Nuno Rebocho, o poeta
português, jornalista, que vive “desterrado” numa das cidade mais velhas do
antigo reino português, Ribeira Grande de Santiago, considerada - em tempos que
já lá vão - uma das mais importantes do antigo reino. Assessor de
imprensa da câmara, escritor e poeta nas horas livres- Já nos referirmos a ele,
em http://www.odisseiasnosmares.com/2014/08/cabo-verde-patrimonio-historico-da.html
mas justifica que aqui lhe voltemos a dedicar mais este post
De novo nos
caminhos da poesia – Depois do "Canto Finissecular" – lançado, na
Biblioteca Municipal de Odivelas, integrado na Bienal da Lusofonia, e dia 25 de
maio, passado, ei-lo, agora, prestes a brindar-nos, com “A Papaia, o seu 28º livro – Baseado na recolha de alguns poemas que integram o original, já escrito de “Rotxa Scribida” – “O Vale dos Sons”.
Redigido na Cidade Velha, evoca a escravatura e refere uma caraterística do seu
vale, que acontece nos dias mais diáfonos: o vale da ribeira de Maria Parda
reflete sons.
.
Com
autorização do autor, reproduzimos o poema
O Vale dos Sons
Grudam-se
os ecos à encosta e são os sons
das
subterrâneas águas dos séculos: são as vozes
acorrentadas
como as espadas de corsários
em
algemas de açúcar. São lágrimas e chicotes
nos
dorsos da memória. São almas degredadas
nas
cavernas dos donatários e verdes mangas
esperando
amadurecer como eu espero
que
da terra adubada irrompam poemas
com
armas de esperança e tão tremendos
como
a candura buliçosa de uma criança.
…/…
No
vale dos sona libertam-se as vozes que tudo falam:
já
não são escravas – trazem a alforria
da
aragem e o odor dos cajueiros
mas
recordam sempre as dores acumuladas nos trapiches
e
os sémenes da opressão nos ventres importados.
Acordam
agonias de porões aferrolhados
e
vómitos sobre os grilhões da viagem. Lembram.
Lembram
e lembram como ferretes marcados
nos
costados ou adagas revoltadas pela injustiça
no
pelourinho calcário da vil cobiça.
…/…
É
isto a mestiçagem: o triunfo da liberdade
cantado
pelos galos da madrugada
com
o amor fundindo as grades das masmorras.
É
o enorme útero parindo a vitória da fraternidade
sobre
o manto seco dos rios da história. É a ribeira
caudalosa
desentulhando o vale da memória
como
o futuro se revela na copa generosa.
A
mestiçagem é isto – a cópula do tempo: a bandeira.
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