expr:class='"loading" + data:blog.mobileClass'>

sexta-feira, 26 de julho de 2019

Hoje é o dia internacional dos Avós - Carta de José Saramago a “Josefa Minha Avó” - Poema à Avó Mariana, de Alda Espirito Santo, com a imagem da Avó Mena, mártir do Batepá, ao lado de sua filha e netos - - E o Tributo aos avós que não chegaram a conhecer os netos nem estes os avós e aos avós que são esquecidos por filhos e netos. E aos netinhos que desconhecem quem são os seus pais e avós.

Jorge Trabulo Marques - Jornalista - Informação e análise 

AVÓ MENA  - MÁRTIR DO BATEPÁ - COM A FILHA E OS NETOS 

HOJE É O DIA DOS AVÓS - EU NÃO OS CHEGUEI A CONHECER -NEM MATERNOS NEM PATERNOS - No Brasil e em Portugal, o Dia dos Avós é comemorado em 26 de julho, tendo sido esta data escolhida em razão da comemoração do dia de Santa Ana e São Joaquim, pais de Maria e avós de Jesus Cristo.

Mas o dia 26 de julho não é um consenso mundial. Na Itália, por exemplo, houve a preocupação de desconectar o Dia dos Avós da memória dos santos, justamente para enfatizar o caráter civil (e não religioso) da celebração- e a "Festa Dei Nonni" é celebrada dia 2 de outubro.
Nos Estados Unidos, comemora-se no primeiro domingo de setembro. No Reino Unido, no primeiro domingo de outubro. A França é um caso raro: há o Dia das Vovós (primeiro domingo de março) e o Dia dos Vovôs (primeiro domingo de outubro). A Estônia comemora no segundo domingo de outubro. A Austrália, no primeiro domingo de novembro. O Canadá, em 25 de outubro.  https://www.bbc.com/portuguese/geral-44930392


Neste dia dos avós, recordo aqui um dos belos poemas de Alda Graça do Espírito Santo, a grande matriarca santomense, autora do hino Nacional de S. Tomé e Príncipe, figura incontornável da poesia  e da cultura destas maravilhosas Ilhas - Ilustrado com a imagem de
Maria dos Santos, mais conhecida por Mena, uma das mártires,  sobrevivente dos hediondos massacres de Batepá,  de Fevereiro de 1953 -  Tinha  80 anos,  em 2015, quando a entrevistei, rodeada da filha e de seus netos,  à  porta de sua casa, em Batepá, distrito  de Mé-Zóchi, uma das mártires - E também pela autora do poema   - Avó Mariana


Avó Mariana
Avó Mariana, lavadeira
dos brancos lá da Fazenda
chegou um dia de terras distantes
com seu pedaço de pano na cintura 
e ficou.
Ficou a Avó Mariana
lavando, lavando, lá na roça
pitando seu jessu
à porta da sanzala
lembrando a viagem dos seus campos de sisal.

Num dia sinistro

p'ra ilha distante
onde a faina de trabalho
apagou a lembrança
dos bois, nos óbitos
lá no Cubal distante.

Avó Mariana chegou

e sentou-se à porta da sanzala
e pitou seu jessu1
lavando, lavando
numa barreira de silêncio.

Os anos escoaram

lá na terra calcinante.

- "Avó Mariana, Avó Mariana

é a hora de partir.
Vai rever teus campos extensos
de plantações sem fim".

- "Onde é terra di gente?

Velha vem, não volta mais...
Cheguei de muito longe,
anos e mais anos aqui no terreiro...
Velha tonta, já não tem terra
Vou ficar aqui, minino tonto".

Avó Mariana, pitando seu jessu
na soleira do seu beco escuro,
conta Avó Velhinha
teu fado inglório.
Viver, vegetar
à sombra dum terreiro
tu mesmo Avó minha
não contarás a tua história.

