O Principie também tem a sua
princesa: originaria de “ nativos, de velha cepa”, de uma família plebeia rica, mas nobre e princesa no que o título encera de
honrarias e de mítico, e até de contrastes: “não deixou marido ou filhos, mas
tão somente herdeiros-interesseiros” (um deles foi o próprio Barão de Água Izé”,
que reclamou para si as suas roças, toda a sua fortuna, por alegadas dívidas – e quais os parentes, senão os tinha, que o podiam o contradizer?!...
), sim, como é dito em registos, mesmo tendo sido rica e poderosa, “não teve
epitáfio, nem lápide ou sequer qualquer piedoso sinal na sua sepultura, a
contrastar no que fez a um dos seus maridos. E já nem sequer é possível
assinalar o local em que foi sepultada”
Correm, a respeito de D. Maria
Correia, lendas fantásticas, que, ao longo dos tempos, têm alimentado a imaginação
popular, e, porventura, com algum fundo de verdade, porque a voz do Povo
é a Voz de Deus, menos a dos relatos de escribas coloniais, que, embora
tivessem reconhecido a sua importância social e citem o imaginário popular,
porém, o seu preconceito racial lhe teria recusado o estatuto de
Princesa Negra
Descontando os naturais exageros, de quem
conta um conto lhe aumenta sempre mais um ponto, que chegam a classificá-la como depravada ninfomaníaca, devoradora de homens - e, então, os homens que ainda hoje têm dezenas
de mulheres por sua conta e alguma
dezenas de filhos, o que são ?!...
Pois, mas quando a mulher tem idêntico comportamento, é logo rotulada de cruel, como diz alguma gíria popular, que, embora não lhe negando a riqueza, a rotula de “mulher viúva muito poderosa”, que “dirigia a roça com punho de ferro”, que “tinha um grande apetite por homens. Quando algum trabalhador lhe agradava, desfrutava dele e depois, para que não contasse a ninguém… matava-o!”
Pois, mas quando a mulher tem idêntico comportamento, é logo rotulada de cruel, como diz alguma gíria popular, que, embora não lhe negando a riqueza, a rotula de “mulher viúva muito poderosa”, que “dirigia a roça com punho de ferro”, que “tinha um grande apetite por homens. Quando algum trabalhador lhe agradava, desfrutava dele e depois, para que não contasse a ninguém… matava-o!”
Como se vê, não faltam os ingredientes necessários
para uma história fantástica, de um quase verdadeiro conto de fadas
ou de lendárias princesas encantadas, que alimentam a
imaginação, tanto dos adolescentes, como de jovens e
adultos, o qu parece ser o caso da mítica, D. Maria Correia Salema
Ferreira, mais conhecida pela Princesa Negra do Príncipe, uma
mulher bela, rica, apaixonada, generosa e sensual.
É o que pode depreender-se, através
dos vários escritos e dos testemunhos pessoais acerca da sua vida e da sua
figura, onde não faltam enredos e episódios, os condimentos mais
curiosos para a realização de uma novela televisiva ou de um filme de longa
metragem e com expressão, tanto nacional, como mundial – Ou não só o
facto das ilhas de S. Tomé
e Príncipe, se erguerem no meio do Mundo, não é já de si, aspeto de singular relevância?!...
Creio que o Ministério da Cultura tem aqui matéria bastante para uma boa iniciativa televisiva ou cinematográfica. Pois, embora não tendo
origem da "casta nobreza" de "sangue azul", foi uma
autêntica princesa: com os seus defeitos e virtudes: no vestir, no luxo, dos
seus dotes físicos, na riqueza e até na sua generosidade, esperteza e nas
extravagâncias:
A
sua vida e a sua personagem é caracterizada pelas mais singulares e excecionais
qualidades de comportamento pessoal e cívico - Não de mera futilidade mas de
uma mulher muita ativa, empreendedora, apaixonada e generosa. Pois dela
constam donativos, de solidariedade e de bondade, cujo exemplo
ninguém mais a superou ou foram igualados na sua época “Encontramos no
B.O. Nº53 de 30 de Outubro de 1858 uma subscrição a favor das famílias
das vitimas da febre amarela em Lisboa sendo a única mulher e maior
subscritora D. maria Correia Salema Ferreira, com 12$000 ”
TESTEMUNHO DE QUEM A CONHECEU
Um desses testemunhos pessoais, éo de Gabriel
Fernandes da Silva – E quem foi este distinto filho da Ilha do Príncipe?
