Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista
É mais um êxito
que vem coroar anteriores traduções de ''O Útero da Casa'' e ''A Dolorosa Raiz
do Micondó'', pela Editora Delta, de Estugarda, que, acaba de publicar, também
em edição conjunta bilingue, ''O País de Akendengué'' e ''Quando Florirem
Salambás no Tecto do Pico.''Tradução de Tobias e Jona Burghardt.
A novidade foi dada a conhecer na página do Facebook, de Conceição Lima, na qual manifesta “ quão me alegra ter os meus quatro livros traduzidos para o alemão.
De recordar que a ’A Dolorosa Raiz do Micondó’’, faz parte de uma coletânea de poemas no Programa Nacional de Bibliotecas Escolares do Brasil - Reconhecida como uma das “vozes líricas mais assombrosas da literatura africana contemporânea” por Michael Kegler - E, num ensaio intitulado “O papel público de escritores e intelectuais1, Edward W. Said, afirma que a voz poética da são-tomense Conceição Lima, um dos nomes que, ao vivenciar a história de seu país, desempenha «o papel simbólico especial do escritor como um intelectual que testemunha a experiência de um país ou de uma região, dando a essa experiência uma identidade inscrita para sempre na agenda discursiva global»
São Tomé e Príncipe é uma terra onde a poesia está na sua paisagem, no azul do mar que a envolve e no rosto das suas gentes: os verdes multicolores são próprios das ilhas tropicais mas nestas ilhas as suas tonalidades assumem uma magia especial - O nosso planeta é vasto mas , além de não haver duas terras com as mesmas singularidades, estas ilhas têm o condão de se situarem no meio do Mundo – Nomeadamente, S. Tomé. A Ilha do Príncipe, fica a 150 Km mais a Norte e é tida como a princesa do Golfo da Guiné. No entanto, quer uma quer outra, para quem as demande, é amor à primeira vista - Não é por acaso que a poesia ali floresce, até das raízes das árvores que mais tempo se agarram ao solo, mesmo quando o mar as deixa nuas e quase agarradas às rochas.Autora de três livros de poesia, publicados pela Editorial Caminho, um dos quais, “A Dolorosa Raiz do Micondó’’, livro lançado pelo Ministério da Educação do Brasil com uma tiragem de 32 mil exemplares.

