Bicentenário da Independência do Brasil – Há 200 anos nasceu um novo país – Entrevista ao almirante brasileiro Max Justo Guedes, 1927 – 2012, Ícone da História Naval Brasileira e da História da Cartografia, autor do livro O Descobrimento do Brasil
Entrevista a um dos mais conceituados
investigadores da historiografia brasileira
Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador -
Comemoram-se, hoje. os200
anos da independência do Brasil, proclamada em 07 de Setembro de 1822 por Pedro
de Alcântara. Portugal
fez-se representar na sua ex-colónia pelo chefe de Estado, Marcelo Rebelo de
Sousa, e também pelo Presidente da A.N. Augusto Santos Silva e do embaixador Francisco Ribeiro Telles, coordenador da
programação destas comemorações.
A convite do Governo brasileiro, confirmaram presença em Brasília, a capital,
os presidentes de Portugal, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique.
Max Justo Guedes, um dos mais notáveis historiadores
da cartografia luso-brasileira, autor de mais de meia centena de estudos e
ensaios carto-bibliográficos dispersos em inúmeras publicações, na breve
entrevista que, em Outubro de 1989, honrosamente me concedeu, por ocasião da
reedição da sua obra “O Descobrimento do Brasil”,
defende que a descoberta do Brasil por Pedro Álvares Cabral, não foi obra do
acaso mas de um conhecimento prévio dos portugueses, que foram os primeiros a
pisar o solo do enorme território:
Considerando de fábulas os que apontam para o navegador espanhol Vicente Yáñez
Pinzón
O autor de "O Descobrimento do Brasil”, estudo baseado, não apenas nas pesquisas que efetuou, como se navegava na época, mas também na sua experiência marítima
Diz, que,
Pedro Álvares Cabral, quando partiu do Tejo, com uma armada para se
dirigir à Índia, torneando o Atlântico Sul, a oeste, ele já tinha
conhecimento prévio da existência de terras ao sul das que, Colombo, havia
descoberto
Por isso, a descoberta do Brasil, não foi obra do
acaso: ele não ia aventura a descobrir terras: era uma viagem definitiva. Com
tudo planeado Defende, Max Justo Guedes, o distinto oficial que “Na Marinha, dirigiu o setor de Patrimônio Histórico e Cultural, reorganizou e equipou o
Serviço de Documentação Geral da Marinha; promoveu a implantação de museus
(Museu do Forte da Barra de Santo António – BA; criou os Navios-Museu; Museu da
Caravela – Campinas; Espaço Cultural da Marinha – RJ); propôs e coordenou
incontáveis colóquios internacionais, preparou edições críticas e publicou
coletâneas que são fundamentais para o conhecimento da história brasileira,
como por exemplo, os volumes da História Naval Brasileira. – Excerto Nosso Contra-Almirante
Max Justo Guedes (1927-2011 .
GRITO DO IPIRANGA - Foi há 200 anos
O quarto filho do rei de Portugal, Dom
João 6º, que havia retornado a Portugal no ano anterior, Dom Pedro foi deixado
no Brasil como o príncipe regente, que, nas margens d
Foi nas margens
do riacho Ipiranga, há 200 anos, em7 de
setembro, que Dom Pedro I (1789-1834) declarou o grito da independência do
Brasil em relação a Portugal, mas devido às dificuldades de propagação das
informações, na época, a população só ficou ciente do feito em 12 de outubro,
dia em que Dom Pedro I se tornou imperador do Brasil e dia do aniversário do
monarca.
O que era então o “Reino Unido de
Portugal, Brasil e Algarves” tornou-se, oficialmente, “Império do Brasil”, o
qual estabeleceu como forma de governo uma monarquia constitucional
parlamentarista e D. Pedro I como primeiro imperador do Brasil.
Tradicionalmente, divide-se o Brasil Império em três fases: Primeiro Reinado
(1822-1831), Período Regencial (1831-1840) e Segundo Reinado (1840-1889), que
terminou com a Proclamação da Independência
"A
História das Navegações Portuguesas tem pecado por ter sido escrita,
por vezes, por quem desconhecia Arte Náutica - dizia Sacadura Cabral
(…) por estranhos às «coisas do mar» como eram quase sempre, cronistas e
historiadores . Incapazes de se imaginarem a navegando dentro dos
navios antigos. Eles fiavam-se nas versões que corriam, contadas por
mareantes românticos, que acrescentavam um «ponto» ao seu «conto». - Não é o caso do Comandante Max Justo Guedes
Mas eis as palavras, que, o Comandante Max Justo Guedes, dirigiu aos leitores. antes de expor o aprofundado estudo:
"Nos últimos meses do já
longínquo ano de 1960, dei efectivo início à redacção de trabalho sobre o
Descobrimento da América do Sul, planejado desde os tempos da Escola Naval, mas
que ficara, até então, limitado a anotações esparsas.