Dizem os registos que nasceu “a 1 de Novembro de 1856; exerceu por
três ou quatro vezes o cargo de Vereador da Câmara, por duas vezes foi
regedor da paróquia, por duas vezes, Juiz Popular e por duas vezes
Escrivão e Tabelião, a primeira vez durante 13 anos e a segunda durante 4 anos,
além de diferentes comissões para que foi nomeado.
É Cavaleiro da ordem de Cristo, por
Decreto de 1889, referenciado pelo Conselheiro José Dias Ferreira, então
Presidente do Conselho de Ministros. Tem
81 anos, boa vista e uma saúde regular. O
seu busto não se curvou ainda ao peso dos anos; a memória prodigiosa de que é
dotado e a facilidade com que nos conta episódios de outros tempos
citando datas e nomes, deixa-nos perplexo.
Este distinto cidadão, natural da Príncipe
- diz o relato dactilografado, a que tive acesso e passo a
transcrever; "deu os seguintes elementos, que confirmam em parte o
que encontramos escrito”
D. Maria Correia Salema Ferreira era natural da Ilha do Príncipe; seu pai António Henriques Nogueira, natural do Brasil, tinha fortuna; Era proprietário da Roça Sant’Anna; Sua mãe D. Maria de Almeida era natural da Ilha do Príncipe; Foi seu primeiro marido o abastado proprietário José Ferreira Gomes natural da Ilha do Príncipe, fidalgo da Casa Real, Cavaleiro professo da Ordem de Cristo e Coronel das Ordenanças o qual era Vicente Gomes Ferreira e de D. Josefa Maria da Conceição. Faleceu em 2 de Novembro de 1837. O brasão gravado numa pedra rectanguar que se encontra na casa particular de Jerónimo José Carneiro na cidade do Príncipe, a que chamam “ da Maria Correia”, existe também na pedra tumular do seu esposo, a qual da Capela da Ribeira Izé foi enviada para a Câmara Municipal da I. de São Tomé . Daqui se conclui que o brasão não pertencia a Maria Correia antes do seu casamento com José Ferreira Gomes
Por volta de 1840 D. Maria Ferreira casou
novamente.
O seu segundo marido chamava-se Aureliano da Silva; era industrial pintor e natural de Maranhão (Brasil). Faleceu no Príncipe em 1853.
O seu segundo marido chamava-se Aureliano da Silva; era industrial pintor e natural de Maranhão (Brasil). Faleceu no Príncipe em 1853.
D. Maria Correia faleceu em 6 de Março de
1862.Dos nativos foi a maior proprietária nesta ilha, equiparando-se ao grande
proprietário Jacinto Pereira Carneiro. Por seu falecimento deixou a Roça Simaló
e a Roça Ribeira Izé a D. Pedro V (individual);
Este testamento porém foi
tomado como falso e por uma divida confessada ao Barão de Água Izé que
procura procuração a Marcelo Francisco da mata, passaram as referidas propriedades
para a posse do dito Barão.
Encontramos no B.O. Nº53 de 30 de
Outubro de 1858 uma subscrição a favor das famílias das vitimas da febre
amarela em Lisboa sendo a única mulher e maior subscritora D. maria
Correia Salema Ferreira, com 12$000
"MARIA CORREIA A PRINCESA NEGRA DO PRÍNCIPE "
"MARIA CORREIA A PRINCESA NEGRA DO PRÍNCIPE "
Este é o titulo de um pequeno livro, publicado em 1944, de autoria de José Brandão Pereira de Melo, até hoje a obra mais completa e que começa por estas palavras:
" Nos finais do século XVIII passado já o
primordial período agrícola da cultura da cana sacarina (que vários factores:
invasões francesas de 1706 e l 799 e, principalmente, o desenvolvimento do
Brasil tinham feito abandonar), a Ilha
Ponto privilegiado, pela sua situação
geográfica, para o abastecimento, em água e comedorias, dos navios negreiros,
entreposto de escravos (recrutados, em geral ou, em grande maioria, nas
costas do Golfo da Guiné) tornou-se a Ilha rincão abastado, onde
abastadamente se vivia.
