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terça-feira, 25 de abril de 2017

São Tomé e Príncipe - Espírito de 25 de Abril subvertido – Do Colonialismo ao Neocolonialismo - Do sonho ao desencanto e frustração

.Jorge Trabulo Marques - Jornalista - Informação e análise 
25 DE ABRIL DA ESPERANÇA AO DESENCANTO E FRUSTRAÇÃO



Comemoraram- se, hoje, em Portugal, 43 anos da  Revolução dos Cravos, mas já sem o entusiasmo e as festividades de outros anos atrás -  Nas antigas colónias portuguesas, creio que foi um dia como qualquer outro - Isto porque, se bem que, a memória do regime ditatorial Salazarista, não possa ser lembrada  pelas mais jovens gerações, os tempos que se vivem são mais de  desencanto, de apreensão  e de frustração, de que propriamente  de confiança no futuro, e o que conta na sobrevivência das classes mais  desfavorecidas, que constituem o grosso da população, tem mais a ver com a sobrevivência do seu dia a dia, do que  factos  passados, que à história compete recordar.

Foto - Site da PR 
Foto - Site da PR 
Comemorações dos 43 anos da revolução dos cravos – Sem discursos políticos inflamados na Assembleia da República e  com ausência de colunáveis - Cavaco ausente da comemoração do 25 de Abril no Parlamento – Mas também Jorge Sampaio  - Porventura,   por motivos de saúde: a idade tem o seu peso

Quem corre por gosto não cansa, pelos vistos, tem sido esta a matriz da Presidência de Marcelo Rebelo de Sousa, marcada pelo entusiasmo por onde passa e com o espírito conciliador – E, avaliar pelo que dizem as noticias (pois não vimos telejornais), foi esta a tónica que marcou o seu discurso na sessão solene das comemorações, que começaram por ter lugar na  Casa da Democracia.

A meio da tarde, houve o tradicional desfile na Av. da Liberdade, voltado para as massas populares,  naturalmente que longe do calor de outras comemorações

EM S. TOMÉ E PRINCIPE -  MILHÕES DE AJUDAS  EXTERNAS QUE VOAM NÃO SE SABE PARA ONDE 


Governo não explica os milhões que recebe nem onde os escoa ou aplica. E quando o faz é para deixar mais dúvidas de que certezas.  Gastam-se milhões de euros em passeatas de um primeiro- ministro, que passa a maior parte do tempo, mais no estrangeiro que na governação interna, avultados dispêndios num enorme palácio da Justiça para se sentarem meia de juízes e servir um Juiz que é simultaneamente presidente do STJ, do Tribunal Constitucional, do Tribunal Tributário e de mais uns quantos poderes  - Sim, num país onde a justiça se deixa subordinar ao poder político, que tem dado mostras de manifesta incompetência e desumanidade  

UM SÓ JUIZ AO COMANDO DO SISTEMA JUDICIAL  - SÓ  NAS MAIS DURAS E TOTALITÁRIAS DITADURAS.  -


"A imparcialidade dos tribunais é um pressuposto fundamental da boa administração da justiça. Uma das formas de garanti‑la consiste em estabelecer na lei um conjunto de circunstâncias que obstam, ou podem obstar, a que um juiz exerça funções num determinado processo por poder estar em causa a sua imparcialidade. Essas circunstâncias reconduzem‑se a duas categorias distintas: os impedimentos e as suspeições".

Os impedimentos são circunstâncias que normalmente afectam a imparcialidade ou pelo menos a sua aparência aos olhos da comunidade. Ao tribunal, não basta ser imparcial, é preciso parecê‑lo. Por isso, a verificação dessas circunstâncias impede em absoluto o juiz de exercer determinadas funções em absoluto o juiz de exercer determinadas funções

O NEOCOLONIALISMO  - SOB A CAPA DE DEMOCRÁTICA - É BEM MAIS PERVERSO E EXPLORADOR 


Com o derrube da ditadura em Portugal, instaurou-se a democracia ao Povo Português e  permitiu às suas colónias a possibilidade de escolherem o seu próprio destino,  liberta do domínio  colonial  - E,  em S. Tomé e Príncipe, assim, aconteceu no dia 12 de Julho, de 1975, com a proclamação da sua independência: com o surgimento de um novo pais, no concerto das nações, tendo  pela frente um caminho difícil e árduo mas ao mesmo tempo aliciante e encorajador, pois nada se alcança sem esforço e  sacrifícios - Ilhas pequenas mas mais férteis e promissoras de que,  em vastas áreas, de muitos países  do mundo.

Todavia, pelo que me é dado analisar, qual não é o desencanto,  do chamado Povo Pequeno,  face aos despotismo corrupto e mercenários da sua governação -   Bom era que os tempos passados do colonialismo, fossem definitivamente enterrados e esquecidos, mas como se, os governantes dos tempos atuais,  ainda procedem pior que o antigo país colonizador? 


 O TEMPO PASSA MAS DEIXA O SEU LASTRO  QUE NÃO É FÁCIL DE APAGAR ...

Nesse dia, eu era o técnico escalado para abrir a estação e pôr o Hino Nacional no ar, seguido de  um programa de música variada – era mais uma das bobines gravadas que recebíamos regularmente da extinta Emissora Nacional. Poucos depois, chega o Raul Cardoso, que, na redação, passava ao papel as noticias transmitidas, em onda curta, por aquela estação, para depois serem lidas nos noticiários da "província". Pois não dispúnhamos de fax.


 “Houve um golpe militar!!... Há uma revolução em Lisboa!"Confessava-me, mal   pôs os auscultadores à escuta.  Porém, as notícias dos acontecimentos em Lisboa, foram encaradas com reservas e a sua divulgação, começou por ser bastante lacónica - Só, depois do pôr-do-sol. já noite, às 19 horas, é que  O Emissor Regional difunde o seguinte comunicado da Repartição do Gabinete e distribuído pelo C.I.T

"Perante notícias de alteração da Ordem Pública na Metrópole, o Governador informa que o Governo Central está em pleno exercício das suas funções. A população tem dado um magnífico exemplo de calma e tranquilidade que o Governo e as Forças Armadas da Província continuarão a assegurar.

CRONOLOGIA DOS ACONTECIMENTOS  - DA REVOLUÇÃO DE ABRIL EM S. TOMÉ


No entanto, ,na população nativa – aquilo que inicialmente fora tomado com bastante desconfiança e incredulidade, depressa a galvanizou e a levou a pôr-se inteiramente ao lado do programa e dos ideais independentistas, defendidos pelo (MLSTP) Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe, sediado no Gabão, cujos dirigentes desenvolveram, desde logo,  uma intensificada ação mobilizadora. 

