Nosso filho caçula
Mandaram-no para S. Tomé
Não tinha documentos
Aiué!
Nosso filho chorou
Mamã enlouqueceu
Aiué!
Mandaram-no para S. Tomé
Cortaram-lhe os cabelos
Aiué!
Mandaram-no para S. Tomé
Nosso filho está a pensar
Na sua terra, na sua casa
Mandaram-no trabalhar
Estão a mirá-lo, a mirá-lo
-Mamã, ele há-de voltar
Ah! A nossa sorte há-de virar
Aiué!
Mandaram-no para S. Tomé
Nosso filho não voltou
A morte levou-o
Aiué!

Marimbas, n`gomas, quissanjes
Vinde Chamar nossa gente
Prá beira do Grande Mar
Sentai-vos, irmãos, escutai:
Precisamos entender
As falas da Natureza,
Dizendo da nossa dor,
Chorando nossa tristeza.
Ora escutai; meus irmãos:
Aquele Sol no poente,
Vermelho como uma brasa
Não é Sol somente. Não!
É coágulo de sangue
Vertido por angolanos
Que fizeram o Brasil
Ouvi o mar como chora,
Ouvi o mar como reza….
Veludo negro tecido
De mil pedaços de pele
Arrancados a chicote,
Ai! Cortados a chicote,
Do dorso da nossa gente,
No tempo da escravatura…
Noite é luto
De que Deus cobre o mundo
Com dó de nós…
Disco de prata luzente
Sabei que a lua fulgente
Contém lágrimas geladas
Por pobres negros choradas…
Perguntai à multidão,
Sentada à beira do Mar:
- Agora, dizei, irmão
Daquela pálida estrela
Tão pequenina e humilde
Qual é o significado?
Talvez seja finalmente
Deus a olhar para a nossa gente…
Excerto – Maurício Gomes – Natural de Luanda, onde nasceu em 14-03.1920
Excerto – Maurício Gomes – Natural de Luanda, onde nasceu em 14-03.1920
Maurício de Almeida Gomes
Pode ser considerado um dos pioneiros da poesia moderna angolana. A palavra a Manuel Ferreira: “O tom messiânico, o chamamento colectivo vem de um homem cuja continuidade poética se perdeu poucos anos depois. Trata-se de Maurício Gomes e que naquele instante faz o lúcido, humaníssimo apelo à sua gente: “tocadores vinde tocar/marimbas, n’gomas quissanges/vinde chamar nossa gente/p’rá beira do grande mar!” e “ouvi o mar como chora,/ouvi o mar como reza…/olhai a noite que chega./veludo negro tecido/de mil pedaços de pele/arrancados a chicote./ai! cortados a chicote./do dorso da nossa gente,/no tempo da escravatura…”. Neste chamamento, com ressonâncias estilísticas da tradição popular e com consciência do momento que se vive, se entra, de vez, no ideário mais representativo da actual poesia angolana”.
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