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quarta-feira, 21 de outubro de 2015

História de S. Tomé – As invasões holandeses às colónias portuguesas começaram nas Ilhas Verdes do Equador, com o desembarque de 12 navios, na praia Almoxarife, em Santana – A tropa portuguesa, desorientada, refugiou-se na Fortaleza de S. Sebastião e foi um grupo de soldados castelhanos, que soltos da prisão, resistiram aos invasores - Estudo revelado, em 1971, pelo Padre José Esteves Luis, à revista Semana Ilustrada







Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador 

Contributos para a História de S. Tomé e Príncipe – Ironia das ironias – Um ano depois de Portugal ter expulsado os servidores da Dinastia Filipina de Castela,  graças a um punhado de valentes “conjurados”, eis que é um pequeno grupo de soldados castelhanos,  comandados pelo capitão Português, João de Sousa e Távora, a oferecem resistência à invasão holandesa, composta por uma armada de 12 barcos, que desembarcaram junto à  praia Almoxarife, em Santana, na Ilha de S. Tomé - Enquanto 200 soldados lusos, desorganizados, temerosos e  mal comandados, se acovardaram e refugiavam na fortaleza de S. Sebastião, no atual Museu Histórico, eram  os sobreviventes de um barco espanhol, atacado e destroçado por franceses, junto à praia das Conchas, que, então feitos prisioneiros, se ofereceram  para, a troco da liberdade, resistirem ao avanço holandês  sobre a cidade - Pormenores mais à frente

Segundo documentos históricos, a guerra Luso-Holandesa, começa com um ataque a S. Tomé e Príncipe em 1597 - Lê-se em Guerra Luso-Holandesa –   

No entanto, a grande invasão ocorreria apenas em 1641, um ano depois da Restauração de Portugal, do jugo Filipino, cujo Império ficaria bastante fragilizado, devido  ao forçado domínio das cortes espanholas – Tanto assim, que, na altura em que os holandeses, invadiram S. Tomé, com uma guarnição  de 12 navios, na praia do Almoxarife, em Santana,  curiosamente, até seria um pequeno grupo de soldados castelhanos, a oferecem a alguma resistência à invasão holandesa – Não porque, ali permanecessem, mas porque - segundo um texto do Padre José Esteves Luís (claretiano) (1927-1975)que mais adiante,  vou transcrever da Revista Semana Ilustrada,  de que fui seu correspondente nestas Ilhas - ,  sim, isto, porque, uns dias antes daquela invasão,   tendo um navio espanhol sido atacado e desmantelado por outro francês na praia das conchas, os soldados deste navio, saltando ali em terra, foram presos e encarcerados. Porém, “ao saberem do  ataque dos holandeses, espontaneamente se ofereceram para combate-lo, comandados  pelo capitão de João de Sousa e Távora, filho do grande Lourenço Pires de Távora. Enquanto, Miguel Pereira, senhor da ilha de grandes riquezas, nada tendo de militar ou de valor, encerrou-se na fortaleza se S. Sebastião com duzentos soldados, tão falhos de instrução como ele.” 

S. TOMÉ E PRÍNCIPE VÁRIOS ANOS –  SOB O DOMÍNIO HOLANDÊS – SÉCULO E MEIO DEPOIS DE TEREM SIDO “EXPLORADAS” PELOS PORTUGUESES -  SIM, ESTE É O TERMO CORRETO

Fortaleza de S. Sebastião - atual Museu Histórico
Ruínas da Fortaleza de S. Jerónimo
O surgimento de potência marítima holandesa foi rápido e extraordinário, e, sobretudo por duas razões  - Por um lado, pelo facto de Portugal ter sido traído por marinheiros   holandeses que, tendo  participado em viagens portuguesas ao oriente, haviam recolhido  informações náuticas importantíssimas – relatos, mapas entre outras observações. Por outro, e este terá sido o aspeto ainda  determinante, porque, os judeus expulsos de Portugal, que ocupavam lugares de alguma importância social no século XV,  foram acolhidos pelos holandeses e viriam fazer pagar cara a desforra – Pois, como é sabido, eram eles os principais financiadores das expedições portugueses, que, ao contrário que é dito, pelos atuais compêndios coloniais, tais aventuras  marítimas,  não se chamavam descobertas, mas explorações – Navegava-se para explorar e não para descobrir, tanto mais que, toda a costa africana, incluindo as ilhas do Atlântico, desde  a Madeira, Açores Canárias a S. Tomé e Príncipe (a que me refiro em ilhas asben e sanam,) já eram há muito conhecidas e referidas por antigas cartas, nomeadamente por  árabes, de cujas informações se serviria o Infante D. Henrique, na sua Escola de Sagres, contratando a nata dos sábios da época,  genoveses, mouros,  entre outros - Nomeadamente, o mestre Jácome de Malorca, perito em instrumentos e cartas, também conhecido  por Jafuda Cresques e Jaume Riba, cartógrafo catalão, de ascendência judaica, apontado  como o coordenador das descobertas marítimas - De referir que, no  "Libro de Astrolábio Lhano (manuscrito em meados do século XIII, são descritos astrolábios de metal completos.