Os jovens nacionalistas nunca chegaram a pôr em risco  a integridade dos colonos  que  nas roças até dispunham de armas já anteriormente distribuídas pelo exército colonial  (não enveredaram pela luta armada), mas causaram forte contestação e  instabilidade, não dando tréguas a qualquer ideia ou projeto  que não visasse a libertação do povo do arquipélago. As suas ações foram muito aguerridas e dinâmicas. Promoveram uma agitação política e social permanente. Não deram hipóteses a que  os movimentos federalistas ou neocoloniais, conquistassem adeptos e se  implantassem. O seu desejo  era conseguir a “Independência-Já”.   Os  slogans mobilizadoras pautavam-se sobretudo por esse único objetivo, explicito em  linguagem popular: “Independência total, çà cu pôvô  mecê”  -  Independência total é  tudo o que povo quer. Foram a principal força interventiva e conciencilizadora durante o processo de descolonização –  E até mesmo depois da tomada de posse do governo de transição



Era naquela altura - aliás, desde meados dos ano 70 - correspondente da Revista Semana Ilustrada, de Luanda - Naturalmente, que,  a repercussão do 25 de Abril, nas Ilhas Verdes do Equador, nomeadamente, em S. Tomé, onde residia, não podia passar despercebida  ao  jornalista - De resto, com o fim da censura, não havia mãos a medir  Muitos dos meus trabalhos, não passavam no crivo dos censores, em Angola, pelo que, finalmente, com a despertar da liberdade de expressão, havia que aproveitar os novos ventos da história ,que, aliás, muitas contrariedade me haviam de trazer, da parte dos colonos  - Na edição da semana seguinte, fiz um relato circunstancial dos principais acontecimentos na Ilha, que julgo ter sido o único a nível da imprensa - Só que era-me difícil  encontrar a revista onde fiz essa publicação. 

  

Em Portugal, e mesmo quando agora estive em S. Tomé, não consegui encontrar, em nenhum dos arquivos, aquela edição, no entanto, para agradável surpresa minha, foi-me possível deparar com a transcrição no livro "O NACIONALISMO POLÍTICO SÃO-TOMENSE - Por Carlos Espírito Santo, - Sem dúvida, um muito aprofundada e muito bem elaborada pesquisa e análise,  que, segundo ao autor,  "tem como finalidade  examinar diferentes vectores que sustentaram o nacionalismo desenvolvido, pelos são-tomenses, desde a queda da monarquia portuguesa (5 de Outubro de 1910) à data da independência  de São Tomé e Príncipe (12 de Julho de 1975" - 


A referida cronologia está inserida no capítulo dedicado â  "Associação Cívica Pró-Movimento de Libertação de S. Tomé e Príncipe", ou seja, num conjunto de factos, relacionados com a  Revolução de Abril de 1974 - E começa assim: 

A 25 de Abril de 1974 (quinta-feira), um grupo de oficiais portugueses liderado pelo major Otelo Saraiva de Carvalho finalizou um pacifico golpe de Estado depondo o regime fascista que vigorava há quarenta anos. Tratou-se, sem dúvida, de um dos mais significativos feitos históricos dos militares lusos, que dessa forma puseram termo ao Estado Novo, marcado pela desigualdade económica, ausência de liberdade de reunião e de expressão, proibição de formações políticas, repressão policial, etc.
Em São Tomé e Príncipe, a queda da ditadura salazarista/ marcelista foi vivida com grande satisfação pela população nativa e também pelos democratas portugueses radicados nestas ilhas, logo que foram informados deste transcendente facto histórico político. Era governador de São Tomé e Príncipe o coronel João Cecílio Gonçalves 658, que regressara a São Tomé no dia 23 de Abril de 1974659, após viagem de trabalho às terras lusas 660.

João Cecílio Gonçalves decidiu pedir demissão do cargo de governador das ilhas de São Tomé e Príncipe, poucos dias depois da triunfante revolução militar portuguesa: 

«Foi com a maior surpresa que a população de S. Tomé e Príncipe, tornou conhecimento da imediata decisão do coronel João Cecílio Gonçalves, de se demitir de Governador desta Província, tanto mais que a continuidade da sua permanência já estava absolutamente assegurada pela Junta de Salvação Nacional, uma breve cerimónia de transmissão de poderes, a que apenas assistiram algumas entidades oficiais e pessoal do gabinete, jâ que a decisão foi repentina e não previamente anunciada, o coronel João Cecílio Gonçalves despediu-se com estas boas palavras à população, com as quais, simultaneamente, procurou justificar a sua resolução:

3º ano após a independência 
“Depois de recebida da Junta de Salvação Nacional a indicação de que continuava em exercício de funções, sábado passado, enviei hoje, às oito de manhã (dia 29) àquela Junta, o telegrama n.013 que assegurava a minha dedicada colaboração ao Movimento das Forças Armadas. Não estão pois de nenhum modo envolvidas na decisão que agora tomo, quaisquer impedimentos de consciência, nesta hora grave que a Nação atravessa, e em que precisa da colaboração de todos. Entendo porém, que a bem do interesse nacional, melhor será para a população de Província, que a nova forma de vida seja vincada de forma mais expressiva, pela saída de quem, anteriormente, tinha a função de governar.


Nestes termos faço a entrega do Governo da Província ao sr. Intendente Pinto de Souto, a quem desejo as maiores felicidades no seu desempenho. Despeço-me de todos com saudade, agradeço as horas magníficas que passei junto da população, que levo no coração, e desejo que o futuro traga as maiores felicidades que merece."
Foram, pois, nestes termos, breves e repletos de comoção, que o coronel Cecília Gonçalves, que ao longo de mais de dois anos tanto se interessou pelo progresso e bem estar destas duas Ilhas portuguesas do Golfo da Guiné e das suas gentes, se despediu.»661

Foram, pois, nestes termos, breves e repletos de comoção, que o coronel Cecílio Gonçalves, que ao longo de mais de dois anos tanto se interessou pelo progresso e bem estar destas duas Ilhas portuguesas do Golfo da Guiné e das suas gentes, se despediu.»661
Anote-se: tal demissão foi originada pelas divergências que ocorreram entre o governador João Cecílio Gonçalves e o comandante militar Ricardo Durão 662, que foi convidado pelo general António Spínola a desempenhar outras funções na capital portuguesa.

Os factos que tiveram lugar em São Tomé e Príncipe nos primeiros dias após o golpe militar dos capitães de Abril foram revelados pelo correspondente da Revista Semana Ilustrada, Jorge Trabulo Marques, jornalista português radicado há bastante tempo neste arquipélago:

«S. Tomé-25. O dia amanheceu sereno e calmo como outro qualquer. As pessoas dirigem-se para os seus locais de trabalho habituais. Um sol resplandecente e equatorial banha de luz e de vida a pequena cidade de S. Tomé. A vida parece continuar com a mesma rotina dos demais dias da semana. Porém, para um número muito restrito de cidadãos, começam a chegar os primeiros rumores de que algo de estranho se passava na capital do País. Há interrogações. Expectativa geral. Tudo o que se fala e se sabe, é escutado de estações de rádio estrangeiras. Por isso a dúvida subsiste. As perguntas sobre o que há ou não, de verdade, sobre a situação em Lisboa, começam a suceder-se a cada instante. E a não encontrar uma resposta exacta, Tudo o que se fala é incerto e impreciso.

