Fim do ano -Povo nas praias, colonos nos bares |
Claro, dir-se-á hoje que tudo foi muito
precipitado, é verdade, com prejuízos para ambas as partes e que podiam ter
sido evitados se o regime colonial - antes do 25 de Abril- tivesse compreendido
os ventos da História e preparasse uma elite africana - Além de não o ter
feito, perseguiu aqueles que pretendiam novos rumos. Promovendo uma guerra
inútil com milhares de vítimas.
Imagens atuais que nao fazem esquecer o passado |
Era de prever, que, um dia, à força do salazarismo querer tudo, nos ia deixar sem nada – Nos lançaria para uma enorme crise social e económica, com graves consequências futuras – Daí que tenham sido muitos os escolhos, desde que o nosso país e os povos que subjugavam, se abriram a novos rumos na senda de uma saudável convivência, tolerância e espírito democrático.
PASSADOS HOJE 42 ANOS,
SOBRE A INDEPENDÊNCIA - A CAMINHO DE 43 - AS MINHAS SAUDADES DE S. TOMÉ NÃO SÃO
DE MODO ALGUM DA VIDA ESCRAVA NAS ROÇAS - Tal como não poderão ser nem
para os pobres trabalhadores negros nem para a maioria dos muitos brancos,
empregados de mato, onde também eu fui - - Que só podiam gozar a graciosa de
4 em 4 anos - Mesmo assim era muito problemático, até porque, muitos deles, não
resistiam às insidiosas febres do paludismo.
Naqueles tempos, um empregado de roça não
podia ir a outra dependência da empresa sem autorização do administrador. E o
mesmo sucedia para se deslocar à cidade, ao qual eram concedidas, autorizações excecionais, pois corria o risco de ficar
mal visto, perante a sobranceria do Patrão, (Administrador) se deslocasse todos os domingos.
Todavia, faz-me pena que as
roças se encontrem no estado, tão degrado, em que se estão, actualmente e, que, muito dos trabalhadores, que ali vivem nalgumas
dessas grandes prosperidades, exploradas por empresas privadas,
aufiram salários ainda mais miseráveis que no tempo colonial:
Sim, confesso que, o que mais me surpreendeu, ao dialogar com um antiga escrava da atual Roça Agostinho Neto, antiga Roça Rio do Ouro, foi esta expressão: Tenho muitas saudades! Porque antigamente tinha muita comida! Tinha escravatura mas tinha comida à vontade!... Agora que não tem escravatura, não há comida!...
Sim, confesso que, o que mais me surpreendeu, ao dialogar com um antiga escrava da atual Roça Agostinho Neto, antiga Roça Rio do Ouro, foi esta expressão: Tenho muitas saudades! Porque antigamente tinha muita comida! Tinha escravatura mas tinha comida à vontade!... Agora que não tem escravatura, não há comida!...
POIS QUE É
ISTO, SENÃO ESCRAVATURA! - OS SALÁRIOS MISERÁVEIS PAGOS, ATUALMENTE, AO FUNCIONALISMO E NAS ROÇAS EXPLORADAS POR
EMPRESAS PRIVADAS - Enquanto um Primeiro-ministro
esbanja milhões em centenas de passeatas pelo estrangeiro -
Evidenciando um comportamento ao velho estilo
dos mercadores esclavagistas – Sim, como é possível um pai de cinco filhos
alimentar a sua família e festejar o fim-do ano!!!!! - A trabalhar de sol a sol
na roça – com salário mensal de 25 euros – “500 contos” - 500 dobras - um euro
vale 25 - Vale-lhe a generosidade da Natureza: a fruta-pão que traz na mão com
o machim com que dobrou as costas, a espinha horas de empreitada a capinar - A
Carrinha que se vê na imagem da miserável senzala, onde coabitam 10
trabalhadores - além dos filhos . com a lama, as galinhas e os porcos, é da
Administração da Roça, que faz exploração agrícola e turismo rural por pessoas
da terra - Que naquele dia se encontravam ausentes, em gozo de férias
Atualmente numa das roças |
25 DE ABRIL EM S. TOMÉ -COMO ME APERCEBI DA REVOLUÇÃO EM PORTUGAL
Era na altura, operador de rádio, no Emissor Regional de São Tomé e Príncipe – Nesse dia, fui destacado para fazer a cobertura, na esplanada da Pensão Henriques, com a comunidade portuguesa, oriunda das Beiras - o Núcleo Beirão: desempenhava a dupla função de operador e de repórter.
