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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Comemorações do 64ª aniversário do Massacre do Batepá, em Fernão Dias, ensombradas com as ausências das várias igrejas em protesto pelo sectarismo de Patrice Trovoada, que mais uma vez quis transformar um ato histórico, de morte e sofrimento, num comício-festa-partidário - Situação nunca vista desde que, há 41 anos, se presta homenagem aos que ali tombaram - Neste post ainda a entrevista ao Juiz português que disse que o capataz do campo de concentração era um homem que teve muitos maus princípios, que estava a cumprir penas muito pesadas por crimes muito graves”

Jorge Trabulo Marques - Jornalista

J












orge Trabulo Marques - Jornalista - Informação e análise 

Uma coisa é o respeito pelo credo de cada um, outra é usar o credo para fins meramente mercantis - Este parece ser o objectivo de um governante que não olha a meios para atingir inconfessáveis  objetivos. - Informações vindas de São Tomé dão-nos conta que  a religião islâmica - tida como professada pelo atual Primeiro-ministro Patrice Trovoada - tem vindo a ser  sorrateiramente implantada em toda Ilha. Inicialmente, com  doações de géneros alimentares, depois com ofertas de casas sociais aos mais carenciados e agora até já se fala na construção de uma grande mesquita muçulmana. Daí as preocupações, que o  oportunismo de Patrice Trovoada está a gerar nos espíritos mais atentos e  esclarecidos. Aliás,  quem ler com atenção o seu livro, "Patrice Trovoada - Uma Figura Africana", poderá entender o que realmente vai na cabeça das suas obsessões doentias ou pela sua  exacerbada vaidade,  exibicionismo e ânsia de poder financeiro e politico.

PELA PRIMEIRA VEZ, DESDE HÁ 41 NOS - IGREJAS NÃO ADERIRAM ÀS MANOBRAS  HIPÓCRITAS  DE PATRICE TROVOADA   E NÃO SE FIZERAM REPRESENTAR EM FERNÃO DIAS 

Depois de tanta propaganda pela rádio e televisão, do envolvimento do Governo, eis que, Patrice Trovoada, quis aproveitar a efeméride das comemorações do 3 de Fevereiro para fazer mais uma campanha política, ao seu estilo vistoso e demagógico, tal como  o havia feito no ano passado  - Com uma diferença: é que em 3 de Fevereiro de 2016, o folclore teve lugar após a cerimónia; agora ele queria comandar a propaganda  à cabeça  da popular e já tradicional "Marcha da Liberdade, que, manhã cedo,  havia  partido da Praça da Independência 

Por isso, desta vez, vai de aguardar  à entrada do caminho para a  Roça Fernão Dias e depois ali se integrar  à frente da  multidão, em clara atitude de populismo e promoção pessoal, arvorado em grande líder pela luta da liberdade,  quando ele, afinal, a amordaça todos os dias,  dando mostras de ser o seu  principal agressor, quer nos órgãos de comunicação social, quer no desprezo como tem votado  o Povo das Ilhas, em constantes e prolongadas passeatas despesistas pelo estrangeiro. 

GRANDE DECEÇÃO  GERAL  - POVO SÓ NÃO  REAGIU À BRONCA PORQUE FOI DE SEGUIDA ENCAMINHADO PRÁS TENDAS DOS COMES E BEBES  - Com absoluto desprezo para as lágrimas e o sentimentos dos que ali foram recordar ou mesmo ainda chorar as lágrimas do seus mortos

Pois qual não foi a desilusão das várias centenas de pessoas que ali se concentraram  na ponte de Fernão Dias, quando verificaram que, a cerimónia principal afinal se cingira a mero formalismo protocolar,  não tendo durado  mais do que 15 minutos. 

Isto porque, após a deposição da coroa de flores pelo Presidente Evaristo Carvalho e Hino Nacional, deveriam seguir-se,  com habitualmente, as manifestações religiosas de algumas das mais conceituadas confissões religiosas implantadas em São Tomé e Príncipe, como a Igreja Católica, Adventista, Evangélica e Nova Apostólica e não estavam no local 

Depois do moderador da cerimónia ter chamado a Igreja Evangélica na pessoa do seu Pastor, que dirigiu algumas palavras aos participantes, ao ser chamada  a Igreja Adventista para atuar, tornou-se notório que,  nesse momento, afinal, não se fazia  representar, portanto na estava no local.

Esta imagem este ano não se repetiu
 Os organizadores procuraram disfarçar o fiasco, chamando as outras igrejas mas o que  não esperavam - para espanto geral - é que  também outras confissões religiosas, tivessem tomado idêntica postura,    particularmente a Igreja Católica, a qual  nunca ali deixou de marcar presença, de ali proferir os seus cânticos e orações, enfim, de se fazer representar ao  mais alto nivel,  na pessoa  do  Bispo da Diocese. 

Sem alternativas, lá tiveram então que dar por encerrado o ato cerimonial, com  profunda decepção estampada nos rostos dos populares, que ali se juntaram,  enfurecidos pela ligeireza e falta de dignidade de tão importante momento solene, culpabilizando o Governo por tão manifesta frustração. tanto mais que é sabido que o islamismo, confessado pelo Primeiro-Ministro, não visa unir os credos e conceder-lhes o mesmo apoio e facilidades mas fomentar a expansão  sua religião com fins  meramente políticos e mercantis para justificar os apoios e as boas graças de alguns países árabes.

Para evitar desacatos,  a multidão foi então encaminhada para os comes-e-bebes do governo -  claro para que cada um abrisse os cordões à bolsa e se desfizesse dos parcos centavos - junto  das dezenas de barracas montadas para venda de bebidas e comidas - diz quem lá esteve - mais parecendo um arraial  festivo  de que uma cerimónia  para recordar  a memória das centenas de vidas que ali barbaramente  tombaram em Fernão dias, por ordem do famigerado Governador Carlos Gorgulho. 