S. Tomé-25. É quase meio-dia. O Governador da Província é já conhecedor das noticias que pela manhã começaram a ser radiofundidas por Emissões do exterior. Terá, naturalmente, como qualquer outro habitante alertado sobre as ocorrências, mantido as suas reservas e dúvidas. Toma conhecimento do teor do comunicado emanado pela Repartição do Gabinete do Governo de Angola, transmitido pela Estação Oficial deste Estado. Que nada de correcto diz, pois é bastante lacónico.

S. Tomé-25. Estamos no começo da tarde. Chega-nos ao conhecimento que parte do efectivo militar aquartelado na cidade entra de prevenção. Notícias não confirmadas começam a partir de agora a circular com maior intensidade pela população que, com crescente expectativa, se interroga ansiosamente.

S. Tomé-25. São 19 horas. O Emissor Regional difunde o seguinte comunicado da Repartição do Gabinete e distribuído pelo C.I.T

"Perante notícias de alteração da Ordem Pública na Metrópole, o Governador informa que o Governo Central está em pleno exercício das suas funções. A população tem dado um magnífico exemplo de calma e tranquilidade que o Governo e as Forças Armadas da Província continuarão a assegurar."
Lampejos de um defunto moribundo. Pois escusado seria dizer que àquela hora ainda o Governo derrubado estaria no exercício pleno das suas funções. Um comunicado, portanto, que não veio trazer luz alguma sobre as dúvidas que já existiam. Maior confusão, porventura, estamos certos, foi o que veio provocar.


Adicionar legenda
Pois se as estações estrangeiras já àquela hora estavam fartas de deitar cá fora a noticia do golpe militar aos quatro ventos. Um caso mais ou menos consumado, era a ideia que começava já a prevalecer em muita gente, tal a veracidade e o pormenor com que o desenrolar dos acontecimentos passavam a ser pelas mesmas relatados. Uma sensação de alívio notava-se nas pessoas, se bem que juntamente com alguma inquietação pela incerteza que, não obstante, ainda pairava. Oficialmente nada de concreto se sabia, apenas o conteúdo daquela comunicação que, àquela hora,  e dada de maneira  como foi redigida, terá sido bastante inoportuna. S. Tomé-25. E a hora de fechar o Emissor Regional. Ouvem-se os últimos acordes do Hino mas até àquele momento a grande verdade, de que já muita gente não tinha dúvidas, não chega a ir para o éter pelas ondas hertzianas desta Voz Portuguesa no Equador. E isto porque a Emissora Nacional, de que faz parte, continua no seu mutismo em relação à sua emissão para o Ultramar. Continua com a sua normal programação, apenas com a diferença dos noticiários serem demasiado breves.

S. Tomé-26. É meia-hora da madrugada. Algum do pessoal do E. R. de S. Tomé e Príncipe que se havia mantido em escuta depois de encerrada esta estação, houve e regista, em fita magnética, as primeiras palavras do grande general António Spínola. Fala como Presidente da Junta de Salvação Nacional, que então se constituira após o Glorioso Movimento das Forças Armadas, em tão boa hora levado a cabo, segundo as sua próprias palavras, no seu memorável comunicado à Nação Portuguesa, de que, a partir daí, assumira a enorme e pesada responsabilidade da condução dos novos destinos.


S. Tomé-26. São cinco e meia da manhã. O Emissor Regional, embora tivesse já pleno conhecimento da situação e das palavras do Presidente da Junta de Salvação Nacional, abre a sua emissão como habitualmente. O programa musical continua a cumprir-se na íntegra. Não faz qualquer referência, entretanto, sem autorização superior. Apenas uma ligeira alteração na programação: Não transmite o noticiário das 6.30.

S. Tomé-26. Aproxima-se as sete horas de um novo dia. De um dia que traria de facto uma bela e risonha mensagem a toda a população destas ilhas. Era a mensagem de um Portugal livre. De um Portugal para um futuro melhor, cujo raiar havia começado já na madrugada da véspera do dia anterior. 

(....) S. Tomé-26. São 10.30. O Emissor Regional de S. Tomé e Príncipe lê uma comunicação das Forças Armadas da Província dando conhecimento do telegrama por elas enviado à ]. S. N. e com o seguinte teor: "Tomado conhecimento proclamação]. N. S., Forças Armadas de S. Tomé e Príncipe garantem total apoio destes objectivos. Política Nacional anunciados. Mais asseguram perfeita calma e tranquilidade população e controle situação local". S. Tomé-26. 19.00. Uma comunicação do Governo da Província anuncia que, segundo telegrama do Ministério do Ultramar, o Governador de S. Tomé e Príncipe é reconduzido.

S. Tomé-27. O Comandante Militar em exercício, tenente-coronel Ricardo Durão, é chamado pela Junta de Salvação Nacional a desempenhar importante cargo no Ministério da Defesa Nacional. Função essa que, segundo posteriormente veio a público, não chegou a ocupar visto ter sido mais tarde designado delegado da J.S.N. junto do Ministério das Corporações.

S. Tomé-29. Em cumprimento de um despacho da Repartição de Gabinete, o pessoal da extinta D.G.S. é obrigado a abandonar o edifício onde se situavam as instalações desta corporação, feito o espólio de todo o material e recheio à mesma pertencente e entregue ao Comando Territorial Independente de S. Tomé e Príncipe. Segundo o mesmo despacho, as ditas instalações passavam a pertencer, o 1.0 andar à Guarda Fiscal, e o rés-do-chão à Policia Judiciária.

S. Tomé-29. Perante a surpresa geral, o governador de S. Tomé e Príncipe, coronel Cecílio Gonçalves, anuncia que, embora reconduzido e tendo na sequência dessa recondução garantido adesão aos princípios da Junta de Salvação Nacional, não havendo assim quaisquer motivos de consciência, mas que no interesse da Província achava melhor entregar a encarregatura do Governo ao Intendente Administrativo, Pinto de Souto.

S. Tomé-29. São cerca de 18.30. Verificam-se os primeiros passos, por parte de um grupo de democratas na ilha, para a criação de uma Associação Democrática. O mesmo grupo, em reunião havida naquela noite, decide convidar todas as pessoas que partilhem dos sentimentos democráticos e estejam de acordo com os objectivos preconizados pela J. S. N. a fazer um "abaixo-assinado" a manifestar o seu inteiro e incondicional apoio a esta Junta. S. Tomé-30. Por despacho do Encarregado do Governo, é anunciada a dissolução em S. Tomé e Príncipe das comissões de Freguesia, Concelhia e de Província, da A. N. P.