Já lá vão uns pares de anos, porém, recuando no tempo, até me parece que foi ontem! Tão vivas ainda estão as memórias. Sim, desse dia mas não das afrontosas represálias, dos tormentos e brutais agressões por parte de alguns colonos, que se opunham à descolonização, das más recordações que o Novo Ano, me havia de trazer por denunciar o que era proibido dizer antes do 25 de Abril - Nomeadamente, os macabros episódios do Batepá. Mas, ainda antes de ter publicado esses artigos, logo a 8 de Janeiro, sou afastado, através de um telegrama enviado para a Emissora Nacional, de ser admitido nos quadros da rádio, devido a uma pequena critica a um organismo público, acerca do turismo - Para já não falar da chantagem do Presidente do Instituto de Trabalho e Acção Social (pós 25 de Abril) que ameaçara demitir-se do cargo se eu não fosse expulso de S. Tomé.
Sim, completaram-se à meia noite de 31 de Dezembro de 2017, a bonita soma de 43 anos, sobre a última festa da passagem do ano, na era colonial – Era bem mais novo e bem mais sonhador - Dias para dar largas às alegrias e se esquecerem as agruras da vida. Tem sido assim, no dobrar do calendário, quando um ano acaba outro começa: é o renovar das esperanças. A vida tem que se alimentada de ilusões, senão tornava-se insuportável.
Em S. Tomé, a passagem do ano, a bem dizer, até era o grande acontecimento dos 12 meses - Não havia outra data mais desejada - Não havia televisão de canal aberto - salvo a telescola, que, segundo me recordo, era em circuito fechado, pelo que a rádio era a grande rainha da informação, a estar sempre nos maiores acontecimentos - Fechava os olhos a muita coisa, pois assim lhe impunham as leis da censura, mas nas festas de cortar a fita, no futebol ou nos espetáculos musicais, nunca faltava. - E, obviamente, que, sendo assim, não podia deixar de fazer a cobertura à passagem do ano 73-74.
Eu nesse dia fiz de operador de som e de locutor. A vida foi-me muito dificil nos primeiros anos nas roças, como empregado de mato, mas agora, embora em regime precário, tinha outro estatuto - Nas famigeradas roças, nunca me adaptei: o administrador da Roça Uba-Budo exigia que os empregados tratassem os trabalhadores todos por tu e de forma prepotente a autoritária - Não aceitei; mandou-me de castigo para a roça Ribeira Peixe, a contar cacaueiro velhos numa zona abandonada, com capim que me cobria e infestado de serpentes: - eu não fiquei lá, mas um dos trabalhadores que em acompanhava, esse infeliz, cabo-verdiano, teve morte imediata aos meus pés.
Não vou aqui recordar esse calvário; à frente direi mais alguma coisa mas agora do que estou a falar é daquela já distante passagem de ano. A cobertura, pela rádio, naquele dia, era assegurada diretamente dos salões de várias coletividades: da Casa do Benfica, do Sporting, do Clube Militar e de Santana - Com festas abrilhantadas pelos mais populares grupos musicais da Ilha, com a sua música típica, convidativa à dança, a puxar ao sentimento e ao “flogá. O grosso da população, à exceção da pequena elite santomense, estava à margem destas festas ou então optava pelos "fundões" mais modestos.
Em S. Tomé, a passagem do ano, a bem dizer, até era o grande acontecimento dos 12 meses - Não havia outra data mais desejada - Não havia televisão de canal aberto - salvo a telescola, que, segundo me recordo, era em circuito fechado, pelo que a rádio era a grande rainha da informação, a estar sempre nos maiores acontecimentos - Fechava os olhos a muita coisa, pois assim lhe impunham as leis da censura, mas nas festas de cortar a fita, no futebol ou nos espetáculos musicais, nunca faltava. - E, obviamente, que, sendo assim, não podia deixar de fazer a cobertura à passagem do ano 73-74.
Eu nesse dia fiz de operador de som e de locutor. A vida foi-me muito dificil nos primeiros anos nas roças, como empregado de mato, mas agora, embora em regime precário, tinha outro estatuto - Nas famigeradas roças, nunca me adaptei: o administrador da Roça Uba-Budo exigia que os empregados tratassem os trabalhadores todos por tu e de forma prepotente a autoritária - Não aceitei; mandou-me de castigo para a roça Ribeira Peixe, a contar cacaueiro velhos numa zona abandonada, com capim que me cobria e infestado de serpentes: - eu não fiquei lá, mas um dos trabalhadores que em acompanhava, esse infeliz, cabo-verdiano, teve morte imediata aos meus pés.
