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terça-feira, 4 de junho de 2019

"HÁ VIDA DEPOIS DA MORTE?! - PARA A ESCRITORA AGUSTINA BESSA LUIS É APENAS A VIDA FISICA QUE SE PERDE – “EU ACHO QUE AS PESSOAS, VERDADEIRAMENTE SAUDÁVEIS, ACABAM MAS NÃO MORREM” – Confessou-me numa interessante e honrosa entrevista que me concedeu ainda muito longe dos 96 da sua partida para o mundo onde o seu espírito “gostava de ficar a vaguear e a meter-se com as pessoas!”


 Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador

“Acredito num poder!... Num espírito verdadeiramente misericordioso” …     “Acha que o tal espírito não fica por aí a vaguear?” 
“Eu gostava de ficar! Tenho uma costela inglesa!... Eu gostava de ficar com o espírito a vaguear e a meter-se com as pessoas! (risos de ambos)  Palavras de um  dos maiores nomes da Literatura portuguesa, que ontem  foi chamada por Deus ou respondendo ao irrecusável apelo da chamada inteligência universal para vaguear ou evoluir por outras paragens terrestres ou cósmicas  


Maria Agustina Ferreira Teixeira Bessa nasceu a 15 de outubro de 1922 em Vila Meã, no município de Amarante. Faleceu, ontem, dia 3 de Junho, em sua casa, na cidade do Porto – A importância da sua obra, que se estendeu por vários géneros literários,  tornou-a num dos nomes mais prestigiados e incontornáveis da língua portuguesa . Em sua memória foi decretado luto Nacional -  O velório da autora vai decorrer na manhã de hoje, na Sé Catedral do Porto, a partir das 10h30De acordo com a informação disponibilizada pelo Círculo Literário Agustina Bessa-Luís, será também aí que, pelas 16h, serão celebradas as Exéquias Solenes, presididas por D. Manuel Linda, Bispo do Porto. Agustina será depois sepultada no cemitério do Peso da Régua, apenas na presença da família. 



Vídeo sonorizado, na parte final, com um fado cantado pela escritora e poeta, Agripina Costa Marques, esposa do falecido poeta António Ramos Rosa

NÃO NASCEU NO PORTO MAS FOI  NESTA CIDADE  QUE VIVEU A MAIOR PARTE DO TEMPO DA SUA VIDA


JTM – Agustina Bessa Luís: a morte não a preocupa?... É uma questão sobre a qual não se interroga?

ABL  - Não! Não me interrogo nem me preocupa!

Eu acho que as pessoas, verdadeiramente saudáveis!... Acabam!  Não morrem!” – Palavras  extraídas de uma interessante entrevista que a escritora me concedeu, em meados dos anos 80, no hall do Hotel S. Jorge, onde costumava hospedar-se quando vinha a Lisboa e  que agora fui recolher do meu vasto arquivo de repórter da extinta RDP-Rádio Comercial.



JTM- Acredita na vida para além da morte?

ABL – É uma pergunta fácil de fazer e difícil de responder: porque, como é que eu vou dizer?... Que há novas formas de vida! E que nós somos uma espécie de  fotocópias! Que se vão multiplicando pela eternidade fora?!

É um bocado ridículo responder a  uma coisas dessas: recuso-me. Não sei!

Se tivéssemos palavras  para responder a isso?!.. É possível! Mas eu não vou pôr palavras para responder a isso

JTM – Agustina Bessa Luís: a morte não a preocupa?... É uma questão sobre a qual não se interroga?



ABL  - Não! Não me interrogo nem me preocupa!

Eu acho que as pessoas, verdadeiramente saudáveis!... Acabam!  Não morrem!

JTM – Conceitos de Inferno, Paraíso e Purgatório: que são para si?

ABL  - Não tenho esses conceitos nem preconceitos. (….) Acredito num poder!... Num espírito verdadeiramente misericordioso…  Que nos   faça compreender… Como quê?!

JTM – Como uma ficção?...

ABL – Não! Não é uma ficção!... Eu compreendo o que é literário mas não se pode transmitir!