TELEVISÃO   NÃO MOSTROU VERDADEIRAMENTE O QUE ALI SE PASSOU - E TAMBÉM FAZ DISCRIMINAÇÃO NAS CELEBRAÇÕES CRISTÃS DO  NATAL E DA PÁSCOA

O ano passado - ele fez festa mas depois da cerimónia
 Obviamente,  que, dado o claríssimo fiasco da cerimónia, estas coisas não iam - como não foram -  ser divulgadas  pelas câmaras da TVS que todos os anos faz uma edição especial do acto central, mas que este ano, decidiu fazer vista grossa  do que, em concreto,  ali se passou

Em São Tomé e Príncipe toda gente lamenta este facto, dizendo  mesmo que foi um gesto de represália pelo facto do Presidente da República, não ter ido às celebrações de Sto. Amaro e Sto. Isidoro e ter preferido ir a Inauguração  da Igreja Universal do Reino de Deus que aconteceu no mesmo dia.

Por outro lado, também subsiste  o desagrado, que cada vez mais se vai generalizando, nomeadamente nos católicos, mais atentos, ao aperceberem-se, que, sempre que Patrice Trovoada está no poder, contrariamente ao habitual, em épocas de Natal e Páscoa a TVS não passa os filmes sobre a vida e morte de Cristo

UM PARA-QUEDISTA SEM AFECTOS NEM RAÍZES, NUMA TERRA ONDE NÃO NASCEU NEM CRESCEU   -  PARA O MERCENARISMO POLITICO TODOS OS FINS JUSTIFICAM OS MEIOS

Patrice Trovoada, enquanto precisou de Taiwan 

Nascido no Gabão, e sem grandes laços de afecto a uma terra, que só conheceria, já em  adulto,  e . sobretudo, tratando-se de um empresário que tem dado mostrar, mais de enriquecer através da ascensão politica e promoção  pessoal, de que propriamente envolvendo-se em ações  do progresso  e o bem-estar das populações, esta será, porventura, uma das estratégias do seu  golpismo misterioso, com vista a captar a simpatia dos petrodólares dos países árabes - Não tanto pela convicção da sua crença religiosa  mas para dar seguimento às suas obscuras intenções, procurando promover o islamismo em detrimento da predominância dos demais credos religiosos, tanto da igreja católica, como das protestantes, abrindo, porém, uma exceção, à igreja universal do Reino de Deus, conhecida por se transformar numa autêntica fábrica de fazer dinheiro sob a batuta das extravagâncias de um  pastor milionário, com expressas orientações aos seguidores para manipularem consciências, corromperem este mundo e o outro – desde fiéis a políticos  - conquanto possam prosperar as remessas dos peditórios e engrossar os dízimos.

UMA IGREJA QUE COLHE OS FAVORES DE UM PRIMEIRO-MINISTRO EMPRESÁRIO - Para o qual tudo é moeda de troca, ou como ele disse: "Ninguém dá sem receber" 


Em S. Tomé - Jornal Transparência
S. Tomé - Jornal Transparência 
O exemplo, mais recente, de que,  para a politica mercenária, todos os meios são legais, ocorreu com a inauguração de um enorme edifício, de dois pisos, com um vasto salão  para as suas práticas religiosas,  junto à antiga cadeia, quase na zona centro da capital – Além de mediático acontecimento religioso, foi também um evento politico e social, uma vez que também contou  com a presença do Chefe de Estado, Evaristo Carvalho, que quis  expressar  “a sua grande alegria pela inauguração do templo nacional, tendo aproveitado a oportunidade de reafirmar a sua total disponibilidade em promover a igualdade de tratamento entre as religiões existentes em São Tomé e Príncipe”- http://www.jornaltransparencia.st/1394.htm

Além do Chefe do Estado (nesse dia, Patrice Trovoada estava ausente do pais) compareceram também  membros do atual Governo, entre outras entidades, além de representações - a nível de pastores, bispos, obreiros, membros fiéis e demais convidados - , que vieram  de Angola, Cabo-Verde, Guiné-Bissau, Guiné-Equatorial, Moçambique, Brasil e de outros países

Nesse mesmo dia, decorriam as celebrações de Sto. Amaro e Sto. Isidoro e  nenhum dos membros ali compareceu,  ao contrário do que sucedia  em anos anteriores, uma vez o povo santomense ser maioritariamente  seguidor da religião católica.

UM GOVERNO EM ABSOLUTO CONFRONTO E DESRESPEITO COM OS SENTIMENTOS HISTÓRICOS, SOCIAIS  E RELIGIOSOS  DAS POPULAÇÕES   


A igreja católica é o mais antigo credo religioso em S. Tomé e Príncipe, com várias igrejas e ermidas nos principais centros urbanos das duas Ilhas, além das capelas que foram erguidas em grande número das roças.  Atualmente, não obstante a existência de outros credos, ainda continua a ser a preferida por uma percentagem substancial da população, tal como tem sido demonstrado, sobretudo nas festas dos santos mais venerados e populares, onde as procissões costumam ser muito concorridas  com as suas  grandes manifestações  de fé e  de religiosidade


Pelos vistos, nada é pacifico para um governo que, em vez de procurar a via do diálogo e da transparência, busca as vias do autoritarismo, do confronto e da arrogância, se bem que disfarçado de cínicos sorrisos e demagógica propaganda – Em tudo onde se envolve, tem que seguir o seu golpismo politico, com absoluto desrespeito para os costume e tradições das  populações,

 Vejamos o  caso das comemorações do 3 de Fevereiro: há dois anos, em 2015, começou pela
mudança das celebrações da histórica Praia de Fernão Dias, onde há mais de 60 anos tradicionalmente os são-tomenses se concentravam para recordar os seus mártires, para uma cerimónia mais citadina, mais ao estilo do menor esforço, da mudança da referida efeméride
para o Museu Nacional, procedimento este que não foi bem acolhido pela população, o qual, além de descontentamento popular inerente, suscitou também viva reação pela elite intelectual santomense menos conformada e mais consciente: em 3 de Fevereiro : Historiadores acusam o Governo de irresponsabilidade  e de tentativa de deturpação da história ... - Télanon 