 Cerca das 16 h. da tarde regista-se o embarque do coronel Cecílio Gonçalves. A sua partida foi sentida com bastante comoção por todas as pessoas que se encontravam presentes no aeroporto. O caso da partida do Sr. coronel Cecílio Gonçalves, segundo sublinha a folha dominical, "O Dia do Senhor" deu a impressão geral de tratar-se de um dia de luto para a população. O ex-Governador amava S. Tomé. Confessava com frequência que gostava das gentes de S. Tomé ... e assim o demonstrou até ao fim. O coronel Cecflio Gonçalves, segundo diz ainda a mesma folha, para além do mais, possuía o dom da sensatez, raro em nossos dias, o equilíbrio e serenidade mental, o apreço da justiça, a firmeza de um militar, a visão clara dos problemas e a vontade de resolver com urgência os que fossem do interesse comum; simplicidade e entrega ao trabalho no silêncio. A educação, as comunicações, o operariado, o turismo, a indústria mereceram-lhe atenção e carinho. S. Tomé fica a dever-lhe muito nestes diversos sectores.

S. Tomé-30. No noticiário da noite do Emissor Regional é tornado público um despacho, ainda emanado pelo Governador cessante, que eleva para novos limites mínimos os salários dos trabalhadores rurais, em regime transitorial, enquanto não é devidamente revista nova legislação sobre o problema. Os ditos aumentos de salários foram pois acolhidos com certo agrado pela população rural, mas, dada a pequena margem acrescida com que foram contemplados, cremos ainda estarem muito aquém da satisfação "dos justos desejos da classe trabalhadora rural.

S. Tomé-1 de Maio. À semelhança do que aconteceu pelo País fora, também o Dia do trabalhador de S. Tomé foi vivido com manifestações do mais veemente apoio ao novo regime português, no qual se depositam as melhores esperanças para uma nova vida e um futuro mais próspero para todos, designadamente para o trabalhador, até agora o menos favorecido e regra geral o mais injustamente remunerado de todas as classes sociais.
O Sindicato dos Empregados do Comércio, Indústria e Agricultura convidou todos os seus associados e trabalhadores para uma manifestação cívica frente ao Palácio do Governo, à qual, de facto, compareceram em peso tendo, após a mesma, seguido em cortejo até às instalações da sede social daquele organismo.

S. Tomé, 2 de Maio. A Direcção do Sindicato dos Empregados do Comércio, Indústria e Agricultura de S. Tomé e Príncipe, interpretando os direitos de liberdade proclamados pela J.S.N. resolveu em reunião extraordinária apresentar à Assembleia Geral o seu pedido colectivo de demissão, proporcionando assim aos associados desse sindicato o direito à livre escolha dos seus dirigentes.

S. Tomé, 2 de Maio. - Os corpos Gerentes da Caixa de Previdência dos Funcionários Públicos de S. Tomé e Príncipe, reunidos em sessão conjunta aprovaram uma exposição ao Encarregado do Governo, pela qual solicitavam a exoneração dos actuais Corpos Gerentes, visto que, embora há longo tempo no exercido das suas funções, nelas não se têm mantido por vontade própria durante todo esse lapso de tempo.
Na mesma exposição, pediam simultaneamente, disposições adequadas onde se determine a constituição de uma Assembleia Geral de todos os da Caixa que eleja, sem quaisquer restrições, salvo o pleno uso dos seus direitos de associados, uma Direcção e um Conselho Fiscal.

S. Tomé, 3 de Maio. - É extinta a Comissão de Censura, nomeada por despacho n.019-1966, de 4 de Abril de 1966, publicado no B.O. do mesmo mês e ano.
S. Tomé, 3 de Maio. - É criada nesta Província uma comissão "adhoc", para controlo da Imprensa, Rádio, Televisão, Teatro e Cinema, de carácter transitório até à publicação de novas leis que regulem estes meios de comunicação sociais.

S. Tomé, 5 de Maio. A rádio de S. Tomé vive momentos altos desde a sua fundação, devido à intensa divulgação e abertura dada à informação que passou a verificar-se a partir do dia 26 de Abril. Por outro lado, a imprensa vive a sua hora mais morta de sempre. O jornal" A Voz de S. Tomé", que era propriedade da extinta A.N.P. continua a ter a sua publicação suspensa, Por seu turno, a folha dominical, "O Dia do Senhor", que devia sair neste dia, não foi autorizada a sair pela Comissão "ad-hoc", por inserir afirmações segundo declarou a própria comissão controladora, de carácter ambíguo e pouco expirei to em relação a referências elogiosas a instituições do regime anterior. Tal suspensão acontece pela primeira vez na existência desta publicação semanal»'

CONSIDERAÇÕES DE CARLOS ESPÍRITO SANTO

Feita a alusão ao meu relato, diz o seguinte, o autor de O NACIONALISMO POLÍTICO SÃO-TOMENSE:

"Talvez seja pertinente referir que a primeira manifestação popular realizada no país pelos nacionalistas santomenses depois da revolução de 25 de Abril teve lugar no dia 1 de Maio de 1974 (quarta-feira). Os organizadores deste evento político eram maioritariamente jovens estudantes do Liceu Nacional, que viviam no Riboque e localidades próximas, designadamente Angelo (Aito) Bonfim, Jorge Torres, Tomé Soares, Edgar Neves, Aurélio Dias Lourenço, Adriano Cassandra "Yano", Henrique Soares e Pascoal Dias Lourenço. A manifestação, cuja iniciativa pertenceu a Carlos Espírito Santo, partiu da residência de Aito Bonfim, situada na Fundação Popular (Água Porca), percorreu diversos lugares, particularmente o Riboque, S. João da Vargem, Rua Padre Martinho Pinto da Rocha, Praça Yon Gato, Sede do Sporting, Xácara e, por fim, Palácio do Governo, onde ocorreu a concentração, tendo os nacionalistas exigido do intendente Licíneo Manuel Pinto de Sousa (substituto do governador) a independência de São Tomé e Príncipe='.

Dito isto, convém sublinhar que encorajados pelos membros da PIDE que ainda operavam livremente no arquipélago, determinados roceiros quiseram perpetrar «forte» repressão contra os são-tomenses no dia 9 de Julho de 1974. Afirma Emílio Sardinha, a este respeito: «Foram os roceiros que organizaram, felizmente sem efeito, para uma chacina em S.Tomé, no passado dia 9! ... Por causa disso, só mais tarde viemos a saber os perigos que corremos! ... Esperemos que tudo por aqui fique.»665 É bastante provável que chacina  que os roceiros tentaram desencadear contra os nativos tenha precipitado a vinda para São Tomé de uma representação da Junta de Salvação Nacional, que ocorreu no dia 11 de Junho de 1974666•

Várias medidas foram tomadas pelos novos representantes do poder. Exemplificando, o edifício da PIDE/DGS foi ocupado e o inspector deste serviço policial, Manuel Nogueira Branco, foi preso e colocado na Cadeia Civil 667, por ordem dos membros da Junta de Salvação Nacional (segundo revela o Dr. Emílio Sardinha) 668. Registe-se: a participação do tenente-coronel Ricardo Durão, que desempenhava o cargo de comandante militar, foi relevante no processo de desmantelamento das estruturas da PIDE e prisão dos responsáveis desta polícia669.