“A História  das Navegações tem pecado por ter sido escrita, por vezes, por quem desconhecia a Arte NáuticaDiz o Almirante Gago Coutinho, em “A Náutica dos Descobrimentos, referindo-se à viagem que precedeu à de Álvares Cabral, ao Brasil, diz, que, naquela época, tal como é dito no livro “Esmeraldo”  a palavra “descobrir” tem o sentido de explorar, pelo que admite tratar-se de “exploração”, confiada a Duarte Pacheco, de uma costa que já fora achada antes de 1498. Seria serviço análogo àquele  que o mesmo Duarte Pacheco conta ter, anteriormente, prestado a D. João II, quando fora encarregado de “descobrir muitos lugares e rios da costa da guiné”, pois já fora “achada” muito antes, no tempo de D. Afonso Henriques".  

(...) "Assim,  quando em Março de 1500, a esquadra de Cabral partiu de Lisboa para a Índia, a existência no Atlântico Sul de terras a ocidente da África era, sem dúvida,  um segredo de Polichileno: todos o conheciam . Aquelas teriam sido descobertas pelo menos dois anos antes." 


Bom, mas referindo-me à invasão dos Holandeses,  como explicar que um pequeno país, quase afogado pelo mar, lograsse ser uma das maiores potências coloniais,  com ataques de pirataria em todos os mares, apoderando-se de territórios já  “descobertos” por Espanha, Inglaterra e Portugal e passasse a ter o domínio do comércio das especiarias no oriente ? – Sim, é que. além de, em determinada altura,  terem sido   ajudados por forças Inglesas, rivais de Espanha e livres da aliança que os ligava aos portugueses durante a União Ibérica, pois é de crer que a explicação, desse domínio, assentasse, essencialmente,  quer no facto de se terem servido de informações náuticas dos portugueses, quer, sobretudo, devido ao  enormíssimo erro histórico da expulsão  dos judeus, que  a Holanda acolheu e soube aproveitar   - Mas vamos então ao interessantíssimo  artigo, publicado na  revista Semana Ilustrada, de autoria do Padre José Esteves Luís que, tal como o Padre António Ambrósio,  eu tive o grato prazer de conhecer,  os quais, além de terem desenvolvido uma apaixonante missão evangélica, em S. Tomé e Príncipe, também se debruçaram, desde os fundos mais recuados da história destas maravilhosas ilhas, até à atualidade.

 PARA A HISTÓRIA DE S. TOMÉ - POR JOSÉ ESTEVES LUIS


"Esta palavra  picão é mais ou menos equivalente ao que o povo designa por oquê. Há no entanto alguma diferença.: enquanto que oquê da linguagem popular é uma elevação ou cabeço continuado por uma planície, haja em vista oquê del rei. Oquê Boi; picão é um cabeço cujo cume é, relativamente  de pequenas dimensões ,e que, elevando-se mais abruptamente, se presta mais à defesa. Temos o picão de Santana, detrás e por cima da igreja paroquiai, o picão, onde em 1867 se construiu o cemitério da cidade. 


Visita do Governador Cecílio Gonçalves a Santana
Igreja de Santana
Detrás da igreja da Conceição, à entrada da estrada do Reboque (Riboque) e  sobranceiro à mesma, elevava-se um cabeço, denominado Picão, há poucos anos demolido, que desempenhou papel de relevo na história de S. Tomé. Foi aí que se  ergueu um forte, que, apesar de demolido, o povo ainda, no século passado denominava Forte dos Holandeses, embora a eles não fosse devida a sua construção. Esse mesmo forte deu origem ao nome da roça em que estava localizada, Arraial, nos documentos oficiais ainda existentes e que .foi durante séculos marcada como limite da cidade por aqueles lados  


Mas vejamos algo  da sua interessante história.


 
Os holandeses senhores da costa do Brasil, ocupando em consequência também Angola, , julgaram necessária a posse de S. Tomé por duas razões: senhores do açúcar  do Brasil, apoderando-se de mais esta fonte de apreciado  produto, ficavam senhores do comércio da Europa; depois a Ilha serviria de  ponto de apoio e abastecimento dos navios que, conduzindo de Angola e Congo os barcos necessários  aos engenhos da América, aqui fariam a última escala


Em Outubro de 1641 à vista da Ilha apareceram 12 barcos, que dirigindo-se para o sul, foram desembarcar tropas de infantaria na praia do Almoxarife, em  Santana


Os desembarcados, sem resistência alguma, pela beira mar,  dirigiram-se para a cidade. Na Água Grande da Praia Melão (Manuel Jorge) encontram a barra-lhes  a passagem um pequeno destacamento de soldados, castelhanos quase todos. Dias antes, estes soldados, tendo o navio espanhol sido atacado e desmantelado por outro francês na praia das conchas, saltando ali em terra, foram presos e encarcerados. Agora, ao saberem da  ataque dos holandeses, espontaneamente se ofereceram para combate-lo.


