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terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

Amendoeira florida e perfumada, por Foz Côa e Mêda, branca e rosa, quando lavrada de costas vergadas à rabiça do arado, puxado pelo burro ou macho, ainda fica mais formosa, embleza o campo, a vila e aldeia

                                                         Jorge Trabulo Marques - Jornalista

A flor da amendoeira perfumada, branca e rosa, quando lavrada de costas vergadas à rabiça do arado, puxado pelo burro ou macho, ainda fica mais formosa, embleza o campo, a vila e aldeia! Inebria namorados e poetas do concelho de Foz Côa e Mêda e faz dar saltos e voos às aves e a qualquer passeante ou feiticeira. Assim o diz a poesia de Manuel Daniel e Orlando Marçal, ambos falecidos - Dois belos exemplos poéticos, entre outros, por estas terras nascidos e crescidos



A UMA AMENDOEIRA

Porque hás-de ser teimosa, amendoeira,
cobrindo-te de flores, de branco e rosa,
se a nada nos conduz tanta canseira?
Vale a pena insistir e ser teimosa?!

Vê bem… O lavrador, desesperado,
não tem compensação para os produtos,
e já não te dá mais o seu cuidado,
nem retira dos ramos os seus frutos.



Pelos vistos, não tens qualquer valia.
P´la amêndoa que nos dás ninguém dá nada.
Se eu fosse a ti, para o ano nem floria…
Ficava muda, queda e ensimesmada…

E só tal não faria , se um sinal
nos desse alguma esperança renascida
que fizesse alegrar o amendoal
e te desse razões para estares florida.

- Extraído do Livro A PORTA DO LABIRINTO
Um livro de “poemas, textos e teatro”
De Manuel Daniel



SOMBRA MARAVILHOSA

Floriu no meu pomar essa linda amendoeira,
plantada por meus pais há duas dúzias d'anos,
ao pé da qual verti a lágrima primeira
de vida amargurada em tristes desenganos...

Fica ao fundo do orto, à sombra dum lilás,
que desabrocha agora em pétalas radiosas,
onde já desfiei nos tempos de rapaz
meus segredos cantantes, como qu'esparsas rosas.

Uma viçosa planta de verde engalanada,
onde, li fina flor de imaculados linhos,
quero sentir, febril, haustos de namorada,
envolto em sol doirado e musica de ninhos.



E´ meu altar sagrado, um níveo bem-me-quer,

estrela d'alva e gula em pedregosos trilhos,
onde ei-de acalentar lindos sonhos, mulher,
acarinhando em luz nossos pequenos filhos.

Soluços derramados por ilusão e dor
fui depô-los bem perto, esfolhando-os pelo ar;
ha-de aí reflorir nosso profundo amor,
quando vieres, enfim, iluminar meu lar.

Filhas, quando as tiver, eí-de bordar pra elas
o que outrora, feliz, arrancava à minh'alma,
sob a paz da paisagem e o fulgor das estrelas,
cheio de graça e fé, d'encantadora calma.

Ei-de cantar meus simples versos peregrinos,
a reacender dar-orna e de terna saudade,
ensinando enlevado a esses florões divinos
tudo quanto criei na minha mocidade.

Nossos filhos ditosos! outros lírios em flor,
a aquecer a existência como um sol d'alvorada,
prenderão com mais febre o imorredouro amor
que sinto em nosso peito, oh mulher adorada!

Filhos! lindos miosostia d'olor inebriante,
gotas puras d'orvalho a sanar uma ferida,
arminho doce e bom em caricia constante,
orgulho cordial vibrando em nossa vida ;

alva luz do luar, belos contos de fada,
frescos e botões em flor do nosso beijo o fruto…
não demores teu passo, oh mulher encantada,
de 'corpo altivo e nobre e tranças cor de luto.

Tua alma imaculada, como aurora de neve,
em seus transportes castos de paixão e candura,
espelha-se em meu intimo, a tremer, ao de leve
em ósculos d'amor da meiguice mais pura.



Que tristeza não houve em desditosas eras
de sofrimento amargo e de lutas magoadas,
hoje na dentro de nós risonhas primaveras,
recendentes de brilho e rosas perfumadas.

Outrora, à ténue mancha desta planta em flor,
esforçava o olhar por descobrir a senda,
onde havia nascer o teu divino amor,
de santa de balada ou rainha de lenda.

Vestidinha de branco indo para um noivado,
Semelha aconselhar adoração, constância,
tanto aceita por nós esse tronco sagrado,
nívea pomba da pz, farol da minha infância.

Estrela salvadora e confidente irmã,
bem-dita sejas sempre, oh arvore florida,
que vou saudar alegre, ao romper da manhã,
sombra do meu vergel, sonho da minha vida!

1906


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