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domingo, 31 de março de 2024

O náufrago e a Páscoa da Ressurreição - Momentos de fé na Guiné Equatorial, em S. Tomé e em Lisboa, com registos do meu diário numa frágil piroga - Que maior tormento e suplício aquele!... À noite deitado no duro fundo daquele inconstante, encharcado, tosco madeiro escavado.

Jorge Trabulo Marques 




O náufrago que sobrevivi não perde a fé na providência divina – É também um ressuscitado, tal como o exemplo de cristo - Meus testemunhos de fé de quem andou perdido 38 dias numa frágil piroga no Golfo da Guiné.

Nunca me dei por vencido ou cruzei os braços mas nem por isso deixei de estender os meus olhos e as palmas das mãos aos céus, orando e suplicando a ajuda divina e creio que nunca me faltou – Naturalmente, procurando sobreviver dos recursos que o mar me oferecia, de aves que pousavam na canoa, de tubarões e outros peixes, que pude pescar, tendo mesmo chegado a beber água salgada, quando a das chuvas me faltava.




                       
Em Julho de 2017,  tive a oportunidade  de voltar à Guiné  Equatorial,  42 anos depois, graças à  amabilidade do  Embaixador  Tito Mba Ada - Estive numa das igrejas e até presente em coros religosos de rua a agradecer a Deus  por me ter ajudado a sobreviver  ao longo daqueles dramáticos 38 dias e noites - O mesmo já havia feito, em Novembro de 2014 quando voltei a S. Tomé, 39 anos depois, em 2014, numa das homilias na igreja Catedral - Posteriromente, tomei parte nas jornadas da juventude em Lisboa, no encerramento de uma das cerimónias  da Guiné Equatorial na  visita do Papa Bento XVI  a Lisboa. -https://canoasdomar.blogspot.com/2023/08/jornadas-da-juventude-da-guine.html
Neste video alguns desses momentos, bem como algumas imagens e registos gravados do meu diário de Bordo.  - 




Depois de tantos combates no mar dos tornados e tubarões
Oh Deus Meu!.. Ó Deus dos céus! Queridos Anjos dos Céus!
Mesmo assim, embora de fome e sede muito ressequido!
Torturado por mil angústias e infindas incertezas e ansiedades!
Abandonado ao sabor de alterosas vagas e brutais tempestades!
Vós, ó meu anjo dos Céus! Talvez nas alturas meio adormecido
por tantas infinitas horas de sentinelas à Terra e aos Céus
mas sempre atento, silencioso, protetor e vigilante
creio que em instante algum me abandonastes!



Nunca me olvidastes à vida! - À luta e a sempre resistido!
A água do mar ainda permaneceu esverdeada de um azul retinto
Porém, meus olhos, embora vertessem lágrimas de maresia e sal
Em momento algum, se cansaram ou deixaram se se arregalar!
De, em todo aquele vasto e imenso perímetro de céu e mar"
De escorrer e de orar sucessivos rosários de sentidas orações





Ó Deus Omnipotente e Salvador!... Ó JESUS CRISTO!...Ó BELO E MAGNÍFICO EXEMPLO  SENHOR MEU!... Que maior tormento e suplício aquele!... Deitado no duro  fundo daquele inconstante, 
encharcado, tosco e frágil madeiro escavado!… Porém, mesmo assim, quão doce e infinito era aquele meu tormento!... Quantas vezes, me lembrei da tua cruz e do teu calvário!... Quando já estavas prostrado e rendido às leis da morte e da vida para te lançarem estendido ao sepulcro!.. Quantas!... Quantas vezes!... Quando tudo à minha volta me parecia revolto e perdido… Sim, no meio avassalador daquelas espessas trevas e noites de breu, cercado pelo tumulto 
escuro do mar e do céu! E, ante a imensa e tenebrosa solidão, apenas se me afigurava vislumbrar o perfil do teu piedoso rosto… Embora triste e macilento, banhado de suor e de lágrimas!... Mas coroado de esplendorosa caridade e de compaixão… por aqueles mesmos que te traíram e não compreenderam a tua humana, divina e nobre missão! Mas aos quais a áurea que iluminava a tua face, me parecia resplandecer apenas emanada por  um infinito sentimento de amor e perdão…

