Jorge Trabulo Marques - Jornalista
A
Plataforma Cafulka, tem desenvolvido
variadíssimas acções criativas,
sendo justamente considerada como que um autêntico laboratório para as suas
pesquisas socio-artisticas, com vista a gerar um
movimento artístico capaz de influenciar transversalmente todas as disciplinas
criativas santomenses e do universo lusófono em Portugal.
Hoje recordamos-lhe, além de uma breve entrevista que nos concedeu,
em Junho passado, aquando da inauguração, no Parque dos Poetas em Oeiras, do conjunto escultrórico do seu compatriota,
Zémé, dedicado à poetiza Espírito Santo (1926-2010), bem como algumas imagens
que registamos de uma exposição coletiva na Galeria de Arte do Casino Estoril,
em Outubro de 2013, assim como outros
aspectos da sua atividade artística
Ismael Sequeira nasceu em
Conceição – São Tomé, aos 20 de Julho de 1969. Estudou Artes Plásticas e
Escultura na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Mas desde cedo
descobriu a sua veia artística, influenciado pela leitura precoce, aos quatro
anos, por sua avó materna, Hilária d’Almeida (Lilí)”, que lhe desenvolveria o gosto em
modelar e construir objetos a partir da reciclagem de materiais.
Começou a pintar desde muito novo, tendo participado numa
exposição comemorativa do aniversário da independência do país, com 13 anos
apenas Em 1982 conheceu Protásio Pina e Cesaltino da Fonseca, expoentes máximos
das artes plásticas em São Tomé e Príncipe na época, que dirigiam o sector de produção
de cerâmica na olaria de Almerim, onde aprendeu a trabalhar barro e cerâmica.
Influenciado por Protásio, começou a pintar a óleo. Mais tarde, trabalhou com
mestres coreanos em pintura de cenários e montagem de quadros humanos para
espectáculos e jogos de ar livre.
Vive em Portugal, há mais de uma década, para onde se deslocou graças a uma bolsa de
estudos para estudar Pintura— Aqui se formou Estudou Artes Plásticas e
Escultura na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. E aqui também
casou e constituiu família, regressando a S. Tomé, sempre que lhe é possível mas o seu grande sonho é voltar
a viver na sua linda ilha. “Por isso,
não perdi contacto com ela e com as pessoas e sistematicamente vou criando
iniciativas e pretextos de colaboração profissional para lá ir- Declarou numa
entrevista, em Nov de 2016, ao STPDigital, da qual tomámos a liberdade de
transcrever alguns excertos.
“Quando penso em São Tomé e Príncipe o que penso, primeiramente, é na sua exuberante beleza natural com enormes potencialidades a serem exploradas e de tornar-se um território de esperança de boa qualidade de vida para a sua população residente. Penso a seguir na miséria espiritual da classe dominante, num país desorganizado e na pobreza do povo insular que sonha com uma nação digna".
“Quando penso em São Tomé e Príncipe o que penso, primeiramente, é na sua exuberante beleza natural com enormes potencialidades a serem exploradas e de tornar-se um território de esperança de boa qualidade de vida para a sua população residente. Penso a seguir na miséria espiritual da classe dominante, num país desorganizado e na pobreza do povo insular que sonha com uma nação digna".
ISMAEL
SEQUEIRA - CERAMISTA E PINTOR - PREDOMINÂNCIA DOS AMARELOS E RUBROS
SOLARES NOS SEUS QUADROS - TALVEZ PELO FACTO DA SUA ILHA SER
DEMASIADO MARCADA PELOS VERDES? - LÁ O CREPÚSCULO É RÁPIDO MAS DEIXA TONALIDADES QUE INCENDEIAM E PACIFICAM A ALMA - SERÁ ESTA A SUA INFLUÊNCIA?
"Cores, cores e
mais cores"
(...) Ismael
utiliza cores muito vivas nas suas obras. Perguntamos-lhe o motivo: “É verdade
que utilizo muito nas minhas pinturas cores vivas, mas gosto sobretudo de fazer
altos contrastes. Mesmo quando utilizo cores frias. Através das cores manifesto
o meu estado de espírito e a psicologia das cores aponta caminhos para bem
interpretá-las.” Observar a natureza ou o meio social no universo urbano em que
vive, influenciam muito a sua escolha de cores da ideia que pretende comunicar.
Nas suas obras, muitas vezes, as cores sobrepõem-se às formas. A utilização de
cores vivas servem para comunicar com maior realce a intencionalidade das suas
ideias.
(...) Quando
pensa em São Tomé e Príncipe o que lhe vem a cabeça?
Ismael
vive a paternidade com muita preocupação. “Vivemos num mundo de muitas
incertezas. Insisto que os nossos filhos devam estudar e se qualificar o melhor
possível para que possam ter várias opções profissionais no mercado de
trabalho. Gostaria que o mundo para os nossos filhos fosse de maior estabilidade,
maior segurança e de melhor dignidade humana. Um mundo em que se pudesse
conviver sem grandes contrastes sociais e com maior solidariedade entre as
pessoas.”
