História de S. Tomé – As invasões holandeses às colónias portuguesas começaram nas Ilhas Verdes do Equador, com o desembarque de 12 navios, na praia Almoxarife, em Santana – A tropa portuguesa, desorientada, refugiou-se na Fortaleza de S. Sebastião e foi um grupo de soldados castelhanos, que soltos da prisão, resistiram aos invasores - Estudo revelado, em 1971, pelo Padre José Esteves Luis, à revista Semana Ilustrada
Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista e investigador
Contributos para a História de S. Tomé e
Príncipe – Ironia das ironias – Um ano depois de Portugal ter expulsado os servidores
da Dinastia Filipina de Castela, graças a um punhado de valentes “conjurados”,
eis que é um pequeno grupo de soldados castelhanos, comandados pelo capitão Português, João de
Sousa e Távora, a oferecem resistência à invasão holandesa, composta por uma armada de 12 barcos, que desembarcaram junto à praia Almoxarife, em Santana, na Ilha de S. Tomé - Enquanto 200 soldados
lusos, desorganizados, temerosos e mal comandados, se acovardaram e refugiavam na
fortaleza de S. Sebastião, no atual Museu Histórico, eram os sobreviventes de um barco espanhol, atacado e destroçado por franceses, junto à praia das Conchas, que, então feitos prisioneiros, se ofereceram para, a troco da liberdade, resistirem ao avanço holandês sobre a cidade - Pormenores mais à frente
Segundo documentos históricos, a guerra
Luso-Holandesa, começa com um ataque a S. Tomé e Príncipe em 1597 - Lê-se em Guerra Luso-Holandesa –
No entanto, a grande invasão ocorreria apenas em 1641, um ano depois da Restauração de Portugal, do jugo Filipino,
cujo Império ficaria bastante fragilizado, devido ao forçado domínio das cortes espanholas – Tanto assim,
que, na altura em que os holandeses, invadiram S. Tomé, com uma guarnição de 12 navios, na praia do Almoxarife, em
Santana, curiosamente, até seria um
pequeno grupo de soldados castelhanos, a oferecem a alguma resistência à
invasão holandesa – Não porque, ali permanecessem, mas porque - segundo um
texto do PadreJosé Esteves Luís (claretiano) (1927-1975)que mais adiante, vou transcrever da Revista Semana Ilustrada, de que fui seu correspondente nestas Ilhas - ,
sim, isto, porque, uns dias antes daquela
invasão,tendo um navio espanhol sido atacado e
desmantelado por outro francês na praia das conchas, os soldados deste navio, saltando
ali em terra, foram presos e encarcerados. Porém, “ao saberem doataque dos
holandeses, espontaneamente se ofereceram para combate-lo, comandadospelo capitão de João de Sousa e Távora, filho
do grande Lourenço Pires de Távora. Enquanto, Miguel Pereira, senhor da ilha de
grandes riquezas, nada tendo de militar ou de valor, encerrou-se na fortaleza
se S. Sebastião com duzentos soldados, tão falhos de instrução como ele.”
S. TOMÉ E PRÍNCIPE VÁRIOS ANOS – SOB O DOMÍNIO HOLANDÊS – SÉCULO E MEIO DEPOIS
DE TEREM SIDO “EXPLORADAS” PELOS PORTUGUESES - SIM, ESTE É O TERMO CORRETO
Fortaleza de S. Sebastião - atual Museu Histórico
Ruínas da Fortaleza de S. Jerónimo
O surgimento de potência marítima
holandesa foi rápido e extraordinário, e, sobretudo por duas razões - Por um lado, pelo facto de Portugal ter sido traído por
marinheirosholandeses que, tendo participado em viagens portuguesas ao oriente,
haviam recolhido informações náuticas importantíssimas
– relatos, mapas entre outras observações. Por outro, e este terá sido o aspeto
aindadeterminante, porque, os judeus
expulsos de Portugal, que ocupavam lugares de alguma importância social no século XV, foram acolhidos pelos holandeses e viriam fazer pagar cara a desforra – Pois, como
é sabido, eram eles os principais financiadores das expedições portugueses,
que, ao contrário que é dito, pelos atuais compêndios coloniais, tais aventuras marítimas, não se chamavam descobertas, mas explorações – Navegava-se para explorar e não para descobrir, tanto mais que, toda a costa
africana, incluindo as ilhas do Atlântico, desde a Madeira, Açores Canárias a S. Tomé e Príncipe
(a que me refiro em ilhas asben e sanam,) já eram há muito conhecidas
e referidas por antigas cartas, nomeadamente porárabes, de cujas informações se serviria o
Infante D. Henrique, na sua Escola de Sagres, contratando a nata dos sábios da
época, genoveses, mouros, entre outros - Nomeadamente, o mestre Jácome de Malorca, perito em instrumentos e cartas, também conhecido por Jafuda Cresques e Jaume Riba, cartógrafo catalão, de ascendência judaica, apontado como o coordenador das descobertas marítimas - De referir que, no "Libro de Astrolábio Lhano (manuscrito em meados do século XIII, são descritos astrolábios de metal completos.
