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sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Roças de S. Tomé – 30 de Setembro Dia da Nacionalização das roças de S. Tomé e Príncipe – Um Feriado Nacional com algum sabor amargo, recordado com uma alegre e concorrida Mega Feira Agrícola de frutos da terra - Os feudos coloniais não deixaram à população, as melhores recordações, mas também pouco ou nada se aprendeu com os erros do passado - Mais delas estão irreconhecíveis em estado de abandono ou subaproveitamento

 

Jorge Trabulo Marques - Jornalista 

2014 


Os santomenses comemoram hoje o DIA 30 DE SETEMBO- mais um feriado do dia da nacionalização das roças coloniais que ocorreu no dia 30 de Setembro de 1975, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 24/75, que sancionou a nacionalização das principais roças exploradas pelos roceiros portugueses em S. Tomé e Príncipe.

O feriado é assinalado hoje com uma Mega Feira Agrícola”, de produtos da terra, Bananas, fruta-pão, mandioca, matabala, batata doce, todo tipo de hortaliças, carnes diversas, ovos, animais vivos ; peixes diversos« Produtos biológicos e ecológicos como Carvão ecológico ; produtos agrícolas biológicos como a pimenta, hortaliças, etc », – lê-se no documento  

Conta com animação de vários grupos musicais  - Refere a STP-Press, que o evento é organizado pelo Ministério da Agricultura, Pescas e Desenvolvimento, abriu por voltas das 06 horas da manhã , está a decorrer nas 3 ruas em torno da Escola Preparatória Patrice Lumumba, nomeadamente, a Rua Barrão de Água Izé, a Rua de Ponte Tavares, e a Rua entre a Escola e a EMAE, num formato de U ». https://www.stp-press.st/2022/09/30/mega-feira-agricola-marca-hoje-30-de-setembro-dia-da-nacionalizacao-das-rocas/

Caué - 1964

LAMENTÁVEL É  QUE O PATRIMÍNIO DAS ROÇAS, NÃO TENHA SIDO PRESERVADO  - Ao menos, que, as tais antigas propriedades, fossem minimamente limpas e preservadas. E não é isso que acontece,em muitas delas,  para prejuízo do povo destas maravilhosas ilhas

Em 2014 , o então Primeiro-ministro Gabriel Costa, anunciou  que o seu Governo com menos de dois meses de mandato, vai lançar um concurso público internacional, para salvar cerca de duas dezenas dos antigos palácios das roças.

Bom era que, as afirmações, que se têm feito em torno da sua preservação,  passassem das palavras às ações, no entanto, o problema, é que, a Ilha, nomeadamente a maior, onde a natureza é fértil e generosa, oferecendo todo o tido de fruta, ao longo do ano e tem o nome do apóstolo São Tomé – Ora, como é do conhecimento bíblico, São Tomé, um dos 12 apóstolos de Jesus Cristo,  era muito cético - só vendo é que acreditava. 

Além do mais,  os santomenses fazem parte de um povo pacífico incapaz de matar um cachorro à nascença, pois entendem que todos os bichos têm direito à vida e que cabe à mãe-natureza fazer a seleção natural, mas os políticos, de modo geral, pelo que me é dado depreender, conquanto não sejam agressivos, são exímios na demagogia – Falam, falam, mas, pelos vistos, as obras vão sendo adiadas para o dia de São Nunca – Neste caso, ao jeito da tradição popular em  torno do apóstolo S. Tomé -  Deixando mais dúvidas de que certezas.  Mais ceticismo de que crença.  Mais  desilusões de que esperanças.

MAS HÁ UMA CRUA REALIDADE, QUE NUNCA DEVE SER DESCURADA 

Praia do Uba-Budo - 2014

De facto,  as administrações das grandes propriedades agrícolas nunca valorizaram a mão-de-obra dos forros, dos filhos da terra. É verdade que nunca foram além de meros capatazes, excetuando alguns mulatos, filhos dos brancos administradores ou feitores gerais. 

Fala-se muito mas desconhece-se o essencial: que eram campos de escravatura. Trabalhei nesses feudos: na Roça Uba-Budo, na Roça Ribeira Peixe e na Roça Rio do Oiro 

Conheci bem a dureza da vida, nessas grandes propriedades, quer para os chamados serviçais, quer para os nativos que ali iam fazer os mesmos trabalhos, mas também para os empregados de mato, que eram igualmente escravizados, mal pagos e que apenas tinham direito à chamada graciosa, de quatro em quatro anos


Roça Rio do Oiro 1977 
2014

Na verdade,  não guardo da roça, as melhores recordações senão o facto de ter apenas 18 anos, ser um jovem  e da surpreendente beleza daquela paisagem, que todos os dias se me revelava, pese a humilhação a que era submetido desde a alvorada  até ao escurecer -  Pois não posso esquecer-me de como era difícil e dura a  vida na roça, tanto para os empregados de mato como para os trabalhadores - E foi esta a categoria que me foi dada, pelo Administrador da Roça Uba-Budo, quando fui para ali estagiar 


 

 


Roça Uba-Budo-2014

A DIFÍCIL VIDA NAS ROÇAS DE MÁ MEMÓRIA  - Para a maioria dos que ainda nelas resistem - sobretudo, de origem cabo-verdiana, com o coração ruído de saudades  das suas queridas ilhas, a situação, em que se encontram, atualmente, não é boa, mas  verdade é que, para quem ali trabalhou, como eu,  esses enormes feudos coloniais, trazem também lembranças de febres palustres e  rosários de humilhações, de muitos sacrifícios e  adversidades 

Roça Agostinho Neto - 2014 - Ex-Rio do Oiro

No meu tempo, a vida por lá também era bem dura e penosa, tanto para os empregados de mato, tal o meu caso, como para os escravizados trabalhadores .Quer  chovesse ou fizesse sol, o trabalho não se suspendia e tinha de começar muitos antes dos seus raios raiarem por entre a floresta ou lá no horizonte do fundo do mar.

 Com os fulgores da  independência, foram nacionalizadas, porém, como,  as suas instalações, careciam de arranjos  periódicos de conservação, depressa passaram a ruínas e a mato.  Agora, naquelas que não foram privatizadas, cada um vai plantando e colhendo o que pode para a sobrevivência pessoal ou familiar. 

Escola Agricola - Num dia da Praxe do Caloiro

Uba-Budo 1963

Tal como  é reconhecido, grande parte da  comunidade cabo-verdiana, em S. Tomé e Príncipe,  continua a viver nas antigas roças em condições muito precárias – De algum modo, abandonados à sua sorte.  

 Desembarquei, em S. Tomé, a bordo do navio Uige, em Novembro de 1963 para fazer o meu estágio de Agente Técnico Agrícola, da Escola Agrícola Conde S. Bento, em Santo Tirso - Não tendo condições, devido à forma desprezível como ali eram encarados os técnicos, por indivíduos que ascendiam apenas à custa dos anos de serviço  e de uma certa brutalidade; acabei por concluí-lo na tropa, quando ali fui encarregado do sector da  Messe dos Oficiais e da  Agropecuária do quartel .  

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