JORGE TRABULO MARQUES - JORNALISTA
Este ano, por via do Covid-19, Arraiais e desfiles estão proibidos”, determinou a a câmara municipal de Lisboa, sustentando que “a elevada concentração de pessoas que marca os arraiais populares, vincando a força da sua tradição, é incompatível com a sua realização mesmo num cenário de achatamento da curva de contágio e da diminuição do número de infestation”
Decisão esta que vai também ao encontro da resolução do Conselho
de Ministros de 29 de maio, que proíbe
“qualquer atividade em espaços abertos, em espaços ou vias públicas, ou em
espaços e vias privadas equiparadas a vias públicas”, incluindo os de
coletividades, associações e instituições similares, e “os desfiles e festas
populares ou outras de qualquer natureza”.
As Marchas
Populares de Lisboa remontam a 1932, quando foram organizadas as
primeiras marchas competitivas, sob orientação de Leitão de Barros. Esta é uma
das mais antigas e crescentes tradições da cidade de Lisboa (às marchas
juntaram-se em 1958 os Casamentos de Santo António).
Porém, em Lisboa já se realizavam
marchas desde o século XVIII. Dessa época há registos de pequenos grupos
que se deslocavam com archotes, cantando em competição – as marchas ao filambó,
uma adaptação das francesas marches au flambeau https://expresso.pt/coronavirus/2020-06-12-Covid-19.-Santo-Antonio-sem-marchas-casamentos-nem-procissoes.-Camara-de-Lisboa-pede-respeito-escrupuloso-das-regras
DIÁLOGO SURREALISTA DE MÁRIO CESARINY - NA NOITE DE
SANTO ANTÓNIO, Em 12 de Junho de 1991, em que o poeta fez o papel do repórter
com a empregada cabo-verdiana, da poetiza Natália Correia, Apontamento
espontâneo de reportagens para Rádio Comercial- RDP, quando questionava algumas
das pessoas que assistiam ao desfile, eis que surge o diálogo mais inesperado e
insólito da noite sobre
ratos e ratazanas nas barracas, que
comem mãozinha de criancinhas e outras surpreendentes revelações – E dos
grandes banquetes com deputados no famoso Botequim, no largo da Graça.
RECORDANDO O POETA E PINTOR - MÁRIO CESARINY - E TAMBÉM UM BOM AMIGO - Jorge Trabulo Marques
Jorge Trabulo Marques - Mário Cesariny
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Tive oportunidade de ser amigo de Mário Cesariny de Vasconcelos, de ter partilhado com ele variadíssimos e inesquecíveis momentos de agradável convívio
"Passados dez anos, sobre a sua morte - "é uma voz que ainda ecoa" e o seu surrealismo uma revolta que ainda não perdeu o sentido” - Entre os amigos mais chegados, a sua presença continua tão forte quanto antes. Como naqueles tempos passados em redor de uma mesa de café a falar de literatura, de política, de arte, de tudo. Sempre certeiro, Cesariny chegava e com uma palavra era capaz de mudar a temperatura de uma sala, sobretudo de pensar fora da caixa porque ele nunca soube o que era estar dentro dela.
Isso — essa ânsia de liberdade noutro Portugal — trouxe-lhe muitos problemas, mas também fez com que se tornasse autor de uma das obras mais importantes do modernismo português. E não só literário, mas também pictórico. Porque a poesia e a pintura andaram sempre de mãos dadas com Cesariny — faziam parte dele. E assim diz quem o conheceu” - .Diz num interessante artigo, Rita Cipriano, publicado no Observador – Do qual extraímos este breve exerto.
CESARINY ADMIRAVA O ESPÍRITO AVENTUREIRO DAS MINHAS ARRISCADAS TRAVESSIAS EM FRÁGEIS PIROGAS E EU ADMIRAVA-O POR SER UM POETA DE CORPO E ESPÍRITO INTEIRO - http://www.odisseiasnosmares.com/2012/10/28-dia-grandes-vagas-alterosas-entravam.html
E também apreciava os meus apontamentos insólitos de reportagens e entrevistas na extinta Rádio Comercial RDP - Um dia haveria de ser ele a substituir o repórter com a empregada de Natália Correia, deslindando segredos, de almoços e jantares, no lendário Botequim e em sua casa e outras revelações - Quem haveria de imaginar tão inesperado acaso!
Tenho no meu vasto arquivo de repórter da rádio, muitos registos da sua voz: quer de algumas tertúlias poéticas onde participou, quer de quando nos cruzávamos nalgumas das ruas ou espaços que ele mais frequentava: - pois, além das entrevistas às mais diferentes personalidades, uma parte dos meus trabalhos eram baseados em registos de rua e casuais, de coisas do arco da velha, em direto ou gravados, de todo o tipo; desde assassinos, a prostituíras, rufias, drogados, marginais, gente conhecida ou anónima, dava-me gosto ir ao encontro do palpitar do coração da cidade, fosse de dia ou de noite. Hoje, a rádio, dispersa-se em mil frequentes, já não dispõe dos grandes auditórios dos anos de oiro da rádio, os seus realizadores imitam-se e repetem-se, como gira-discos e só servem para enfastiar o ouvinte com carradas de anúncios, música barulhenta e enfadonhas conversas da treta.
