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segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Batepá – 03-02-1953 - São Tomé recorda hoje os seus mortos caídos no atoleiro do campo de concentração de Fernão Dias – Presidente Marcelo esteve no local, há dois anos - Mas o fascismo também fez vitimas na “Metrópole” - Três anos depois, a 10 de Julho de de 1956, a pequena aldeia do Colmeal, terra do meu bisavô paterno, é varrida com violenta repressão: habitantes expulsos, casas queimadas e um penoso saldo de várias mortes

Jorge Trabulo Marques - Jornalista 
Antes do 25 de Abril, pouco mais poderia expressar que uma grande dor reprimida mas não esquecida

















Foi precisamente há 67 anos mas a lembrança  desses ignóbeis acontecimentos permanece ainda bem viva na memória dos escassos sobreviventes, mas não esquecida na memória coletiva de um Povo, que hoje recorda, com a já tradicional  "Marcha da Liberdade", com partida às sete da manhã, da Praça da Independência, as largas centenas de mortos que barbaramente foram espancados no Campo de Concentração de Fernão Dias.

Um local pantanoso, infestado de mosquitos, embora a escassos metros da praia, onde muitos presos, ou  eram imediatamente acorrentados e lançados ao mar ou, ainda sob o peso de fortes grilhetas,  obrigados a carregar pesadas tinas de água ou grandes blocos de pedra, por forma a que o seu extermínio ainda fosse mais doloroso, porque física e psicologicamente mais sórdido e lento, quando não sufocados pelo terreno movediço da lama para onde também eram atirados ou mortos vivos em valas abertas pelos próprios prisioneiros, que eram obrigados a cavar a sepultura, sob as prepotências e as arbitrariedades de um contratado  de  angola, um tal Zé Mulato, um inqualificável verdugo que  que as autoridades foram buscar à cadeia,  onde  cumpria pena de assassínio, para chefiar o dito campo de morte. 


Portugal “assume a responsabilidade” pelo massacre de Batepá – Palavras de Marcelo Rebelo de Sousa, há dois anos, na visita que fez ao Memorial dos Heróis da Liberdade, caídos à mão de um governador português há 65 anos aqui em Fernão Dias: com estas palavras, depois de depositar uma coroa  de flores:“Vim aqui homenagear todos aqueles que lutaram pela liberdade e em particular todos os que morreram pela liberdade faz agora precisamente 65 anos


EM PORTUGAL - NUMA REMOTA ALDEIA - TAMBÉM HOUVE OUTRO MASSACRE


Claro que não se pode dizer que, em 1953, os tempos também fossem bons para os portugueses que viviam na “metrópole do império colonial”, muito pelo contrário: eram tempos de repressão, de fome e de miséria – Nas escolas as crianças eram reprimidas à  chibatada  e  com reguadas de deixar as mãos arder e ensanguentadas - 

 E quem poderá esquecer o massacre de a pequena aldeia do colmeal,  onde nasceu o meu bisavô paterno, varrida por ação de um processo judicial, injusto e prepotente, no dia 10 de Junho de 1957, com os seus habitantes despejados à força, com  desfecho trágico de casas queimadas e algumas mortes por balas da GNR- a guarda pretoriana do regime colonial-fascista -, é  também outra das páginas negras da História da Lusitânia moderna – Ver pormenores em http://www.vida-e-tempos.com/2019/09/colmeal-romagem-espiritual-silenciada-e.html


A MÁGOA QUE DIFICILMENTE SERÁ APAGADA DA MEMÓRIA DOS SOBREVIVENTES

Em 1974, entrevistei algumas das vítimas para a revista Semana Ilustrada, de Luanda, duas dos quais em Fernão Dias, no local do famigerado campo de Concentração e outro santomense, ainda  com feridas por sarar numa das pernas, com que foi acorrentada - - Trabalhos jornalísticos esses que me haveriam de custar graves dissabores, violentas reações por parte, de alguns colonos. que me furaram os pneus do meu carro à navalhada, penduraram uma forca na porta de minha casa e me agrediram selvaticamente


BARTOLOMEU CRAVIDE - 20 ANOS DEPOIS AINDA TINHA FERIDAS DAS GRELAS NAS PERNAS E POR SARAR 

"Prenderam-me durante 45 dias. Houve a ideia de arranjar mão-de-obra gratuita. E daí surgiram as prisões, mais prisões sem quaisquer razões para isso. Procurava-se emprego e não se encontrava. No entanto, as rusgas sucediam-se e as pessoas que encontravam eram presas. É claro que houve um ou outro que reagiu sobre essas atitudes."

Pouco depois do 25 de Abril, vi com os meus próprios olhos  essas feridas -  Ainda em chagas vivas por sarar! ... Provocadas por longo cativeiro, no campo de concentração de Fernão Dias, acorrentados a bolas de ferro, tal como aos escravos nos barcos negreiros. Pude entrevistar algumas dessas pessoas para a Revista Semana Ilustrada.



Vi também  a fotografia da famosa cadeira onde os presos eram algemados, submetidos a ignóbeis espancamentos e torturas,  até sujeitos a choques elétricos para os obrigarem a confessar e assinar declarações de factos forjados para os incriminarem o seu envolvimento numa revolta que pretenderia matar o governador e os colonos e aproveitarem-se das suas mulheres  - Mais tarde  a PIDE, enviada   por Salazar, iria negar a existência da conspiração, que depois de ter sido rotulada de comunista, passar a ser provocada por elementos desafetos ao regime .

