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segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Nas Ilhas Verdes do Equador - O Mercado Municipal de S. Tomé era um poema colorido, diversificado e vivo - - Era assim: "lá dentro ou cá fora, nas entradas e ao lado é tudo a olhómetro: não há medidas de peso, litro, decalitro, decilitro ou decalómetro. -Não há balanças: é ao molho, molhinho, a púcaro, garrafa ou a copo - Mas vai deixar de o ser Em seu lugar, vai erguer-se mais uma nova torre para uns poucos engrossarem os bolsos .~

JORGE TRABULO MARQUES - JORNALISTA .

Mercado Municipal de S. Tomé 

Em Luanda, o antigo mercado do povo, apelidado de Roque Santeiro, por razões urbanísticas megalómanas, já fechou há muito, mandaram-se os pequenos comerciantes para muito longe da cidade:

O mesmo vai suceder no emblemático mercado municipal de S. Tomé, para acolher mais uma torre, descaracterizando o coração da cidade e favorecer uns poucos em detrimento de milhares, que vão ser empurrados para 3 km na periferia da capital


Empresários muito contentes na pescada do espaço do Mercado Municipal  -: Empresários dispostos a investir na requalificação do mercado municipal O grupo privado Noor liderado por Ramy Zayat, manifestou disponibilidade em investir no projecto de requalificação que foi exibido ao sector privado. Nós também vamos participar dando a nossa colaboração para execução deste projecto», afirmou o empresário António Alves, mais conhecido em São Tomé e Príncipe, por António Navalhada ou António  Dolores 
Todavia, vale a pena recordar a poesia e a tradição desse velhinho mercado, que, desde que foi construído, no período colonial, praticamente nunca sofreu obras e foi desprezado, tal como sucedeu a muitos outros edifícios - E que agora vai levar a estocada final.

Era assim, durante muitos anos e antes da Covid servir de pretexto para saciar o apetite insaciável de oportunistas e gananciosos

"No Mercado Municipal, tudo é comercializado,
ou mesmo cá fora, ao lado, tudo é vendido a olhómetro:
Não há medidas de peso, litro, decalitro, decilitro ou decalómetro. 







Não há balanças: é ao molho, molhinho, a púcaro, garrafa ou ao copo:
Em diversificada, colorida  e perfumada oferta! - Restringido
a humildes e exíguos montinhos espalhados por esteiras ou trapos:
De piripiri, pimenta, canela, mandioca, baunilha safú  ou matabala
Das cestas ou dos coalos, contam-se as mangas pelos dedos!
O mesmo se faz das pinhas de bananas  e de todos os frutos!




Tanta riqueza tropical! Tanta coisa boa natural!
 Cocos, jacas, safús, limões,  abacates, pau de canela,
fruta pão, papaia ou  mamão, maracujá,  pitanga, nona, carambola,
sementes de izaquente, pimenta e baunilha, cana do açúcar!
Vinho espumoso e branco de palma!- O dinheiro é vilão! 
Mas quem o não tem faz-lhe muita falta!
– A “dobra” é a moeda de troca
 e a nota de papel é contada aos “contos!
Tal como antigamente, no tempo do escudo colonial!


Sim!.. Quem vai ao mercado, 
onde há muito por onde escolher e muito para vender.
tem para ver ou  comprar: peixe seco ou fumado,
banana prata, oiro, macâ, macaco roxa ou banana-pão
azeite engarrafado de dendém, abóbora, pimentos e pimentão, 
repolho, mandioca, batata-doce, abobrinha, tomate e alho,
malaguetas, salsa  e quiabo – sei lá quão mais!

Quão profusa tela colorida e luzidia se lhe abre ao olhar!
Tela composta por  tantos e tão saborosos produtos
nascidos da húmus da terra vermelha, húmida e  fértil!
Colhidos das hortas ou por baixo das eritrinas
que dão sombra aos  cafezeiros e cacauzais
ou mesmo no seio do  espesso mato florestal!
.

Pródigo de frutos exóticos, de majestosas e verdejantes árvores,
exuberante manto arbóreo, do qual  são talhadas  as frágeis pirogas
para os ágeis e corajosos pescadores partirem na aventura ao mar largo
e fazerem depois na praia  as suas pequenas lotas de pescado.



No mercado municipal ou mesmo cá fora, ao lado.
-Não há balanças: é ao molho, molhinho, a púcaro, garrafa ou a copo:
tudo isso é variado, verdadeiro e genuíno, 
vem do azul do mar ou da terra húmida
e tudo é fresco, puro e casto.

É um hábito ancestral ! -  Frutos
e produtos hortícolas expostos em cestas,
sarapilheiras, cestos ou simples esteiras,
estendidos em panos brancos, já muito manchados
pela seiva acastanhada que escorre e os mascara,
dos pingos vertidos dos belos cachos amontoados das bananeiras.



É a antiga  tradição que prossegue - Só que agora,
toda essa  suculenta e apetitosa amostra que se espalha ,
se compra e vende, não é sinónimo dos tempos coloniais das roças
dos serviçais dos pés descalços, maltratados, esfarrapados, chicoteados
do longo período das trevas, dos dias da escravidão:

Agora o pescador “angolar” já não zarpa da borda da praia,
da sua humilde e pobre cubata, coberta por folha de andala
construída de cana de bambu, de madeira da floresta
ou coberta de chapa,restringido quase  à margem da praia:
a roça era senhora de tudo e só faltava empurrar 
os miseráveis casebres para o meio das águas:



Sim, agora as pirogas navegam livres e voam soltas,
como as aves que  esvoaçam os ares da densa floresta
ou sobrevoam o ventre ubérrimo da luxuriante  “capoeira”!
Vão a remos ou já de vela erguida,  desde a orla azul e cristalina,
desde a sua aldeia, mar fora! Vão pescar o peixe-voador, o cangá, a raia,
o  gandú (tubarão) a garoupa, atum, robalo, carapau, bonito,  malaguita, cherne, 
chinchi, concó, agulha, bacuda, gangá, lula, linguado, sêlê, mulato,
peixe-espada,choco, o polvo - e tantos outros variadíssimos frutos do mar ! –

Partem livremente: -  eles ou os “forros”!
Já não há os  humilhados e os reprimidos  como antigamente!
 A mando do todo poderoso capitão dos portos!
Ou vítimas de capatazes, de chicote na mão,  nos terreiros e senzalas 

Excerto  - Jorge Trabulo Marques 



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