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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

COSTA CONCÓRDIA E A COBARDIA DE FRANCESCO SCHETTINO: PORQUE ABANDONASTE O TEU BELO E IMPONENTE NAVIO?!...NÃO SABIAS QUE ELE E OS PASSAGEIROS FAZIAM PARTE DA TUA VIDA?!

- Jorge Trabulo Marques - Jornalista e antigo Navegador Solitário

O naufrágio do Costa Concordia, um dos mais graves naufrágios da história italiana, ocorreu em 13 de janeiro de 2012 . Às 21h45min07s, o referido cruzeiro atingiu o grupo de rochas conhecido como Scole , próximo à Ilha de Giglio , na Itália . O navio era propriedade da empresa de navegação Costa Cruzeiros , do grupo Carnival Corporation & plc , e era comandado por Francesco Schettino.

O naufrágio causou 32 mortes entre passageiros e tripulantes e, no julgamento subsequente, o Comandante Schettino foi condenado a 16 anos de prisão. Esta tragédia detém o recorde do naufrágio do navio de passageiros de maior tonelagem da história  https://it-m-wikipedia-org.translate.goog/wiki/Naufragio_della_Costa_Concordia?_x_tr_sl=it&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt-PT&_x_tr_pto=sc


"Que Deus tenha piedade dele, mas nós não podemos ter nenhuma", disse promotor sobre o ex-comandante do Costa Concordia"Vada a bordo": promotoria pede pena de 26 anos a Schettino

  É no mar que se conhecem os mais belos exemplos de coragem e de abnegação. -  Os de cobardia, são muito raros. Porque é justamente nesse imenso palco, no meio das suas adversidades,  que as fraquezas  do homem se transformam em forças, os medos se esbatem e esquecem e só há lugar para a coragem, para que o ser humano transcenda a sua própria natureza. O náufrago, indiferente ao perigo,  se solidarize com o infortúnio dos que vivem a mesma tragédia e se irmane no mesmo sentimento de dor, de compaixão, do comum apelo à sobrevivência, sinta que a sua vida se reparte com os que lhe estão próximos, com a sorte daqueles que o mar ameaça tragar. A luta é individual mas o  espírito que os une é colectivo!... É como se a dor e angústia perpassasse por um só corpo.E, todavia, quantos sentimentos e aflições se debatem nos mesmos instantes ou momentos de abandono e desespero!...

E, se porventura, a cobardia  ensombra e aplaca a lucidez, a inteligência, a autodisciplina, o equilíbrio mental,  altera as capacidades de decisão, a força de vontade, naquele a quem todos confiam o rumo do  navio, que o conduza  a salvo a bom cais ou a porto seguro, oh! miserável fraqueza humana!.. Quão  insensato impropério! Quão horrenda situação, renegada vilania e cobarde acto! 


Oh! a tragédia a regar os  cravos dos sacrilégios no mais líquido e pavoroso Inferno! Ó velas dos antigos veleiros de piratas, corsários rindo de desdém e ao vento,  em  mares sombrios e sonoros, em noites  de trevas lívidas e marmóreas! Lançados ao saque, como lobos esfaimados, em épicas contendas, sobre os convés de caravelas naufragadas, como escombrosos fantasmas, perdidos, desgovernados e desamparados!  Ó selváticos vampiros, feras cruéis esgrimindo desvairada e  sangrenta ferocidade,  deixando para trás o incêndio, o fogo e a morte, em  violenta e apressada fuga com o sangue dos mártires transformado no vil metal de ouro e prata!.. Ó pálida e mesquinha face dos cobardes e dos egoístas!. De quantas vidas e mortes vos alheastes!






Ó capitão do Costa Concórdia!....Já viste, como deixas-te, o  esplendoroso barco que comandáveis, por erro e incúria  vossa!!.. Ele, que agora jaz de costado, resvalando - ao que dizem - para o abismo, se não lograrem segurá-lo, qual moribundo que prolonga a sua morte até cair na cova ou funda sepultura!..  .

Quando o curso da viagem é abruptamente interrompido e o naufrágio salta à vista!... Olhai em vosso redor!.. O duelo com o mar é sempre um pitoresco e nobre desafio, o eterno sobressalto nas águas fatais e confusas mas  também a sacra oportunidade  da alma se elevar e revigorar num suspiro de heroicidade e brilho! Portai-vos como bravos!...

Ó comandante do Francesco Sachetinno! Que ares infames de cobardia ou de vício vos toldaram o cérebro?!...Que pérfida comédia foi essa, assombro ou susto de experiente marinheiro?!...Porque voltaste as costas ao vosso belo navio?!... A pouco mais de uns escassas dezenas de metros das rochas!... Porque vos retiraste?!... Porque razão– na hora mais grave e heróica -, vos acobardaste! – E, abandonaste, em confusa e atribulada salvação, aqueles que acreditaram e confiavam as suas vidas, em aprazíveis dias de férias e de evasão, no imponente navio cruzeiro?!