Não vou aqui recordar esse calvário; à frente direi mais alguma coisa mas agora do que estou a falar é daquela já distante passagem de ano. A cobertura, pela rádio, naquele dia, era assegurada diretamente dos salões de várias coletividades: da Casa do Benfica, do Sporting, do Clube Militar e de Santana - Com festas abrilhantadas pelos mais populares grupos musicais da Ilha, com a sua música típica, convidativa à dança, a puxar ao sentimento e ao “flogá. O grosso da população, à exceção da pequena elite santomense, estava à margem destas festas ou então optava pelos "fundões" mais modestos.
OS SANTOMENSES DIVERTIAM-SE NAS PRAIAS AO NASCER DO SOL
O Povo Santomense tinha também outras formas de se divertir – Por exemplo, o costume de, ao nascer do sol, muita gente acorrer às praias, penso que ainda hoje o faz – Nomeadamente, no Pantufo e na praia de S. Pedro, na Baía Ana de Chaves - Muitos aproveitavam para ir dar o seu mergulho e dar largas à sua folia. Fiz a reportagem de algumas dessas festas para a revista Semana Ilustrada. Aliás, em Portugal, há também quem faça o mesmo: não enjeite testar a sua saúde na água gelada do Inverno – Uma das Praias, já famosa, pelos banhos do fim do ano, é a de Carcavelos, no estuário do Tejo. Mas, em S, Tomé e Principie, como as ilhas se situam no Equador, as águas estão sempre quentes, os banhos, em qualquer altura do ano, são sempre um regalo, um agradável convite a devassar a água cristalina das ondas.
VÍDEO SONORIZADO COM OS SONS E VOZES DA REPORTAGEM DA COBERTURA DA RÁDIO – FIM DO ANO 1973/74
O vídeo, editado no You Tub, é ilustrado com algumas fotos das muitas reportagens, sim, das centenas que publiquei na revista Semana Ilustrada, de Luanda – A qualidade, não é a melhor mas julgo que, para as gerações dos cabelos de prata, que nasceram em S. Tomé, ou que lá viveram, idos de Portugal, é capaz de ter o seu interesse, quanto mais não seja, como memória ou documento histórico. Mas até creio que, como motivo de curiosidade, é mais abrangente.
JORNALISTA E OPERADOR DE RÁDIO – NESSE DIA TAMBÉM FIZ REPORTAGEM RADIOFÓNICA – MAS NEM ASSIM LOGREI SER ADMITIDO NO QUADRO:
Oito dias depois, fui banido da admissão, por ter levantado a questão da problemática do turismo, na revista Semana Ilustrada -
Um telegrama, enviado para a Emissora Nacional, pelo Intendente do Emissor Regional de São Tomé e Príncipe, Sr. Carlos Dias, pressionado pelo Diretor dos Serviços Técnicos, inviabilizara a minha admissão no quadro:
Instaurou-me um processo disciplinar, devido a um artigo publicado naquela revista – Por ter falado na problemática do Turismo, em S. Tomé – O Diretor deste serviços, não gostou e lá tive que levar com a ripada:
Este, como era amigo do Eng. Américo Freire - um fascista que havia sido enviado pela Emissora Nacional, para reestruturar os serviços técnicos do Emissor Regional, instalar uns potentes emissores de Onda Média, para fazer de S. Tomé, um centro de propaganda colonial para a região dos países do Golfo da Guiné e África Central - , obrigou o Intendente Carlos Dias, a enviar um telegrama para Lisboa, a anular a minha admissão, que havia sido proposto por ele mesmo à EN. – Ainda teve a lata de me chamar o seu gabinete e de me confessar: “você disse mal do meu grande amigo, vai-se lixar!... E não o ponho no olho da rua, porque precisamos de você!”