“A
Históriadas Navegações tem pecado por
ter sido escrita, por vezes, por quem desconhecia a Arte Náutica – Diz o
Almirante Gago Coutinho, em “A Náutica dos Descobrimentos, referindo-se à
viagem que precedeu à de Álvares Cabral, ao Brasil, diz, que, naquela época, tal como é dito no
livro “Esmeraldo” a palavra “descobrir” tem o sentido de explorar, pelo que admite tratar-se de “exploração”, confiada a Duarte Pacheco, de uma costa
que já fora achada antes de 1498. Seria serviço análogo àqueleque o mesmo Duarte Pacheco conta ter,
anteriormente, prestado a D. João II, quando fora encarregado de “descobrir
muitos lugares e rios da costa da guiné”, pois já fora “achada” muito antes, no
tempo de D. Afonso Henriques".
(...) "Assim, quando em Março de 1500, a esquadra de Cabral partiu de Lisboa para a Índia, a existência no Atlântico Sul de terras a ocidente da África era, sem dúvida, um segredo de Polichileno: todos o conheciam . Aquelas teriam sido descobertas pelo menos dois anos antes."
Bom, mas referindo-me à invasão dos
Holandeses,como explicar que um
pequeno país, quase afogado pelo mar, lograsse ser uma das maiores potências coloniais,
com ataques de pirataria em todos os
mares, apoderando-se de territórios já “descobertos”
por Espanha, Inglaterra e Portugal e passasse a ter o domínio do comércio das
especiarias no oriente ? – Sim, é que. além de, em determinada altura, terem sidoajudados por forças Inglesas,
rivais de Espanha e livres da aliança que os ligava aos portugueses durante a
União Ibérica, pois é de crer que a explicação, desse domínio, assentasse, essencialmente, quer no facto de se terem servido de
informações náuticas dos portugueses, quer, sobretudo, devido aoenormíssimo erro histórico da expulsão dos judeus, quea Holanda acolheu e soube aproveitar - Mas vamos então ao interessantíssimo artigo, publicado na revista Semana Ilustrada, de autoria do Padre José Esteves Luís que, tal como o Padre António Ambrósio,
eu tive o grato prazer de conhecer, os quais, além de terem desenvolvido uma
apaixonante missão evangélica, em S. Tomé e Príncipe, também se debruçaram,
desde os fundos mais recuados da história destas maravilhosas ilhas, até à
atualidade.
PARA A HISTÓRIA DE S. TOMÉ - POR JOSÉ ESTEVES LUIS
"Esta palavrapicão é mais ou menos equivalente ao que o
povo designa por oquê. Há no entanto alguma diferença.: enquanto que oquê da
linguagem popular é uma elevação ou cabeço continuado por uma planície, haja em
vista oquê del rei. Oquê Boi; picão é um cabeço cujo cume é, relativamentede pequenas dimensões ,e que, elevando-se
mais abruptamente, se presta mais à defesa. Temos o picão de Santana, detrás e
por cima da igreja paroquiai, o picão, onde em 1867 se construiu o cemitério da
cidade.
Visita do Governador Cecílio Gonçalves a Santana
Igreja de Santana
Detrás da igreja da
Conceição, à entrada da estrada do Reboque (Riboque) esobranceiro à mesma, elevava-se um cabeço,
denominado Picão, há poucos anos demolido, que desempenhou papel de relevo na
história de S. Tomé. Foi aí que seergueu um forte, que, apesar de demolido, o povo ainda, no século
passado denominava Forte dos Holandeses, embora a eles não fosse devida a sua
construção. Esse mesmo forte deu origem ao nome da roça em que estava
localizada, Arraial, nos documentos oficiais ainda existentes e que .foi
durante séculos marcada como limite da cidade por aqueles lados
Mas vejamos algoda sua interessante história.
Os holandeses senhores da
costa do Brasil, ocupando em consequência também Angola, , julgaram necessária
a posse de S. Tomé por duas razões: senhores do açúcardo Brasil, apoderando-se de mais esta fonte
de apreciadoproduto, ficavam senhores
do comércio da Europa; depois a Ilha serviria deponto de apoio e abastecimento dos navios
que, conduzindo de Angola e Congo os barcos necessáriosaos engenhos da América, aqui fariam a última
escala
Em Outubro de 1641 à
vista da Ilha apareceram 12 barcos, que dirigindo-se para o sul, foram
desembarcar tropas de infantaria na praia do Almoxarife, emSantana
Os desembarcados, sem
resistência alguma, pela beira mar,dirigiram-se para a cidade. Na Água Grande da Praia Melão (Manuel Jorge)
encontram a barra-lhesa passagem um pequeno
destacamento de soldados, castelhanos quase todos. Dias antes, estes soldados,
tendo o navio espanhol sido atacado e desmantelado por outro francês na praia
das conchas, saltando ali em terra, foram presos e encarcerados. Agora, ao
saberem daataque dos holandeses,
espontaneamente se ofereceram para combate-lo.