Os nativos da Trindade decidiram como protesto pelos desmandos exercidos por Carlos de Sousa Gorgulho, quando foi governador de São Tomé e Príncipe, destruir todas as placas que ostentavam o nome deste tirano, em diversas ruas e largos dessa vila670. Mais, as populações de várias localidades promoveram reuniões exigindo justiça pelas torturas morais, físicas e psíquicas que lhes foram infligidas durante o regime colonial-fascistas".

A maior parte dos dirigentes do MLSTP estava radicada na Guiné Equatorial quando se verificou o golpe de Estado efectuado pelas forças militares portuguesas, a 25 de Abril de 19746n. Este facto obrigou Manuel Pinto da Costa, Leonel Mário d' Alva, José Frete, Guadalupe de Ceita e António Pires dos Santos (Ohnet) a instalarem-se no mês seguinte na cidade de Libreville, que estava bem próxima de São Tomé e Príncipe, e onde dois responsáveis dessa força política (Miguel Trovoada e Carlos Graça) residiam há bastante tem P0673. O governo do Gabão concedeu excelentes ajudas a todos estes políticos são-tomenses. Por exemplo, Manuel Pinto da Costa foi nomeado conselheiro do ministro do Plano e Finanças. Usufruía de Principesca remuneração e podia viajar quando bem desejasses".

Foi enviado pela direcção do MLSTP um telegrama tendo como destinatário o Movimento das Forças Armadas (MFA), felicitando esta instituição pelo feito histórico que realizara ao libertar Portugal do jugo ditatorial", Através dos seus representantes na metrópole colonial (particularmente Gastão Torres), o MLSTP procurou contactar com os membros do MFA e da Junta de Salvação Nacional GSN), com os grupos políticos, sobretudo com o Partido Comunista e com o Partido Socialista, e também com determinadas organizações de massas, visando, fundamentalmente, conhecer as posições dos novos dirigentes portugueses quanto à emancipação do povo de São Tomé e Príncipe676.

Utilizando contactos oficiosos directos, o MLSTP tentou igualmente perscrutar os verdadeiros propósitos do Governo Provisório português sobre a descolonização, uma vez que as declarações públicas dos diversos representantes do poder no território português (designadamente o Conselho de Estado, o Movimento das Forças Armadas, a Junta de Salvação Nacional e o Governo Provisório) eram discordantes. Ora, uma primeira troca de impressões realizou-se no mês de Maio de 1974, na capital inglesa, durante as negociações entre Portugal e o PAIGC. Miguel Trovoada e Carlos Graça representaram o MLSTP e do lado português estava Mário Soares. As conversações prosseguiram em Setembro do mesmo ano em Nova Iorque e nelas participaram Miguel Trovoada e Manuel Pinto da Costa, e Mário Soares, acompanhado do representante permanente de Portugal nas Nações Unidas?".

Apesar de os objectivos fundamentais da revolução de Abril terem sido a descolonização, a democratização e o desenvolvimento678, os expedientes desencadeados pela direcção do MLSTP foram desconsiderados pelos membros do governo português, que procuraram, servindo-se de diversos recursos, que São Tomé e Príncipe permanecesse desprovido de soberaniaf", Mais, o governo português sublinhava que para além do MLSTP existiam ou poderiam eventualmente surgir outras forças políticas que deveriam exprimir-se livremente. Assim sendo, era inadequado examinar com somente uma única organização o destino político de São Tomé e Príncipe680. «É dentro desse esquema que deve ser compreendido o aparecimento em S. Tomé e Príncipe de grupelhos defendendo a ideia de uma autonomia interna que lhes assegurasse a perenidade de uma união indissolúvel com a dita mãe pátria»681. Foram criados dois grupos políticos: o Centro Democrático de São Tomé e Príncipe e a Frente Popular Livre.

Uma vez que a estratégia delineada pelo MLSTP visava negociar directamente com os governantes portugueses a transferência pura e simples de poderes=", isso implicava que Portugal reconhecesse tal organização como único e legítimo representante do povo de São Tomé e Príncipe. Querendo lograr este posicionamento, o Bureau Político do MLSTP decidiu criar a Associação Cívica Pró- MLSTP, que foi, portanto, o braço legal do Movimento no interior do país683• Constituída na ilha de São Tomé (Riboque, terraço Ar e Vento), pelas 15 horas do dia 15 de Junho de 1974, sobretudo por funcionários públicos e jovens, alguns dos quais regressados de Portugal onde prosseguiam estudos universitários, a Cívicas", tal como era vulgarmente conhecida, valendo-se sobretudo do discurso nacionalista, tratou logo de mobilizar inúmeros são-tomenses que desejavam a independência nacional685, originando visível regozijo nas populações

«A associação cívica em organização, manteve-se permanentemente à disposição de todos quantos pretendiam assistir às reuniões, jamais se negando a fornecer esclarecimentos e a aceitar um debate franco e construtivo. Jamais pretendeu arregimentar adeptos. ·

Esclarece ter sempre afirmado que a sua linha de trabalho se situa na via da Independência Total para as ilhas de 5. Tomé e Príncipe.
Uma vez assente o seu programa de politização decidiu-se dar carácter legal à organização em assembleia geral.
Uma cópia da acta livremente aceite e subscrita em reunião posterior à referida Assembleia Geral, foi presente aos delega· dos da Junta de Salvação Nacional e transmitida pelo Emissor Regional de S. Tomé e Prfncipe.»6S7

«A associação cívica em organização, manteve-se permanentemente à disposição de todos quantos pretendiam assistir às reuniões, jamais se negando a fornecer esclarecimentos e a aceitar um debate franco e construtivo. Jamais pretendeu arregimentar adeptos. ·
Esclarece ter sempre afirmado que a sua linha de trabalho se situa na via da Independência Total para as ilhas de 5. Tomé e Príncipe.
Uma vez assente o seu programa de politização decidiu-se dar carácter legal à organização em assembleia geral.
Uma cópia da acta livremente aceite e subscrita em reunião posterior à referida Assembleia Geral, foi presente aos delega· dos da Junta de Salvação Nacional e transmitida pelo Emissor Regional de S. Tomé e Prfncipe.»6S7
Todas essas considerações foram extraídas do jornal Presença de S. Tomé e Príncipe, órgão oficial da Associação Cívica, publicado no dia 23 de Julho de 1974. O responsável desta edição foi Aida de Espírito Santo, poeta - nacionalista são-tomense, e dirigente da r:ferida organização política. Questões relacionadas com a evolução política de São Tomé e Príncipe e os desempenhos da Cívica durante o processo de mobilização popular, tendo como finalidade  a independência nacional, foram privilegiados nesse periódico."