Mário Cesariny, conhecendo bem as minhas andanças, sabendo que, no saco do repórter, havia sempre um gravador pronto a premir a tecla para acionar o movimento da cassete de gravação, por vezes, era ele mesmo, que quando nos cruzávamos, se o apanhasse em pleno desvario poético, me perguntava: “Olá Jorge!... Trazes aí contigo a maquineta?”... – Claro que, mal descobria o seu perfil, à distância, era o gesto de que imediatamente me preparava para tomar: – E, sem mais delongas, ali estava o poema, acabado de criar, vertido como se naquele momento lhe estivesse a jorrar da mais cristalina fonte e da encosta do mais sublime ou auspicioso monte.
Ele concedia-me esse privilégio, não porque estivesse a pensar na forma de promover os seus versos, visto essa questão há muito estar ultrapassada, pois, a bem dizer, Cesariny, quando nasceu, já devia vir com o rótulo dos predestinados, além de que também não precisava de correr atrás da imprensa, nem o desejava nem era esse o seu gosto. Fazia-o, por um lado, porque me considerava seu amigo, e, por outro, porque, sendo também uma pessoa afável, simpática e dialogante - que gostava de dizer os seus poemas, como se cada verso lhe saísse do mais fundo das suas emoções ou cogitações, e não mercê de meras construções imaginativas de quem é muito letrado e até sabe fazer umas versalhadazecas umas rimas ou coisas parecidas, engraçadas ou intelectuais, que, mais das vezes ninguém entende – mas sobretudo, porque esse gesto também era surrealista, uma insólita forma de expressão artística.
Nesse aspeto, ele não fazia concessões – Sim, o gosto de surpreender e ser-se surpreendido, um ato poético, artístico e espontâneo, por aquilo que fazia e criava – Cesariny era avesso às entrevistas combinadas mas adepto e apaixonado do diálogo informal e espontâneo. E até sucedia, por vezes, que, ao cruzar-me com ele na rua, ao perguntar-lhe se me podia dizer alguns versos para o meu gravador, me respondia: “desculpa, Jorge; mas neste momento não ando com versos na cabeça, não posso perder tempo contigo:
- Não vês, além aquele magala, tão jeitoso! …Vou ver se o engato!”…Agora não posso falar contigo… E lá ia à sua vida…De cabeça erguida, de quem não deve, não teme; enfiado na sua gabardine… Qual andorinha apeada, mais parecendo levitar de que andar.
Conheci-o, casualmente, pela primeira vez, nos finais dos anos 70, numa discoteca Gay, no Príncipe Real, denominada Rokambole, próximo da Faculdade de Ciências– Tinha ali ido fazer uma reportagem para a Rádio Comercial sobre a estreia de um espetáculo de travesti, e, enquanto assistia às hilariantes pantominas dos atores, quis um feliz caso que estivesse sentado no mesmo sofá ao seu lado: às tantas, e, como nestes ambientes informais e descontraídos, quando as pessoas estão sentadas lado a lado, o diálogo geralmente acontece, sou eu que, lhe lanço esta pergunta:
Por caso, o Sr. não é poeta? - Ele sorri e responde que sim, mas não disse mais nada nem eu insisti – Isto pelo facto de ter observado, na sua maneira de falar, simples, espontânea, no relacionamento com outra pessoa, da sua idade, sentada do seu lado direito (mais tarde vim a saber que era o pintor Francisco Relógio) com a qual de vez em quando iam trocando umas palavras, porém, sem qualquer tipo de afetação na voz ou nos gestos, ao contrário de outras pessoas, que por ali conviviam e se divertiam, Porém, como é sabido, no rosto dos espíritos iluminados, o silêncio também fala. E eu quando andava em reportagem, olhava as pessoas, com olhos de ver, procurava eventuais motivos de curiosidade para apresentar no programa em que participava – Pois, tal como me confessara, mais tarde, o pintor, Carlos Botelho, em sua casa: vocês, repórteres, devem ter muito que trabalhar para alimentar uma bocarra, tão grande, como é a da rádio – Sim, no tempo em que fazer rádio, não era só no estúdio mas ir ao encontro das pessoas e dos acontecimentos.
A mesma dificuldade me reconheceria também, António Ramos Rosa, outro grande poeta, que, depois de o ter visitado numa enfermaria de um hospital, pela primeira vez, me receberia muitas vezes em sua casa, tendo, a partir de certa altura, não apenas tido o prazer de conviver com ele e com a sua esposa, Agripina Costa Marques, mas também para lhe registar algum poema, acabado de criar ou mesmo de levar o original para minha casa para lho depois lho entregar em letra de forma: pois, houve uma altura, na sua vida, em que, devido a problemas de saúde, escrevia com alguma dificuldade, com gatafunhos, quase indecifráveis e, mesmo o que batia à máquina de escrever, necessitava de melhor apresentação: os versos saiam-lhe espontaneamente, até de uma simples palavra, que eu próprio pronunciasse,, a sua poesia era de emoções, que faziam pensar mas dir-se-ia que não era pensada mas sim vertida de uma mente, fermentada e fecundada de múltiplos e profundos pensamentos, talvez mesmo em permanente estado de ebulição ou delírio . Bom, mas neste momento, eu estou agora a lembrar a memória de Mário Cesariny
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