 

Oh! Quem me dera viajar até aos distantes mares do sul e ouvir o comandante a gritar da ponte: canoa ao mar!!...Ouvir de novo a mesma ordem::  A canoa estorva! O barco tem que pescar!!... Ou  fica a bordo a trabalhar ou meta-se já dentro dela e borda fora!!.. – Eu optei por ir para o mar abraçado à minha frágil piroga!.. Preferia naufragar – como, de resto, à noite o destino, em alteroso mar bravio, atiçado pela violência de inesperado tornado, assim mo reservava – mas jamais (eu que a comandava, eu que era seu fiel marinheiro) a abandonaria solitária  à mercê da fúria dos ventos tempestuosos, das misteriosas correntes e das enormes vagas!







A noite ia alta, o mar encrespado!  
E, apesar da fadiga e do cansaço 
da faina de um longo dia de pesca, 
parecia que ninguém queria ir aos beliches.
Ao meu lado, vários olhares apreensivos,
ainda envergando as habituais capas,
embora já bastante acostumados
aos horrendos cenários do tornado,
perfilavam-se volvidos e concentrados
além da escotilha!.. Todos viam,
com assombrosa nitidez, através
da embaciada ocular janela,
as constantes investidas do  mar
medonho, ameaçador, convulsivo!
Fustigando o barco, que balançava
da proa à popa, ao convés - varrido!

 .
Via-se e ouvia-se, em cada negra vaga
que os relâmpagos a espaços iluminavam,
o revolto remoinho, o tumulto enegrecido
e pálido que se erguia,  o turbilhão violáceo
das águas a rebentar e a estrondear!...
- Sim, não nego, não desdigo tudo isso!
O pavor que tudo aquilo me infundia!
O temor  daquela pavorosa imagem!
A  noite era povoada de escombros
e de assombro! - Também o meu coração!
Tudo aquilo, me infundia estranho medo,
causava-me alguma inquietude e apreensão,


Não vás amigo! Fica junto de nós a trabalhar!
Não te vai faltar nada! – Não vês como bravo está o mar?!...
Não vás irmão!...Não te queiras  afogar!..Não vês a morte!...
Não vês a tempestade, a ameaça do mar a  espreitar-nos?!...
Mas eu preferi envolver-me no que ele tem de generoso e colérico,
fazer dos seus humores, calmarias ou tempestades, o meu desafio,
confiar nos caprichos e ditames do destino da boa ou da má sorte!
Por isso, na manhã seguinte, mal o sol equatorial  raiou a despontar,
como que emergindo do fundo do vasto manto azul circular: à voz
de "canoa ao mar"! Lá fui sozinho à minha vida, rumo ao Norte!
Desiludido por não ter sido largado um pouco mais a sul e a oeste,
lá parti, de regresso a São Tomé, pelo desconhecido oceano a fora!

Partira de São Tomé, a bordo do pesqueiro americano Hornet  para ser largado na grande corrente Equatorial, rumo ao Brasil,evocando antiga rota dos escravos  - e, na verdade,  pouco mais faltavam que umas escassas milhas para o ponto desejado - Porém, aqui o comandante, embora faltando à palavra, não  fora cobarde:  quisera demover-me da ousada aventura, oferecendo-me trabalho a bordo; era prudente e cauteloso, receava que o frágil madeiro escavado, não suportasse as investidas do mar.E as três noites que passei  a bordo foram  horríveis, escotilhas fechadas, ninguém podia ir ao convés, ondas a varrerem-no de ponta a ponta ! - "Você vai morrer!... Fique connosco a trabalhar!"..Diziam-me alguns dos marinheiros, que vinham a espreitar ao meu lado o vendaval da noite cerrada!.. .Estava-se em plena época das chuvas, o mesmo cenário iria repetir-se na noite seguinte.

Em parte, tinha alguma razão - mas apenas pelo facto de ir sozinho e  a canoa necessitar de mais braços.Mesmo assim, lutei e sobrevivi durante 38 longos e atribulados dias. Pois, o que há de mais perigoso, mortífero  e assustador, não é o mar largo! São as áreas costeiras -  Eu sabia, que, afastado dos tornados e calmarias do grande Golfo da Guiné, não teria tantas dificuldades!  - A bem dizer, foi o que aconteceu ao Costa Concórdia: aproximou-se demasiado da costa, o pedregulho podia não constar na carta náutica mas estava lá - E os escolhos não se vêm à vista desarmada e, quando o sonar, o equipamento do navio, dá por ela, já é tarde: a imprudência paga-se cara. Lá diz o velho ditado: "o que há de perigoso no mar é a terra" - E foi sempre o que eu mais receei: pois não podia prever onde chegava, em que ponto iria aportar,  a que horas da noite ou do dia me poderia aproximar de chão firme. A simples bússola não bastava.


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