Enfrentando tempestade
Sim, no meu caso,  muitos foram os momentos de extrema aflição, que me pareceram verdadeiras eternidades, especialmente durante os longos e difíceis 38 dias, enfrentando tempestades, sucessivas, o doloroso sofrimento da incerteza e da fome, o suplício da  sede, com tanta água à minha volta e, por vezes, mesmo bebendo-a, não podendo matar a sede, além de constantes e quase mortíferos ataques de tubarões – porém, de todas as memórias que perduram – e estou certo que perdurarão para o resto da minha vida – o que mais me apraz registar – em todo o imenso somatório das minhas vicissitudes,  é o espírito de  determinação, de coragem e de uma infinita paciência,  o de, nunca, em momento algum, me ter resignado ao extremo abandono e solidão, de lutar, de jamais me ter rendido a  cruzar os braços, face às imensas dificuldades, mas o firme e constante propósito de as poder superar.

E, pelo que  pude depreender,  esta foi justamente uma das mensagens, que julgo ter podido transmitir, com a minha exposição “ Sobreviver no Mar dos Tornados, 38 Dias à Deriva numa Piroga, que apresentei, de 28 a 30 de Julho,  em 2015,  no Centro Cultural Português, em S. Tomé,  depois da 1ª exposição no Padrão dos Descobrimentos, em Março de 1979, além das que pude apresentar posteriormente, em Foz Côa, sede do meu concelho e na cidade da Guarda, capital do meu distrito, e mais recentemente,  na freguesia de Santa Comba.  



 


sexta-feira, 29 de março de 2024

Hoje é Sexta-Feira-Santa - Tempo de recolhimento, de silêncio e reflexão Após caminhada sobre os penhascos e as fragas do meu tempo na aldeia que me viu nascer e crescer, aqui os recordo e medito

                                                                Jorge Trabulo Marques 

Sexta-Feira-Santa - Tempo de recolhimento, de silêncio e reflexão
Após caminhada sobre os penhascos e as fragas do meu tempo|
Sinto confundir-me com a nudez das pedras, contemplo e reflito
Confiante de que, na liberdade e no fluido da luz,
abrindo meus braços aos céus possa imitar Jesus!
Sim, que, na limpidez e harmonia da matéria transparente
possa encontrar o significado da oração que me transcende!
Como derramada fonte que me eleva e consagra na minha cruz!



Em vida, cada um leva a sua cruz
até que a voz da eternidade o chame
para o lado de lá da outra margem.
Independentemente de ser ou não Cristão,
da qualquer crença que siga e professe,
nunca será demais abrir os braços aos céus e meditar
nos bons exemplos Naquele que se deixou crucificar
em defesa de um ideal de que julgava servir a humanidade!



quinta-feira, 28 de março de 2024

São Tomé - Na baía dos imbondeiros milenares - Lagoa Azul - Das árvores de troncos gigantes e de muitas memórias inscritas Os mais volumosos e mais velhos do mundo, chegam a ter 500 metros cúbicos de madeira.

Jorge Trabulo Marques - Jornalista 

Pertencem à família botânica da Adansonia digitata, árvore de grande porte que pode viver mais de 2 mil anos, com uma grande capacidade de resistir a longos períodos de seca


Nestas praias tranquilas é impossível não contemplar o verdadeiro estado puro da natureza, as águas limpas e translucidas, as diferentes tonalidades das águas, entre outros aspetos que cada um aprecie, tais como a desova das que ocorre entre Setembro a Abril.

Lagoa Azul fica protegida numa enseada, pelo que as suas águas tranquilas, de cor turquesa, são um dos destinos favoritos na ilha de São Tomé.

Localizada a cerca de meia hora da capital, esta pequena enseada apresenta água azul transparente e de excelente temperatura. Está rodeada de pedras vulcânicas e embondeiros e é excelente para a prática de pesca submarina.