"Nascida em Santana, na
ilha de São Tomé, em 08 de dezembro de 1961, Maria da Conceição de Deus Lima
estudou Jornalismo, em Portugal, especializou-se em Estudos Afro-Portugueses e
Brasileiros, no King’s College London, e em Estudos Africanos, na School of Oriental
and African Studies (SOAS), em Londres. Como jornalista, Conceição
Lima, além de possuir experiência de mais de vinte anos na BBC, fundou em São
Tomé, no ano de 1993, o semanário independente «O país hoje». Na ilha,
além da imprensa escrita, ela também trabalhou no rádio, na televisão.
6Como poetisa,
Conceição Lima tem inúmeros poemas publicados em periódicos6 e os organizados em três livros: O
útero da casa, de 2004; A dolorosa raiz do Micondó, de
2006; O país de Akendenguê, de 2011.7 Sua produção poética encontra
referencial na história e nos resíduos das diásporas. Eles podem se manifestar
tanto nas relações sociais que se desenrolam no interior do espaço insular,
quanto naquelas que ocorrem no seu exterior, mas com a história de socialização
das ilhas sempre estão relacionados
Em 2009 regressou a São Tomé pela segunda vez e desde então tem vindo a trabalhar como jornalista freelance. O seu terceiro volume de poesia, "O País de Akendenguê" (2011, A Terra de Akendengué), foi reconhecido em Portugal como "um acontecimento de rara importância na poesia portuguesa contemporânea" (Helder Macedo). Nela expande o termo »ilha« para o universal e confere-lhe africanidade insular, ao lado de numerosos artistas e trabalhadores culturais africanos como Pierre Akendengué, Alda Espírito Santo, Protásio de Pina, Luís Carlos Patraquim, Tchicaya U Tam'Si e Francisco José Tenreiro Camões, Sophia de Melo Breyner Andresen, Vladimír Holan ou Adonis também pertencem, uma dimensão universal. Depois de seu segundo retorno à ilha, a perspectiva africana de sua poesia se expandiu e se aprofundou: "21 - Eu rasguei os cartões postais. / Nada é tão real quanto estar aqui." ) No quarto volume de poesia, "Quando Florirem Salambás no Tecto do Pico", ela também aborda a atual situação política e social de seu país.
Trata-se, com efeito, de “uma obra poética que tem sido objeto de vários estudos de Mestrado e de doutoramento em universidades portuguesas e sobretudo brasileiras.” Referência do Téla Nón quando “A Dolorosa Raiz do Mincondó, começava a dar nas vistas - Já se dizia: "Nesta coletânea de 27 poemas da poetisa são-tomense Conceição Lima, o micondó, árvore considerada sagrada em diversas regiões da África, simboliza origem, casa, morada ancestral. A evocação de tais raízes é dolorosa devido a acontecimentos históricos, como a escravidão e a colonização, que imprimiram profundas feridas e rupturas na identidade nacional, e na própria poetisa, cujos antepassados foram trazidos à força para o arquipélago africano e mais tarde enviados para outras terras como escravos. Íntima, pessoal e sofrida, a poesia de Conceição Lima é também dotada de um lirismo e esteticismo sublimes, presenteados aqui pela primeira vez ao público brasileiro. Embora a dor seja uma constante em seus versos, o sentimento que os perpassa é o da sutil esperança de que a mesma memória que resgata os fatos traumáticos ajude a fazer germinar algo novo dos escombros, como o micondó que, com suas profundas raízes e frondosa copa, fez florescer o alfabeto poético de Conceição Lima.”’ 03/04/2014. Raízes de Micondó de Conceição Lima espalham-se pelo Brasil...3 livros para celebrar o Dia da Consciência NegraSÃO ASSIM OS POETAS ...
“Os barcos regressam
carregados de cidades e distância
Adormecem os grilos
Uma criança escuta a concavidade de um búzio.
Na proa, decerto, a decisão da viragem”
( Com Sofia de Melo Breyner) Em Fernando Pessoa, quis o acaso que alguém se lembrasse de vasculhar o seu baú e descobrir a herança do seu legado. Outros, porém, às tantas, lá se dão de conta que o que é belo deve ser partilhado. Creio ter sido o caso de Conceição Lima, quando lançou “O útero da Casa”, em 2004” – Veja-se bem o significado da palavra de útero: tão só, o mais íntimo de si, as emoções mais marcantes da sua vida. Pelo menos, algumas das muitas vividas: mesmo “quando eu não sabia que era quem sou/ Quando eu ainda que era já eu” - Mesmo assim, vai-se ao fundo da memória – Mas impossível é transformar todos os sentimentos, em versos – Seria também matar a poesia, pois, o pensar, ou racionalizar demais, como dizia o poeta da Mensagem, torna as pessoas infelizes: é preciso “Sentir como quem olha/ Pensar como quem anda” – No fundo, é o que nos transmite a bela poesia de Conceição Lima
Creio na levitação das bruxas
Creio em vampiros
Porque os há.

Há-de nascer de novo o micondó —
belo, imperfeito, no centro do quintal.
À meia-noite, quando as bruxas
povoarem okás milenários
e o kukuku piar pela última vez
na junção dos caminhos.
Sobre as cinzas, contra o vento
bailarão ao amanhecer
ervas e fetos e uma flor de sangue.
Rebentos de milho hão-de nutrir
as gengivas dos velhos
e não mais sonharão as crianças
com gatos pretos e águas turvas
porque a força do marapião
terá voltado para confrontar o mal.
Lianas abraçarão na curva do rio
a insónia dos mortos
quando a primeira mulher
lavar as tranças no leito ressuscitado.
Reabitaremos a casa, nossa intacta morada.
In . A Dolorosa Raíz do Mincondó - 2006

“O país de Akendengué” (em homenagem ao músico, poeta e filosofo pan-africanista Pierre Akendengué.)metaforiza a África e retalha a vivencia poética de Conceição Lima desde a adolescência até ao presente. É também um espaço de recolha e de contactos abreviados e através de versos com aqueles a autora apelidou de fantasmas elementares da história política e cultural africana. – In Voz da América – Excerto de Conceição Lima publica livro de poesia em homenagem ao É o terceiro livro de Conceição Lima depois do “Utero da Casa” e “A dolorosa Raiz do Micondó