O ano passado, a cerimónia decorreu na praia de  Fernão Dias, com a inauguração  de um memorial às vitimas, naquele local onde foi erguido um campo de concentração que provocou centenas de mortes. : o evento foi bem aceite, com significativa participação popular, do então Presidente Manuel Pinto da Costa e sua casa civil e militar, Primeiro-ministro Patrice Trovoada, membros do Governo, embaixadores, várias entidades nacionais e estrangeiras, confissões religiosas   e a presença de alguns dos sobreviventes dos Massacres do Batepá, tendo terminado com um autêntico comício politico no terreiro da Roça Fernão Dias





Este ano, a intenção era a mesma: não propriamente de comemorar uma data histórica mas dela tirar unicamente dividendos políticos, sobretudo numa altura em que é crescente o descontentamento da governação, com as condições sociais da população a degradarem.se, tipologia de  doenças desconhecidas a expandirem-se e sem que se descortinem forma de se  lhe fazer frente e de tranquiliza o Povo – E vai de promover uma festarola em jeito de romaria de comes e bebes..


Claro, que, promovendo imitativas deste género, onde as carências alimentares são gravosas – mesmo recorrendo aos frutos do mato – , era de prever que a ideia até ia colher natural agrado e  simpatia – O que ele não estava à espera é que, as confissões religiosas, que tradicionalmente  e fazem representar, virassem as costas a   quem vem dando mostras as atraiçoar em detrimento do islamismo e da igreja universal. 

NÃO LANÇARAM 12O HOMENS AO MAR PORQUE A TRIPULAÇÃO DO BARCO SE OPÕS




UM CABO-VERDIANO CORAJOSO - REBELOU-SE CONTRA O COMANDANTE DO NAVIO, EVITANDO QUE OS SANTOMENSES FOSSEM LANÇADOS  AOS TUBARÕES - MAIS TARDE A PIDE DESCOBRIU-O E METEU-NO FAMIGERADO CAMPO DO TARRAFAL

- Na imagem, o corajoso Bernardino Lopes Monteiro, com os dois filhos:  o mais  crescidote, o Vital Monteiro, falecido em 1974, e o mais novo, Victor Monteiro,  que chefiou o  Gabinete do ex-Presidente da República de S. Tomé e Príncipe, entre outras anteriores altas funções.

É uma das raras fotografias que tem de seu  pai.  envergando a farda azul de marinheiro, que  ele tanto gostava de vestir aos domingos, na antiga Roça Rio do Ouro, para onde, anos mais tarde, haveria de ir como contratado - Farda essa com a qual se orgulhava de  trazer à memória as suas recordações de imediato do navio António Carlos, designadamente da rebelião  que ali protagonizara, convencendo,  o resto da tripulação negra a juntar-se à sua indignação, evitando, com a sua coragem e heroicidade, tão horrível afogamento.

Como também trabalhei nesta roça, como empregado de mato, recordo-me perfeitamente da sua imagem: era o homem da leitaria: pelo seu aspeto fisico, até cheguei a pensar que fosse branco mas era mais um dos pobres sacrificados da escravidão daqueles tempos.

Toda a gente o conhecia e estimava: era uma pessoa muito comunicativa, amaével e simpática, que parecia saber um pouco de tudo e ter mais cultura de que os brancos que o chefiavam.



 CORONEL VICTOR MONTEIRO, FILHO DE BERNARDINO LOPES MONTEIRO - ELE CONTA O QUE LOGROU APURAR DE SEU PAI 

FOI NA HUMILDE ALDEIA DO BATEPÁ - ONDE TUDO COMEÇOU


O texto, que a seguir aqui vou reproduzir, editei-o ano passado por esta altura, na sequência de outros sobre o mesmo assunto, mas julgo que não por demais voltar aqui a editar algumas das suas passagens

Os Massacres do  Batepá, que começaram num remoto lugarejo, com o mesmo nome, perdido no mato e que depois se estenderam a várias aldeias, vilas e aos habitantes da cidade, lamentavelmente não é caso único, que só o 25 de Abril lograria terminar. É também o  da mártir aldeia do Colmeal situada algures numa escondida encosta da Serra da Marofa, Figueira de Castelo Rodrigo, que prefiguraria , igualmente, uma das páginas mais negras da História da Lusitânia moderna sob jugo e ocupação portuguesa. - 

.Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista (em S. Tomé de 196363 - a 1975) - E empregado de mato, nomeadamente na dependência de Fernão Dias - da antiga Roça Rio do Ouro, atual Agostinho Neto


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Foi precisamente há 64 anos mas a lembrança  desses ignóbeis acontecimentos permanece ainda bem presente na memória coletiva do Povo Santomense, as largas centenas de mortos que barbaramente foram espancados no Campo de Concentração de Fernão Dias,  



Em 1974, entrevistei algumas das vítimas para a revista Semana Ilustrada, de Luanda, uma das quais ainda  com feridas por sarar numa das pernas, com que foi acorrentada - Trabalhos jornalísticos esses que me haveriam de custar graves dissabores, violentas reações por parte, de quem não gostavava que se fizesse luz sobre os escamoteados massacres 

