Príncipe, que recentemente tinha ascendido à sua independência, para saudar o povo irmão brasileiro, quando eu aportasse na sua costa.

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