Comandava este pequeno
grupo o capitão de João de Sousa e Távora, filho do grande Lourenço Pires de
Távora.
No entanto, na cidade, ao
saberem do desembarquee ao avistarem a
armada holandesa na baía, havia grande
perturbação e embaraço. Miguel Pereira, governador da eleição popular por ser
sobrinho do titular morto e senhor da ilha de grandes riquezas, nada tendo de
militar ou de valor, encerrou-se na fortaleza se S. Sebastião com duzentos soldados,
tão falhos de instrução como ele. Os moradores, na sua maior parte,com fazendas e famílias refugiaram-se no
mato. Os mais valentes e levados pelo exemplo do Capitão de João de Sousa e
Távora, ainda organizaram duas companhias de paisanos, faltos de prática e
comando, que se dirigiram ao cotado rio da praia Melão. No caminho tiveram
conhecimento de que o João de Sousa se ia retirar e por isso voltaram para a
cidade e debandarampara os matos. O
valentee decidido capitão, depois de
combater por algum tempoe sabendo da
retirada dos soldados de socorro, recuou para a povoação e foi fortificar-se
com os companheiros no Pico da Conceição. Ali construiuumas trincheiras deterra batida. Não, tendo, porém, artilharia
nem munições , teve de bater em retirada ao ser atacado pelos holandeses
senhores já da cidade.
Fortaleza de S. Sebastião - Atual Museu Nacional
Em 8 de Novembro de 1642
e mandado pelo Rei de Portugal, desembarca em Santana, o governador Lourenço
Pires de Távora, casado com a segunda Ana Chaves. Aincumbência dele seria ocupar a ilha, embora
sementrar abertamente em guerra com os
holandeses. Fortificou-se no picão deSantana , e depois de váriasperipécias ocupa a cidade. Ficandoos holandeses na fortaleza, elecom os oficiais foi tomar assento na torre, casa de pedra(sítio do actual Palácio). E “ mandei chamar o capitãoJosé Martins, que dessem por ordem o buscar
uma parte iminente para fazermos uma fortificação para o que podia suceder e
foi ver e me veio avisar que achou detrás de Nª Srª da Conceição uma parte
chamada Picãoque era parte iminente a
propósito para se fazer o arraial; uma parte ficar em boa vista que devassava
toda a cidade a todas as partes. Dei por ordem a todos os moradores que
mandassem eus escravos da fazenda ao serviço de El Reique viessem dar ajuda a fazer umafortificação", assim faa Lourenço Pires
de Távora no seu relatório. ·(Pe Manuel do Rosário Pinto). -
Terminado o forte em 1643
nele seinstalou aguarnição portuguesa enquanto os holandeses
continuavam na fortaleza de S. Sebastião. De princípio houve luta, reduzida a
frequentes rebates· e bombardadas entre os holandeses da fortaleza e os
portugueses que dominavam a cidade. Passado pouco tempo consertou-se um modus
vivendi. Acabaramas hostilidades e os
holandeses vinham fazer feiraaté à
capela deS. Sebastião. Os moradores
voltaram à cidade, os soldadosportugueses foram licenciados, o forte português desguarnecido de
militares
De repente o generalbatavo mandou a Lourenço Pires de Távora um
ultimato que expiraria às 4 horas da tarde de Dezembro de 1644. O governador
português era intimado e demolir o forte dentro de horas, podendo no entanto
levar a artilharia e as suas munições . Lourenço Pires de Távora apanhado de
surpresa ainda quis entreter o holandesescom respostas evasivase
interessar os habitantes na defesa; mas nem aquele admitiu delongas, nem estes
estiveram para incomodar-se.Assim o
governador cheio de amargura procurouesconder as munições eenterrar a
artilhariae incertodo futuro e a mercê aos inimigos , retirou-se
'para a fazenda doIlhéu de Santo Amaro.
O forte foi demolido e nunca mais serviu para fins militares. Na imaginação do
povo ficoua sua ideia associada a dos
holandeses, de onde o nome de Forte dos Holandeses e o nome da Roça,
Arraialdos portugueses·
Pelos anos de 1870,
pertencendo estaroça ao Estado, foi
entregue à guarnição para ser horta militar contribuindo assim para osustento da mesma.Achando-se também muitomal servida a cidade de instalações
hospitalares, tratou-se de escolher local para o novo edifício . U dos lugares
estudados e que tiveram o interesse da comissão, para isso nomeada, foi o alto
do Picão ou Forte dos Holandeses, como era conhecido. Só não foi preferido por
ao lado dele se encontrar um grande pântano. O cabeço histórico acabou, já nos
nossos dias, por ser arrasado para fazer desaparecer este e outros charcos que
rodeavam a cidade.
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