Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador
Esta
data é reconhecida pelos santomenses, com um triplo significado: - Assinala
a chegada dos Portugueses, em 21 de Dezembro de 1470, à costa de
São Tomé, pelos navegadores portugueses, João de Santarém e Pero Escobar;
a festa Católica Romana do dia de São ou Santo Tomás - E também a tomada de
posse, em 21 de Dezembro de 1974, do Governo de Transição, liderado por Leonel
Mário d´Alva, até à proclamação da independência a 12 de Julho de 1975.
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Viagem de S. Tomé ao Principe - 3 dias |
Estive no local do Padrão dos Descobrimentos, em Anabô, há 52 anos
a erguer a bandeira Portuguesa - Não tanto pela colonização posterior mas
orgulho-me dos feitos dos bravos marinheiros portugueses, que, em frágeis
caravelas, partindo de um pequeno país, que não ultrapassava um milhão de
habitantes, demandaram por mares desconhecidos, deram a conhecer ao mundo novas
terras, navegaram por todos os oceanos, mais deles perdendo a vida em
dramáticos naufrágios
Admiro a coragem dos marinheiros portugueses mas questiono a colonização e os seus métodos - Há precisamente 52 anos, nas comemorações do V Centenário , fiz a ligação de canoa da capital da Ilha à praia onde se diz terem chegado as primeiras caravelas, desfraldando a bandeira portuguesa
O facto mereceu relevo na imprensa local, o mesmo não sucedeu quando, um mês depois parti de canoa clandestinamente de S. Tomé ao Príncipe, tendo sido espancado e preso pela PIDE -
Em Novembro de 2014, voltei lá, mas agora com as duas bandeiras: a de S. Tomé e Príncipe e a de Portugal. Sim, depois de ter feito a travessia de canoa de S. Tomé à Nigéria, em 13 dias, e tentado a travessia oceânica, que, embora não o tendo conseguido, acabei por viver a experiência de náufrago, ao longo de 38 dias, após o que acostei na Ilha de Bioko.longo de 38 dias, após o que acostei na Ilha de Bioko.
Não há
certezas quanto à data exata da descoberta das ilhas do Golfo da
Guiné - Admite-se, no entanto, que, a Ilha de S. Tomé, teria sido
descoberta em 21 de Dezembro de 1470, dia do apóstolo S. Tomé, e , em 17 de
Janeiro do ano seguinte, a Ilha do
Príncipe, por João
de Santarém e Pêro Escobar
A
Ilha de Ano Bom, a 565 km a sudoeste da parte continental da Guiné
Equatorial e a cerca de 200 km a sul de São Tomé, foi descoberta por
volta de 1475, no 1º de janeiro, de dia de ano-bom - A Ilha de Fernando do Pó,
atual Bioko, foi descoberta pelo navegador do mesmo nome; admite-se
que tenha sido em 1472 - Estas duas Ilhas, foram possessão
portuguesa entre 1474 e 1778, ano em passaram para a Coroa
Espanhola, pelo Tratado de El Pardo em troca de terras
espanholas na América do Sul, que seriam posteriormente anexadas ao Brasil
Mas não foi no sítio onde se encontra o Padrão dos Descobrimentos, em Anabô, onde é suposto, anos mais tarde, ter começado a colonização e a exploração do açúcar, mas na Lagoa Azul, um pouco mais a sul daquela área, na pequena enseada de águas profundas e abrigada dos ventos
Do alto das velhas muralhas do Fortim de São Jerónimo, onde tantas vezes olhava a espuma que ali ia rebentar nas rochas negras e contemplava o mar ao largo, sim, muitas vezes ali me envolvi em prolongadas cogitações. E só via o mar... Só pensava, obsessivamente, nas distâncias e nas entranhas do mar.!.. Olhava-o com pasmo e respeito, mas queria sentir-me também parte dele! Ser mais um elemento do mítico e misterioso oceano! Ir por ali a fora numa das ágeis pirogas.! Desvendar segredos esquecidos no tempo!
Oh, e quantas vezes ali mesmo, não experimentei as estreitíssimas cascas de noz, navegando em frente ou embicando na areia da pequena praia ao lado, naqueles meus habituais treinos, ao Domingo, vindo da Praia Lagarto (ao fundo da descida a caminho do aeroporto), passando em frente da Baía Ana Chaves, Fortaleza de São Sebastião, costa da marginal, Praia Pequena e ponta do Forte de São Jerónimo -e, por vezes, ainda um pouco mais a sul, à Praia do Pantufo.São Jerónimo era geralmente a baliza de chegada e de retorno ... E, também, muitas vezes ao fim da tarde e pela noite adentro, era o meu local preferido (até por ficar um pouco isolado e retirado da cidade) para me familiarizar profundamente com o mar.