O gênero Adansonia – batizado em honora ao botânico francês Michel Adanson (1727-1806) – reúne oito espécies, sendo seis na ilha de Madagascar e outras duas no continente africano. Todas com um sistema radicular poderoso e engrossado. É visto em áreas da África do Sul, Botswana, Namíbia, Moçambique e outros países africanos, sempre nas florestas quentes e secas, em áreas livres de geadas que recebem pouca chuva, onde os solos são bem drenados. Sua curiosa silhueta, um tanto extravagante, é característica e mostra um tronco grosso e esponjoso com uma casca dura que guarda no seu interior milhares de litros de água. Para os povos da África simboliza a vitória da força e determinação. As flores malcheirosas se transformam em frutos que servem como alimento, tanto para os humanos como para os animai Das árvores de troncos gigantes e de muitas memórias inscritas Os mais volumosos e mais velhos do mundo, chegam a ter 500 metros cúbicos de madeira.

quarta-feira, 27 de março de 2024

S. Tomé e Príncipe - Professores exigem salário mínimo de 400 euros – Tem sido de cerca de 100 euros, ou sejam 2.500 dobras - Abrange cerca de 65 por cento de famílias são-tomenses - As reivindicações arrastam-se desde o principio do ano, com paralisações desde há 26 dias - Agora manifestaram-se nas ruas da capital envergando trajes de luto.

                                              Jorge Trabulo Marques - Jornalista 

O PM Patrice Trovoada diz que o governo não tem dinheiro para pagar aos professores e educadores, como salário base.

Como é possível sobreviver com  100 euros mensais? - O que vale são os frutos da terra, que as ilhas produzem ao longo de todo o ano.  49 anos depois da independência, as condições de vida do grosso  da população, nem por isso conheceram substanciais melhorias.  

De luto e empunhando cartazes com várias mensagens, centenas de professores e educadores percorreram as diversas ruas da cidade de S. Tomé exigindo um salário digno. A manifestação pacífica acontece depois de 26 dias de greve que paralisa praticamente todas as escolas públicas do arquipélago.

Reclamam “o custo de vida muito alto, o nível de endividamento insuportável, stress profissional, pressão psicológica, transferências injustificadas, muitas vezes para outro distrito, falta de formação […] enquadramentos e promoções insuficientes, perda de direitos consagrados no Estatuto da Carreira Docente, desvalorização da atividade docente, congelamento de benefícios, estagnação da progressão na carreira, abandono forçado” e outras situações que “tornaram o exercício da profissão muito desgastante, difícil e particularmente desestimulante para integração”.

Existe neste momento atraso de pagamento de salários dos professores, de cerca de seis meses, incluindo os professores reformados que foram contratados. Há um descontentamento em quase todos os níveis, e que o ministério se preocupe com a solução destas questões", acrescentou o líder sindical

 

Nas condições em que nós vamos trabalhar não é possível garantirmos uma educação [de qualidade] às crianças de São Tomé e Príncipe e a nossa paralisação é exatamente para garantir que haja condições para que um professor consiga trabalhar, ensinar e que um aluno também vá para escola e consiga apreender, porque toda a gente sabe que o ensino está a degradar-se de ano para ano", disse o líder sindical

terça-feira, 26 de março de 2024

A VOZ DE UM NÁUFRAGO no meio de uma tempestade tropical - No Golfo da Guiné, há 50 anos - No mar dos tornados e tubarões - Ao 22º dia a bordo de uma piroga -Registo do meu diário de bordo num pequeno gravador que pude preservar num vulgar caixote de plástico, igual aos lixo, bem como a máquina fotográfica.

Jorge Trabulo Marques  - A voz de um náufrago no meio de um tornado 
Excertos gravados do meu diário de bordo 11-11-1975 

Ao fim da manhã do 22ª dia, confirmavam-se os meus receios:  - Surge a tempestade: o que eram sinais de velada ameaça, subitamente, transformam-se num afrontoso pesadelo - O mar!... O mar!... Quando se enfurece, o mar é sempre igual em qualquer parte.
 Mas ainda tinha pela frente mais 16 dias, até acostar à Ilha de Bioko, em Dezembro de 1975, onde fui preso e condenado à forca por suspeita de espionagem. Felizmente, lá me salvei, graças a uma mensagem que trazia comigo do MLSTP para ler quando chegasse ao Brasil, que era a travessia que me propunha fazer. - Voltei lá em 2017 para agradecer a quem me salvou daquele pesadelo de cinco dias numa das cadeias mais sinistras de África e talvez da Terra.