VIRTUDE DE SUMÁRIO INQUÉRITO SOBRE PROCEDIMENTO OPERADOR JORGE LUIS MARQUES. REFERIDO NSI 1929 12 CORRENTE FECAEEE PELO VEXA NÃO CONSIDERAR AQUELE OPERADOR PARA INCLUSAO ARTIGO 19/0
CUMPRIMENTOS
CARLOS DIAS ER STP"
PRESIDENTE DO INSTITUTO DE TRABALHO, PRESSIONOU O GOVERNADOR A EXPULSAR-ME DE S. TOMÉ - COLOCOU O LUGAR A DISPOSIÇÃO: OU EU ERA EXPULSO OU ELE SE DEMITIA MAS A REVOLUÇÃO DE ABRIL ESTAVA NA RUA E TROCOU-LHE AS VOLTAS
Naquele mesmo ano, quatro meses depois, surgia o 25 de Abril: passei a poder escrever o que antes me estava vedado, porém, só Deus sabe as represálias de que fui alvo: desde pressões para ser expulso de S. Tomé, a bárbaras agressões:
A revolução apanhou de surpresa, a generalidade dos colonos. A liberdade de expressão, ainda não era bem aceite: a mentalidade colonial, reinante, não ia mudar de um dia para o outro. Por isso, caso não viesse a contar com a compreensão e o apoio do então Alto-Comissário, Pires Veloso, estou certo que tinha sido demitido da rádio e expulso para Portugal, tal como foram alguns revolucionários do MLSTP.
A revolução apanhou de surpresa, a generalidade dos colonos. A liberdade de expressão, ainda não era bem aceite: a mentalidade colonial, reinante, não ia mudar de um dia para o outro. Por isso, caso não viesse a contar com a compreensão e o apoio do então Alto-Comissário, Pires Veloso, estou certo que tinha sido demitido da rádio e expulso para Portugal, tal como foram alguns revolucionários do MLSTP.
A primeira grande pressão partiu do Presidente do Instituto de Trabalho, Previdência e Acção Social, que, em vez de defender os trabalhadores, esteve sempre ao lado dos grandes roceiros e dos patrões mais abusadores –
Chamavam-lhe o cavalo branco, pela sua cabeleira grisalha e postura autoritária.
Era uma figura mal vista, sinistra, que passava os fins-de-semana nos banquetes dos roceiros . Quando tive oportunidade de criticar a sua atuação, colocou imediatamente o lugar à disposição: ou eu era expulso ou ele se demitia
Chamavam-lhe o cavalo branco, pela sua cabeleira grisalha e postura autoritária.
Era uma figura mal vista, sinistra, que passava os fins-de-semana nos banquetes dos roceiros . Quando tive oportunidade de criticar a sua atuação, colocou imediatamente o lugar à disposição: ou eu era expulso ou ele se demitia
Dei-me conta de tal atitude através do Emissor Regional.de S. Tomé e Príncipe, que difundiu um oficio emanado da Repartição de Gabinete, dizendo que “uma noticia publicada em Semana Ilustrada, na edição Nª 362, levou o Presidente do Instituto de Trabalho, Previdência e Acção Social, a pôr à disposição do Governo o seu lugar naquele organismo público, o que não foi aceite, segundo o mesmo comunicado, por continuar a merecer a confiança do Governo".
Os jornalistas são sempre as primeiras vítimas, os bodes-expiatórios da ira popular, das guerras e conflitos - Em S. Tomé, só não me lixaram, talvez por milagre - Mas não foi da população nativa que partiram as agressões e ameaças. Aliás, foi no seio desta que eu fui protegido.
A minha sorte foi que, nessa altura, o governador Cecílio Gonçalves (aliás, uma excelente pessoa) já quase não mandava, visto não se adaptar ao desenrolar dos acontecimentos, tanto em S. Tomé, pelas manifestações da população, que exigia a independência, como em Lisboa, acabando por abandonar a colónia - E, quem o veio a substituir, não quis embarcar nas pressões pró-coloniais dos roceiros e de Spínola, optando por criar condições para que o processo da descolonização, decorresse, pacificamente sem derrame de sangue. Tal como escrevi neste site, em - http://www.odisseiasnosmares.com/2014/08/general-pires-veloso-e-hoje-sepultado.html
“NÓS E O PRESIDENTE DO INSTITUTO DE TRABALHO
“Da Repartição de Gabinete do Governo de São Tomé e Príncipe, recebemos o seguinte oficio:
Incumbe-se Sua Excelência o Encarregado do Governo de solicitar, nos termos do art, 414, do E.F.U., a transcrição seguinte comunicado na Revista da mui digna direcção de V. Exa, como mesmo destaque e na mesma página em que a noticia foi publicada;
Sob o título: “Nós e o Presidente do Instituto de trabalho” , e assinado por Jorge Trabulo Marques, publica o número 366 da revista “SEMANA ILUSTRADA”, um artigo me que se produzem várias afirmações que põem em causa a actuação do actual Presidente do Instituto do Trabalho e Acção Social desta província”
NÃO CEDI ÀS AFRONTOSAS AMEAÇAS E CHANTAGEM
Apesar das prepotentes ameaças, nunca me deixei atemorizar – E voltei à carga: Eis a passagem da minha resposta: (…) "Pelo que nos parece, o Presidente do Instituto de Trabalho, Previdência e Acção Social, não se tem conformado com verdades que lhe apontamos ( e verdades quem gosta que lhas digam?) facto que até o levou a colocar o seu lugar a disposição do Governo(atitude esta que nos deixa um bocado confusos} vamos pois dar-lhe conhecimento de mais qualquer coisa. Até para defesa do seu prestígio pessoal, que mais não seja.