Avó Mariana, velhinha minha,

pitando seu jessu
na soleira da senzala
nada dirás do teu destino...
Porque cruzaste mares, avó velhinha,
e te quedaste sozinha

pitando teu jessu?
- Alda Espírito Santo, em "É nosso o solo sagrado da terra". Lisboa: Ulmeiro, 1978, p. 51-52
A CARTA DE JOSÉ SARAMAGO - PRÉMIO NOBEL DA LITERATURA - para "Josefa, minha avó" - 
Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo — e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água.


Viste nascer o sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal. Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira — sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz.
Não sabes nada do mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião. Herdaste umas centenas de palavras práticas, um vocabulário elementar. Com  isto viveste e vais vivendo. És sensível às catástrofes e também aos casos de rua, aos casamentos de princesas e ao roubo dos coelhos da vizinha. Tens grandes ódios por motivos de que já perdeste lembrança, grandes dedicações que assentam em coisa nenhuma. Vives. Para ti, a palavra Vietname é apenas um som bárbaro que não condiz com o teu círculo de légua e meia de raio. Da fome sabes alguma coisa: já viste uma bandeira negra içada na torre da igreja.(Contaste-mo tu, ou terei sonhado que o contavas?)
Transportas contigo o teu pequeno casulo de interesses. E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre. O teu riso é como um foguete de cores. Como tu, não vi rir ninguém. Estou diante de ti, e não entendo. Sou da tua carne e do teu sangue, mas não entendo. Vieste a este mundo e não curaste de saber o que é o mundo. Chegas ao fim da vida, e o mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não faz parte da tua herança: quinhentas palavras, um quintal a que em cinco minutos se dá a volta, uma casa de telha-vã e chão de barro. Aperto a tua mão calosa, passo a minha mão pela tua face enrugada e pelos teus cabelos brancos, partidos pelo peso dos carregos — e continuo a não entender. Foste bela, dizes, e bem vejo que és inteligente. Por que foi então que te roubaram o mundo? Quem to roubou? Mas disto talvez entenda eu, e dir-te-ia o como, o porquê e o quando se soubesse escolher das minhas inumeráveis palavras as que tu pudesses compreender. Já não vale a pena. O mundo continuará sem ti — e sem mim. Não teremos dito um ao outro o que mais importava. Não teremos, realmente? Eu não te terei dado, porque as minhas palavras não são as tuas, o mundo que te era devido. Fico com esta culpa de que me não acusas — e isso ainda é pior. Mas porquê, avó, por que te sentas tu na soleira da tua porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e dizes, com a tranquila serenidade dos teus noventa anos e o fogo da tua adolescência nunca perdida: «O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer!»É isto que eu não entendo — mas a culpa não é tua.

AQUI DEIXO ESTA BELA IMAGEM DE LINDOS E AMOROSOS ROSTOS AFRICANOS - NA ESPERANÇA DE QUE TODOS TENHAM UMA AVOZINHA OU AVOZINHO, QUE LHE POSSA NESTE DIA DISPENSAR ALGUNS BEIJINHOS E CARINHOS




A ARTE COMO BELA EXPRESSÃO ARTÍSTICA DA FAMILIA  - MENSAGEM DO PROF. VITOR SERRÃO , NESTE DIA DOS AVÓS 26 DE JULHO. "Eu que sou avô, e pai, e filho, e amigo dos amigos, entre muitas outras coisas, celebro a data que se convencionou chamar DIA DOS AVÓS recorrendo, como me é usual, ao discurso de uma obra de arte. Não com a tradicional referência à Oração de Sant'Ana e S. Joaquim na Porta Dourada, tema que gerou algumas obras-primas. Escolhi, ao invés, uma FAMÍLIA DE CAMPONESES, tela dos irmãos Le Nain, pintores franceses da segunda metade do século XVII que criaram uma espécie de 'pintura proletária' avant la lettre. Muito bom, este quadro com um casal de trabalhadores rurais com seus filhos e netos. A fraternidade feita arte, a arte feita fraternidade no intimismo do retrato de grupo a que não faltam cão, gato, música de flauta, frugalidade de alimentos e calor de lareira.


Nenhum comentário :