É um facto que a descolonização foi precipitada e atabalhoada,  - E por culpa de quem? Por culpa apenas do 25 de Abril? ... De modo algum - Do salazarismo que nunca preparou uma elite genuinamente santomense e sempre olhou estas ilhas com olhos de domínio e subjugação colonial


É verdade que houve alguma leviandade - Porém,  quando em toda a África  (à exceção das colónias portuguesas e da África do Sul) sovam hinos de libertação e de independência, seria justo que Portugal persistisse na mesma teimosia:  "Salazar, praticando uma política de isolacionismo internacional sob o lema Orgulhosamente sós, levou Portugal a sofrer consequências extremamente negativas" 

Tudo isso podia ter sido evitado se  Salazar ou Marcelo Caetano, tivessem preparado uma elite negra, como fizeram os ingleses, mas optaram pelo analfabetismo, pela guerra e repressão.

NOS ÚLTIMOS ANOS, OPERAVAM-SE ALGUMAS TRANSFORMAÇÕES ECONÓMICAS E SOCIAIS, QUE PODIAM FAZER ESQUECER OS NEGROS TEMPOS MAIS RECUADOS  DA COLONIZAÇÃO, TODAVIA PERSISTIAM AINDA MUITAS MAZELAS POR CICATRIZAR 


Citam estudos que «a maior parte das terras que estavam, pelo menos até 1872, na posse dos forros ou nativos da terra ( 96 por cento dos 153 proprietários estavam ainda registados como sendo negros) foram compradas ou tiradas por fraude ou à força aos respectivos proprietários, a ponto de, em 1898, os roceiros brancos já possuírem 90 por cento das terras»

Com a revolução dos cravos, caíam as algemas, renasciam novas esperanças; soavam outros ventos: soprados pelo movimento libertador das Forças Armadas, que também rapidamente ali encontrava eco nas duas ilhas – Os colonos receberam-no com apreensão e jamais se mentalizaram para o alcance das transformações que rapidamente se iam operar. E, na população negra – aquilo que inicialmente fora tomado com bastante desconfiança e incredulidade, depressa a galvanizava e a levaria a pôr-se inteiramente ao lado do programa e dos ideais independentistas, defendidos pelo (MLSTP) Movimento para a Libertação de São Tomé e Príncipe  , fundado em 1972 por Manuel Pinto da Costa, cujo secretário-geral e demais dirigentes, desde logo desenvolveram intensificada acção mobilizadora

Pondo-a em prática através de duas frentes: pela antena  do “Povo Livre”,  uma estação de rádio que passou a emitir de Libreville –,  capital do  Gabão, no programa "A Voz do Povo de São Tomé e Príncipe", com o total apoio do Presidente Omar Bongo . E, no interior das ilhas,  com manifestações de protesto e ações de esclarecimento, intensa atividade política, protagonizada pela Associação Cívica – pró MLSTP, que entretanto fora criada  com a instauração das liberdades democráticas.  Formada, sobretudo, por jovens estudantes e  outros  elementos nacionalistas. 

Que se  saiba, nunca chegaram a pôr em risco  a integridade dos colonos  - aliás, estes,  nas roças até dispunham de apetrechado  arsenal, com armas já anteriormente distribuídas pelo exército colonial, havendo  formação e treinos  regulares, em campos de tiro.


INDEPENDÊNCIA TOTAL, CÁ CU PÔVÔ MECÊ”

Cartaz com que foram dadas as boas vindas ao então Tenente Coronel Pires Veloso - O Primeiro e o último governador pós 25 de Abril - Este o aviso de que a vontade do povo santomense era soberana e imparável, por mais obstáculos que existissem.

 Os ativistas – pró-independência - não enveredaram pela luta armada mas causaram forte contestação e instabilidade, não dando tréguas a qualquer ideia ou projeto que não visasse a total libertação do povo oprimido do arquipélago. Promovendo uma constante onda de agitação política e social. Não deram hipóteses a que os movimentos federalistas ou neocoloniais, conquistassem adeptos e se implantassem. 



Independência-Já” era a palavra de ordem mais ouvida nos comícios e manifestações de ruaE, nos cartazes, os slogans mobilizadores pautavam-se, sobretudo, por um claro e único objetivo, expresso em linguagem popular : “Independência total, çà cu pôvô  mecê ”  -  Independência total é  tudo o que povo quer. Os jovens ativistas da Associação Cívica, foram a principal força interventiva e conciencializadora durante o processo de descolonização –. Sem a sua coragem e o seu dinamismo, porventura, ainda hoje as duas ilhas, eram colónias, tal como sucede a outros territórios que estão nas mãos de 61 países.

A ABOMINÁVEL Polícia Internacional e de Defesa do Estado NÃO DESMOBILIZA E CONTINUA   ACTIVA EM SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE

Enquanto,  na  Rua António Maria Cardoso, capital do Império Colonial, os PIDES se entrincheiravam, metralhando quem se lhe opusesse ou eram presos e humilhados onde fossem localizados, em São Tomé, nada parecia perturbá-los: mesmo depois de já não existirem dúvidas, quanto ao êxito do Movimento dos Capitães de Abril, a PIDE teimou manter-se em atividade por algumas semanas, fazendo de contas que a situação na colónia não se ia alterar: porém, à cautela, houve o cuidado (com a conivência das secretas do CTI de STP)levarem os arquivos para aquele quartel e limparem os cadastros. 


Vi lá um Tenente, daqueles serviços, muito lesto à frente do edifício a conduzir as operações da remoção e transporte do recheio, que lhes interessava apagar. Fotografei a situação mas os negativos, infelizmente (tal como algumas centenas) ficou-me um colono com eles. Depreendi imediatamente que havia por ali marosca. 

Não me enganei. Pois, logo que foi permitida  a consulta pública dos arquivos da PIDE/DGS, na Torre do Tombo, me inteirei de que o meu processo  levara sumiço:  só lá encontrei as capas do dossier. Fora espancado e preso pela PIDE (na sequência da minha travessia de canoa ao Príncipe) e tinha a certeza que deveria lá ter alguns registos. Constatara que haviam limpado tudo.  Restavam as capas e o nome. Creio que fizeram o mesmo em todos os arquivos da PIDE/DGS  naquelas Ilhas. Duvido que tivessem deixado quaisquer folhas com os relatos dos seus abusos . E não foram poucos.Era uma questão que gostaria de apurar..



Por seu turno, a velha raposa do inspector (Nogueira Branco), ao dar-se conta de que o curso da revolução era irreversível, receando perder o comboio da história, quis armar-se em democrata e foi um dos primeiros subscritores do chamado Partido Democrático. - Um felizardo!... De regresso a Portugal, foi-lhe retido o "bago" mensal. Mas um oficial superior (seu amigo pessoal e conterrâneo), que havia ali comandado a Companhia de Caçadores de São Tomé e Príncipe , intercedeu e, a ovelha carneira de cabeleira branca,  lá continuou a receber a avultada mesada por "honrosos serviços prestados à pátria" - Foi-me dito, recentemente, pelo próprio oficial. 