Escasseava a  mão de obra barata..E o governador planeava construir grandes edifícios à custa do trabalho forçado nas ilhas e  mandou o ajudante de campo armado em soldado nazi a comandar um grupo de milícias para  ordenar o trabalho obrigatório.. Num verdadeiro retorno aos primórdios do ignóbil e duro esclavagismo, até que,  numa remota aldeia perdida no mato,  algures pela Vila da Trindade, alguém se encheu de coragem e reagiu sobre o fogoso e arrogante alferes, que teve a reação popular que merecia  e à altura da leviandade e do desprezo como olhava a  população  e impunha  a sua vontade .

VISITA AO LOCAL DOS TRÁGICOS ACONTECIMENTOS – EM 1974 – 20  ANOS DEPOIS  - TENDO COMO GUIA DOIS SOBREVIVENTES: Manuel dos Ramos e Manuel Carmona


Este o excerto do relato – “O local fica perto da. sede da de pendência Fernão Dias, à Roça Rio do Ouro, à frente de um' mar azul  imenso, bordado de viçosos coqueiros e de um capim que cresce exuberantemente  e, por entre vestígios e recortes de antigas construções, em tempos utilizados para servir a ponte de cais acostável para  os- barcos de longo curso que ali atracam  (...) 
Lá se encontravam ainda, junto à praia conforme nos disse, os dois ta marinheiros onde diariamente eram estendidos os cadáveres e dali transportados, por uma camioneta, para uma vala comum, no cemitério da cidade. 

Mostrou-nos, igualmente, o sítio onde ele também esteve estendido no chão duro, cercado então por arame farpado, e onde ficavam a aguardar o momento do interrogatório ou da pena capital.


Acompanhou-nos ao lugar, onde ficava a casa que o chefe da brigada do campo de concentração e de trabalhos Forçados utilizava para pro ceder às torturas, aos interrogatório e  julgamento das inúmeras pessoas que para ali iam presas. 

Por último, trouxe-nos ao lugar onde os presos partiam brita para construção de uma pista para o aeroporto que a partir de ali se pretendia iniciar e apontou-nos o pântano onde eram também forçados a trabalhar. Na berma do mesmo, encontramos ainda uma argola de uma corrente de ferro, com que eram amarrados. Mata ali e vai pôr junto desses tamarinos e tapa com  chapa”.concentração e de trabalhos Forçados utilizava para pro ceder às torturas, aos interrogatório e  julgamento das inúmeras pessoas que para ali iam presas. 

Tudo isto lhe ouvimos de viva voz com palavras de emoção e tristeza , ao  recordar aqueles horrendos episódios  de que foi vitima e assistiu - Pormenores das duas entrevistas neste site em http://www.odisseiasnosmares.com/2015/02/s-tome-e-principe-memorias-do-batepa-5.html

 A  MÁRTIR POVOAÇÃO DE BATEPÁ

É hoje uma pequena vila, porém, há 62 nos, era apenas um conjunto de algumas modestas casas de madeira –  Mas foi justamente aí, pelo facto dos santomenses se haverem recusado  a trabalharem à força, como escravos,  nas obras públicas e nas plantações do Cacau e do Café das grandes roças, que começaria uma das páginas mais negras da história da colonização portuguesa neste arquipélago – Mas também, por outro lado, a lembrança de um período que haveria de ser marcado pelas mais nobres e corajosas provas de resistência ao repressivo domínio esclavagista. 

 SOBREVIVENTE - A DOR QUE O TEMPO AINDA NÃO APAGOU - ESPANCADA À CRONHADA DEPOIS DE LHE METEREM A CABEÇA NUM TANQUE DE  ÁGUA - Era menina e estava grávida.




Maria dos Santos, mais conhecida por Mena  - Ainda  jovem, e  mesmo grávida, não foi poupada à brutalidade facínora das ordens do então Governador Carlos Gorgulho: arrastada à força de sua casa, levada para um calabouço na então Vila de Trindade, espancada barbaramente, Primeiro deu-se o saque às casas: carregaram o que puderam dos modestos teres e haveres, após o que as incendiaram.


Imagens e palavras de um abominável massacre. O pai de Teresa, esposo de Maria dos Santos, , também vitima da mesma barbárie, depois de lhe terem queimado a casa e o carro (que saquearam antes de a incendiarem) ainda procurou refúgio no mato mas foi apanhado, preso e enviado para o Campo de Concentração de Fernão, onde acabaria por embarcar, com mais 120 homens para serem lançados ao mar, no barco António Carlos. Tal porém não sucederia por  a tripulação do navio se ter oposto, tal como vim  a saber através de outro depoimento, que obrigaram o comandante a deixar os prisioneiros na Ilha do Príncipe, onde acabariam por ficar presos   – 

Um desses  valorosos homens era o cabo-verdiano, Bernardino Lopes Monteiro, pai  do Coronel Victor Monteiro Dias,  que foi  chefe do Gabinete do Presidente Fradique Menezes e de Manuel Pinto da Costa, a  cujo episódio, já me referi  neste site.  ...http://www.odisseiasnosmares.com/2019/02/sao-tome-decorre-hoje-comemoracao-do-3.html

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