Diário de Bordo 4- Neste momento estou a enfrentar violenta tempestade! Tive que lançar a âncora flutuante. A canoa correu sérios riscos!...Nunca estive em tantas dificuldades como agora!… mesmo assim o tempo acalmou ligeiramente, mas ainda continua a tempestade a sentir-se e arrastar-me agora de este para oeste!… Está a retardar novamente a minha viagem!... Devem ser aí umas 11 horas da manhã!…Estava uma manhã estupenda e, de um momento para o outro, apareceu esta tempestade que ameaça a todo o instante virar a minha canoa.

Baú onde pude preservar as memórias que me restam
Diário de Bordo 5 -O mau tempo continua a fazer sentir-se!... Não sei qual o destino onde vou ter!… É difícil neste momento fazer qualquer prognóstico… É um tornado dos maiores que tenho enfrentado...E o pior foi encontrar a minha canoa na posição pior de segurança, porque, a canoa, tem uma posição em que pode enfrentar mais ou menos as tempestades...Tive que lançar a âncora e um bidão de plástico que força com que a canoa fique ligeiramente de proa à vaga…De qualquer modo, a situação continua melindrosa!... Agora não chove mas está a fazer uma grande ventania e o mar está muito cavado!... Estou a ser arrastado para Sul, portanto, estou a ser retardado!... As perspetivas de chegar a terra, estão a ser cada vez mais morosas. É realmente uma situação verdadeiramente dramática!... A canoa esteve há pouco à beira de se virar!... Só por muita sorte, só por milagre não se virou!...

NESTES MARES, EM QUE OS DIAS SE REPARTEM POR IGUAL COM AS NOITES, TUDO É SÚBITO E INESPERADO: Uma simples nuvem no horizonte num claro céu azul e limpo, tanto pode significar o princípio de uma tempestade, como de uma podre calmaria  - Agora, as alterações climáticas estão profundamente alteradas, em todo o planeta; não sei se, naqueles mares, para pior ou melhor - Mas há 44 anos, eu vivia ali um longo e tormentoso drama  Ao sabor dos ventos e das correntes e balanceado para todos os quadrantes. 

Diário de Bordo 6 - Sinceramente, o tornado já passou... Está agora a notar-se a ressaca... Estou bastante afastado da Ilha de Fernando Pó, muito afastado!...Estou convencido que não vou ter a oportunidade que já tive...Neste momento, não sei qual a minha posição; estou bastante para Sul!... Não sei se voltarei a ter a oportunidade que já tive!... Afinal o que me interessa é terra e eu parece que estou a brincar com o meu destino!... Não pode ser!... Estou francamente perturbado neste momento!... Vou ver se consigo conservar o máximo de calma!... Mas já estou saturado... Estou cansado... Estou com fome!… Estou longe de terra! Agora estou muito mais longe do que já estive!

Mais afastado de terra e fatigado.  Não estou desiludido ou desesperançado. Pelo contrário, sinto-me mais forte e mais habilitado. O mar já não é aquele lençol líquido rebelde e ondulante, a sua fisionomia está moribunda  e não demorará a quedar-se numa ténue e plácida superfície.

Diário de Bordo 7 - Duas horas já são passadas... Não há vento. O mar tem uma ligeira ondulação: está mais ou menos calmo... Depois de um grande susto e de momentos de grande aflição... Porque, de facto, a trovoada foi violenta e ameaçou a cada momento voltar-me a canoa, não tivesse eu lançado a âncora flutuante, aliás, que é um sistema que eu improvisei (com um bidão de plástico, amarado a uma corda e à proa da canoa, na primeira noite em que fui assolado pelo tornado, forçando-a a ficar de proa à vaga e que me fez perder o remo e o leme e alijar da maior parte dos alimentos, para evitar ir ao fundo)  mas cheguei à conclusão que posso muito bem dar a terra, à costa de África... Quer dizer...se não houver vento de sul para norte, não preciso de pôr a vela, porque a corrente me arrasta... Se a trovoada surgir de sul, ponho a vela e a canoa evolui para noroeste...portanto, para a costa de África. Cheguei também à conclusão de que, realmente, numa tempestade, a embarcação não pode ficar completamente à deriva; se ficar com a vela, furta-se às vagas e não se vira tão facilmente. Claro que a vela tem de ser pequena, porque, se for grande, pode-se voltar...Por exemplo, neste momento tenho a vela e a canoa está a evoluir para a noroeste...E é pena não haver um pouco mais de vento... Portanto, eu posso muito bem ir dar à costa de África, tanto à Nigéria, como ainda a Fernando Pó. Para ir a Fernando Pó, basta que eu ponha a vela, quando houver vento de sul para norte; não preciso de remo sequer; basta prender a vela; prendo-a e então a canoa desliza para nordeste