Comandava este pequeno grupo o capitão de João de Sousa e Távora, filho do grande Lourenço Pires de Távora.


No entanto, na cidade, ao saberem do desembarque  e ao avistarem a armada holandesa  na baía, havia grande perturbação e embaraço. Miguel Pereira, governador da eleição popular por ser sobrinho do titular morto e senhor da ilha de grandes riquezas, nada tendo de militar ou de valor, encerrou-se na fortaleza se S. Sebastião com duzentos soldados, tão falhos de instrução como ele. Os moradores, na sua maior parte,  com fazendas e famílias refugiaram-se no mato. Os mais valentes e levados pelo exemplo do Capitão de João de Sousa e Távora, ainda organizaram duas companhias de paisanos, faltos de prática e comando, que se dirigiram ao cotado rio da praia Melão. No caminho tiveram conhecimento de que o João de Sousa se ia retirar e por isso voltaram para a cidade e debandaram  para os matos. O valente  e decidido capitão, depois de combater por algum tempo  e sabendo da retirada dos soldados de socorro, recuou para a povoação e foi fortificar-se com os companheiros no Pico da Conceição. Ali construiu  umas trincheiras de  terra batida. Não, tendo, porém, artilharia nem munições , teve de bater em retirada ao ser atacado pelos holandeses senhores já da cidade. 



Fortaleza de S. Sebastião - Atual Museu Nacional
Em 8 de Novembro de 1642 e mandado pelo Rei de Portugal, desembarca em Santana, o governador Lourenço Pires de Távora, casado com a segunda Ana Chaves. A  incumbência dele seria ocupar a ilha, embora sem  entrar abertamente em guerra com os holandeses. Fortificou-se no picão de  Santana , e depois de várias  peripécias ocupa a cidade. Ficando  os holandeses na fortaleza, ele  com os oficiais foi tomar assento na torre, casa de pedra  (sítio do actual Palácio)  . E “ mandei chamar o capitão  José Martins, que dessem por ordem o buscar uma parte iminente para fazermos uma fortificação para o que podia suceder e foi ver e me veio avisar que achou detrás de Nª Srª da Conceição uma parte chamada Picão  que era parte iminente a propósito para se fazer o arraial; uma parte ficar em boa vista que devassava toda a cidade a todas as partes. Dei por ordem a todos os moradores que mandassem eus escravos da fazenda ao serviço de El Rei   que viessem dar ajuda a fazer uma  fortificação", assim faa Lourenço Pires de Távora no seu relatório. ·(Pe Manuel do Rosário Pinto). - 


Terminado o forte em 1643 nele se  instalou a  guarnição portuguesa enquanto os holandeses continuavam na fortaleza de S. Sebastião. De princípio houve luta, reduzida a frequentes rebates· e bombardadas entre os holandeses da fortaleza e os portugueses que dominavam a cidade. Passado pouco tempo consertou-se um modus vivendi. Acabaram  as hostilidades e os holandeses vinham fazer feira  até à capela de  S. Sebastião. Os moradores voltaram à cidade, os soldados   portugueses foram licenciados, o forte português desguarnecido de militares


De repente o general  batavo mandou a Lourenço Pires de Távora um ultimato que expiraria às 4 horas da tarde de Dezembro de 1644. O governador português era intimado e demolir o forte dentro de horas, podendo no entanto levar a artilharia e as suas munições . Lourenço Pires de Távora apanhado de surpresa ainda quis entreter o holandeses  com respostas evasivas  e interessar os habitantes na defesa; mas nem aquele admitiu delongas, nem estes estiveram para incomodar-se.  Assim o governador cheio de amargura procurou  esconder as munições e  enterrar a artilharia  e incerto  do futuro e a mercê aos inimigos , retirou-se 'para a fazenda do  Ilhéu de Santo Amaro. O forte foi demolido e nunca mais serviu para fins militares. Na imaginação do povo ficou  a sua ideia associada a dos holandeses, de onde o nome de Forte dos Holandeses e o nome da Roça, Arraial  dos portugueses· 


Pelos anos de 1870, pertencendo esta  roça ao Estado, foi entregue à guarnição para ser horta militar contribuindo assim para o  sustento da mesma.  Achando-se também muito  mal servida a cidade de instalações hospitalares, tratou-se de escolher local para o novo edifício . U dos lugares estudados e que tiveram o interesse da comissão, para isso nomeada, foi o alto do Picão ou Forte dos Holandeses, como era conhecido. Só não foi preferido por ao lado dele se encontrar um grande pântano. O cabeço histórico acabou, já nos nossos dias, por ser arrasado para fazer desaparecer este e outros charcos que rodeavam a cidade.

Pe. José Esteves Luis 

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