 REALIDADE HISTÓRICA , DEMASIADO NEGRA PARA SER BRANQUEADA




Enquanto, o celerado José Mulato, que, antes de partir para Portugal,  através da “porta do cavalo” do aeroporto de S. Tomé, disfarçado com as suas habituais vestes de caqui azul de carpinteiro) me confessara ter sido "uma máquina bruta a  matar",  saindo-se com esta abominável expressão,  sem o mínimo de remorsos: "matei mais de mil!"; sim, enquanto esse   criminoso,  que o Governador Carlos Gorgulho, foi buscar à prisão (do qual, aliás, já se servira, muito antes para atos intimidatórios de cobranças  e expropriações abusivas ou coercivas, não com vista a defender os interesses do Estado mas os bolsos de corruptos  altos funcionários da Administração ou dos roceiros) sim, enquanto esse facínora,  nomeado capataz-mor   das brigadas de recrutamento de trabalho forçado, e, posteriormente,  promovido a chefiar o Campo de Concentração de Fernando Dias, pois bem, não obstante esta hedionda confissão, já o todo  poderoso Governador, que, no dizer do então comandante da Polícia e seu ajudante de campo, se portava, em vários detalhes, como um ditador à maneira da Gestapo no tempo de Hitler na Alemanha”, viria a confessar  (na farsa do julgamento mandado instaurar pelo Salazarismo para salvar as aparências) que apenas ordenara a matança de  47 vidas.

Mesmo que assim fosse, mas foram largas centenas (há quem fale em alguns milhares), só por esse facto  - veja-se como a justiça do colonialismo poderia ser tomada a sério – ainda foi condecorado e levou dois rasgados louvores, a que mais adiante se fará referência.

Assim sendo, alguma vez os familiares das vítimas foram inimizados, com a devida justiça ou o país colonizador apresentou desculpas formais pelos massacre do Batepá? – Nem uma coisa nem outra

Atente-se, na gravidade das acusações de que foi  incriminado: por“crimes de homicídio, crimes de ofensas corporais, crimes de abuso de autoridade, ofensas corporais em presos, por exemplo, crimes.de ameaça, crimes de fogo posto, crimes de roubo”.

Contudo, mesmo após o 25 de Abril, dir-se-á que a chamada Revisão do Caso Batepá”, não foi além de mera formalidade.

 De resto, é o que hoje posso depreender das palavras do  Juiz Victor Pereira de Castro, nomeado pelo então “Governo da província, que,  interpretando uma justa reivindicação do povo, pediu ao Governo  Central  a revisão do  caso de Batepá.” 

E quem era, afinal, Victor Pereira de Castro? – O mesmo juiz que,   ali havia estado, a chefiar a Justiça, em 1961  – Ao menos podiam ter escolhido um juiz que não tivesse um  currículo colonial – Ou alguma vez, naquele tempo, se chegava a Juiz, que não fosse da absoluta confiança do regime? – Ou também não era o fascismo que os escolhia para os julgamentos dos presos políticos, na maquiavélica farsa dos Tribunais Plenários?

Declarou-me o seguinte: “ Parece-me que não se deve falar em intenção de indemnizar. Parece-me que o problema é um problema moral para se poder efectivamente tentar a nível de indemnização; indemnização relaciona-se mais com atribuição material”

PROCESSOS: DESDE OS FILTRADOS A DESAPARECIDOS – Restaram pouco mais de 70  CONSEQUÊNCIA DO “APROVEITAMENTO DE UMA MÁQUINA “(..)PARA FINS QUE NÃO ERAM RAZOÁVEIS

Todavia, um dos sobreviventes, que entrevistei, em 1974, a que me referi em artigos anteriores, dizia o seguinte: “ O meu pai era o Manuel João da Graça das Neves. Tinha o número 430” – Claro que o número não ficava apenas por essa cifra” No entanto, declarava-me, na mesma data , o dito Juiz:

 Suponho que tenho aqui a minha frente, mais de 70 processos crimes relacionados com os acontecimentos do Batepá, filtrados através do próprio Tribunal da Comarca”.

Por isso mesmo – sublinhava: “Não podemos dizer que houve extravio de processos ~ Há processos que não aparecem . Quer dizer sabemos que não estão nos seus lugares, onde normalmente deviam estar. Mas nós esperamos..."

E também - segundo declarações do   douto magistrado - “Não se deve falar em máquina montada para torturas. A  Administração podia estar muito mal montada, mas não tinha a intenção concreta de torturar; o que houve foi isto: um aproveitamento da máquina que normalmente serviria para fins úteis , aplicada ao serviço de fins que não eram razoáveis"

Além dos relatos, expostos em anteriores postagens, alguns dos quais por mim obtidos em 1974, desta vez venho divulgar  a entrevista que me foi concedida pelo Juiz Victor Pereira de Castro, responsável pela revisão do então chamado “Caso do Batepá –  Que  o  Governo da Província de S. Tomé e Príncipe, interpretando uma justa revindicação do povo, pediu ao Governo central a revisão do Caso Batepá “– Dizia então  uma nota oficiosa  - Entrevista, essa, nalguns aspetos, mais cautelosa de que esclarecedora; mesmo assim, não deixa de ser um documento importante. Pois julgo ter sido a única entrevista que concedeu 

ELOGIOS - Justificados?

Todavia, não se tomem em conta os elogios, que então  fiz, na introdução da entrevista – Pois, se soubesse, o que hoje sei  do desfecho que acabou por ter  a dita “Revisão do Caso Batepá” (sim, que não passou de uma pró-forma para tentar “serenar” as manifestações pós-25 de Abril) certamente que não teria começado por fazer uma análise tão elogiosa – Se bem que também ainda não tinha dados, nem depois cheguei a ter, já que ficaram retidos em arquivos que, mesmo passados, tantos anos, ainda permanecem vedados aos investigadores: 

Iniciativa governamental que classificaria, no introito da entrevista, como “criteriosa e séria, coisa que ainda não se tinha feito, ou pelo menos tão corajosa e frontalmente como agora, por parte das autoridades portuguesas, que, para o efeito, encarregaram um jurista competente: o Dr. Victor Pereira de Castro.