Neste momento, já estou mais otimista... Depois daqueles momentos de grande aflição, em que vi quase a canoa virada e tive que me deitar para um dos lados, porque a canoa esteve mesmo... Havia vagas grandes, alterosas!…Entretanto, lancei um plástico agarrado à âncora  (a âncora flutuante), isso fez força, esticou a corda e evitou que a canoa se virasse... A canoa, correu realmente o risco de se virar!... Ora isso não pode acontecer de maneira alguma... Aliás, uma pessoa, nestas condições, a cabeça tem que estar sempre a pensar!... Sempre a improvisar... Não podemos cruzar os braços perante o perigo...Temos que ter sempre ideias novas para fazer face a novas situações... Este é um predicado muito importante... Pois nunca se pode uma pessoa dar por vencida!...Pode chatear-se, saturar-se, enfim, desanimar um pouco, mas por vencida nunca se deve dar!... Eu, apesar de tudo, apesar de já estarem 22 dias passados, aqui nesta situação, verdadeiramente dramática, muito difícil, eu não me dou por vencido!... Eu sei que hei-de ir dar a terra, custe o que custar!... A menos que a canoa se parta, mas isso não há-de acontecer

Livros pouco tempo para os ler
Diário de Bordo - Um pormenor curioso: tem piada que tive uma manhã bonita, uma manhã de sol!...Estava eu a ler um livro: “A Funda” de Artur Portela Filho, quando comecei a ver nuvens escuras e a ouvir um murmúrio, um ruído enorme: vi logo que era vento!... Pois, mal dei aqui uma arrumadela à canoa, surgiu logo essa trovoada, e de que maneira!

O céu por cima da minha cabeça está praticamente desnudado. Mas não tem aquele tom luminoso de um puro azul, que me inspira alegria.  Está encoberto por uma fluidez baça, por uma película levemente brumosa e prateada. Porém, em toda a periferia do horizonte, notam-se altos cúmulos. Estas nuvens têm aspetos muito giros mas algo misteriosos e inquietantes que não me inspiram absoluta tranquilidade. Porventura, reservam-me alguma surpresa desagradável....Vivo numa verdadeira inconstância de altos e baixos...

Diário de Bordo 8 - São neste momento perto das quatro horas da tarde, sensivelmente. Agora há uma paz!... Há um silêncio...O mar está calmo, sereno!... Um verdadeiro contraste com o mar que há bocado estava..O céu tenuemente enevoado, o sol mal se faz sentir....Sinto-me absolutamente desprezado neste momento!

Sinceramente, estou saturado! Saturado, porque não estou a navegar, a fazer da canoa aquilo que eu quero...Estou à mercê do mar, dos ventos, das correntes, das trovoadas!... Sou para aqui aquilo que os ventos e as correntes quiserem!...Estou farto de vislumbrar o horizonte, em busca da desejada costa africana!... Vejo lá longe Fernando Pó...Se calhar tenho de ir para lá, porque, senão às tantas, nem para lá nem para outro lado!...

Sinto ao mesmo tempo uma réstia de esperança... Há bocado vi que a minha canoa podia-se ter voltado de um momento para o outro!... Correu sérios riscos!...Eu não perdi a esperança, apesar de tudo...Tenho tido bastante sorte, também....

