Jorge Trabulo Marques - C - A SÓS À FLOR DO MAR E TENDO COMO ÚNICO
TETO O AZUL PURO OU PARDO DOS ALTOS CÉUS E A ESCURIDÃO DE TREVAS INFINDAS
DEPOIS DO SOL SE AFUNDAR! - - Recordando em soltos versos como solta foi a minha deriva, naquelas eternas
horas de 38 dias a fio! Noites confusas, infinitas de incerteza e de
assombração!. - O ser humano dispõe de imensos recursos para salvaguardar a sobrevivência, que, verdadeiramente, só os conhece nos momentos mais difíceis ou dramáticos da sua existência, saindo da provação ainda mais seguro e reforçado.
Leia – Uma das várias
postagens de 38 longos dias numa piroga no Golfo da Guiné
Sozinho perante tão extrema grandeza marítima,
tão imensa e misteriosa amplidão
e ser-se ao mesmo tempo
extrema fragilidade e ínfima pequenez,
é, sem dúvida, coragem, triunfo e arrojo
às adversidades da inóspita natureza!...
Sede insaciável de se ser bafejado pela luz mais clara e pura dos astros!
Voar como ave perdida pelos vastidão infinita dos espaços!
Errar como um vagabundo pelos mares de todo o mundo!
Instantânea e antiquíssima harmonia! Voluptuoso jorro de energia!
Lufada fresca, vivo e perene rasto a divindade!
Levado a sós por genuínos impulsos de aventura,
pensamentos insondáveis, chamamentos
de bravura ocultos, inimagináveis!
É o aspirar da palavra solar,
ter por companhia,
o ritmo, a graça, a melodia
o deslumbramento dinâmico do anelado azul,
a vibrátil claridade.
A conjugação de todas as ânsias reprimidas
na esteira de se alcançar, num só desejo, numa só vontade,
os limites do inatingível, a margem
Percorrendo vastas planícies salgadas em turbulentas águas,
deixando para trás preocupações triviais, ódios mesquinhos.
Mesmo que a ousadia condene a viver um só instante de eternidade,
Mesmo que a ousadia condene a viver um só instante de eternidade,
oh, sim! vale a pena viver o sublime,
correr o risco e a temeridade.
Decifrar os enigmas do incognoscível
estar ao mesmo tempo dentro e fora da verdade,
dos misteriosos limites que comandam os desígnios
da morte e da vida.
com o destino completamente à mercê de um errático acaso,
ao sabor do imprevisto e do filtro do instinto,
perdido entre o vento, o olvido
e as espáduas do esquecimento,
oh! não é temeridade vã, inútil o laço da solidão!
Mas o desejo porfiado e ardente em decifrar
os calmos e febris prodígios do desconhecido,
a busca incessante do oiro na sua essência,
no seu estado original, ainda incandescente
a procura dos silêncios visíveis
dos sons puros na grande imensidão,
no seu estado selvagem, verdadeiramente inocentes!
Vozes, rumores e murmúrios de todos os tempos
que soem e repercutam ecos
de invulgar pureza e libertação!
Guiado pelos astros e pelo mesmo instinto das aves
- tal foi o meu caso: uma Bússola
dá uma ajuda mas não indica o lugar.
Os Vikings usaram a Bússola Solar Mais nada.
Todavia, dominaram os mares no seu tempo.
Leituras satélite por GPS, informações astronómicas,
a posição exacta a qualquer hora:
Instrumentos náuticos, esses, só os grandes barcos, ao largo!
- Vi alguns mas não me viram a mim - Eu não era nada.
Até ia perdido, prisioneiro de um incerto e amargo destino -
E eles, os pilotos sem os instrumentos a bordo?!...O que seria deles?!..
Mesmo assim, talvez se sentissem menos livres
e mais prisioneiros do que eu!..
Ir sozinho para o mar, é partir
em demanda dos mais ténues rumores e labirintos sagrados!
Saciar a fome da floração silenciosa, da vagabunda dança de um sopro íntegro
de fulgor furtivo de sabedoria e pureza.
É fazer-se ao mar e navegar sem contrapartidas seguras à partida
e não ter qualquer certeza de paisagens imaginárias ou reais à chegada!..
É a transparente e claríssima sede de nostalgia dos mais puros céus!
É viajar na senda dos séculos passados, eras volvidas
Apelar ao instinto animal (que raramente se engana, tal como o da ave)
É vidência! Deslumbramento! Itinerário transfigurado.
É trocar o certo pelo incerto
- Sem todavia saber que próximo futuro o aguarda,
a que portos poderá arribar,
que enseadas de ilhas frondosas o esperam,
que recortes de orlas vai contemplar,
que escolhos vai ter pelo caminho,
que perigos e ameaças
lhe poderão interromper a viagem.
Largar tudo - os horários, a família, os amigos,
a tranquilidade de um lar - e partir
mar fora numa frágil piroga
ou até em barcos maiores e bem equipados,
singrando o ondulante manto líquido,
trocando o certo pelo incerto, o desconhecido,
não receando os revés da ousadia e a má sorte,
não temendo as partidas da omnipresente imagem da morte,
alheio a tudo: às inesperadas variações dos ventos,
à dança e contra-dança de correntes poderosas
súbitos vendavais, "súbitas trovoadas temerosas!"
Navegar sobre as ondas encapeladas,
ir de velas enfunadas, é sentir a alma rubra!
Alheia aos perigo que rondam por toda a parte,
subindo ou imergindo
dos insondáveis abismos!
Navegar à flor das águas agitadas é ter por companhia
a menos de um palmo ou da grossura de uma tábua,
a cova funda e horrível da mais funesta e imensa sepultura
.
Deixar, enfim, que o mar e o vento cumpram a sua palavra!
Não pensar em horários nem perder tempo em coisas banais
Ser sonho ousado que se cumpra e nada mais!
Jorge Trabulo Marques
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