A sessão evocativa, decorreu, ao fim da tarde, da última sexta-feira, dia 18, no Centro Cultural de Cabo Verde, em Lisboa, em ambiente alegre e caloroso, com momentos poéticos e sons de viola adequados à morna nostálgica da casa anfitriã e, naturalmente, também à essência dos seus versos, que ali foram lidos e cantados por vozes amigas
A apresentação do seu livro "Chão de
Canela", com que quis assinalar os 30 anos da sua carreira literária,
contou com a presença do Embaixador de S. Tomé e Príncipe, em Lisboa, António
Quintas e de sua esposa, esteve a cargo
de Inocência Mata, que teceu rasgados elogios à obra e à carreira literária de
Olinda Beja, aliás, igualmente enaltecidos em toda a sessão.
“Chão de Canela” - lê-se em nota introdutória – “é uma obra que
traz a marca inconfundível de uma das grandes vozes da literatura de São Tomé e
Príncipe. Nela somos conduzidos por várias histórias que, ao mesmo tempo em que
dialogam com os poemas publicados da autora e com a tradição dos provérbios santomenses
nas epígrafes, têm como fio das missangas a mais aromática e conhecida das
especiarias que uniu Oriente e Ocidente através dos tempos e de alguns traumas
do passado ainda presentes. Dessa forma, Olinda Beja conta, canta e encanta com
as suas histórias através de uma linguagem profundamente poética e enraizada na
memória viva e na cultura crioula, de quem espalha pelo mundo os sabores e
aromas dessa santomensidade” – Diz Kleyton Pereira – Prof. de Literaturas africanas – Universidade Federal
Rural de Pernambuco
Tal como é reconhecido, e também foi sublinhado, na festiva
sessão, Olinda Beja, poeta de reconhecido mérito, brilhante contadora de histórias e dinamizadora cultural “dedicou-se
à escrita desde muito jovem, escrevendo e contando histórias sempre que o seu
coração lhe pede. Com o livro “À Sombra do Oká” recebeu em S. Tomé e Príncipe o
Prémio Literário Francisco José Tenreiro 2012-2013.Poeta, romancista, contadora
de histórias, Olinda Beja tem divulgado, através de conferências e recitais de
poesia, a cultura de S. Tomé e Príncipe por vários países, nomeadamente Brasil,
Austrália, Timor, Marrocos, França, Espanha, Suíça, Inglaterra, Luxemburgo e
Cabo Verde
As suas obras encontram-se traduzidas em várias línguas, designadamente espanhol, francês, inglês, chinês (mandarim), árabe e esperanto, e têm sido objeto de estudo em várias universidades
“ANTES DE TUDO”... Este o título com que, Olinda Beja, começa por falar do seu livro nestes termos Talvez nem fosse preciso escrever estas linhas, mas sendo eu uma apaixonada pelas palavras, sobretudo por estas tão perfumadas de canela, achei por bem transmiti-las ao papel, redigi-las, dando-lhes, uma vez mais, forma e vida. Em breve elas seguirão o seu destino na descodificação que delas fizerem, na compreensão e no trato com que as arrumarem no sótão da memória ou na transmissão oral que elas tiverem, arrancadas por fim ao recinto místico das páginas deste livro.
Desde criança fiz das palavras um passatempo favorito no empreendimento sonoro que nessa altura a minha capacidade transmitia e recebia. Joguei com elas, alternei-as, conjuguei-as, fui conhecendo e coletando umas, deitando fora outras...
Hoje continuo a admirá-las, a usá-las na profusão de sentimentos, de sons e de gestos com que me defendo dos maus agoiros,.. e sinto que elas têm perfume como uma qualquer flor que se encontre por aí, nos caminhos pedregosos ou à beira-mar ou no mais profundo vale de uma floresta esquecida. Por isso escrevi este “Chão de Canela”.
Levei as palavras pela viagem histórica desta especiaria tão desconhecida noutros séculos remotos e que um homem, célebre marinheiro português, resolveu trazer para a lusa terra e que rapidamente se espalhou pelos recantos do mundo.
Saboreamos hoje a canela como saboreamos o Cravinho, a pimenta, o gengibre, a noz-moscada... mas de todas as especiarias é ela a mais aromática, a mais doce, a mais exótica e a mais viajada.
Quando me passeio pela floresta da terra onde nasci, deslumbro-me com os imensos pés de canela que abundam bem perto do sítio onde tenho o meu refúgio. Reconheço na casca a delícia do aroma e de imediato sonho com as doçuras onde ela enfeitará Pratos e travessas de salgados e doces...
Numa profusão de histórias
variadas que começam e acabam nas ilhas onde canta O ossobó, ofereço em todas o
aroma da especiaria mais antiga da humanidade!”
SINOPSE
Mais um livro em que a autora de Bô Tendê? (1991) – um seminal livro sobre o misticismo
insular (sim, com e, eventualmente para celebrar o que se pode considerar uma
mística mestiçagem ou um misticismo mestiço) – deixa impressa o seu idioleto
poético: uma poética feita de mineração da palavra, mas em conjugação com a
estética do sensorial, de que resulta um discurso em que prevalece a sua sensibilidade
pessoal na relação com o mundo insular. Essa sensibilidade ancora-se na memória
sensorial, a que a autora (poetisa e ficcionista) nos habitou, desde títulos
que nos remetem para os sentidos: visão (No País do Tchiloli ou O Cruzeiro do
Sul), audição (Bô Tendê? ou Quebra-Mar), olfato (Pé-de-Perfume ou Aromas de
Cajamanga), tato ( Pingos de Chuva ou À Sombra do Oká) e paladar (Chá do
Príncipe e Um Grão de Café), enquanto este último, Chão de Canela – um
coletânea de dezassete narrativas em diálogo com poemas de livros anteriores, a
convocar a historicidade do percurso da escritora) – parece ser a síntese
sinestésica dessa ontologia do subjectivo na obra de Olinda Beja.
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