Jorge Trabulo Marques
SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE – ILHAS MARAVILHA QUE GERAM POETAS E CONVIDAM À CONTEMPLAÇÃO E À POESIA - MESMO QUANDO AS REPRIMEM - - Por Jorge Trabulo Marques - jornalista e investigador
SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE – ILHAS MARAVILHA QUE GERAM POETAS E CONVIDAM À CONTEMPLAÇÃO E À POESIA - MESMO QUANDO AS REPRIMEM - - Por Jorge Trabulo Marques - jornalista e investigador
A
beleza natural de São Tomé e Príncipe é meio caminho andado para ser-se
poeta – e estas ilhas têm grandes poetas: desde um Costa Alegre, a
Francisco José Tenreiro, passando por Francisco Stockler, Alda do
Espírito Santo, Conceição Lima, a Olinda Beja, entre outros, são nomes
de elevada craveira, que atestam uma extraordinária literatura poética
Homenagem de Cícero Alves |
A
ambas, já me referi, detalhadamente, neste meu site, contudo. penso
ser oportuna esta minha evocação, citando algumas das passagens, que
aqui dediquei a duas grandes figuras femininas das letras santomenses,
como acréscimo da minha singela homenagem a um nome incontornável da
literatura das encantadoras Ilhas Verdes do Equador
Porém, antes de aqui
citar os seus poemas, recordo também a homenagem, que, há um ano, nesta
mesma data, lhe foi prestada no 2º jantar convívio de São-Tomenses, na
Diáspora, organizado pela Associação das Mulheres de S. T. P. em Portugal, Mén
Nón, que decorreu, na sede da ACOSP, na cidade de Lisboa, em
ambiente de muita alegria e de entusiasmo, muito acolhedor e fraterno,
como é timbre das gentes das maravilhosas Ilhas Verdes do Equador
fraternidade – Com a sala completamente cheia, na qual puderam ser apreciados
alguns dos mais saborosos pratos típicos da gastronomia, ao som da música
da terra e alguns momentos de poesia, com a leitura de belos poemas de Alda do Espírito Santo (1926-2010), figura emblemática da
literatura e da cultura santomense, com versos lidos pela voz da
moçambicana, Elsa de Noronha
Elsa de Noronha, natural de Moçambique,
(22 de Agosto de 1934), filha do poeta moçambicano Rui de Noronha, declamadora
e também ela autora de poesia, tem sido uma verdadeira paladina para a
divulgação da poesia africana em língua portuguesa
Alda Graça do Espírito Santo, nasceu
a 30 de abril de 1926, em S. Tomé, deixou-nos em 9 de Março de 2010 – Mais conhecida como Alda do Espírito Santo,
poetiza e escritora
ALDA-
Duas sílabas numa só palavra - Acrescida do apelido divino " do Espírito
Santo - Nome da Inesquecível Musa, a Mui Amada e Grande Mãe das Ilhas Maravilha - A Grande
Inspiradora Poetiza da liberdade e da Beleza! A Grande Irmã da Dor e do Amor e
do sentimento amargo e mui dolorido sofrimento ancestral de um Povo - Quem
esquecerá o seu rosto?
Não
partiu para o exilio mas, mesmo sob a vigilância da antiga policia
politica (PIDE) nem por isso deixou de usar a palavra, os seus versos,
como a voz mais ativa e interveniente pelo seu Povo - Considerada,
por isso, como expoente máximo do nacionalismo são-tomense, pós
independência. Alda Graça, morreu em Angola para onde foi evacuada por
razões de saúde. Morreu na terra dos seus compatriotas de luta pela
independência nacional, como Mário Pinto de Andrade. Um dos nomes de
Angola que Alda Graça muitas vezes citou nas suas intervenções públicas.
– Excerto deAlda Graça do Espírito Santo
Lá no «Água Grande»
Lá no «Água Grande» a caminho da roça
negritas batem que batem co’a roupa na pedra.