Natural foi que cuidasse
logo do Descobrimento do Brasil, estudo concluído nos tumultuados dias de
Agosto do ano seguinte. (houve a renúncia do Presidente Jânio Quadros), que,
logo depois, foi entregue, para publicação, à Diretoria de Hidrografia e
Navegação (DHN).
Em Dezembro de 1963,
designado instrutor de guardas-marinha, iniciei. viagem de instrução à Europa e
América do Norte, deixando os originais ainda aguardando oportunidade de
impressão, situação em que os reencontrei, em Maio seguinte, quando retomei ao
Rio de Janeiro. Pude, por isso, antes de ser transferido para o Nordeste,
embora dificultado por intervenção cirúrgica que ·me imobilizou por dois longos
meses, efectuar pequenas alterações nos originais, consequentes das rápidas
pesquisas que realizara, em Lisboa, quando o NE «Custódio de Mello», navio em
que viajara, esteve no Tejo.
No ano e meio em que
servi em Alagoas não mais tive notícias do andamento da impressão, ..• sendo
surpreendido, em 1966, quando voltei a servir na ex-capital brasileira, com
telefonema de um companheiro da DHN, informando-me que o trabalho fora editado.
Pese embora a boa vontade
dos que trabalharam na impressão a falta de revisão, por parte do autor, em
assunto especializado e alheio ao quotidiano da Diretoria, permitiu que falhas
tipográficas e mesmo erros, que talvez pudessem ter sido evitados, aparecessem
no· texto impresso.
Ainda assim, o opúsculo
alcançou certa repercussão no Brasil, dando origem às comemorações conjuntas
Brasil-Portugal, do Quinto Centenário de Pedro Alvares Cabral, em 1968,
iniciativa do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro impulsionado pelos
saudosos Wanderlei de Pinho e Pedro Calmon.
Quando coordenei, em
1975, a redacção e publicação do primeiro volume da História Naval Brasileira,
aproveitei, parcialmente o trabalho, transformando-o em capítulo da obra, com
as reduções e adaptações indispensáveis ao propósito dela; também ali incluí alguns
outros escritos que enfocavam descobrimentos americanos, mas o projecto
original e maior, acima mencionado, mercê de obrigações múltiplas em novas
direcções, não mais seria retomado. O Descobrimento do Brasil ficou sendo a
única singradura da viagem planejada.
Decorridos mais de 27
anos desde a redacção do texto original, as grandes comemorações, ora em curso,
dos Descobrimentos Portugueses, fazem com que meu trabalho seja novamente
focalizado. A editora VEGA interessou-se em reeditá-lo, com introdução - que
extremamente me honra do ilustre, admirado e querido amigo Professor Doutor
Luís Mendonça de Albuquerque.
Não faria sentido deixar
no texto os erros e omissões já referidos e de há muito notados; procurei
eliminá-los, sem, contudo, alterar substancialmente, na forma ou no conteúdo, a
primeira edição; introduzi, também, quando isto foi indispensável, algumas
notas, facilmente reconhecíveis porque indicadas pelo ano em curso.
É minha modesta
contribuição à divulgação e melhor conhecimento da gesta maior do querido e
admirado povo lusitano e meu sincero agradecimento pela obra magnífica por ele
realizada em meu país, descobrindo, povoando, colonizando, civilizando e
expandindo-o a limites quase inacreditáveis e legando-o unido, política e socialmente,
aos brasileiros de hoje.
Rio de Janeiro. Novembro
de 1988
Max Justo Guedes
UM CLÁSSICO - Entre os livros sobre a descoberta do Brasil - Disse Luís de Albuquerque
O historiador Luís de Albuquerque, no prefácio que escreveu, diz que se trata de "um
clássico, sobre a viagem de Pedro Álvares Cabral, os seus antecedentes
e, sobretudo, sobre a exploração que a sua armada fez de uma pequena
parcela da extensa costa brasileira.