Não sei se V. Exa já tinha dado conta que não goza de muitas simpatias em S. Tomé. (no Príncipe, não sei o que lá vai). E parece-me que afinal não só das classes trabalhadores com até de certas entidades patronais, para as quais, V. Exa, não vem tomando idêntico critério que usa para com outras.
Por· outro lado, o seu pessoal, os funcionários que estão sob as suas ordens, igualmente, grande número deles não gostam de V.Exa. Nem confiam em V. Exa. Disseram-nos que tem sido muito injusto para com eles. Que não se tem interessado nem utilizado o mesmo critério para todos no que respeita a promoções, e, consequentemente, compensação dos seus serviços. Se V.Exa. não sabia disso então fica desde já sabendo. Mas é muito natural que, quando o senhor ler estas linhas, parte dos seus subordinados, já se tenha manifestado e feito compreender perante a sua pessoa: pois já nos disseram que iam marcar uma reunião com V.Exa.
No que respeita à calasse dos trabalhadores, vários têm sido os trabalhadores que se nos têm vindo a lamentar da sua pessoa. Não pretendemos apontar ninguém, até porque não é essa nossa função. Ainda, há dias, por exemplo, um trabalhador de uma roça veio ter connosco dizendo que tinha sido despedido sem justa causa da propriedade onde trabalhava. Ainda por cima lhe passaram uma guia (cuja fotocópia temos connosco ) para efeitos. de apresentação às entidades oficiais, em que se referia que o dito trabalhador se havia despedido, mas tinha sido precisamente o contrário, segundo ele próprio nos declarou.” – Excerto
Naturalmente que não posso culpabilizar a generalidade dos colonos portugueses pelas suas atitudes intempestivas: - os brancos foram apanhados de surpresa pelo desenrolar dos acontecimentos e andavam muito nervosos, receando pelo seu futuro. Ninguém os molestou fisicamente - E a única vida que se perdeu, até foi a de um santomense, com uma bala da tropa: o acidente ocorreu a 6 de Setembro: Rodrigues Pinta de 59 anos, estivador, conhecido por Giovani, foi morto "por uma bala perdida" durante uma manifestação acalorada no Bairro do Riboque -
Nesse mesmo dia, .Paulo Ferreira, um soldado de 23 anos da Companhia de Caçadores de S. Tomé e Príncipe, morreu num brutal acidente de viação, quando a sua unidade regressava da roça de Santa Catarina.
Mas a verdade é que havia um movimento silencioso mas ativo. O MLSTP , que começou estar sediado em Fernando Pó e depois se transferiu para o Gabão, fazia as suas emissões de rádio, em dialeto e também atuava no interior das ilhas ( em reuniões sob o maior sigilo, a PIDE andava à coca e, de volta e meia, prendia e espancava. - Tais factos estão hoje suficiente documentados e descritos. Os colonos é que desconheciam essas aspirações: julgavam que a guerra, em Angola, não lhes dizia respeito - E, a bem dizer, do desfecho desta dependia também o futuro de S. Tomé e Príncipe - E foi justamente o que sucedeu, com a revolução do 25 de Abril "Nem mais um soldado para a guerra" - E, a partir daí, não havia outra solução que não fosse a dos acordos, em Argel, para dar a independência às colónias - Há quem diga que foi mal feita - Sim, dito sobretudo por aqueles que, alheios à mortandade dos soldados e dos guerrilheiros, apenas olhavam para os seus interesses pessoais.