Batem e cantam modinhas da terra.
Cantam e riem em riso de mofa
histórias contadas, arrastadas pelo vento.
Riem alto de rijo, com a roupa na pedra
e põem de branco a roupa lavada.
As crianças brincam e a água canta,
brincam na água felizes…
Velam no capim um negrito pequenino.
E os gemidos cantados das negritas lá do rio
ficam miúdos lá na hora do regresso…
Jazem quedos no regresso para a roça.
(Poesia negra de expressão portuguesa, 1953)
Fevereiro
Silêncio na rua, silêncio nas almas
Um minuto de silêncio angustiado
Repicar de sinos na aurora dos tempos
Um silêncio reverente
Para a página do futuro.
(É nosso o solo sagrado da terra, 1978)
Às
mulheres da minha terra
Irmãs, do meu torrão pequeno
Que passais pela estrada do meu país de África
É para vós, irmãs, a minha alma toda inteira
— Há em mim uma lacuna amarga —
Eu queria falar convosco no nosso crioulo cantante
Queria levar até vós, a mensagem das nossas vidas
Na língua maternal, bebida com o leite dos nossos primeiros dias
Mas irmãs, vou buscar um idioma emprestado
Para mostrar-vos a nossa terra
Excerto - Continua em
NATAL NA ILHA
Ao cair da tarde, pelas estradas da Ilha
Cabaninhas de andala
Tecidas por dedinhos de garotos,
É a nota tocante do Natal.
Uma tocha de mamão
É o luzeiro no caminho
Alumiar o “passo”.
Mas o exotismo dos trópicos
Descendo pelo calendário dos festejos
Faz do “Dá chinja” a festa da família.
Quarta-feira de cinzas
É cara ao coração da nossa gente,
Onde se sente a ausência dos finados.
Na hora do “angu”,
Do clássico calulú de Peixe
Todos se juntam,
Nas roças, nas grutas, nos ermos mais
perdidos,
Em redor da mãe velhinha,
Da avó da carapinha branqueada
Na tradição festiva do “Bocado”.
P’las mãos dessa velhinha solene
todos, todos, recebem p’la mesma colher
Numa união feliz e africana
A primeira colherada
Do menú familiar.
E só então, a refeição começa.
A toda a hora pelo dia fora.
Vem chegando gente
Pró sagrado “Bocado”
Do avô extinto do ano que passou
E da filha arrancada à vida
em plena mocidade.
Cinzas…. Natal…
Exotismo dos trópicos?
- Uma pergunta e uma resposta que pairam
nos ares
Alda Graça do Espírito Santo
Em São Tomé e Príncipe é uma terra onde a
poesia está na sua paisagem, no azul do mar que a envolve e no rosto das suas
gentes: os verdes multicolores são próprios das ilhas tropicais mas nestas
ilhas as suas tonalidades assumem uma magia especial - O nosso
planeta é vasto mas , além de não haver duas terras com as mesmas
singularidades, estas ilhas têm o condão de se situarem no meio do
Mundo – Nomeadamente, S. Tomé. A Ilha do Príncipe, fica a 150 Km mais a Norte e
é tida como a princesa do Golfo da Guiné. No entanto, quer uma quer outra, para
quem as demande, é amor à primeira vista - Não é por acaso que a poesia ali
floresce, até das raízes das árvores que mais tempo se agarram ao solo, mesmo
quando o mar as deixa nuas e quase agarradas às rochas.