Max Guedes, oficial
superior da Marinha de Guerra Brasileira prefigura um caso, em nossos tempos já
infelizmente pouco vulgar, de atracção de marinheiro pela História da Marinha
ou de temas que a ela intimamente se relacionam. O Descobrimento do Brasil,
publicado quando era capitão de corveta, é o segundo passo de uma vida dedicada
aos estudos históricos ( em 1963 publicara Derrotas dos Grandes Navegadores,
sua obra de estreia), mas que deve ser considerada o ponto de partida
definitivo para seguir uma vocação sem hiatos e de ano para ano enriquecida com
perspectivas mais ambiciosas e mais diversificadas. Nos seus estudos, que se centrifugam
em · redor do pó/o que é a Marinha, incluem: trabalhos de excepcional
merecimento para a História Naval Brasileira ( em curso de publicação), obra
monumental de que foi um dos mais entusiastas impulsionadores; textos sobre
Cartografia portuguesa dos séculos XVI e XVII, como Brasil Costa Norte
Cartografia Vestutissima ou Anónimo - António Sanches, e. 1633, ambos de 1970;
análises dos antigos roteiros, como um Roteiro Apócrifo do Estreito de
Magalhães - Tentativa de Identificação da autoria, de 1971 ou A Carreira da
India - Evolução do seu Roteiro, de 1985; edição comentada de obras-primas da
hidrografia da Costa do Brasil, como o Roteiro de todos os Sinais, de /968 ou,
do mesmo ano, o Livro que dá Razão do Estado do Brasil; contribuição do maior interesse
para a História do reconhecimento da costa do Brasil, como As Primeiras
Expedições Portuguesas e o Reconhecimento da Costa Brasileira. editado em /970:
e muitos e muitos outros escritos sobre diversos temas. incluindo wna valiosa
contribuição para a História da Independência do Brasil (1972) e cotaboraçâo
avulsa e dispersa por inúmeras publicações periódicas do Navigator à Revista
das Índias e dos Anais Hidrográficos à
Revista da Universidade de Coimbra.
Todos os trabalhos que
citámos, e grande cópia de outros que omitimos. fizeram de Max Justo Guedes um
historiador internacionalmente apreciado e justamente tido como autoridade nos
múltiplos assuntos a que dedicou a sua atenção. Por isso se inclui entre os
editores-correspondentes da revista Imago Mundi e é. desde 1987 e de pleno
direito. presidente da Comissão Internacional para a História da Náutica e da
Hidrografia - além de pertencer a inúmeras instituições cientificas, em
particular da Academia de Marinha Portuguesa, onde há muito entrou como sócio
efectivo. – Excerto
“Ícone
da História Naval Brasileira e da História da Cartografia, almirante Max Justo
Guedes continuou se dedicando aos estudos até ser vencido pelo câncer”
Foi
neste termos que, a ele se referiu a Revista da História, por ocasião do seu
falecimento, em 09/11/2011 “vítima de
câncer o almirante Max Justo Guedes, especialista em História Naval Brasileira
e História da Cartografia. Max, que era considerado um elo brasileiro com os
estudos do historiador português Jaime Cortesão, ajudou a formar gerações de
historiadores e inúmeras publicações sobre pesquisa cartográfica, tornando-o
conhecido em todo o Brasil e no mundo. Com seu jeito sempre receptivo a
estudantes e profissionais, nem a doença o afastou do mundo da historiografia:
Justo Guedes era um dos organizadores de um seminário no Itamaraty sobre o
centenário da morte do Barão do Rio Branco, que acontece no ano que vem.
A
influência de Cortesão norteou toda a obra do almirante. Ambos compartilhavam a
“teoria do sigilo”: para eles, a escassez de mapas em Portugal e Espanha,
quando comparada à produção holandesa, por exemplo, se deve à tentativa de
manter um rígido controle de informações estratégicas. Tais dificuldades,
porém, instigaram Justo Guedes. Para compor o trajeto da esquadra de Pedro
Álvares Cabral até o Brasil, o almirante realizou uma detalhada pesquisa de
campo que contou até com navegações e voos de helicóptero. Assim, Justo Guedes
questionou a intencionalidade do descobrimento do Brasil baseando-se em farta
documentação e justificativas técnicas – trabalho que lhe rendeu notoriedade em
todo o mundo-
O trabalho
era, por sinal, sua grande paixão. Mesmo combalido pela doença, Justo Guedes não
parou. Há cerca de dois meses, ele e o professor Arno Whelling começaram a
elaborar, no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro – onde Max era 2º
vice-presidente –, um seminário que será realizado no ano que vem no Itamaraty
sobre o centenário da morte de Barão do Rio Branco, que também foi, por sinal,
um dos seus objetos de estudo.
“O trabalho
era sua vida. Mesmo com a doença, ele continuava se dedicando aos estudos da
História. Foi uma figura muito importante que mudou os estudos da História
Naval no Brasil”, lembra Arno. – Mais pormenores emMorre Justo Guedes - Revista de História
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