Por sua vez,  os agentes também não pareciam nada preocupados.  Na esplanada do Rialto, continuavam a refastelar-se com cervejas, tendo-lhes ouvido dizer que "o novo governo vai precisar de nós". Passeavam-se ao estilo dos mesmos figurões do costume. Todavia,  um artigo de minha autoria, na Semana Ilustrada, desmoronar-lhes-ia quaisquer ilusões. “PIDES À SOLTA! QUEM OS RECOLHE?” Logo que o escândalo veio a lume, foram enviados para a Quinta de Santo António. Essa gente era perigosa; os seus dias, já pertenciam ao passado. Eles e a quase generalidade dos colonos, continuavam a pensar, como se nada tivesse acontecido. Recuavam-se a compreender a nova realidade! 

A 25 de Abril de 1974, os acontecimentos  do Massacre de Batepá, de Fevereiro de 1953, ainda estavam muito vivos na memória do Povo de São Tomé e Príncipe.


Ainda havia quem tivesse feridas nas pernas por cicatrizar das pesadas grilhetas - Fora as que sangravam no coração!....que dificilmente se apagam... Vi com os meus próprios olhos  essas feridas -  Ainda em chagas vivas por sarar! ... Provocadas por longo cativeiro, no campo de concentração de Fernão Dias, acorrentados a bolas de ferro, tal como aos escravos nos barcos negreiros. Vi também  a fotografia da cadeira elétrica e outras macabras imagens

Ainda entrevistei algumas das vítimas - "Prenderam-me durante 45 dias. Houve a ideia de arranjar mão-de-obra gratuita. E daí surgiram as prisões, mais prisões sem quaisquer razões para isso. Procurava-se emprego e não se encontrava. No entanto, as rusgas sucediam-se e as pessoas que encontravam eram presas. É claro que houve um ou outro que reagiu sobre essas atitudes." Declarações de Bartolomeu Cravid

O FACTO DE S. TOMÉ SER PEQUENO NÃO SIGNIFICA QUE LHE SEJA IMPOSSÍVEL ASPIRAR AOS MESMOS SONHOS DOS  GRANDES PAÍSES











Tem 43 anos esta afirmação:  - “Pelo facto de S. Tomé ser pequeno, isto não quer dizer que vá precisar de esmolas" - Declarações de um dirigente do MLSTP -  
Sem dúvida, era perfeitamente compreensível a explicação do Dr. Victor Correia, proferida há 40 anos, em declarações à revista Semana Ilustrada, de Luanda, da qual era seu correspondente

Infelizmente é quase do que vive: da dependência, quase total, das ajudas externas - Todavia, é bom não esquecer:

Alcançou-se a liberdade, deram-se importantes passos  na irradiação do analfabetismo, houve significativas reformas na urbanização e turismo, alguma industrialização, se bem que ainda incipiente, combateu-se o índice mortalidade infantil, que no tempo colonial atingia dramaticamente todas as famílias, deu-se um grande salto no combate às doenças endémicas, houve realmente grandes progressos em múltiplos aspetos e sectores da vida, económica, politica e social de São Tomé e Príncipe - A população, quase triplicou e, e se tal aconteceu foi por alguma razão e, os filhos destas Ilhas, deixaram de ser colonizados, podem orgulhar-se de que têm uma pátria e uma bandeira

.AS ROÇAS DE MÁ MEMÓRIA  - FEUDOS DA ESCRAVATURA À INDEPENDÊNCIA



.Muitos portugueses (colonos) também foram vítimas das prepotências e da exploração dos roceiros – Pessoalmente, fui um dos  muitos escravos nas roças - não eram só os africanos;  também eu trabalhei naquela roça grande!- Na Roça Rio do Ouro,   hoje conhecida por Roça Agostinho Neto Estive lá até que fui  mobilizado para a tropa, tendo ido tirar o curso de sargentos milicianos, em Angola, seguido do curso dos comandos e regressado ao CTI de STP, onde conclui o serviço militar.



Desempregado e desiludo com a malvadez e as prepotências do administrador Roça Uba Budo, fui lá pedir trabalho - Apanhei um velho autocarro, desde a cidade  até Guadalupe e apresentei-me lá manhã cedinho. Esperei que o administrador sdirigisse aos escritórios, tendo-o  abordado pessoalmente: "O que é que você faz aqui?"... pergunta,  mal me aproximo dele. "Estou desempregado e venho pedir-lhe trabalho, Sr. Fonseca....Vim fazer um estágio na Roça Uba Budo, depois fui mandado para a Ribeira Peixe. E não me dei lá bem"... "Já sei quem é você... Já sei o que se passou... O Pereira, já me falou de você.... Não sabia o que lhe havia de fazer e mandou-o para a Ribeira Peixe!... Aqui tudo se sabe... Ele diz que o queria mandar embora, porque fala muito com os pretos!... Que dá muita confiança aos serviçais... Mas eu não me importo que fale com eles!... desde que acabem as empreitadas!..."

Sim, foi uma experiência dura e traumatizante: desses tempos, a única saudade que tenho é a da surpreendente beleza que ia descobrindo quando andava lá pelo mato, depois de terminadas as empreitadas e do convívio com alguns empregados, que eram igualmente escravizados e da minha mocidade. E, naturalmente, não posso esquecer-me da tristeza que me infundiam aqueles pobres pés descalços (especialmente os cabo-verdianos e moçambicanos) cobertos por umas tangazistas ou uns trapos, de manchim na mão (que, aliás, também o empregado do mato o tinha de usar), subindo e descendo grotas a cavaletes, que, o regulamento da roça, não tratava com seres humanos, mas como escravos..

Os primeiros anos da minha permanência, em S. Tomé, foram passados na roça e foram tempos muito difíceis. Pois nunca me adaptei ao regime esclavagista que vigorava nas grandes propriedades agrícolas. Por várias vezes conheci o desemprego e muitas dificuldades. Inclusivamente uma espécie de desterro na Roça Ribeira Peixe – também conhecida pela Roça Perseverança.  Fui para ali mandado de castigo pelo administrador da Roça Uba Budo ( da Companhia Agrícola Ultramarina),  por me ter recusado a obedecer a velhos e repressivos regulamentos com os trabalhadores –  Aos maus tratos que lhe eram infligidos.  Só algum tempo depois de ter cumprido o serviço militar é que a minha vida conheceria um novo rumo nomeadamente depois de começar a descrever, numa revista de angolana, a minha primeira aventura marítima. O director e o chefe de redacção da Semana Ilustrada, ficaram tão entusiasmados com ao meu relato, que depois me convidariam para correspondente desta revista, em São Tomé.  A qual rapidamente  passou a ser uma espécie de alternativa e lufada ao  único jornal existente  – A Voz de São Tomé  -  totalmente controlada e apoiada pelo governo colonial. Os meus artigos ganharam leitores e influência local. Mas também acabariam por me trazer muitos problemas  -  Foi devido a eles ( mesmo aos que não foram censurados) que  consegui um emprego como operador  de rádio. Mas também acabaria por ser  devido a um desses trabalhos jornalísticos que não lograria entrar para os seus quadros. 