Não há ninguém...Nem um barco de pesca, nem um barco!... Não vejo nada!… Nem aves, tão pouco... Nem peixes!... Apenas os tubarões, azuis e os martelos, continuam em volta...Mais nada!... A água tem uma cor escura!...Não sei que dizer mais... Esperar, até quando?!.. Esta ânsia!... Quando eu posso pisar terra firme?!...Quando?!...

Entretanto, tenho aqui o meu pequeno aparelho com o qual , quando tenho um bocadinho de disposição, me vou entretendo a ouvir música (ligo o pequeno rádio, aliás, à Rádio Nacional de São Tomé) - Neste momento está a dar música .Ouve-se aqui perfeitamente apesar da distância. Hoje tem estado a transmitir muitos trechos de música africana. Hoje é o dia da Independência de Angola. Um dia de festa para muita gente e para mim um dia tão triste!

domingo, 24 de março de 2024

Domingo de Ramos a terminar - Que traga um ramo coroado de flores , de paz e de amor à humanidade – Nossos votos com um poema do Bispo Dom Manuel dos Santos e de Miguel Torga

Eu sou a luz do Mundo, diz o Senhor
Quem me segue não anda nas trevas,
mas terá a luz da vida! (jo 8,12)

Nos caminhos escuros da noite
nas veredas das montanhas esquecidas
Tu me guias, Tu és a luz!

Nas horas de angústia e de medo
nos momentos de solidão e dor
Tu me guias, Tu és a luz!





Nas tempestades do mar do silêncio
nas horas de abandono e tristeza
Tu me guias, Tu és a Luz!

Nas veredas de sede e de cansaço
nos desertos de areia e de miragens de enganos
Tu me guias, Tu és a Luz!

E eu sei quem te protege
pode morrer numa cruz
mas descobre caminhos da vida
caminhos de luz!

D. Manuel dos Santos – Ex-Bispo da Diocese de S. Tomé e Principe
Do Livro Poemas de Vida e de Fé


Ponho um ramo de flores
na lembrança perfeita dos teus braços;
cheiro depois as flores
e converso contigo
sobre a nuvem que pesa no teu rosto;
dizes sinceramente
que é um desgosto.
Depois, não sei porquê nem porque não,
essa recordação
desfaz-se em fumo;
muito ao de leve foge a tua mão,
e a melodia já mudou de rumo.
Coisa esquisita é esta da lembrança!
Na maior noite,
na maior solidão,
sem a tua presença verdadeira,
e eu vejo no teu rosto o teu desgosto,
e um ramo de flores, que não existe, cheira!

Miguel Torga, Diário I (1941)



Diz a liturgia Cristã, que " o Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor marca a abertura de nossa Semana Santa e carrega, em si, a síntese do que celebramos como católicos: acolhemos e exaltamos a soberania e a majestade de Cristo, nosso Messias. Mas a sua realeza se dá não como no mundo. Cristo é Rei, soberano, que mostra seu poder no trono da Cruz, apagando toda mancha do pecado, e ressurgindo glorioso, pela nossa salvação.
Importante notarmos que em nossa vida espiritual podemos fazer o mesmo que os judeus fizeram, caso não compreendamos a lógica da realeza de Cristo: aclamá-lo com Rei e Senhor, e ao mesmo tempo, pelas nossas atitudes, crucificarmos a Jesus e afastarmos de nós qualquer menção à Cruz e conversão de vida. Vida e obras devem concordar!
Além disso, vale destacar que os Ramos que levamos às nossas casas não podem se tornar, para nós, objetos de superstição. Os Ramos servem para nos recordar a dinâmica de Jesus Cristo, Rei e crucificado. São, sim, um poderoso sacramental em nossas vidas, levando a bênção para nossos lares, porém, os Ramos só serão bênção se ousarmos entronizar, em nossos corações e vidas, o Cristo Rei, tal e qual celebramos na liturgia deste Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor.

sábado, 23 de março de 2024

Equinócio da Primavera 2024–03-20 – Maravilhosos momentos Luso--Santomenses- - Celebrados nos Templos do Sol, numa bela manhã florida e brilhante de giestas brancas, no maciço dos Tambores, aldeia de Chãs- Foz Côa, Santuário Rupestre da Pedra da Cabeleira de Nª Srª, acompanhados de calorosos recitais poéticos