VÍDEO DE HUMOR, ROSTOS, PAISAGENS E MÚSICA DE SÃO TOMÉ – “Turista Americano” entrevistado pelo “Emissor Anfíbio do Pantufo” – Memórias do ERSTP de há 42 anos –
Os jornalistas são sempre as primeiras vítimas. os bodes-expiatórios da ira popular, das guerras e conflitos - Em S. Tomé, só não me lincharam, talvez por milagre - Mas não foi da população nativa que partiram as agressões e ameaças. Aliás, foi no seio desta que eu fui protegido
Por duas vezes todos os pneus à navalhada |
39 anos depois |
Nesse mesmo dia, .Paulo Ferreira, um soldado de 23 anos da Companhia de Caçadores de S. Tomé e Príncipe, morreu num brutal acidente de viação, quando a sua unidade regressava da roça de Santa Catarina.
As constantes manifestações populares, reclamando a independência, causavam-lhes alguma instabilidade. Ora, nestas coisas, como geralmente acontece, nos conflitos, os jornalistas são sempre as maiores vítimas, o bode expiatório da situação - Enquanto em Angola, havia uma guerrilha declarada, que ceifava já milhares de vidas de parte a parte, em S. Tomé, a luta era diferente - O povo é por natureza pacífico. Em São Tomé e Príncipe, não existia criminalidade, senão esporadicamente e mais do foro passional - Apesar da população ter sido tão sacrificada ao longo dos séculos, à exceção das revoltas do "angolares" (etnia, dedicada especialmente à pesca), os maiores problemas, com que a colonização portuguesa nas ilhas, se teve de bater, foi com os corsários franceses e holandeses.
Por conseguinte, quando o Povo Santomense, teve oportunidade de sair à rua e se manifestar, exigindo abertamente a independência, fê-lo calorosamente, mas sem atos de violência - No entanto, para os colonos, tais manifestações eram entendidas, como uma ameaça à sua continuidade nas Ilhas. De certo modo, é verdade - as roças, principal fonte da exploração colonial, nunca serviram o povo santomense mas os donos dessas grandes propriedades, que viviam refasteladamente em Lisboa: os chamados turistas da Gravana, que só ali iam a dar umas passeatas e a banquetear-se em lautas jantaradas - Salvo o administrador, o chefe de escritórios e o feitor-geral, em cada roça, o resto, tanto empregados brancos, como trabalhadores, não passavam de escravos: pessoalmente, passei por esse dura experiência.
ESPALHARAM-SE POR TODAS AS RUAS - O QUE ME VALEU FOI TER DESCOBERTO A ESCADA DE UMA PORTA ABERTA E REFUGIAR-ME NO TELHADO DESSE PRÉDIO
MESMO ASSIM, QUANDO CORRIA À SUA FRENTE, AINDA LEVEI COM UMA PEDRA NA CABEÇA e outra nas costas - Depois de descarregarem toda a ira e ódio na minha modesta viatura, furando-lhe os quatro pneus à navalhada, arrombara-me a casa, partiram-me tudo: escaqueiraram-me a máquina de escrever, onde nem sequer ficou um simples copo inteiro para beber água - Não satisfeitos com a malvadez, deixaram uma forca pendurada na porta, e, na parede ao lado, uma cruz desenhada e a inscrição: " a morte sanciona cada traidor".
TIVE QUE ME REFUGIAR, EM CASA DE UM SANTOMENSE: dos pais do Constantino Bragança, que, tendo assistido à perseguição, se deslocou à noite ao local para me colher no seu modesto casebre, algures no mato: Sr. Jorge! Pode descer, que os brancos foram todos para o quartel da Polícia Militar e do Cinema Império e venha para a minha casa"
A minha casa ficou irreconhecível, num monte de destroços. Como não me apanharam lá no seu interior, deixaram-me à porta o laço da prometida forca de corda. Pelos vistos, em qualquer parte do mundo, os jornalistas são sempre as primeiras vítimas. É neles que descarregam todos as iras e ódios. Ainda hoje, ao escrever estas linhas, se me toldam os olhos, tal os maus momentos por que passei. Ao meu modesto carro, por duas vezes, lhe furaram os pneus à navalhada.- Não me importo de ser confrontado com os elementos da natureza mais hostil, mas ser atingido pelo ódio humano é mil vezes pior!...Não é medo é um sentimento de profunda tristeza e revolta.