Mas passemos ao seguimento da entrevista e às questões que começava por levantar:

1974 - “Por que se deram os acontecimentos do Batepá? Quais as causas de ordem económica, política e social que os terão motivado ?  E qual a finalidade do trabalho que está sendo levado a cabo pelo Dr. Victor Pereira de Castro, entidade incumbida pelo Governo, da revisão do caso Batepá ? 

Numa das últimas edições. de Semana Ilustrada, já apresentámos alguns depoimentos com pessoas que foram vítimas das violências então praticadas durante essa altura. De novo aqui estamos com outras declarações.
Não pretendemos, como talvez alguém julgue, reacender - sentimentos talvez já ocultos ou apagados. Não pretendemos semear o ódio. O nosso objectivo é puramente outro, tentar responder às perguntas atrás formuladas. Em segundo lugar, pretender, com a divulgação desses relatos a nu, minimizar um pouco do sofrimento e agonia de um povo, que, durante o regime anterior, nunca permitiu que o seu sofrimento e dor fossem ouvidos e  conhecidos por mais alguém se não por esse mesmo povo que sofreu. 

É pois este o nosso objectivo. Independentemente de qualquer ideia sensacionalista que talvez também alguém lhe pretenda atribuir. 

Assim, em conformidade com este nosso propósito, apresentamos de seguida a entrevista, com o dr. Victor Pereira de Castro, incumbido, pelo Governo Português, de proceder a revisão e uma análise do caso do Batepá . 

Quando chegar à altura em que o seu trabalho de investigação se completar, poderemos contar com uma entrevista talvez ainda mais importante. Por agora, contentar-nos-emos com o que nos declarou. Quanto a fotografias, só permitiu que fotografássemos a rima de processos que lá tinha sobre uma mesa e uma corrente de ferro que, há dias, lhe chegou às mãos e com que eram na altura acorrentados as pessoas presas.
De qualquer maneira o nosso agradecimento, pois, mesmo assim, foi bastante atencioso para connosco.

J.M – poderá dizer-me as razões por que foi escolhido para rever o caso do Batepá?
P.C. Ignoro. Não faço a mais pequena ideia da razão por que fui escolhido. Talvez por ter sido aqui juiz em 1961.
J.M. Nessa altura, já se tinha inteirado dos acontecimentos do Batepã?
P.C. Logo que cheguei a S. Tomé ouvi falar no Batepá.
J.M. Não se debruçou sobre o caso ?

P.C. Sim Li vários processos. Havia os que estavam no tribunal em arquivo, que se relacionavam com o Batepá, e até havia processos que estavam a· correr ainda.
J.M. A sua missão específica, neste momento? 

P.C. Fazer o inquérito aos acontecimentos do Batepá. Talvez a ver se consigo reconstituir todos os acontecimentos que se deram durante aquele período histórico.
J.M. E depois de reconstituir esses processos há a ideia, naturalmente de indemnizar todas as pessoas que foram lesadas, não é verdade?
P.C. A ideia não é minha; é do Estado. Estou a servir o Estado. O Estado mandou-me fazer um inquérito. Não me disse para quê. Não me disse qual era o fim. Disse-me para eu fazer um inquérito.
J.M. Mas de momento não se sabe qual é a finalidade desse inquérito?
P.C. Toda a gente pensa que o inquérito seja feito para algum fim útil.

J:M. Mas se nesse inquérito se apurar que há indivíduos com culpas e que ainda não foram condenados? Depois de vinte anos esses indivíduos poderão ainda ser condenadas pelo seu procedimento naquela altura ?
P.C. É um problema jurídico que vai ser muito discutido. Que tem que ser discutido. Saber efectivamente a partir de que momento conta o prazo de prescrição desses crimes.
Em termos normais, segundo as ideias correntes, a prescrição ao fim de vinte anos apaga os efeitos do crime. Haverá razões para que o prazo de prescrição conte a partir de uma data posterior aos acontecimentos ?
Não sei: Há quem entenda que sim. 


J.M. Existirão ainda muitos indivíduos que terão cometido crimes e que ainda não foram julgados?
P. C. Elementos directamente relacionados, com os crimes – “autores matérias desses crimes, pelo menos civis foram julgados no tribunal comum. De todos ? Não posso afirmar.
J.M. Portanto há uma ideia de indemnizar todas as pessoas que foram lesadas ? ...
P.C. Até aqui tem-se conseguido obstar que 0 problema do Batepá seja francamente debatido. Estou convencido que o Estado tendo conhecimento directo dos problemas, há-de querer efectivamente assumir a responsabilidade que têm também' os problemas.
J.M. Que tipos de crimes se terão cometido?
P.C. Os crimes que foram. Julgados e apreciados no Tribunal da Comarca, são crimes de homicídio, crimes de ofensas corporais, crimes de abuso de autoridade, ofensas corporais em presos, por exemplo, crimes.de ameaça, crimes de fogo posto, crimes de roubo.
P .C. Suponho que sim. Que há elementos oficiais que nos determinaram que houve muitos. A confissão oficial do próprio governador de então, debita, salvo erro,47 vidas. Serão exactamente essas as vítimas do Batepá?  Não sei. Ainda não temos elementos.