 Porém,  depois do 25 de Abril, ainda haveria de enfrentar maiores riscos e dificuldades Não por parte da população negra mas por  grupos de colonos, que não aceitavam que se denunciassem certas arbitrariedades perpetradas pelo regime derrubado, tal como não viam com bons olhos qualquer artigo em que  se desse voz  ao movimento  libertador da descolonização e independência. Tendo acabado por ser praticamente o alvo da  ira  da sua não compreensão  pelo estado de  mudanças que o espírito de Abril desencadeara, quer no continente quer nas colónias.    Não vou aqui relatar os episódios das suas agressões – pertencem ao passado e dariam muitas histórias. Mas não quero deixar de me referir a uma inesperada abordagem  pelo Cônsul dos EUA, em Luanda: queria informações aprofundadas sobre o movimento independentista das ilhas. Sabia que eu era dos poucos brancos que acompanhava de perto as suas manifestações e reuniões. Mas vinha também com outro propósito.

MULTIDÃO DE COLONOS INVADE O PALÁCIO, INSULTARAM O GOVERNADOR – E NO FINAL – QUANDO ME VIRAM ALI PRÓXIMO – CORRERAM ATRÁS DE MIM PARA ME LINCHAREM 

Uma manhã, ao saírem do palácio, depois de insultarem, o Governador, Pires Veloso – mal me viram sentado na esplanada do Restaurante Palmar, – onde pretendia inteirar-se daquela estranha ocorrência -, imediatamente correram furiosos atrás de mim!  E eram umas largas centenas. Se me apanhassem, naquele momento, estou convencido que me  tinham esmagado e linchado. - Mesmo assim ainda levei com uma pedra na cabeça. E o que me valeu foi ter subido por umas escadas e me ter  refugiado num telhado. À noite foi socorrido por um santomense que me levou para sua casa, onde estive escondido  quase duas semanas.

 Fugi para uma escada até que caísse a noite para me escapar para qualquer sítio, pois sabia que já tinham assaltado a minha casa e espatifado tudo. Era demasiado arriscado ali voltar.  Foi um rapaz negro (que me distribuía a Semana Ilustrada) que,  tendo-se apercebido da minha entrada naquela escada (onde por acaso pude esconder-me sem que fosse visto pelos moradores) que veio, mais tarde, em meu auxilio. Os colonos (muitos deles, em vez de regressarem às suas casas), optaram por se aquartelar com a tropa portuguesa. Nessa altura, as ruas à noite ficavam praticamente desertas e eu tive então oportunidade de escapar dali. Tendo passado quase duas semanas na casa dos pais desse generoso jovem, num autêntico esconderijo, algures no mato. 



PIRES VELOSO ALUDE,  NO SEU LIVRO:  “VICE-REI DO NORTE – Memórias e Revelações” À INESPERADA INVASÃO DOS COLONOS AO PALÁCIO DO GOVERNADOR

A manifestação podia ter acabado numa tragédia: havia o desejo de pegar em armas e atacar os defensores da Independência Total. Estes depressa galvanizaram as populações e o movimento do pró era imparável. Só se matassem o povo inteiro. Houve quem estivesse quase a perder as estribeiras.





Adicionar legenda
PIRES VELOSO, AGIU BEM,  EM  OBRIGAR O TENENTE-CORONEL RICARDO DURÃO A VOLTAR NO MESMO AVIÃO – ATITUDE INTELIGENTE QUE EVITOU UM BANHO DE SANGUE – E  REFORÇOU A CONFIANÇA JUNTO DOS DIRIGENTES NACIONALISTAS 

Faltou-lhes lá o Tenente-Coronel Ricardo Durão a liderar a revoltaque, uns dias antes, desembaraçara no aeroporto de São Tomé. Se o  Tenente-Coronel Pires Veloso já falecido, com a patente de  General), não o obrigasse a voltar no mesmo avião, estou certo de que, as águas que correm nas pacíficas Ilhas de São Tomé e Príncipe, ter-se-iam toldado por muitas manchas de sangue. E, sobretudo, se o Governador, não apelasse à calma dos manifestantes: os quais se rebelaram por motivos absolutamente injustificáveis, pois ninguém os molestou - Seguiram, depois, para  o quartel da Polícia Militar e Cinema Império. Porventura, na perspectiva de que, Ricardo Durão, os viesse comandar -  Já que a o episódio do seu regresso forçado não fora tornado público.


Mais tarde, já em Lisboa, uma dúzia de colonos, apanharam-me no Metro e voltaram agredir-me traiçoeiramente, como se estivessem na selva em São Tomé. Tal como fizeram na então chamada "Praça de Portugal", quando me dirigia a minha casa, por volta das oito da noite. Aguardavam-me emboscados no interior de um carro estacionado. Não havia luz na cidade, e, mal me viram, encadearam-me com os faróis e atiraram-se a mim como lobos. Tendo-me deixado, quase morto e prostrado no asfalto


Não me mataram, porque, entretanto, viram os faróis de outro carro e puseram-se na alheta. Noutra ocasião, arrombaram-me a casa, escaqueiraram com todas as minhas coisas e puseram-me uma forca pendurada à entrada da porta.  Por duas vezes, furaram-me à navalhada os pneus dos meu carro. Entre outras patifarias.


Francisco da Costa Gomes   - Chaves, 30 de Junho de 1914 — Lisboa, 31 de Julho de 2001

Marechal  Francisco Costa Gomes -   Uma das grandes personalidades, militares e cívicas,  Membro da Junta de Salvação Nacional desde a madrugada de 26 de Abril, e, como chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas em 30 de Abril de 1974. O primeiro Presidente da República Portuguesa a discursar perante a Assembleia Geral das Nações Unidas - Em Janeiro de 1975 está presente na assinatura do Acordo de Alvor, entre o governo e os movimentos de libertação angolanos, relativo à independência de Angola. Depois de dar posse ao IV Governo Provisório, também chefiado por Vasco Gonçalves (25 de Março de 1975), preside à assinatura, em 11 de Abril de 1975, do primeiro pacto MFA-Partidos.


Declarações inéditas de Francisco Costa Gomes, uma vez que,  da longa entrevista, que  honrosamente me concedeu, na qualidade de repórter da extinta Rádio Comercial RDP, apenas escassos minutos foram transmitidos. O  tema principal da minha deslocação a sua casa, versava sobre questões relacionadas com  o armamento atómico e convencional  das duas grandes potências e  o  papel do Marechal na Conferência Mundial da Paz, que, por agora, apenas reproduzo em texto .

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