O navegador solitário - então numa canoa -
sente a paixão incontida que intrinsecamente o povoa,
que lhe pulsa e circula nas veias, a evidência
confiante de que um frágil esquife o poderá conduzir
através de uma imensa estrada branca e azul
(que apenas a tempestade e noite cerrada será capaz de toldar ou denegrir)
longe e liberto de qualquer silêncio ou grito
do mundo do qual se despede e, decidido, se vai apartar!..
Sente a alegria que o anima de navegar à vela ou a remo,
desafiando as mandíbulas encrespadas
do mar, os dedos irados do demo
os sopros impetuosos ou irascíveis do vento.
Está ciente da ansiedade que o vai aplacar
de vogar ou singrar cavalgando a crista e a cava sobre cada vaga,
Sim, mesmo antes da largada, sentirá de véspera
a ansiedade própria de quem parte
mas não tem a menor certeza do que o espera.
Vai de cara levantada,
mas o destino jamais lhe pertencerá..
Sentirá por cima da sua cabeça, na face
do seu rosto, à sua volta,
por baixo do pequeno "barco" que o transporta, o fluxo
e o refluxo das marés, o latejar do próprio Universo,
umas vezes para o transcender além do centro
do indivisível círculo ondulante que o cerca,
outras, para o assolar, engolir e sepultar,
sob o aroma da ruína, a febril grossa massa líquida,
envolvendo-o, submergindo-o
pela espuma do salgado hálito marítimo!
Sulcar a superfície do mar é ir em demanda
da sumptuosa beleza ou do terrível sufoco e destruição!
É navegar por extensões de horizontes que tanto o inquietam
e atormentam, como poderão tranquilizá-lo e sossegar-lhe o coração!
Que tão depressa lhe aterrorizam ou embriagam os sentidos
como, com igual surpresa, o afrontam com imprevisível provocação.
em demanda dos mais ténues rumores e labirintos sagrados!
É saciar a fome da floração silenciosa,
da vagabunda dança de um sopro íntegro
de fulgor furtivo de sabedoria e pureza.
É fazer-se ao mar e navegar sem contrapartidas seguras à partida
e não ter qualquer certeza de paisagens imaginárias ou reais à chegada!..
É a transparente e claríssima sede de nostalgia dos mais puros céus!
É viajar na senda dos séculos passados, eras volvidas
ou dos que ainda hão-vir por vontade de Deus.Apelar ao instinto animal (que raramente se engana, tal como o da ave)
É vidência! Deslumbramento! Itinerário transfigurado.
É trocar o certo pelo incerto
É vidência! Deslumbramento! Itinerário transfigurado.
É trocar o certo pelo incerto
- Sem todavia saber que próximo futuro o aguarda,
a que portos poderá arribar,
a que portos poderá arribar,
que enseadas de ilhas frondosas o esperam,
que recortes de orlas vai contemplar,
que escolhos vai ter pelo caminho,
que perigos e ameaças
que recortes de orlas vai contemplar,
que escolhos vai ter pelo caminho,
que perigos e ameaças
Largar tudo - os horários, a família, os amigos,
a tranquilidade de um lar - e partir
mar fora numa frágil piroga
ou até em barcos maiores e bem equipados,
singrando o ondulante manto líquido,
trocando o certo pelo incerto, o desconhecido,
não receando os revés da ousadia e a má sorte,
não temendo as partidas da omnipresente imagem da morte,
alheio a tudo: às inesperadas variações dos ventos,
à dança e contra-dança de correntes poderosas
súbitos vendavais, "súbitas trovoadas temerosas!"
Oh!, como é fantasmagórica a imagem,
ímpia e devastadora a visão do mar e do céu!
Quando, após enormes adversidades, num permanente desafio à sorte,
após se deixarem para trás cerrações da cor da fuligem e do breu,
vigílias infindáveis, incertezas, noites de angústia e assombração,
vogando à flor de turbulentas, enegrecidas águas,
fitando continuamente a mesma infinda abstração,
em vez do acolhedor e esperançoso porto de abrigo,
a tão desejada tranquila praia de água transparente e de areia fina,
espelhada de sol e de coral, rodeada de verdejante e formoso arvoredo,
se depara - Oh triste ventura! -
a escarpada encosta, o promontório íngreme do rochedo!
- Aconteceu-me na primeira viagem,
quando, ao pôr-do-sol e com tornado à vista,
me tive que afastar para o largo
(mais uma noite sem tréguas) para não correr o risco
de ser atirado contra aquela enorme arriba!
não temendo as partidas da omnipresente imagem da morte,
alheio a tudo: às inesperadas variações dos ventos,
à dança e contra-dança de correntes poderosas
súbitos vendavais, "súbitas trovoadas temerosas!"
Oh!, como é fantasmagórica a imagem,
ímpia e devastadora a visão do mar e do céu!
Quando, após enormes adversidades, num permanente desafio à sorte,
após se deixarem para trás cerrações da cor da fuligem e do breu,
vigílias infindáveis, incertezas, noites de angústia e assombração,
vogando à flor de turbulentas, enegrecidas águas,
fitando continuamente a mesma infinda abstração,
em vez do acolhedor e esperançoso porto de abrigo,
a tão desejada tranquila praia de água transparente e de areia fina,
espelhada de sol e de coral, rodeada de verdejante e formoso arvoredo,
se depara - Oh triste ventura! -
a escarpada encosta, o promontório íngreme do rochedo!
- Aconteceu-me na primeira viagem,
quando, ao pôr-do-sol e com tornado à vista,
me tive que afastar para o largo
(mais uma noite sem tréguas) para não correr o risco
de ser atirado contra aquela enorme arriba!
Navegar sobre as ondas encapeladas,
ir de velas enfunadas, é sentir a alma rubra!
Alheia aos perigo que rondam por toda a parte,
subindo ou imergindo
dos insondáveis abismos!
Navegar à flor das águas agitadas é ter por companhia
a menos de um palmo ou da grossura de uma tábua,
a cova funda e horrível da mais funesta e imensa sepultura
.
Deixar, enfim, que o mar e o vento cumpram a sua palavra!
Não pensar em horários nem perder tempo em coisas banais
Ser sonho ousado que se cumpra e nada mais!
Jorge Trabulo Marques
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