Restos mortais - transladados por duas vezes - Sepultados na Capela de S. João -propriedade de Ana de Chaves e seu marido - Mais tarde, em 1880, devido a violação e vandalização do jazigo, transladados para a Igreja da Misericórdia (era então a igreja matriz), a qual, tendo também tendo ficado em ruínas. são colocados num caixão de amoreira, no altar-mor da atual Sé Catedral - Mas de que não se sabe, muito bem, se ainda por la estão - Tanto mais que, devido a obras, alguns jazigos foram removidos
Vários tem sido os investigadores
e historiadores, que se têm ocupado, acerca da lendária origem de Ana de Chaves –
Correm as mais díspares versões: há quem defenda ter sido uma judia desterrada,
por força das perseguições movidas aos judeus ou então filha ilegítima do rei D. João III ou dama da
corte de D.
Catarina afastada por ciúmes pela Rainha para bem longe dos olhares libidinosos ou conspícuos do marido
.
Estas são as versões mais
correntes – Porém, o que agora me leva a escrever sobre esta mítica mulher, nem
será tanto especular ou trazer de novo alguns excertos do que acerca dela se escreveu,
mas fundamentalmente dois aspetos:
Por um lado, o facto de,
ao rever textos antigos da revista Semana Ilustrada, de Luanda, da qual fui seu
correspondente, em S. Tomé, me ter
despertado a curiosidade um artigo, de autoria do Padre José Esteves Luis, com
o título: “ A INFLUÊNCIA DO MARIDO DE ANA DE CHAVES NA HISTÓRIA DOS PRIMEIROS
TEMPOS EM S. TOMÉ” – diz o velho ditado, que, por detrás, de um grande homem,
está também uma grande mulher – Ou vice-versa. - Terá sido este o caso? Esta a questão que me relançou a curiosidade
O segundo aspeto, foram as translações sucessivas de quem teria direito à paz dos mortos - ao deparar, nas minhas pesquisa, com um documento, de
autoria de um Inspetor do Ministério do Ultramar – anos 30 – em que alude ao
vandalismo de que fora alvo o túmulo em que, Ana Chaves e o seu marido, haviam
sido sepultados, e da consequente transladação da capela de S. João para a Igreja da Misericórdia
Historicamente, tais dados já são conhecidos, porém, creio que não com o pormenor que seguidamente aqui reproduzo:
Historicamente, tais dados já são conhecidos, porém, creio que não com o pormenor que seguidamente aqui reproduzo:
Nos livros de Actas da C.M. de São Tomé, existe a acta de 6 de
Março de 1880 a fls 177. Em cuja sessão a Câmara resolveu o oficio acima e
convidar para a transladação dos restos mortais de Anna de Chaves e seu esposo
Gonçalo Alves, o Governador, empregados públicos, eclesiásticos, militares e
particulares, sendo as despesas feitas pela Câmara. Conforme a proposta e
deliberação respectiva registadas a folhas 172 Vº do livro nº 4 de actas da
C.M. de São Tomé, são do teor seguinte:
….O Senhor Vereador Salvaterra pedindo a palavra propôs para se fazer a transladação do túmulo de Anna de Chaves, que se acha na Igreja S. João, para a Igreja da Misericórdia que serve de Sé, sendo esta transladação feita à custa do Município. Foi aprovado por unanimidade para o dia a que por esta Câmara for designado, e isto por considerar a dever-se perpectuar um nome ilustre d’esta Senhora e seu marido como vultos a memorável que foram e fazem parte da História desta Ilha; cujo túmulo estando colocado na igreja de São João erigido por eles, devido ao abandono da mesma fora este túmulo arrancado e quebrado por vândalos que, persuadidos de encontrem alguma riqueza depararam com os restos mortais dos mesmos, que deixaram espalhados pelo chão e, nestas circunstâncias é dever da Câmara prestar a homenagem de respeito à sua memória, mandando transladar os mesmos restos para a Igreja da Misericórdia que serve de Sé, guardados no mesmo túmulo que deverá ser consertado também por conta deste Município”
IGREJA DA MISERICÓRDIA: A
sua construção datava possivelmente de 1504, ano em quo se principiou o
hospital da Misericórdia, cuja irmandade já estava estabelecida como consta na
carta de 3 de Maio 1504 -Em 1913 foi demolida, aproveitando-se a
pedra para a construção no mesmo local do edifício onde funcional hoje diversas Bipartições do Estado - Correios, Tribunal - Fazenda e Conservatória.