Conhecia a existência da sua obra e
também do prestígio que o seu nome goza nas letras e no jornalismo mas ainda
não tinha tido o prazer de estar olhos nos olhos e frente a frente, e,
ainda para mais, logo em direto num dos mais apreciados e mediáticos programas
de informação e debate de ideias da televisão de S. Tomé e Príncipe –
Naturalmente que não me posso esquecer desse amável rosto
Sem dúvida, uma presença simpática e
respeitável, possuidora de um currículo jornalístico de alto gabarito - Conceição Lima esteve 15 anos a
viver em Londres, onde se licenciou em Estudos Afro-Portugueses e
Brasileiros pelo King"s College, obtendo o grau de mestre em Ciências
Políticas e Estudos Africanos pela School of Oriental and African Studies,
tendo exercido a atividade de jornalista e produtora dos serviços em
Língua Portuguesa da BBC Porém, lá como cá (sim, mas não só, a
democracia, dita pluralista, tem destas leituras ou heresias) quando mudam os
governos, surge a irresistível tentação dos “saneamentos”. e não se olha
ao mérito. E, pelos vistos, foi a marginalização de que foi alvo, Conceição
Lima, com o saneamento do seu programa na
TVS, Cartas na Mesa, considerado o programa mais visto da televisão de São Tomé
e Príncipe – Isto porque, Em
São Tomé e Príncipe há um grave défice de liderança
Raízes (do secular) Micondó de Conceição Lima espalham-se pelo Brasil
Conceição Lima, que, nas maravilhosas ilhas do equador é mais conhecida por São de Deus Lima, creio que em resultado da admiração,
do carinho e da popularidade, que goza no seu país, é o nome mais
traduzido da literatura são-tomense, nomeadamente nas línguas alemã,
árabe, francesa, italiana, galega, espanhola, inglesa, servo-croata,
turca e shona.
Autora de três livros de poesia, publicados pela Editorial Caminho, um dos quais, “A Dolorosa Raiz do Micondó’’, acaba de ser lançado pelo Ministério da Educação do Brasil com uma tiragem de 32 mil exemplares.
Autora de três livros de poesia, publicados pela Editorial Caminho, um dos quais, “A Dolorosa Raiz do Micondó’’, acaba de ser lançado pelo Ministério da Educação do Brasil com uma tiragem de 32 mil exemplares.
A referida obra poética, publicada em 2011 no Brasil pela editora Geração Editorial, de São Paulo e, que, por ocasião da 2ª Bienal da Feira do Livro de Brasília, que decorreu de 12 a 16 de Abril, já havia sido selecionada pelo Programa Nacional de Bibliotecas Escolares do Brasil, num conjunto de mais de 400 títulos», vê agora confirmado seu lançamento, e, consequentemente, o reforço da visibilidade dos seus livros no maior país de expressão de língua portuguesa.
Em
recentes declarações ao Téla Nón, Conceição Lima disse estar muito
feliz pelo reconhecimento da sua obra e pela projeção que isso
representa da literatura são-tomense. «Saber que contribuo para elevar o nome e a cultura de São Tomé e Príncipe é muito gratificante e deixa-me realmente muito feliz», 11 Dez 2014 Livro de poesia de Conceição Lima com tiragem de 32 mil exemplares no Brasil
Trata-se, com efeito, de “uma
obra poética que tem sido objeto de vários estudos de Mestrado e de
doutoramento em universidades portuguesas e sobretudo brasileiras.” Referência do Téla Nón quando “A Dolorosa Raiz do Mincondó, começava a dar nas vistas - Já se dizia: "Nesta
coletânea de 27 poemas da poetisa são-tomense Conceição Lima, o
micondó, árvore considerada sagrada em diversas regiões da África,
simboliza origem, casa, morada ancestral. A evocação de tais raízes é
dolorosa devido a acontecimentos históricos, como a escravidão e a
colonização, que imprimiram profundas feridas e rupturas na identidade
nacional, e na própria poetisa, cujos antepassados foram trazidos à
força para o arquipélago africano e mais tarde enviados para outras
terras como escravos. Íntima, pessoal e sofrida, a poesia de Conceição
Lima é também dotada de um lirismo e esteticismo sublimes, presenteados
aqui pela primeira vez ao público brasileiro. Embora a dor seja uma
constante em seus versos, o sentimento que os perpassa é o da sutil
esperança de que a mesma memória que resgata os fatos traumáticos ajude a
fazer germinar algo novo dos escombros, como o micondó que, com suas
profundas raízes e frondosa copa, fez florescer o alfabeto poético de
Conceição Lima.”’ 03/04/2014. Raízes de Micondó de Conceição Lima espalham-se pelo Brasil...3 livros para celebrar o Dia da Consciência Negra
SÃO ASSIM OS POETAS ...