E lá viviam então, antes da chegada
daqueles europeus que foram os precursores do seu moderno desenvolvimento
agrícola, os nativos, de velha cepa indígena, alguns num faustuoso viver que,
ajudando a sua natural imprevidência, ingénita vaidade e alardeio de riquezas,
em breve os viria reduzir à espécie de miséria em que hoje se acham
cristalizados.
Entre os grandes proprietários desse
tempo, figura, à cabeça
Figura lendária lhe ouvi já chamar.
Mas nada tem de lendária essa figura de mulher, que foi uma polarização das
qualidades e defeitos da sua época, da sua casta e da sua terra, figura
absolutamente e bem real, que viveu dentro das realidades do seu tempo
realizando a sua vida esplendidamente.
Vivia, pois, na Ilha do Príncipe, no
alvorecer do século XIX, Maria Correia, figura central de várias lendas, que a
imaginação nativa tem arquitectado e conserva, heroína de actos
frutuosos, de moralidade discutível mas de real proveito para o aumento de seus
cabedais, actos que, aliás, não estavam fora do espírito da época nem da
característica ou especializada moral colonial desses tempos.
D. Maria Correia Salema era natural do
Príncipe, onde nascera em 1788, filha do major de Milícias António Nogueira
(brasileiro) e de D. Ana Maria de Almeida, também nativa do Príncipe.
Casou, em 16 de Agosto de 1812, aos 24 anos, com o capitão das Ordenanças José Ferreira Gomes, (brasileiro), filho do capitão-Mor Vicente Gomes Ferreira (1) e de D. Josefa Maria da Conceição.
José Ferreira Gomes, que veio fixar-se no Príncipe,
a quando da proclamação da independência do Brasil, era .homem viajado e, além
de proprietário agrícola, armador de navios - destinados ao melhor negócio do
tempo: o tráfico de escravos .
Foi o introdutor na Ilha do Príncipe, em
1822, do cacau, cuja planta trouxera do Brasil e frutificou ali pela primeira
vez, na sua roça Simaló. E bastaria isto para o assinalar ao nosso interesse
historiográfico e também ao grato reconhecimento de quantos hoje vivem do
cacau, nessas afortunadas e ricas ilhas do Golfo da Guiné, para onde a planta
foi sendo sucessivamente levada, primeiro para S. Tomé e depois para Fernão do
Pó e Ano Bom. .
Se não por suas virtudes, pelos menos por
seus méritos, foi José Ferreira Gomes galardoado com o grau de Cavaleiro da
Ordem de Cristo e o título honorífico de Moço-fidalgo da Casa Real. Morreu, aos
56 anos, em 2 de Novembro de 183 7, Ouvidor Geral Substituto e coronel das
Ordenanças.
Quer a tradição local que este posto de
coronel, que atingiu, tenha sido de um alto simbolismo e de picaresca
assimilação, pois, ao que consta da mesma tradição, parece não ter sido de uma
fidelidade conjugal por aí além D. Maria Correia.
Quis mostrar a viúva grande pesar, em
alardes de manifestações sentimentais. Entre estas podemos citar o epitáfio
lírico, mandado gravar na lápide sepulcral do finado, que copiamos
integralmente:
Involta (sic) em pranto, em dor, e agonia,
Traçou a triste esposa lutuosa,
Às cinzas do esposo saudosa,
Este epitáfio sobre a campa fria
Aqui jazem os restos de uma consorte,
Exemplo de bondade e de ternura,
Baixou dos mortos à mansão escura,
Deixando a inerme esposa entregue à sorte.