J.M. Analisando o caso à face do ambiente da época, sob o ponto de vista social, económico e político, que terá contribuído para o desenrolar desses acontecimentos?
P.C. É esse um dos temas de estudo, que tenho necessidade de encarar.
J.M. A população de S. Tomé pode confiar em absoluto no trabalho que está a levar a cabo, e na resolução final que o Estado irá tomar ?
P.C. A população de S. Tomé não tem razões nenhumas para confiar no meu trabalho, porque o meu trabalho pode sair imperfeito. Agora a população de S. Tomé o que pode ter é a ideia absoluta de confiar no Governo. 
J.M. Portanto, digamos, acha que depois dessa resolução do Governo, em tentar indemnizar a população que foi afectada, que essa mesma população continuará ainda com ressentimento s desses actos: Digamos foi uma mancha que jamais se apagará do povo ? 
P.C. Parece-me que não se deve falar em intenção de indemnizar. Parece-me que o problema é um problema moral para se poder efectivamente tentar a nível de indemnização; indemnização relaciona-se mais com atribuição material. Penso que à população de S. Tomé, a maior reparação moral que se pode dar é esta.  É a de se pôr a nu, ter a coragem de se descobrir, destapar precisamente esse período histórico. Pois não foi nada, nada feliz para nós. Essa é a maior reparação que se pode dar à população de S. Tomé.
Penso que é essa reparação que a população de S. Tomé mais aspira que lhe seja dada. Além dessa admito que efectivamente o Governo possa, em relação a vítimas que mais sofreram em termos materiais, ajudá-las. Mas também acredito que houve vitimas em S. Tomé, que nem sequer queiram ouvir falar em reparação material. Porque o sofrimento delas não tem preço. 

- J.M. Vejo que tem aqui, à sua frente, um montão de processos. Que número calcula ?
P.C. Suponho que tenho aqui a minha frente, mais de 70 processos crimes relacionados com os acontecimentos do Batepá, filtrados através do próprio Tribunal da Comarca. 
J.M. Portanto, o seu trabalho, constitui, essencialmente em rever esses processos?
P.C. Não. O meu trabalho não é só limitado em rever os processos; é de coligir elementos que me permitam, efectivamente, ter uma ideia do próprio ambiente político, do ambiente social, do ambiente económico em que esses acontecimentos se integraram. 
Não se podem compreender isoladamente os acontecimentos de 3 de Fevereiro de 1953:
J.M. Tem encontrado esses elementos ao seu alcance e obtido as necessárias facilidades
P.C. Tenho tido as facilidades todas da parte da Administração, e tenho tido inúmeras dificuldades porque a maior parte dos elementos extraviaram-se, não estão nos seus devidos lugares. Estão escondidos em arquivos, que não somos capazes de decifrar, ou temos muitas dificuldades em decifrar.
P.C. Não podemos dizer que houve extravio de processos ~ Há processos que não aparecem . Quer dizer sabemos que não estão nos seus lugares, onde normalmente deviam estar. Mas nós esperamos... 


Em relação aos processos que estão no Tribunal não se nota extravio nenhum. Há processos que correram na Administração, há processos de inquérito, até processos normais de inspecção à Província, onde se procuram, onde até se suspeita que haja' elementos muito importantes, para a reconstituição histórica do ambiente. E esses processos temos tido muita dificuldade em localizá-los. Aliás há um processo, o processo do Tribunal Militar, que decorreu no Tribunal Militar especial de S. Tomé, que ainda não conseguimos até este momento descobrir. 
J.M. E na questão de contactos com as pessoas? Essas pessoas têm aparecido? Tem realmente prestado depoimentos?
P.C. Têm. Há pessoas que se me têm dirigido por escrito, contando a versão que têm dos acontecimentos; há pessoas, que me têm escrito para prestar declarações orais.
J.M. Portanto, até agora, o seu trabalho tem decorrido normalmente ? Para além do que disse não tem encontrado outras dificuldades nos elementos que precisa? 
P.C. São essas as dificuldades com que eu me debato; o trabalho em si é difícil ...
J.M. Para quando prevê concluir esse trabalho? 

P.C. Tenho de o concluir dentro de relativamente pouco tempo. Quero ver se em Setembro tenha o trabalho pronto. Quero dizer o trabalho de investigação, porque depois terei de fazer o relatório e será demorado. 
J.M. Esse trabalho será apresentado depois?
P.C. Ao Governo .
J.M. Durante os acontecimentos do Batepá, houve elementos que foram os instrumentos, digamos assim, do Governo, dessa máquina montada para torturar e martirizar ...
P.C. Não se deve falar em máquina montada para torturas. A Administração podia estar muito mal montada, mas não tinha a intenção concreta de torturar; o que houve foi isto: um aproveitamento da máquina que normalmente serviria para fins úteis "aplicada ao serviço de fins que não eram razoáveis. 


J. M. Como encara esses indivíduos que foram mandados torturar as pessoas, que serviram de instrumentos a esse Governo? 
P. C. Aos indivíduos que tivessem tido qualquer grau de responsabilidade, de torturas feitas a presos, há a apreciação feita em processos nos Tribunais e esses indivíduos foram condenados. 
J.M. Mas a maior responsabilidade caberá, evidentemente, à parte governamental ?
P.C. Não sabemos; esses indivíduos, quando foram julgados, lançaram uma parte da responsabilidade para o Governo.
J.M. No entanto houve elementos que foram condecorados pela sua accão desenvolvida nos acontecimentos do Batepá e, mais tarde, julgados devido à sua intervenção nesses mesmos acontecimentos. Como explica isso ?
P.C. Não. Há uma certa lenda em torno dos acontecimentos do Batepá. Houve indivíduos que foram, no âmbito regional dos acontecimentos, louvados pelo papel que desempenharam no decurso deles, e esses indivíduos, ou alguns deles, não tenho bem presente, aliás é um dos elementos que ainda não consegui, até porque não me parece assim de ponto muito importante para encarar desde já, que foram louvados; parece-me que há alguns que posteriormente foram condenados, pelo Tribunal da Comarca, pelo papel que desempenharam nesses mesmos acontecimentos. 
J,M. Corno acha que a população deverá  condenar esses indivíduos que ainda hoje se encontram em S. Tomé e tenham tomado parte activa nos acontecimentos do Batepá?
P.C. Eu tenho a ideia de que aqueles indivíduos que desempenharam papel activo nos acontecimentos, foram em virtude disso julgados, foram condenados, já deram a reparação que tinham de dar à sociedade; em termos puramente teóricos, não devem mais nada · em termos humanos,  em termos emocionais, não sei ... o problema é da população de S. Tomé. 