SÃO ASSIM OS POETAS ...
Desde os anos 80 que Maria da Conceição Costa de
Deus Lima, descobriu os caminhos da poesia, contudo, e, como geralmente
acontece aos maiores poetas, a poesia é como voo de ave: voa ou voga, simplesmente, através dos grandes espaços ou mares
da sensibilidade e da imaginação, sem, todavia, ter pouso seguro.
Vão-se fixando instantes, na sebenta do dia a dia, sem contudo haver a
preocupação de os transformar em livro ou de lograr um porto de
arribação – Em suma, vai-se viajando:
“Os barcos regressam
carregados de cidades e distância
Adormecem os grilos
Uma criança escuta a concavidade de um búzio.
“Os barcos regressam
carregados de cidades e distância
Adormecem os grilos
Uma criança escuta a concavidade de um búzio.
Talvez seja o momento de outra viagem
Na proa, decerto, a decisão da viragem”
Na proa, decerto, a decisão da viragem”
( Com Sofia de Melo Breyner)
Em Fernando Pessoa, quis o acaso que alguém se lembrasse de vasculhar o seu baú e descobrir a herança do seu legado. Outros, porém, às tantas, lá se dão de conta que o que é belo deve ser partilhado. Creio ter sido o caso de Conceição Lima, quando lançou “O útero da Casa”, em 2004” – Veja-se bem o significado da palavra de útero: tão só, o mais íntimo de si, as emoções mais marcantes da sua vida. Pelo menos, algumas das muitas vividas: mesmo “quando eu não sabia que era quem sou/ Quando eu ainda que era já eu” - Mesmo assim, vai-se ao fundo da memória – Mas impossível é transformar todos os sentimentos, em versos – Seria também matar a poesia, pois, o pensar, ou racionalizar demais, como dizia o poeta da Mensagem, torna as pessoas infelizes: é preciso “Sentir como quem olha/ Pensar como quem anda” – No fundo, é o que nos transmite a bela poesia de Conceição Lima
Em Fernando Pessoa, quis o acaso que alguém se lembrasse de vasculhar o seu baú e descobrir a herança do seu legado. Outros, porém, às tantas, lá se dão de conta que o que é belo deve ser partilhado. Creio ter sido o caso de Conceição Lima, quando lançou “O útero da Casa”, em 2004” – Veja-se bem o significado da palavra de útero: tão só, o mais íntimo de si, as emoções mais marcantes da sua vida. Pelo menos, algumas das muitas vividas: mesmo “quando eu não sabia que era quem sou/ Quando eu ainda que era já eu” - Mesmo assim, vai-se ao fundo da memória – Mas impossível é transformar todos os sentimentos, em versos – Seria também matar a poesia, pois, o pensar, ou racionalizar demais, como dizia o poeta da Mensagem, torna as pessoas infelizes: é preciso “Sentir como quem olha/ Pensar como quem anda” – No fundo, é o que nos transmite a bela poesia de Conceição Lima
Três Verdades Contemporâneas
Creio no invisível
Creio na levitação das bruxas
Creio em vampiros
Porque os há.
Creio na levitação das bruxas
Creio em vampiros
Porque os há.
In O Útero da Casa, primeiro livro de Maria da Conceição de Deus Lima, lançado quando ainda residia em Londres e trabalhava para a BBC - Confirmando-se, desde então, “entre as mais interessantes vozes do pós-independência - e do pós-colonial - num universo onde muitas vozes anunciadas não se afirmaram no sistema literário nacional."