Apesar do sentimento, tão lírico e
lapidarmente manifestado, a “inerme esposa” dez anos depois (já com 59 anos)
contraía segundas núpcias, em 7 de Fevereiro de 1847, na capela de
sua Roça Ribeira Izé, com Aureliano da Silva, pintor de seu ofício e natural de
S. Luiz de Maranhão (Brasil), de 33 anos, muito mais novo, portanto, do
que ela e moço apessoado. Ao que ouvi dizer a alguém, que ainda o conheceu,
parece que apenas por seu dotes pessoais ou físicos foi escolhido por D. Maria
Correia para sucessor do referido coronel.
Infelizmente, para sua “sede de amor”, o
segundo marido pouco lhe durou, vindo a morrer em 18 de Agosto de
1852
Abra-se aqui um parêntesis para informar
que aquela lápide, riquíssima, de mármore (em que o epitáfio era encimado
pelo vistoso brasão de armas de José Ferreira Gomes) foi levada, há anos, para
S. Tomé, tirada do cemitério anexo à capela de Nossa 'Senhora da Pureza, da
antiga roça Ribeira Izé, propriedade de D. Maria Correia, onde seu marido fora
sepultado. Em S. Tomé fui encontrar a lápide, no pátio exterior da Câmara
Municipal, mal equilibrada sobre três pedregulhos e servindo para umas pretas
lavarem roupa! …
Por ordem do Governador, Capitão Vaz
Monteiro, a quem expus o estúpido vandalismo, foi a lápide transportada para o
Museu da Colónia, em organização - desde 1938,! (2).
Fechado o parêntesis, continuo a dizer o
que consegui apurar da vida de D. Maria Correia.
Apesar do sentimento, tão lírica e
lapidamente manifestado, a «inerme esposa» dez anos depois (já com 59 anos!)
contraía segundas núpcias, em 7 de Fevereiro de 1847, na capela da sua roça
Ribeira Izé, com Aureliano da Silva, pintor de seu ofício e natural de S. Luíz
do Maranhão (Brasil), de 33 anos, muito mais novo, portanto, do de que ela e
moço bem-apessoado. Ao que ouvi dizer a alguém, que ainda o conheceu, parece
que apenas por seus dotes pessoais ou físicos foi escolhido por D. Maria
Correia para sucessor do falecido coronel.
A bi-viúva também lhe não sobreviveu
muitos anos;' pois morreu em 1 de Março de 1861, · com 73 anos. Eis
a cópia integral do respectivo registo de enterramento:
«Hoje as Cinco horas da Madrugada felleceo
a Excellentissirna Senhora Donna Maria Corrêa Salema Ferreira, de molestia -
Gastre enterite - Segundo declarou o Facultativo. Natural desta Ilha, Idade
Setenta e três annos, Viúva. Será sepultada no lugar competente, Caixão á
terra. Pagou a quantia de oito mil réis. Cemitério da Ilha do Príncipe 1.º de
Março de 1861- Ramos Presidente-Teves Regedor - Damião Vaz Pauleth guarda do
Cemitério. ( l.º Quarteirão Superior) - N.º 38.»
Mas como não deixou marido ou filhos, mas
tão somente herdeiros-interesseiros, não teve epitáfio, nem lápida ou sequer
qualquer piedoso sinal na sua sepultura. E já não é possível assinalar hoje o
local em que foi sepultada, no cemitério do Bom-Fim. «Sic transit gloria mundi
... >>.
Diz a tradição oral da Ilha do Príncipe ( e de alguns nativos, que ainda a viram, recolhi estas referências) que D. Maria Correia vivia opulentamente, faustosamente até o que, julgo, não só crível, mas absolutamente natural e lógico, tratando-se de uma nativa rica: a pessoa mais rica da Ilha, nesse tempo. Mantinha dois palácios apetrechados e com pessoal permanente, onde alternadamente residia: um na sua roça Ribeira Izé e outro no Simaló, junto da cidade. De ambos se conservam ainda minas, de que bem se pode inferir a sua traça e grandeza.