Em 1880 recebeu os restos mortais de Ana de Chaves e seu marido, que haviam sido sepultados na capela de S- João, de que eram proprietários - Porém, encontrando-se esta capela em em ruínas e com os restos mortais vandalizados, os mesmos foram transladados para a Igreja da Misericórdia, que então servia de Catedral - a pedido Pró-vigário da Diocese ao Presidente da Câmara Municipal de São Tomé,
Em 1880 recebeu os restos mortais de Ana de Chaves e seu marido, que haviam sido sepultados na capela de S- João, de que eram proprietários - Porém, encontrando-se esta capela em em ruínas e com os restos mortais vandalizados, os mesmos foram transladados para a Igreja da Misericórdia, que então servia de Catedral - a pedido Pró-vigário da Diocese ao Presidente da Câmara Municipal de São Tomé,
MAS QUEM ERA, AFINAL, ANA CHAVES?
Para o autor de “Anas de Chaves,”, citado por Amândio César, na antologia “Presença do Arquipélago de S. Tomé e Príncipe na Moderna Cultura Portuguesa, que diz o seguinte:
“ Não disponho aqui de
bibliotecas nem de outros elementos a que possa socorrer-me para versar este
importante assunto. Seja-me porém lícito reproduzir a tradição que apresenta
Ana de Chaves como uma senhora de alta estirpe, filha natural de Rei, segundo
umas versões; dama camarista da Rainha, segundo outras versões e, seguindo
estas, teria razão nos ciúmes da mesma Rainha o homizio da grande dama -nestas
paragens, onde a magnificência régia lhe concedeu muitas terras, para a
compensar do degredo.
Seja como for, Ana de Chaves
deixou indeléveis traços da sua existência na colónia, onde espalhou o bem a
mãos largas, criando e subsidiando diversas instituições religiosas e de
caridade.
Para Francisco Costa
Alegre, num desenvolvido e interessante artigo, publicado no Téla Nón, sob o
título: ANA (da CUNHA) CHAVES: MULHER ou MULHERES?!! - refere-se igualmente às versões mais
conhecidas:
“ descendente de judeus, residente em S. Tomé, na condição de
refugiada das perseguições feitas em Portugal. Nesta versão, o nome de família
“de Chaves” terá sido adoptado para substituir um qualquer outro de origem
semita, cuja utilização seria perigosa. Sendo expulsa de Portugal, teria
adoptado, no ultramar, um discreto nome lusitano.
Numa segunda versão, Ana de Chaves terá sido uma
modesta dama da corte, aia da rainha D. Catarina, cujos dotes físicos teriam
chamado a atenção do rei D. João III e atraído sobre si os ciúmes da soberana.
Nesta versão, a rainha terá mesmo resolvido o problema, determinando que a sua
aia abandonasse a corte e rumasse a S. Tomé. Mas, na sua real bondade,
legou-lhe várias possessões em troca do seu afastamento da corte. A terceira e
última versão identifica-a como filha ilegítima do rei, e, por isso mesmo,
ocultada e enviada para S. Tomé. Conhece-se, no entanto, o nome da amante do
rei e mãe da nossa heroína, uma tal Cezília de Chaves, falecida em 1540, como
indica a sua lápide funerária.ANA (da CUNHA) CHAVES: MULHER ou MULHERES
Depois desta citação, passo então à reprodução integral do artigo do Padre José Esteves Luís - aproveitando também para aqui editar a imagem da capela de S. João e de outras da mesma época em que viveu a mítica Ana de Chaves
"A INFLUÊNCIA DO MARIDO DE ANA CHAVES NA HISTÓRIA DOS PRIMEIROS TEMPOS DE S. TOMÉ E PRÍNCIPE"
Um dos homens que sem dúvida tiveram mais influência
na história dos primeiros tempos da Ilha foi o marido, de Ana Chaves, embora
nos documentos históricos e, sobretudo, na tradição popular, a esposa lucrasse
mais na imaginação do povo com os bens por ele acumulados.
Como se chama ele? Houve quem afirmasse
ser o seu nome. Gonçalo Álvares. Segundo um documento publicado pelo Dr.M.
Braga da Cruz na revista das festas da cidade de S~ Tomé em 1966:Ana Chaves,
viúva de Gonçalo Álvares, em 1545 pede ao rei a confirmação da posse de um
terreno ·que ao seu marido fora atribuído por sesmaria e que se estendia por
300 varas ao longo do ribeirão da Lagoa, tendo na sua testada a mesma largura,
frente ao mar.
Temos pois aqui claramente expresso o nome
do marido de Ana Chaves e que eleja era morto em 1545. Provavelmente morreu no
ano de 1540. No jardim da biblioteca municipal há uns fragmentos diversos de
pedra que poderá pertencer à extinta
capela de S .João Baptista, e que se consegue ainda ler "Ana de Chaves . Faleceu
em 1540 .Não será do marido que fala? Sabemos por um boletim oficial que no
século passado a tampa da sepultura partida e abandonada que encerrava os ossos
de Ana de Chaves e do marido foi levada para os jardins da câmara. ·
·
Quem seria este Gonçalo Álvares?