"Constituído por 28 poemas, O Útero da Casa demonstra
desde o início a força poética de uma autora comprometida com si mesmo e
seu país de origem. Através de “lugares metonímicos”, no dizer da
crítica literária portuguesa Inocência Mata (prefaciadora da obra),
Conceição Lima deslumbra o seu leitor ao construir e reconstruir os seus
lugares de afetividade; o seu país, rico em simbolismos e lutas, a
partir de um “eu feminino”, em que a casa ganha uma dimensão de amargura
e rememoração -Excerto de Conceição Lima e a linguagem-morada
"No
livro A dolorosa raiz do micondó, Conceição Lima, poetisa de São Tomé,
reconstitui espaços, paisagens da intimidade e histórico-sociais por
meio da representação lírica de sua memória. O quintal da infância, a
árvore do micondó, dentre outros elementos espaciais e paisagísticos,
ganham contornos simbólicos nessas rememorações, que se espraiam ainda
na lembrança de tempos dolorosos vivenciados em seu país"
SÓYA
Há-de nascer de novo o micondó —
belo, imperfeito, no centro do quintal.
À meia-noite, quando as bruxas
povoarem okás milenários
e o kukuku piar pela última vez
na junção dos caminhos.
Sobre as cinzas, contra o vento
bailarão ao amanhecer
ervas e fetos e uma flor de sangue.
Rebentos de milho hão-de nutrir
as gengivas dos velhos
e não mais sonharão as crianças
com gatos pretos e águas turvas
porque a força do marapião
terá voltado para confrontar o mal.
Lianas abraçarão na curva do rio
a insónia dos mortos
quando a primeira mulher
lavar as tranças no leito ressuscitado.
Reabitaremos a casa, nossa intacta morada.
In . A Dolorosa Raíz do Mincondó - 2006
Olinda Beja
Há-de nascer de novo o micondó —
belo, imperfeito, no centro do quintal.
À meia-noite, quando as bruxas
povoarem okás milenários
e o kukuku piar pela última vez
na junção dos caminhos.
Sobre as cinzas, contra o vento
bailarão ao amanhecer
ervas e fetos e uma flor de sangue.
Rebentos de milho hão-de nutrir
as gengivas dos velhos
e não mais sonharão as crianças
com gatos pretos e águas turvas
porque a força do marapião
terá voltado para confrontar o mal.
Lianas abraçarão na curva do rio
a insónia dos mortos
quando a primeira mulher
lavar as tranças no leito ressuscitado.
Reabitaremos a casa, nossa intacta morada.
In . A Dolorosa Raíz do Mincondó - 2006
ONDINA BEJA, HÁ DOIS ANOS, NO DIA 1º DE MAIO DE 2015 -
Olinda
Beja é, sem dúvida alguma, uma das mais espantosas musas do firmamento
poético de São Tomé e Príncipe, nascida lá nas bandas do meio do mundo,
onde se avista o cruzeiro do Sul – Toda a sua poesia é como que a expressão genuína das raízes da maravilhosa e luxuriante Ilha que a viu nascer. Do mar, da terra e dos seus frutos e flores - sabores e perfumes. Ela é tudo isso! A expressão poética das
Ilhas e das suas gentes. Com a genial e rara inspiração de dizer os
seus poemas, com a mesma musicalidade calorosa da voz do seu povo e,
simultaneamente, nos revelar a beleza envolvente de um verdadeiro
paraíso terreal - Naturalmente,
com os seus espantos, cores, alegrias, ansiedades e sofrimentos – E,
estes, muitos foram ao longo de séculos. Por isso mesmo, é das raras
poetas que tem o condão de dizer o que escreve, tal como o sentiu no
instante da sua criação: não só recita, declama mas canta! – Não sei se
haverá, entre os poetas da língua portuguesa, pessoa capaz de nos
proporcionar momentos de tão rara e intensa beleza poética e deslumbrante sensibilidade interpretativa, como são os oferecidos por Olinda Beja.