O
artista disse ao STPDigital que não pode ficar indiferente a falta de
sensibilidade do Estado Sãotomense em apoiar a nossa cultura como um pilar
estrutural para o desenvolvimento humano, económico e social do país. “Há
pessoas interessantes preocupadas com as questões culturais, mas sem influência
política não podem fazer nada numa terra onde tudo só funciona na auto-estrada
política”. Ismael criticou, igualmente, todos os outros agentes socioculturais
que nada fazem para alterarem este ciclo e falou na necessidade de uma
revolução cultural. “A Revolução Cultural faz-se sem dinheiro. Faz-se com a
consciência da necessidade de mudar tudo o que está mal apelando aos bons
valores sociais vitais para o bem colectivo”. Ismael acredita que através da
arte e da cultura, os agentes desta especialidade podem exercer influências
positivas capazes de transformar o país. “As artes plásticas deram este sinal e
que vem crescendo há quase trinta anos. E podemos ir mais longe se tivermos
visão e maior ambição. Temos mais artistas no activo desde a Independência
Nacional, temos uma Bienal de Arte e Cultura, que ajuda a projectar a qualidade
das nossas artes, temos um pequeno movimento artístico-cultural fora do país
que dimensiona o melhor que São Tomé e Príncipe tem neste domínio”, acrescentou
o artista.
Arte para todos vs “Arte Elitista”
Como artista que é, Ismael admitiu que, infelizmente,
a arte é elitista. “Mas é verdade que no nosso quotidiano somos confrontados
com diversos objectos de arte e vivemos paralelamente com soluções criativas
interessantes. A arte pode ser para todos. A arte pública é uma solução para
oferecer ao público a fruição da criação artística através da escultura,
instalação, arte urbana, performance, espectáculos de música e dança na rua,
fotografia vitrinismo, videomaping, arquitectura, etc.” O artista frisou o
papel das galerias e museus, que podem oferecer entrada gratuita uma vez por
semana para que o público se interesse mais pela arte. “Para que a arte chegue
mais facilmente a maioria das pessoas há que se investir mais nela. Há que se
investir muito mais na cultura não só como entretenimento mas como veículo de
comunicação e formação do sujeito humano.”
Dá-nos como exemplo, o Projecto URB da Plataforma
CAFUKA, que desenvolve projectos efémeros de arte pública com o objectivo de
levar a arte ao público comum com mais facilidade. Em 2011, o projecto foi
experimentado em São Tomé. Ismael cita também a CACAU como outro exemplo de
investimento cultural que merece toda a atenção nacional por oferecer uma
produção de bens artísticos e culturais grátis à população em geral, incluindo
a formação em algumas áreas artísticas. “Tem aparecido igualmente alguns apoios
isolados de individualidades e mecenas do país que o devem continuar a fazer”.
O artista sãotomense disse ainda que o apoio do Centro Cultural Português, da
Aliance Française de São Tomé e Príncipe e, mais recentemente, do Cento
Cultural Brasileiro tem sido um contributo importante na melhoria da produção e
difusão dos valores culturais nacionais para que a arte chegue com maior
regularidade às pessoas. “E penso que elas devem estar atentas a todas estas
ofertas”.
A Cultura Nacional
Para Ismael, o estado investiu mais e melhor na arte e
na cultura nos anos 80. “A arte em si continua a cumprir o seu papel de
condicionar no observador a reflexão das principais temáticas propostas de que
a sociedade vive. O estímulo a produção artística e cultural é feito também dos
contextos em que a própria sociedade vive. O ambiente fértil para a crítica,
para reflexão e produção artística é o de crise, sistemas fechados e grandes
acontecimentos. Estes estimulam a criatividade. Abre espaço para a encenação
teatral, em que a literatura, a pintura, a escultura e a música também procuram
protagonismo para se afirmar como veículo de comunicação”. O artista disse que
a cultura sãotomense fora do país tem alcançado espaço, principalmente em
Portugal, enquanto no próprio país tem se mantido estável. “Em Lisboa, a
vivência de algumas tradições religiosas e festas regionais cresceram, a
afirmação da identidade através dos trajes femininos e hábitos alimentares melhoraram,
as artes plásticas e a literatura tem ganho maior protagonismo, surgiram três
bandas musicais de matiz musical sãotomense. Isto tem um significado e merece a
nossa maior atenção.”
Mas, segundo Ismael, apesar de estável, o estado da
cultura não está bem. “Necessita de urgente investimento. Investimento nos
quadros humanos especializados, em infraestruturas, na conservação e
preservação do património cultural tangível e intangível, na criação de
organismos especializados na gestão de bens culturais, criação de equipa e
projectos de investigação de bens culturais, paisagísticos e geológicos, etc.”
Ismael destacou também a necessidade urgente de cuidados que as roças
necessitam para se reerguerem como organização económica e cultural.
Para o artista, a cultura nacional necessita de uma
dinâmica que trace novas orientações para que os valores da nossa memória
colectiva resistam no tempo e que as futuras gerações deles se beneficiem. Entrevistado
por Katya Aragão – Todos os pormenores em https://stpdigital.net/2016/11/09/ismael-sequeira-a-revolucao-cultural-faz-se-sem-dinheiro/
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