VÍDEO DE HUMOR, ROSTOS, PAISAGENS E MÚSICA DE SÃO TOMÉ – “Turista Americano” entrevistado pelo “Emissor Anfíbio do Pantufo” – Memórias do ERSTP de há 42 anos –
Programa de Humor com desfile de rostos e panoramas maravilhosos de S. Tomé, e , por fim, com a audição de um antigo trecho de música típica santomense . Acompanhe-nos na entrevista, que eu próprio fiz a John da Purificação Semith”, o “Turista Americano” que descobriu S. Tomé, em 1973 para visitar a ilha e escalar o Pico Cão Grande - Uma rábula de humor, transmitida num programa radiofónico, do extinto Emissor Regional de S. Tomé e Príncipe, que aqui lhe recordamos, com várias imagens da Ilha, que eu registei 39 e 40 anos depois de ter partido numa canoa para tentar a travessia de S. Tomé ao Brasil
Fora admitido a operador de Rádio, a nível de um regime precário, salvo erro, em 1971 – Lograra entrar para a rádio, no seguimento dos meus artigos publicados na Semana Ilustrada, de Luanda – Deu-se a feliz coincidência, de, após a minha travessia de canoa de S. Tomé ao Príncipe, em Fevereiro de 1970, se encontrar o chefe de redação daquela revista, em S. Tomé, que, ao tomar conhecimento da minha aventura, me convidou a fazer o relato na referida publicação, que acabou por ser ali editado em quatro edições, situação que iria dar novo rumo à minha vida em S. Tomé
Dois meses antes, ou seja, na véspera do início das comemorações da descoberta da Ilha pelos navegadores portugueses, havia realizado a ligação de canoa, da cidade até à praia de Anambô, onde se encontra o padrão dos descobrimentos, sim, porque, embora o regime colonial, já me houvesse dececionado bastante, com os abusos e as prepotências nas roças, eu continuava a admirar a coragem dos homens das frágeis caravelas, que haviam sulcado os vários oceanos. Em sua homenagem (mas também como um teste para outras aventuras mais arrojadas, e com outros propósitos) decidira empreender a tão arriscada ligação, indo ali desfraldar a bandeira portuguesa, ao lado daquele monumento histórico.
O facto mereceu relevo na imprensa local, o mesmo não sucedeu, quando, um mês depois parti de canoa, clandestinamente, largando à meia-noite, da Baía Ana de Chaves, disfarçado de pescador. No regresso, ao desembarcar do avião, fui espancado pela PIDE e encarcerado, por ter sido tomado como desertor. A Voz de S. Tomé, limitou-se a umas escassas linhas, a citar o correspondente da EN, que havia dado a noticia para Portugal
O facto mereceu relevo na imprensa local, o mesmo não sucedeu, quando, um mês depois parti de canoa, clandestinamente, largando à meia-noite, da Baía Ana de Chaves, disfarçado de pescador. No regresso, ao desembarcar do avião, fui espancado pela PIDE e encarcerado, por ter sido tomado como desertor. A Voz de S. Tomé, limitou-se a umas escassas linhas, a citar o correspondente da EN, que havia dado a noticia para Portugal
Contudo, mesmo assim, o bastante para o chefe de redação, da Semana Ilustrada, Sr. Mourão de Campos, se aperceber que a minha aventura era merecedora de outro destaque.
As reportagens tiveram um grande impacto e, mercê dos meus dotes literários, fui então convidado a continuar a colaborar, ao mesmo tempo que trabalhava como Técnico Agrícola, na Brigada de Fomento-Agro-Pecuário, na tentativa de ali concluir o meu estágio de Agente Rural, já que fora este o motivo que, antes da tropa, aos 18 anos, me levara a embarcar para S. Tomé, o que não conseguira nas roças, onde não me adaptei
As reportagens tiveram um grande impacto e, mercê dos meus dotes literários, fui então convidado a continuar a colaborar, ao mesmo tempo que trabalhava como Técnico Agrícola, na Brigada de Fomento-Agro-Pecuário, na tentativa de ali concluir o meu estágio de Agente Rural, já que fora este o motivo que, antes da tropa, aos 18 anos, me levara a embarcar para S. Tomé, o que não conseguira nas roças, onde não me adaptei
Mais tarde, deixei aquele organismo e pude então entrar como operador de rádio, naquela estação e desenvolver, com mais tempo e oportunidades, a função jornalística .