Lembrava-me das façanhas dos pescadores são-tomenses, dos seus antepassados que demandaram as ilhas, dos barcos negreiros que ali aportaram e também dos nossos marinheiros (antes desse vil mercado) que por aquelas águas navegaram; imaginava quantos naufrágios e sofrimentos aqueles mares, já não teriam causado.
Sabia dos muitos perigos que me podiam esperar - não os desdenhava! - mas entregava-me ao oceano de coração aberto, possuído de uma enorme paixão, em demanda dos grandes espaços e de uma infinita liberdade, tal qual as aves migradoras! Olhava-o como se fosse já meu familiar e meu amigo. Embora sabendo que a sua face, quando acometida de irascível crueldade, havia sido palco de muitas tragédias, havia engolido muitos barcos e tragado muitas vidas. Contudo, eu não ia ali apenas movido pelo prazer da aventura: só por isso, não sei se compensaria... Mas orientado por razões mais fortesHavia algo, no fundo de mim, impelido como que por um pendor sobrenatural inexplicável que me fazia acreditar que, mesmo que apanhasse alguns sustos, tal como já havia acontecido em anteriores viagens, lá haveria de sobreviver e de me safar!.
O mar também é generoso quando quer ... A sorte protege os audazes e acreditava que o mar haveria de compreender os objetivos pelos quais que norteava o meu espírito e a minha temeridade.
Quando Luís de Camões escreveu na estância XII do V Canto de "Os Lusíadas"
"Sempre, enfim, para o Austro a aguda proa,
No grandíssimo golfão nos metemos,
Deixando a Serra aspérrima Leoa,
Co Cabo a quem das Palmas nome demos.
O grande rio, onde batendo soa
O mar nas praias notas, que ali temos,
Ficou, coa Ilha ilustre, que tomou
O nome dum que o lado a Deus tocou."
"O contributo dos Portugueses para uma nova visão do Mundo e da Natureza é essencialmente informativo e empírico (baseado nos sentidos). Como escreveu Pedro Nunes: “os descobrimentos de costas, ilhas e terras firmes não se fizeram indo a acertar…” Pois os nossos marinheiros: “…levavam cartas muito particularmente rumadas e não já as que os antigos levavam"
"Enquanto os gregos avançavam na área da cartografia, os romanos estavam ainda num estágio anterior. Utilizando uma forma de representação primitiva, situavam Roma no centro do Mundo e davam maior importância ao registo de rotas" (..)Durante muitos séculos, os mapas foram um privilégio das elites – apenas reis, nobres, alto clero e grandes navegadores e armadores tinham acesso a esse tipo de informação. Só com a invenção da imprensa de Gutenberg, em meados do século XV, os mapas puderam ser mais amplamente utilizados. " In. Uma nova visão do Mundo - contributo português
QUEM POVOOU AS ILHAS DO GOLFO DA GUINÉ?
Título de dois artigos, de minha autoria, publicados no extinto Diário Popular (27-12-76 e 4-12-76) depois de várias travessias em pirogas no Golfo da Guiné, com as quais pretendi demonstrar que as canoas são capazes de fazer grandes viagens e resistir às maiores tempestades - admitindo, por isso, a possibilidade de as mesmas terem sido usadas pelos primeiros povoadores das ilhas, oriundos do litoral africano.
Li o que diz a versão colonial e os contributos de outros autores, que se têm debruçado sobre este assunto. Tenho também comigo textos que nunca publiquei. Sempre na perspetiva de os reunir num livro, juntamente com os relatos das minhas aventuras. A verdade é que me tenho dispersado com outras atividades e o tempo passa
(construção da canoa Yoan Gato - que usei na minha última viagem)
Defendo a teoria de que os primeiros povoadores, aqueles que, pela primeira vez, aportaram nas suas baías, foram os hábeis navegadores das canoas, vindos da costa africana.
Demonstrei essa possibilidade através das várias travessias que empreendi - De resto, não será por mero acaso que as canoas surgem nas cartas do século XVII, com idêntico destaque ao das caravelas
.
Em minha modesta opinião, a história das descobertas prima mais pela ficção e efabulação de que em dar-nos conta do que se verdadeiramente se passou. Mas o fenómeno da sublimação foi transversal a outras potências coloniais.
.Mesmo, acerca do ano e dia da chegada dos Portugueses, às Ilhas do Golfo da Guiné, há mais dúvidas de que certezas. Era cómodo fixar uma data e julgo que foi o que sucedeu.
Atualmente, os historiadores não se limitam às transcrições das versões mais ou menos oficiais, devassam velhos arquivos e lançam-se, sem preconceitos, numa investigação mais aprofundada - A mentalidade colonial era contrária a esse tipo de estudo - E já surgem estudos curiosos, que pelo menos vão de encontro a um passado anterior ao da época colonial... Abrem a porta a outros horizontes e probabilidades, contrariando versões intocáveis, como se fossem intangíveis dogmas papais
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