É
o que se pode dizer um espetáculo musical e poético, ao vivo, que não
cansa, não enfada, contrariamente a muitas destas sessões. Pois é das tais récitas poéticas, que prende e emudece de encanto a assistência, arrebata e faz levantar em apoteóticos aplausos, quem a ouve. – Sim, porque, a par dos seus extraordinários dotes poéticos e artísticos, também costuma fazer-se acompanhar de um outro talento musical – De Filipe
Santo, que, dedilhando, artisticamente, os melhores sons do africanismo
sãotomense, lhe empresta ainda mais redobrado sentimento e fulgor.
Olinda
Beja, autora de 16 livros de poesia e
ficção, distinguida pelo Prémio Literário Francisco José Tenreiro, atribuído a
obra " A Sombra do Ocá, tem sido
uma autêntica embaixatriz da divulgação
da lusofonia, da cultura das Ilhas de s. Tomé e Príncipe e de Portugal,
deslocando-se, frequentemente, a estabelecimentos de ensino do universo
lusófono, dando a conhecer as ilhas do
cacau e fazendo aproximação dos dois povos através da riqueza cultural
que une os dois povos.
Alda Graça do Espírito Santo - "Um
marco indelével na sua vida de escritora, que teve uma influencia enorme na sua
poesia: tanto poético, humano, social - "Foi uma mulher extraordinária na minha vida" - Reconhece Olinda Beja
r
Numa
amável entrevista que me concedeu, em Julho de 2013, por o ocasião da
Feira dos livros do Instituto Português do Desporto e Juventude, em
Lisboa, referiu que gostaria que
o seu país não precisasse de estender a mão às organizações
internacionais, porque, se for bem gerido, bem estruturado, tem tudo! "Além
de um Povo Maravilhoso, que é a riqueza do pais, é o Povo: não é o
petróleo: é um Povo Pacifico, que quando se conhece, dá tudo por tudo
por si. É um Povo que nunca fecha a porta a ninguém"
Se é verdade
que ser-se poeta é um dom, dado por divinas inspirações, não menos verdade é
que são as vidas , os acasos, os lugares onde se nasce ou por onde se passa que
determinam a condição de um poeta. Se, Luís de Camões, não tivesse andado
embarcado pelos mares do Atlântico ao Índico, não tinha escrito os Lusíadas,
mesmo que escrevesse uns versos, dificilmente o consagrariam para a
posteridade. O mesmo teria sucedido a Fernando Pessoa, senão tivesse percorrido
o atlântico de Lisboa a Pretória e depois regressado. Jamais a sua alma teria
sido iluminada por tanta força poética e por tanto mar.
Olinda Beja,
à semelhança de Almada Negreiros, nasceu em S. Tomé, na Vila de Guadalupe em 1946, filha de mãe santomense e pai natural da
Beira Ata, tendo partido para Portugal, com apenas dois anos de idade.
Se não se tivesse dado esse curioso ou profético acaso, talvez não fosse a
poeta que é hoje, sim, se lá tivesse ficado - Por um lado, porque, as imagens
de criança, são marcantes para toda a vida, por outro, porque, ao sentir que
perdia o elo
à sua terra de origem, houve como que o apelo intrínseco, instintivo,
a essas mesmas raízes, aparentemente perdidas. Que, de resto,
Olinda, ao longo da sua vida, tem procurado reforçar, através de várias
viagens a essas suas ilhas amadas. Lendo poetas e escritores da sua terra
natal, convivendo com as suas gentes, com a sua cultura e a sua luxuriante
paisagem. Não foi o caso de José Almada Negreiros, que nunca lá
regressou. Mesmo assim, que influência!... Mas, olhando para aquele
rosto, sorridente, expressivo, onde os traços da mestiçagem, da miscigenação
africana, não escondem a sua origem, vê-se, logo num primeiro
contato, nas primeiras palavras, que o seu coração fala a linguagem dos
trópicos. Das pátrias irmãs, unidas pela mesma língua e história,
pertencendo ambas à mesma comunidade da CPLP. - E, de que, Olinda se
orgulha, e tem sido a militante apaixonada.