J.M. Haverá alguns elementos que, embora tendo tomado parte activa nesses mesmos acontecimentos, foram forçados pois se não tivessem aceitado essas ordens, teriam sido naturalmente mortos? 
P.C. É muito difícil à distância, ou até pode ser muito fácil à distância que estamos dos acontecimentos, dizermos qual teria sido o comportamento que as pessoas deviam ter durante eles; que é difícil é . sabermos o que concretamente seria possível fazer naquele ambiente que se criou em S. Tomé. É de registar que houve muitas pessoas, que estando em S. Tomé, não actuaram durante os acontecimentos .. Houve pessoas que estavam em S. Tomé e que não aceitaram o comportamento que se estava a ter perante as vítimas dos acontecimentos; houve também, admitimos perfeitamente que tivesse havido pessoas que se tivessem deixado levar pelos acontecimentos, até na convicção de que se estava a dar qualquer coisa de muito sério; e outras, até porque veio ao de cima a parte má que tinham, e que encontrou momento oportuno de se pôr em evidência.

- O autor deste site, como empregado de mato, em trabalhos de plantação de palmeiras em Fernão Dias

J.M. No caso do conhecido José Mulato. Ele é e sempre foi unia pessoa· muito discutida em S. · Tomé. É um individuo que, actualmente, pois, parece-nos, vive muito ordeira e honestamente do seu trabalho. Qual é a opinião pessoal que tem a respeito deste indivíduo, que se diz ter tomado parte muito activa no desenrolar dos acontecimentos do Batepá? _
 P.C. Conheço pessoalmente. o José Mulato desde há dias porque o chamei para conversar sobre os acontecimentos. Conheço o José Mulato através de processos; foi um homem que teve muitos maus princípios; foi um homem que, muito novo, teve de dar contas à sociedade (e deu-as') por ter cometido um crime de homicídio, com o concurso de agravantes muito sérias. Estava a cumprir pena. Foram buscá-lo. Puseram-no numa posição que não era compatível com a sua natureza, a sua qualidade de criminoso de direito comum. Suponho que fez muitos crimes. Foi condenado por crimes muito graves que cometeu, e penso que sofreu uma das penas mais pesadas que foram dadas aos intervenientes dos acontecimentos.

J.M Foi uma das pessoas, portanto, que sofreu a maior pena. Mas essa pena não terá modificado a pessoa, não lhe terá inspirado outro comportamento ? Pois, como sabe, a errar se corrige o homem. Ele hoje será um homem recuperado, arrependido desses procedimentos e que deve ser encarado pela população de outra maneira?
P.C. Teoricamente, um homem que cumpriu a sua pena espiou o crime; pensamos que as penas têm efeitos correctívos ? : É confundirmos aquilo que devia ser com aquilo que realmente poder ser : Não sei. Não sei se o José Mulato se modificou: Parece-me que está a ser um homem útil na sociedade. Diz que ele é uma pessoa bem comportada? É um bom trabalhador? São estes os factores positivos que se podem tomar em conta.
J.M. No que respeita ainda ao popular José Mulato é um indivíduo que já cumpriu a sua pena. Não virá a sofrer qualquer outra pena se se vier a apurar que ele teve mais culpas que aquelas que lhe foram imputadas nos processos que o levaram a essa condenação ?
P.C. Tenho a ideia que o José Mulato apanhou a condenação maior que lhe podia ter sido aplicada. Tenho a ideia : Concretamente não sei. Um dos processos precisamente o que tenho a frente, é o do José Mulato. 
 J.M .. E o processo maior?
P.C. Não. Há vários processos maiores. Este é um dos grandes. 

J.M. Ainda sobre ele: acha que o seu caso deva ser encarado num aspecto muito particular ?
P.C. Não. O problema de José Mulato, aliás o problema de todo o criminoso, tem de ser encarado em termos jurídicos, em termos sociais, em termos económicos, em termos psiquiátricos. Não sei até que ponto o José Mulato, o comportamento do José Mulato, não é o comportamento que nasceu de um circunstancialismo social em  que se integrava : E preciso ver isso. Era um homem que teve maus princípios, suponho que foi filho de pai incógnito, aos 17 anos cometeu um crime passional em condições tais que lhe veio a ser aplicada uma pena mais grave: Em função,· da idade que tinha, estava a cumprir a pena; parece-me até que era um preso muito disciplinado, quando foram pegar nele e o puseram numa posição em que indivíduos sem grandes bases morais poderiam ser levados a cometer excessos. Ele cometeu-os: 
J.M. Logo a culpa é da parte de quem ?
P.C. Não sabemos quem tem culpa. Se fosse por mera advertência que ele tivesse sido chamado, a culpa era de negligência.' Se tivesse sido por intenção, a culpa já era muito mais de apreciar. Portanto não sabemos. As pessoas, e a vida às vezes…

CULPADOS COM PENAS LEVES OU ABSOLVIDOS – ATENDENDO À NATUREZA HEDIONDA DOS CRIMES  - AQUELES QUE OS DENUNCIARAM, LEVARAM COM A RIPADA

Foi o caso de Salgueiro Rego, que, por discordar das arbitrariardes do Governador Carlos Gorgulho, haveria de levar com um processo em cima – Mais tarde escreveria  um livro, a que dera o título Memórias de um ajudante-de-campo (em dois volumes), proibido nestas Ilhas, ao qual será dado destaque numa das próximas postagens

A dado passo escrevia o seguinte:.“Felizmente que o Ministro, a quem escrevi particularmente contando-lhe o que se passava, me mandou embarcar. Mas vieram atrás de mim oito dias de prisão tudo descrito no 1º volume das minhas memórias, castigo que o Ministro não teve coragem de anular sabendo-se de toda aquela pouca vergonha que por lá se passava e obrigou o Governo Central a mandar regressar os três culpados de toda aquela péssima cena que foi sem dúvida um dos factores do que estamos sofrendo em Africa. No meu quartel havia 50 soldados angolanos que tomavam parte em todas aquelas tristes cenas que tendo acabado o tempo e regressado às suas terras temam, contando, ajudado a criar a revolta que estalou e que felizmente tanto lá como em S. Tomé tudo se mantém agora nas mãos de dirigentes respeitáveis, compreensivos e justos tratando os negros como merecem.