Alguns dos meus artigos, não chegaram a ser publicados, foram-me devolvidos com o risco da censura – Mesmo assim, apesar dessas limitações repressivas, pude publicar ainda muita coisa – Com o 25 de Abril, as liberdades de expressão foram instauradas, e, obviamente, os meus artigos passaram a incomodar as mentalidades que não aceitavam a descolonização e novos ventos da história. Fui vitima de feroz perseguição por alguns colonos, de traiçoeiras e cobardes agressões, ao ponto de ter que me sair da ilha, numa canoa, com destino à Nigéria: eu já andava há algum temo com o desejo de fazer essa viagem para comprovar que as canoas poderiam fazer longas travessias, entre a continente e as ilhas e terem sido os primeiros povoadores, pelo que, em vez de procurar sair de barco ou de avião, aproveitei para o fazer de canoa. Uns meses depois, no mesmo ano, voltei a São Tomé, já país independente, para empreender um teste, ainda muito mais ousado: a travessia de S. Tomé ao Brasil. Não vou agora aqui descrever os pormenores, desses longos e atribulados 38 dias, pois, já os relatei neste site, e tal me levaria longe.
Alguns dos meus artigos, não chegaram a ser publicados, foram-me devolvidos com o risco da censura – Mesmo assim, apesar dessas limitações repressivas, pude publicar ainda muita coisa – Com o 25 de Abril, as liberdades de expressão foram instauradas, e, obviamente, os meus artigos passaram a incomodar as mentalidades que não aceitavam a descolonização e novos ventos da história. Fui vitima de feroz perseguição por alguns colonos, de traiçoeiras e cobardes agressões, ao ponto de ter que me sair da ilha, numa canoa, com destino à Nigéria: eu já andava há algum temo com o desejo de fazer essa viagem para comprovar que as canoas poderiam fazer longas travessias, entre a continente e as ilhas e terem sido os primeiros povoadores, pelo que, em vez de procurar sair de barco ou de avião, aproveitei para o fazer de canoa. Uns meses depois, no mesmo ano, voltei a São Tomé, já país independente, para empreender um teste, ainda muito mais ousado: a travessia de S. Tomé ao Brasil. Não vou agora aqui descrever os pormenores, desses longos e atribulados 38 dias, pois, já os relatei neste site, e tal me levaria longe.
SEMANA ILUSTRADA – O ÓRGÃO DA IMPRENSA ESCRITA - DO EXTERIOR – QUE MAIS PÁGINAS DEDICOU A S. TOMÉ E PRÍNCIPE, ANTES E DEPOIS DO 25 DE ABRIL
A Semana Ilustrada, era muito apreciada e popular, nas Ilhas Verdes do Equador, tanto pelos santomenses, que a chegaram até a homenagear, como pela comunidade portuguesa – Esta só nos deixou de apoiar, quando passamos a publicar artigos das manifestações pró-independência e dos massacres do Batpá
Nunca nenhuma revista ou jornal dedicara tanto espaço nas suas páginas, como a Revista Semana Ilustrada – por duas vezes, até houve uma casa comercial, a Firma Alves e Ribeiro Lda, que decorou as suas montras com as capas da nossa revista - A iniciativa partiu do então jovem, de 18 anos, Horácio de Sousa Ribeiro, empregado na referida loja, que, com agradável surpresa, quatro anos depois, viemos a reencontrar na bancada do Estádio da Luz, no exercício da nossa atividade jornalística, nomeadamente, na reportagem fotográfica – Naturalmente, que foi um momento de calorosa surpresa e emoção, que aqui registo, com muito agrado, com a evocação do passado e do presente.
De recordar, que, quando a TAP resolve suspender as suas três carreiras e passa a operar apenas um voo, foi a manchete deste semanário, que obrigou, aquela empresa pública, a repor os mesmos voo. Nas Ilhas, o único banco era o Banco Nacional Ultramarino – E foi um artigo, igualmente de minha autoria, com as declarações de vários comerciantes e industriais, que levaram a que fosse autorizada a abertura de um Banco Comercial. E tantas outras coisas: a elogiar, quando achávamos que o devíamos fazer, e, quanto a criticas, aquelas que a censura nos deixava passar – O que nem sempre sucedia, pois vários foram os artigos que me foram devolvidos pela redação com o bisturi da censura.
Obviamente, que, com a libertação do regime ditatorial, o que é que se esperava?... Que continuássemos a ter que medir bem as palavras? – Por nossa parte, não hesitamos: entendemos que o caminho era o da democracia e da libertação do domínio colonial – É um facto que, muitos erros se cometeram, num pais que ensaiava os primeiros passos do seu próprio caminho, e, então, em Portugal, não se cometem ainda grandes erros, hoje? – Por nosso lado, não nos estamos arrependidos dos que escrevemos.
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