Por enquanto e à vista dos documentos
existentes na Ilha, creio podermos afirmar que era pessoa importante, muito respeitada
e rica.
Em documento de 1535 (M. M. A, tomo II, p.
46) aparece um Gonçalo Álvares que, ‘juntamente com Rodrigo Aires, e juiz ordinário
e dos órfãos e corno tal firmam um documento em 6 de Setembro de 1535.
Será este Gonçalo o marido de Ana de
Chaves?
Tenho para mim que sim. Este homem
sobressaia no meio social da Província pela sua honradez e. pelos seus bens
materiais, pois era sistema geralmente seguido serem escolhidos para juízes do
povo, pessoas honradas da terra e com bens materiais para não serem facilmente corrompidos
por pleitas ou apetite de lucro. No marido de Ana Chaves que tao rica era e que,
segundo reza uma carta de Frei Rodrigo, missionário do Congo, com data de 1565,
e "uma dona nobre e virtuosa, da qual já V. A. (O. Catarina) tem noticia;
chama-se Ana. de Chaves e tem bens deste mundo", creio juntarem-se .esses
predicados.
Sabemos por documentos posteriores, entre
eles, o da instituição. em 1594 do mor gado · de S.João Baptista, por Ana de
Chaves, e um antiquíssimo mapa, embora sem data, certamente dos primitivos, que
Ana Chaves era possuidora de várias terras entre elas a fazenda do Yô Grande,
da Angra de S. João dos Angolares, etc, que por estarem .mais ao sul e lado a
lado com os matos em que se acoutavam os fugidos, “os pretos elevantados, pretos
mocabos ou angulos do Pico" .Estas
terras, deviam ter sido recebidas por herança· do marido ou eram do casal. Daí
o interesse juiz do povo, aiem do bem comum, ter o pessoal na repressão das
incursões destes fugidos. Escreve aos
oficias régios " Fazemos saber a
vossas mercês em como é verdade e
notório que mocambo com muita gente andam no mato e fazem quanto dano podem em matar
e· roubar homens e destruir engenhos e fazendas ; o que tudo e perda e dano do
povo desta Ilha dela de serviço d’el-rei
nosso senhor".
Da sua parte, do povo, entregam. 40000
reais para a guerra no mato
A que família a pertenceria este Gonçalo Álvares,
marido de D. Ana de Chaves? ..
Creio poder responder, por deduções
várias: que devia ser da família do, grande Álvaro de Caminha e, como .filho do
parente mais chegado, herdeiro dos seus bens e dos seus legados e virtudes. É hipótese
que pretendo firmar com 'alguns documentos coevos e posteriores. ·
1º A identidade de apelidos, juntamente
com a grande estima a ele tributada e que se reflete na autoridade da esposa.
Esta estima parece ser eco daquelas, palavras que em 1499 ao rei escreviam os habitantes degredados de S. Tomé: haverá agora seis anos, pouco menos, que vivemos, em
poder de Álvaro de Caminha, do qual, por
suas grandes· virtudes, éramos assim amparados e regidos com Justiça, que
nenhum de nós sentia o desterro desses vossos reinos. Nosso Senhor se quis
lembrar, de nós que nos ficou (após a
sua morte) por capitão e. Governador Pero Álvares de Caminha, seu primo, que nos mantém em muita
justiça e nos faz todo bem que pode….Antes queremos viver em sua companhia sem
nenhum proveito, que em poder de quem não conhecemos, com todo los proveitos do
mundo. Porque antes nos iremos viver ao mato…". Sabemos que este Pero Álvares,
herdeiro e testamenteiro do primo, tinha já filhos nessa altura. Assim o afirma
uma carta dele para o mesmo rei D. Manuel.
2º O Pe. Manuel do Rosário Pinto escreve
primeiro capitulo do seu livro tão conhecido: "Tem (a Ilha) '82 ribeiras
de água doce, mui boa; entre elas há um rio Grande de Ana de Chaves, ao sul da
Ilha e que chamam hoje Ribeira Palma". Esta Ribeira Palma é situada pelo autor do tal mapa no sul da Ilha
mas do lado 'poente. É à fazenda neste rio estabelecida que Pero Álvares de
Caminha manda parte dos moços (judeus) que, vindos com Álvares de Caminha, lhes
tinham sido encomendados por morte dele: "E outros mando agora ao Rio
Grande, que é detrás da Ilha·. (M.M.A.
