expr:class='"loading" + data:blog.mobileClass'>

sábado, 14 de setembro de 2019

A SÓS À FLOR DO MAR -Navegar sozinho, sem outros meios náuticos de navegação, com o destino completamente à mercê de um errático acaso, ao sabor do imprevisto e do filtro do instinto,

A SÓS À FLOR DO MAR


Sozinho perante tão extrema  grandeza marítima, 
tão imensa e misteriosa amplidão 
e ser-se ao mesmo tempo
  extrema fragilidade e ínfima pequenez, 
é, sem dúvida,  coragem, triunfo e arrojo 
às adversidades da  inóspita natureza!... 


Sede insaciável de se ser bafejado pela luz mais clara e pura dos astros!
Voar como ave perdida pelos vastidão infinita dos espaços! 
Errar como um vagabundo pelos mares de todo o mundo!
Instantânea e antiquíssima harmonia! Voluptuoso jorro de energia! 
Lufada fresca, vivo e perene rasto a divindade! 



Levado a sós por genuínos impulsos de aventura,
pensamentos insondáveis, chamamentos 
de bravura ocultos, inimagináveis!
É o aspirar da palavra solar, 
ter por companhia,
o ritmo, a graça, a melodia
o deslumbramento dinâmico do anelado azul,
a vibrátil claridade.
A conjugação de  todas as ânsias reprimidas
na esteira de se  alcançar, num só desejo, numa só vontade,
os limites do inatingível, a margem 
do insuperável e do sobrenatural!



Percorrendo vastas planícies salgadas em turbulentas águas,
deixando para trás preocupações triviais, ódios mesquinhos.
Mesmo que a ousadia  condene a viver um só instante de eternidade,

oh, sim! vale a pena viver o sublime,
correr o risco e a temeridade.
Decifrar  os enigmas do incognoscível
estar ao mesmo tempo dentro e fora da verdade,
dos misteriosos limites que comandam os desígnios 
da morte e da vida.

Navegar sozinho, sem outros meios náuticos de navegação,
com o destino completamente à mercê de um  errático acaso,
ao sabor do imprevisto e do filtro do instinto,
 perdido entre o vento, o olvido 
e as espáduas do esquecimento,
oh! não é temeridade vã, inútil o laço da solidão! 
Mas o desejo porfiado e ardente em decifrar 
os calmos  e febris prodígios do desconhecido, 
a busca incessante do oiro na sua essência,  
no seu estado original, ainda incandescente
a procura dos silêncios visíveis 
dos sons puros na grande imensidão,
no seu estado selvagem, verdadeiramente inocentes!
 Vozes, rumores e murmúrios de todos os tempos
que  soem e repercutam ecos
de invulgar pureza e  libertação!

 Guiado pelos astros e pelo mesmo instinto das aves
- tal foi o meu caso: uma Bússola
dá uma ajuda mas não indica o lugar.
 Os Vikings  usaram a Bússola Solar Mais nada.
Todavia, dominaram  os mares no seu tempo.
Sem Cronómetro Marítimo Astrolábio  Sextante
Cartas Náuticas ou Almanaque náutico
Leituras  satélite por GPS, informações astronómicas, 
a posição exacta a qualquer hora:
latitude e longitude da  rota.
Instrumentos náuticos, esses, só os grandes barcos, ao largo!
- Vi alguns mas não me viram a mim - Eu não era nada.
Até ia perdido, prisioneiro de um incerto e amargo destino -
E eles, os pilotos sem os instrumentos a bordo?!...O que seria deles?!..
Mesmo assim, talvez se sentissem menos livres
e mais prisioneiros do que eu!..




Ir sozinho para o mar, é partir 
em demanda dos mais ténues rumores e labirintos sagrados!
Saciar a  fome da floração silenciosa, da vagabunda dança de um sopro íntegro  
de fulgor furtivo de sabedoria e pureza. 
É fazer-se ao mar e navegar  sem contrapartidas seguras à partida
e não ter qualquer  certeza de paisagens imaginárias ou reais à chegada!..
É a transparente e claríssima sede de nostalgia dos mais puros céus!
É viajar na senda dos séculos passados, eras volvidas 
ou dos que ainda  hão-vir por  vontade de Deus.



Apelar ao instinto animal (que raramente se engana, tal como o da ave)
É vidência!  Deslumbramento! Itinerário transfigurado.
É trocar o certo pelo incerto
- Sem todavia saber que próximo futuro o aguarda,
a que portos  poderá  arribar,
que enseadas de ilhas frondosas o esperam, 
que  recortes de orlas vai contemplar,
que escolhos vai ter pelo caminho,
que perigos e ameaças
lhe poderão interromper a viagem.

 




Largar tudo - os horários, a família, os amigos, 
a tranquilidade de um lar - e partir 
mar fora numa frágil piroga
ou até em barcos maiores e bem equipados, 
singrando o ondulante manto líquido, 
trocando o certo pelo incerto, o desconhecido,
não receando os revés da ousadia e  a má sorte,
não temendo as partidas da omnipresente imagem da morte,
alheio a tudo: às inesperadas variações dos ventos,
à dança e contra-dança de correntes poderosas
súbitos vendavais, "súbitas trovoadas temerosas!"





Navegar sobre as ondas encapeladas,
ir de velas enfunadas, é sentir a alma rubra!
Alheia aos perigo que rondam por toda a parte,
subindo ou imergindo 
dos insondáveis abismos! 
 Navegar à flor das águas agitadas é ter  por companhia
a menos de um palmo ou da grossura de uma tábua,
a cova funda e horrível da mais funesta e imensa sepultura
Deixar, enfim, que o mar e o vento cumpram a sua palavra!
Não pensar em horários nem perder tempo em coisas banais
Ser sonho ousado que se cumpra e nada mais!

Jorge Trabulo Marques

Nenhum comentário :