Também na cidade de St.º António do
Príncipe iniciou a construção de outro palácio, ocupando todo o quarteirão onde
depois se edificaram os Paços do Concelho, construção que foi abandonada por ir
a atingir altura superior e proporções mais grandiosas que as da vizinha Igreja
Matriz - o que seria desairoso e pouco digno do espírito ou feição religiosa da
época e da própria D. Maria Correia. Assim o diz, como explicação, a tradição
oral.
Da sua riqueza podemos saber, de ciência
certa, por alguns documentos que encontrei, entre montões de papelada a
apodrecer numa loja térrea, quando organizei o interessante e valioso Arquivo
do Governo do Príncipe, hoje incorporado na Biblioteca Municipal, criada em
1940.
E o primeiro uma escrita de convenção de
herança, feita entre D. Maria Correia e os herdeiros (irmãos) de seu segundo
marido: João Paulo da Silva e D. Águeda Elísia da Silva, em 14 de Abril de
1855, na qual se relacionam bens na importância de 4.096$800 réis, «por conta
da herança que a todo o tempo lhes pudesse vir a pertencer, se porventura
ficassem habilitados, calculados segundo as terças do Inventário, abatendo-se
todas as dívidas existentes. e a sua respectiva meação». Pela mesma escritura
deram-se os herdeiros por «quites, pagos e satisfeitos ( p1,dera!) renunciando
e dando por expirado todo e qualquer direito hereditário que tenham ou venham a
ter sobre os bens do mesmo casal».
Os bens relacionados nessa escritura
constam de prédios rústicos ( «O que Capa» e «O que Boi», com as respectivas
casas de habitação e plantações), escravos (25 homens e 23 mulheres), roupas,
móveis, joias e outros objectos de ouro e prata.
Uma cláusula interessante dessa escritura,
que mostra bem a esperteza de D. Maria Correia, é a seguinte, que copiamos
textualmente, para lhe não tirar o saboroso valor:
«Que não estando ainda os mesmos
presumptivos herdeiros habilitados, e podendo acontecer para o futuro que
appareça quem maior direito tenha de haver a mesma herança, impunha a condição
de ser ela recebida, depois da presente Escritura [assinada } pelos
interessados, prestando a competente fiança, ou responsabilidade legal.» .
Esta cláusula foi também aceite pelos
interessados (herdeiros), ficando os bens, havidos por herança, implicitamente
sujeitos e hipotecados para garantia, até à habilitação legal definitiva dos
mesmos herdeiros. Digam
lá que não era hábil ou habilidosa a D. Maria Correia!
Os bens totais do casal da nossa heroína
(Inventário de Outubro-Novembro de 1852, por morte do segundo marido) foram
avaliados em 24-.992$742 réis. Não incluindo o patacho «Ferreira» que foi
judicialmente vendido em leilão, por 250$018 réis, a juntar ao inventário.
Não vale a pena ( e seria fastidioso)
discriminar os bens. Mas
pode apontar-se, da leitura que fizemos do largo inventário, as roças:
«Simalé», «O que Boi», «Pico» ou «Praia Velha», «Ribeira Izé»,
<<Ü que Onça», «Quinta», «O quedo Rosário», «Sillu», «Pertinho»,
«O que Capa», <
Para não alongar fastidiosamente estas
simples notas, mencionaremos apenas as pratas de seu uso, que caracterizam e
definem um viver opulento: bacia e jarro, três salvas, talheres (26 colheres,
17 garfos e 28 facas), galheteiro, paliteiros, açucareiros, bules, leiteiras,
cafeteiras, colheres para chá, etc.
Possuía· também uma salva e um copo, de
ouro, para seu uso pessoal, objectos estes que foram avaliados no referido
inventário em 282$600 réis.
Das suas joias pessoais, de oiro e
pedraria, corais, etc., apontaremos: 9 pares de brincos, 3 cadeias ou trancelins,
18 colares, 5 anéis, 3 alfinetes-broches, além de uma caixa para rapé, um
crucifixo, um rosário, um breve e um relógio, tudo de oiro.
E a livraria (nota interessante a definir
a sua mentalidade, a do marido ou do casal) foi avaliada em 80$000 réis. Andam
por lá dispersos, na posse de vários nativos, peças. soltas da sua baixela, em
boa porcelana, com o brasão nas cores heráldicas respectivas e as suas iniciais
em dourado.