JTM – O Inferno é este! Em que vivemos!

ABL – O fazer da vida num inferno, diz-se que são os outros! Mas não é: também não acho!...

Nós temos em nós essa dualidade do Inferno e do Paraíso!...

JTM – Depois de morrermos, acabou-se?... Acha que o tal espírito não fica por aí a vaguear?!...

ABL – Não!... Eu acho que… Eu gostava de ficar! Tenho uma costela inglesa!... Eu gostava de ficar a vaguear e a meter-se com as pessoas! (risos de ambos)

JTM – Mas não acredita que isso possa acontecer?!..

ABL – Seria bom demais! (rindo)

Por enquanto estou viva! (rindo) Porque não tenho a certeza do que possa fazer depois de morta!...


JTM – Há quem diga que é bom termos essa fé!...  Agustina não necessita dessa fé?! De admitir essa probabilidade?!

ABL – Não! Não necessito!... Não é para mim primordial!

JTM – Bom, esta última pergunta: fala-se no fim do mundo! Numa hecatombe!  Que venha pôr termo à humanidade!... O que é que acha?...

ABL – Acho que há muitas probabilidades! Mas… lembro-me de um filme e, de uma vez que o vi,  em que uma personagem dizia: há sempre uma terceira probabilidade, entre o possível e o impossível!... Há sempre uma terceira probabilidade!

JTM – Estaremos longe dela?

ABL – Justamente por que é uma terceira probabilidade não sabemos como ela é… Eu não sei… Ultrapassa-nos!... (…)

JTM – Não devemos, portanto, pensar muito nisso?

ABL – Não digo que não: cada um dispensa as suas atenções, conforme a sua natureza o orienta!..


BIOGRAFIA Agustina estava afastada da vida pública há vários anos por motivos de doença  - Mas grande parte da sua vida foi  passada a escrever. Dos romances aos escritos mais breves, Agustina domina a palavra com a mestria que caracteriza os génios da literatura. Escritora, ensaísta, articulista e jornalista, o seu estilo surpreende e provoca.

O cenário de infância é rural, no norte, ao correr do rio Douro. Agustina, nascida em Vila Meã em 1922, contém em si a força dessa terra, feita de instinto, sabedoria e de uma certa crueldade com que vai tecer os enredos da abundante bibliografia. Escreve sobre a condição da mulher, a natureza humana, o bem e o mal. O encontro com os livros e com as leituras acontece cedo, na biblioteca do avô materno. Começa a escrever a partir de estampas que recorta e, aos 12 anos, as suas histórias fazem dela a heroína da turma.

A escrita passa a ser uma obsessão. Agustina confessa que escreve  rapidamente e quase sem emendas. Publica o primeiro romance, “Mundo Fechado”, em 1948, com 26 anos de idade. Seis anos depois aparece “A Sibila”, romance que a consagra e que conquista presença nos currículos escolares. Algumas das suas histórias, como”Fanny Owen” ou a obra-prima “Vale Abraão”, foram adaptadas ao cinema por Manoel de Oliveira, o decano dos cineastas portugueses.

Prosadora de qualidades reconhecidas e amplamente premiadas, a vencedora do Prémio Camões em 2004 é considerada a herdeira de Camilo Castelo Branco. As histórias que faz são parecidas com a vida, desconexas e filosóficas. Observadora atenta da sociedade portuguesa, recorre a uma ironia sofisticada e impiedosa para criticar o mundo fechado da aristocracia nortenha.

Romances, contos, peças de teatro, biografias, ensaios. A obra é extensa, com mais de 40 títulos publicados. Agustina cultiva também outros palcos: foi mandatária da candidatura de Freitas do Amaral nas eleições presidenciais de 1986, diretora do jornal Primeiro de Janeiro e diretora do Teatro Nacional D. Maria II.  Em 2008,  a autora duriense sofreu um AVC e está impossibilitada de sair de casa. Longe dos livros que já não escreve, nem lê. http://ensina.rtp.pt/artigo/no-universo-de-agustina/







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