t.I,P. 177). Quer dizer a mesma fazenda que o Padre Manuel do Rosário (e outros
documentos, aliás) afirma pertencer a Ana de Chaves, estava na posse em 1499 de
Pero Álvares ·
3º Quando em 1864 foram vendidos os bens
que pertenciam ao morgado de S .João Baptista, entre os prédios vendidos, figuram
a rua e a travessa de S. Miguel, detrás
do palácio dos governadores. Foi precisamente nesse local que Álvaro de Caminha
mandou fazer grandes :asas, em forma de "mosteiro" onde recolheu os
moços judeus, como na frente fizera os seus aposentos de torre fortificada. Mas
deixemos falar o próprio Álvaro de Caminha no seu testamento: se por ventura
para o mosteiro vierem frades enquanto o dito Pedro Álvares estiver na Ilha,
lhe entregarei todos os ditos aposentos e a torre… se não ficarão para os ditos moços por amor de
Deus… para cerca dele tomarão toda a
terra que houverem mister… da que tenho feito derredor dele…".
Os governadores a começar. em Fernão de Melo,
ficaram a viver na torre, o mesmo fizeram os seus sucessores até que no século passado,
no tempo do governador Gregório José Ribeiro, estando muito arruinada foi
substituído pelo actual palácio. Em 1874 (B.O. 1874 p. 165) dizia o capitão e administrador
do concelho, Henrique Augusto Dias de
Carvalho•'
'' …o palácio oferecido por Ana de Chaves
à colónia, bastante antigo e ·velho onde têm habitado os Últimos governadores
da província". Se a torre ou
palácio onde moraram os governadores foi edificado por Álvares de Caminha como
se afirma que foi legado por Ana de Chaves? Não será porque os bens de Álvares através
de Pero Álvares foram recebidos por Ana
de Chaves?
4º Os bens possuídos por Ana de Chaves e que figuravam no morgado por ela instituído, eram tais e tão vantajosas posições; que só de principio escolheu onde quis ,podia conseguir. Devo dizer , no entanto, que alguns bens que mais tarde figuram entre os do dito morgado, como o ilhéu das Rolas, ainda em 1572, pertenciam ao Rei. O mesmo direi da fazenda de Santa Cruz que em 1579 estava arrendada ao rei por Paulo Dias de Novais.
5º Uma das coisas em que mais se empenhou Álvaro
de Caminha foi em fundar nesta Ilha um mosteiro de frades franciscanos. Isto
mesmo deixou muito encomendado ao seu primo e testamenteiro Pero Álvares de Caminha.
Ouçamo-lo: "E vindo os ditos frades, lhe será tudo entregue, porque é mais
excelente e natural para eles que para os leigos e tem o aposentamento e mais
gracioso que pode ser em nenhum mosteiro, como há-de ser… E quando S. A. não poder acabar que venham
frades de S. Francisco da Observância, para que ate fim do mundo está
apropriada, cada vez que eles quiserem…”
Vejamos agora o que foi escrito acerca
deste mesmo desejo de' Ana .de Chaves pelo Frei Rodrigo, já citado, em 1565:
"Chama-se Ana de Chaves, tem bens do mundo, deseja muitos tempos de fazer
à custa em aquela povoação, onde é bem necessário,
um mosteiro da ordem do Bem-aventurado S. Francisco e está já muitos dias
provida do brevê do Papa para o poder fazer, e o mesmo hã muitos dias que ajunta
as coisas serias para ele.
Uma das sepultura na Sé Catedral |
Não quero terminar sem lembrar que, na
ninha ideia, esse terreno que da parte, do rei foi concedido por sesmaria a
Gonçalo Álvares, e que os estendia por trezentas varas a cavaleiro da serra, ao
longo do ribeirão da lagoa, com outras tantas varas de frente ao mar, deve ser
ou a fazenda Praia Lagarto, que tinha mais ou menos essas medidas, 1464 metros
(vara 4,88 m), ou então a fazenda a que atrás nos referimos do Rio Grande, mais
tarde Palma, aí pelo Xufe Xufe ou Quija, que estava, realmente detrás da Ilha e
que pertenceu i mesma· Dona. A hipótese da Praia Lagarto, tem contra si o não
estar detrás da Ilha. A segunda o ser o rio grande e não ribeira e não da Lagoa.
O Lagoa poderia ter sido escrito em vez de Lagarto e ainda podemos admitir que ao Lagarto por ter uma lagoa ou charco a que se
refere Valentim Fernandes, chama-se ribeirão da Lagoa. Dir-se-á que a praia Lagarto
não está detrás da Ilha. Como eles consideravam a Ilha redonda, tudo o que ia para além da baía, não seria detrás da Ilha?
Padre José Esteves Luís
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