Sim, Olinda Beja, embora, bem cedo deixasse o clima quente e húmido do
equador, passando a viver nas terras frias da Beira Alta (em cujos horizontes e
espaços rurais, já se inspirou para escrever alguns dos seus mais belos poemas
e livros de ficção, como seja " A Casa do Pastor") não tardou a que,
um dia, respondesse ao mágico canto do Ossobó. Aqueles sons que teria
ouvido em menina. Quando o seu pai e a sua mãe negra, viviam lá pelo interior
da roça - Sons inconfundíveis das lindas aves do paraíso que povoam as
florestas que ensombravam e cobriam as plantações dos cacaueiros.
"Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas (Português/Francês)
pela Universidade do Porto, Olinda Beja é docente do Ensino Secundário desde
1976. Ensina também Língua e Cultura Portuguesa na Suíça, é assessora cultural
da Embaixada de São Tomé e Príncipe e dinamizadora cultural. Publicou os livros
de poemas 'Bô Tendê?', 'Leve, Leve', 'No País do Tchiloli', 'Quebra-Mar' e
'Água Crioula', os romances 'A Pedra de Villa Nova', '!5 Dias de Regresso' e 'A
Ilha de Izunari' e ainda livros de contos.
QUEM
SOMOS?
O mar chama
por nós, somos ilhéus!
Trazemos
nas mãos sal e espuma
cantamos
nas canoas
dançamos na
bruma
somos
pescadores-marinheiros
de marés
vivas onde se escondeu
a nossa
alma ignota
o nosso
povo ilhéu
a nossa
ilha balouça ao sabor das vagas
e traz a
espraiar-se no areal da História
a voz do
gandu
na nossa
memória...
Somos a
mestiçagem de um deus que quis mostrar
ao universo
a nossa cor tisnada
resistimos
à voragem do tempo
aos apelos
do nada
continuaremos
a plantar café cacau
e a comer
por gosto fruta-pão
filhos do
sol e do mato
arrancados
à dor da escravidão
Olinda Beja
Alda Graça do Espírito Santo
Nasceu a 30 de abril de
1936 , na cidade de São Tomé, capital do Arquipélago de São Tomé e
Príncipe, Alda Neves da Graça do Espírito Santo. Filha de uma professora
primária e de um funcionário dos Correios, ainda nova faz seus
primeiros estudos em São Tomé. 1940: Em
meados de 1940, muda-se com a família para o norte de Portugal, anos
depois a família muda-se para Lisboa onde Alda inicia seus estudos
universitários. 1950: No
início dessa década, morando em Lisboa com a família, Alda Espírito
Santo faz contato com alguns dos importantes escritores e intelectuais
que viriam a ser os futuros dirigentes dos movimentos de independência
das colônias portuguesas de África, como Amílcar Cabral, Mário Pinto de
Andrade, Agostinho Neto, Francisco José Tenreiro, entre outros. A casa
de sua família, no número 37 da Rua Actor Vale, funciona como local de
encontros do CEA (Centro de Estudos Africanos). Os encontros regulares
na casa de Alda promoviam palestras sobre temas diversos como
Linguística, História e também sobre a consciência cultural e política
acerca do colonialismo, do assimilacionismo e da defesa do colonizado.
Excerto de Vidas Lusófonas - Alda Espirito Santo
Combatente
da luta pela independência nacional, poetisa, considerada expoente
máximo do nacionalismo são-tomense, pós independência. Alda Graça,
morreu em Angola para onde foi evacuada desde a última semana por razões
de saúde. Morreu na terra dos seus compatriotas de luta pela
independência nacional, como Mário Pinto de Andrade. Um dos nomes de
Angola que Alda Graça muitas vezes citou nas suas intervenções públicas.
– Excerto deAlda Graça do Espírito Santo
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