 Jorge Trabulo Marques  -  Reportagem com poemas de Alda Espírito Santo e Manuel Pires Daniel 








Tributo à saudosa Mãe da Pátria Santomense , a poetiza - Alda Espírito Santo, 30-04-19 26 – 09-03-2020 - Poema lido por Ilídio Sacramento, natural das maravilhosas Ilhas Verdes do Equador

Escritora, poetisa, política, destacou-se na luta contra o fascismo e o colonialismo. Foi uma figura emblemática da luta pela independência de São Tomé e Príncipe.
Reconhecida pela sua verticalidade, coerência e coragem, esta cidadã constitui uma referência incontornável nos grandes valores que estiveram na origem da luta do povo são-tomense pela libertação do jugo colonial-fascista e pelo progresso social.



Foram lidos poemas de três poetizas santomenses, Alda Graça Espirito Santo, Conceição Lima e Olinda Beja, bem como de Manuel Daniel, de Dom Manuel dos Santos, ex- Bispo da diocese de S. Tomé e Príncipe, Manuel Alegre, Maria Assunção Carqueja, esposa do Prof Adriano Vasco Rodrigues, a quem ficamos a dever o primeiro estudo da Pedra da Cabeleira de Nª Sra. De Natália Correia, Manuel Alegre e de uma poetisa ucraniana, cujos resgistos sonros contamos publicar na medida do possivel.



POETA MANUEL DANIEL - ERA UM DOS NOSSOS PEREGRINOS - Não o podemos também esquecer --Os seus poemas fazem parte das nossas celebrações

Deixou-nos, em 22 de Janeiro de 2021 -  Foi uma das vitimas da Convid 19 - Natural de Meda, tendo residido, desde há vários anos, em V.N. de Foz Côa, onde fez grande parte da sua vida - Advogado, escritor, jornalista, poeta, dramaturgo, autor de 40 peças de teatro, nomeadamente para crianças, 20 das quais ainda inéditas - Espírito solidário e associativo, de sensibilidade relevante, em associações de solidariedade social, nomeadamente no Lar da Santa Casa da Misericórdia e na Associação Humanitária dos bombeiros de Foz Côa na qual foi seu Presidente da Assembleia Geral, 20 anos, desde 1979 a 1999

A manhã raiara coberta de uma etérea neblina, porém, apesar da sua beleza, parecia ir ofuscar e não propiciar o mais surpreendente raiar do sol no primeiro dia da primavera, no hemisfério Norte. E, naturalmente, quem ali se desloca é para poder desfrutar dessa maravilha de Deus.


Sim, por via de algumas névoas e neblina, perderam-se os momentos iniciais da entrada dos raios solares na venerável gruta que atravessa o majestoso monumento megalítico, contudo, mesmo assim, o luminoso astro divino, ainda se abriu e nos propiciou a tão abençoada e desejada imagem, que purifica, transmite alegria e encantamento aos olhos dos peregrinos que ali se deslocam

Um punhado de amigos, mas todos imbuídos por uma forte e calorosa espiritualidade, numa cerimónia simples, mas prenhe de esplendor e magia

Além da participação, da já habitual colaboração de José Lebreiro e de Agostinho Soares, pudemos contar com a amável presença amiga de Ilídio Sacramento, natural de S. Tomé e Príncipe e de sua esposa, Diana, de nacionalidade americana, que aqui se deslocaram expressamente para nos abraçar e partilhar da alegria deste nosso tradicional evento - Residentes nos no Canadá, desde há vários anos, onde contraíram matrimónio e tiveram lindos filhos e lindos netos . Ambos possuidores de um prestigiado currículo profissional.

Uma vez mais o nosso abraço amigo por tão calorosa e amistosa partilha, assim como também a outros nossos amigos, que, conquanto não pudessem estar presentes, tiveram a gentileza e amabilidade de nos dirigirem mensagens de estimulo. Nomeadamente, Pedro Daniel e António Lourenço, ex-autarca desta freguesia, ao longo de mais de 30 anos, e ao qual tanto esta aldeia lhe deve pelo seu abnegado entusiasmo e dedicação