O meu injusto castigo cumpri-o e não houve da parte de ninguém que mo tirasse porque, estou certo di1SS0, sabia-se que o Ministro do Exército em Conselhos de Ministros tudo fazia, e conseguiu, promover o Governador a oficial general e há pouco tempo a 2.° Comandante da Legião Portuguesa! !

Diz-se nestes louvores - para não ferir as susceptibilidades do Grande Governador Gorgulho que tão bem se portou - que a exoneração de governador da província de S. Tomé foi a seu pedido ! ! O que fez pena a toda a gente da terra ... 1

A folha oficial publicou também dois louvores a este oficial:

Um, do sr. Ministro do Exército: «Porque, perante uma grave tentativa de sublevação na província de S. Tomé, soube, na qualidade comandante militar, enfrentar os acontecimentos com a mais» «firme decisão, a despeito da defecção de parte do corpo de Polícia» «local, e demonstrou, além de bravura e valor excepcionais, notáveis» «qualidades de iniciativa na organização de forças para combater os sediciosos, conseguindo pela sua actuação e exemplo restabelecer prontamente a ordem e confiança no espírito da população da Ilha, e evitar, com a sua enérgica intervenção, grave desprestígio para a» «soberania nacional, no que demonstrou possuir qualidades de abnegação e coragem dignas de serem distinguidas».

O outro, do sr. Ministro do Ultramar : «Pelos relevantes serviços prestados no exercício do seu cargo, que desempenhou com» excepcional actividade, tendo levado a efeito, pela sua tena1c.i.dade e esforço incansável, um conjunto de importantes rea1lizações que muito contribuíram para o notável progresso verificado em S.» «Tomé e Príncipe nos últimos  anos».

Com estes louvores, tão justos e tão honrosos, até devia ter sido condecorado com valor  militar, Torre Espada e uma promoção a general por Distinção ...

QUANTOS OS  QUE TOMBARAM NO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DE FERNÃO DIAS, NOS BRUTAIS INTERROGATÓRIOS, CASAS INCENDIADAS OU NAS RUSGAS?

É sabido que, em 5 de Fevereiro, foi o próprio Governador Gorgulho, a comandar as brigadas da escravatura e da morte – Mas não só:  por várias vezes também se dirigiu ao campo de Concentração de  Fernão Dias para obrigar os prisioneiros a confessar  a farsa do “comunista” golpe de Estado, obrigando os pobres desgraçados  a confissões através dos mais bárbaros atos de tortura, com pesadas correntes ao pescoço e à cintura, punições que iam ao macabro requinte de os obrigar a  acarretar água do mar para a terra.

Quantos tombaram? – Esta questão foi também levantada num estudo do investigador Gerhard Seibert, que, diz o seguinte: (tradução de francês) “Os vários dados sobre o número de vítimas do massacre  divergem bastante. 
Manuel Pinto de Almeida, o advogado, dos réus portugueses  que tentaram em 1955 escrever uma carta a Salazar " defendeu  que centenas de nativos foram massacrados em Fernão Dias e atirados ao mar "

63 “Capitão Salgueiro Rêgo (1967, p 13) afirma ter visto na prisão " Loucura [Cegada] que causou uma dúzia de mortes entre os negros. " Manjericão Davidson cita uma carta de um missionário americano que falou quase de duzentos mortos - 64  Edwin e Munger (1961, pp. 128-130) fala em sua carta  "dois mil vítimas" (Casualties). A mesma estimativa foi feita por um autor português em 1975 (Castro 1980, p. 219). Quando, em 1962, Miguel Trovoada, então líder do Comité de Libertação de São Tomé e Príncipe (CLSTP) ex-presidente de São Tomé e Príncipe), disse na Quarta Comissão da Assembleia Geral das Nações Unidas,  que centenas de pessoas foram massacradas - 65 O nacionalista  Mário Pinto de Andrade angolano,  persistiu em sua estimativa de mais de mil mortes durante o massacre  -66 - Em 1969, a revista Tricontinental LaHavana publicou um artigo anónimo informando que 1.032 pessoas exactamente foram mortos em menos de uma semana em fevereiro 1953 67 Este aumento também foi divulgada pelos nacionalistas e santomense e repetidas por inúmeros autores

68  Isto corresponde a cerca de três por cento do população nativa da época. O historiador René Pélissier, que visitou São Tomé, em 1966, (..) avalie o número real de vítimas entre cinquenta e cem - 69  Victor Pereira Castro,  que investigou o massacre imediatamente após 25 de abril de 1974, a pedido o ministro da coordenação inter-regional do momento, Almeida Santos, chegou à conclusão de que havia entre trinta e quarenta vítimas - 70 . No mesmo ano, um membro da PIDE em São Tomé certificou que  o número de mortos era inferior a quinhentos. No entanto, outras fontes bem informadas alegam que não mais de cem pessoas foram mortas durante a violência

71 O antropólogo Pablo Eyzaguirre, que fez a pesquisa em São Tomé em 1981, acredita que "dada a duração dos ataques, a mobilização de grupos hostis a Forros e condições de campos de trabalho forçado, calcula que o número de 1.032 mortes durante os problemas de Batepa é perfeitamente possível "(Eyzaguirre 1986 p. 333). Na verdade, ele nunca será possível saber o número exato de vítimas. Em nossa opinião, o número 1032 é principalmente um valor simbólico" - Mais pormenores em LE MASSACRE DE FÉVRIER 1953 À SÃO TOMÉ - Lusot

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