Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador
Magistral herança que ressoa a primórdios, trazendo o eco recôndito e
longínquo de remotas eras, dos povos que por aqui se abrigaram e cultuaram os
seus deuses, erigindo insólitas catedrais, templos solares alinhados com os
ciclos da Natureza, altaneiras estátuas de descomunais figuras humanas em descampados
morros, impressionantes formas de animais, de aves, enfim, configurando as mais
estranhas criaturas e fantasmagorias, cavadas e moldadas no ventre ou na face
do acinzentado e negro-sarapintado granítico - qual fabuloso petrimundo
dissimilado por mil cidadelas
Não é mera obra do acaso, vestígios da erosiva e poderosa ação dos
elementos - Na verdade, sítios há que são uma tentação, um verdadeiro centro de
emanações e de eflúvios, propensos ao deleite, ao esquecimento e à sublimação.
Quando não coberto das giestas em flor, aparentemente, mais lembra terra
de ninguém, parda e vazia paisagem de um qualquer pedaço lunar, porém, estou
certo que não haverá alguém que, ao pisar o milenar musgo ressequido daquelas
tisnadas fragas, ao inebriar-se com os seus bálsamos, subtis fragâncias, e
volvendo o olhar em torno dos vastos horizontes que se rasgam por largos
espaços, fique indiferente ao telúrico pulsar, à cósmica configuração e
representação divina, que ressalta em cada fraguedo ou ermo penhasco
Ali se refugiaram povos muito antigos, aproveitando os naturais abrigos:
as cavernas abertas nos enormes megalíticos, as fendas e as grutas dos
encastelados afloramentos, ou mesmo implantando, nos espaços mais estratégicos
e abrigados, os seus acampamentos, valendo-se de grotescas lascas e pedras
soltas, de cujas construções ainda prevalecem abundantes amontoados e outros
vestígios - e até um santuário de sacrifícios, amuralhado por um recinto
circular, junto ao qual se destacam dois colossais fraguedos, assentes num lagedo
que descai em rampa. Um deles, o principal, está de tal maneira inclinado a
poente, que parece desfiar todas as leis do equilíbrio e da gravidade. Visto de
trás, faz lembrar um enorme crânio humano
A fronte, pelo contrário, parece ter sido cortada de alto abaixo por um
só golpe - sabe-se lá por que hábil mão e recorrendo a que gigantesco machado!
Junto à sua base, de extremo a extremo, e no sentido poente nascente, é
atravessado por uma galeria em forma de cúpula, tendo no interior, um nicho com
uma pintura a negro, que tem dado origem a várias lendas e que a o povo
chama(talvez pelo seu entrelaçado), a Cabeleira de Nossa Senhora, nome pelo
qual é também conhecido o dito santuário.
A outra fraga, fica um pouco ao lado - e também não é uma pedra vulgar.
A sua orientação é ligeiramente diferente. Vista de costas para poente, parece
um enorme boné semi-pousado ou cabeça de réptil de olho aberto. Porém, o lado
que está voltado para Norte, uma boa parte do seu fundo, sai do lagedo que o
sustenta, é oco, fica incrivelmente suspenso em vazio, tomando a forma de uma
gigantesca campânula
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