Em 30 de Janeiro de 1845, requeria D.
Maria Correia ao Juiz de Direito da Comarca do Príncipe «autorização para
vender alguns bens de seo Cazal, a fim de poder amortizar algumas grossas
dividas com que está onerado o mesmo Cazal», o que lhe foi deferido,
apresentando, em 12 de Maio, uma relação dos bens que pretendia vender: roças
«Pico», «Ribeira das Agulhas», «Praia Velha», «Praia Ubá» e «Praia Rei», assim
como 66 escravos e algumas joias de oiro.
D. Maria Correia deixou em testamento as
suas roças «Simalé» e «Ribeira Izé» ao Rei D. Pedro V (doação pessoal). O
testamento foi, porém, impugnado pelo l.º Barão de Água Izé e tido como não
válido, passando essas propriedades para a posse daquele agricultor, como saldo
de uma dívida ao mesmo, cujo documento foi apresentado ... posteriormente.
Da sua riqueza dissemos já o bastante,
pelo menos o que se podia dizer, fundamentalmente. Da sua importância social,
digamos assim, de seu lugar na sociedade coeva do Príncipe, vão algumas notas
soltas e exemplos: Inscreveu-se,
em 1858, para a subscrição nacional a favor das vítimas da febre amarela em
Lisboa, com a quantia de 12$000 reis, a mais alta importância subscrita.
Noutra subscrição, aberta também em 1858,
para custear o funeral do Governador Francisco António Correia, achamos o nome
de D. Maria Correia firmando uma das mais altas importâncias inscritas.
Dando conta dos ofícios divinos em
sufrágio da alma do mesmo Governador e apontando as pessoas de maior cotação
social que assistiram ao acto, o Sub-Delegado do Procurador Régio (Ofício n.º
17) punha à cabeça do rol o nome da Ex.?" Senhora D. Maria Correia Salema.
Era assim mesmo: Exma Senhora D. Maria Correia Salema, que figura em todos os registos de baptismo e óbito de serviçais e filhos de serviçais seus, como no seu próprio registo de enterramento, atrás transcrito.
É de notar que este tratamento de
Excelência era raro ao tempo e reservado a pessoas de condição. Em todos os
documentos que compulsámos (e foram centenas), quer do Arquivo do Governo do
Príncipe, quer do antiquíssimo Arquivo Municipal, só o vimos aplicados aos
Governadores (nas suas diversas modalidades: Corregedores, Capitâis-Mores ou
Governadores de Distrito) e a ela. O que é uma prova, alta prova, da sua
importância ou cotação social.
Correm, a respeito de D. Maria Correia,
lendas fantásticas, sem a mais leve sombra de realidade ou possibilidade (não
nos detendo, por isso, a fixá-las aqui) e algumas histórias, com mais viso de
verdade.
Entre estas, uma, que as circunstâncias
ocasionais do tempo e o que sabemos do carácter e viver da nossa heroína tornam
absolutamente lógica e possível de se ter passado consoante reza a tradição
local. Trata-se da maneira
como D. Maria Correia iludia a vigilância dos navios ingleses, em cruzeiro de
repressão da escravatura ... feita pelos outros.
Diz-se que ela, quando vinha a chegar
carregamento importante de carne negra, convidava os oficiais ingleses a
visitarem uma das suas propriedades do Príncipe, onde os recebia
principescamente e onde regiamente eles se banqueteavam.
Como a consequência fatal de tais
'banquetes era ficarem os convivas, pelo menos, incapacitados por largas horas,
aportava entretanto o carregamento a uma praia oposta da Ilha. E
quando os amigos ingleses retomavam as suas faculdades e reembarcavam para o
cruzeiro, era tarde e as senzalas-prisões estavam cheias de mercadoria fresca.
Algumas das imagens - antigos postais coloniais - foram extraídos do livro "Postais antigos de S. Tomé e Príncipe - de João Loureiro; outros do livro de Francisco Mantero - A Mão d'Obra em S. Tomé e Príncipe
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