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domingo, 12 de janeiro de 2020

S. TOMÉ - A CAMINHO DA ROÇA QUE JÁ FOI COLÓNIA AÇORIANA - Mais uma das belas crónicas de Rute Norte, a cilista portuguesa por trilhos, caminhos e estradas


É com muito prazer que, mais uma vez, tomo a liberdade de aqui reproduzir alguns excertos das interessantes crónicas, onde as habilidades e os sorrisos das amorosas crianças continuam a ser as principais protagonistas,  tão belamente ilustradas pela cilista portuguesa, a corajosa jovem Rute Norte, caminheira por vários países do oriente ao ocidente, simplesmente através de duas rodas e que também não quis perder a oportunidade de assim conhecer as maravilhosas ilhas de S. Tomé e Principe - Desta vez, recordando-nos o   percurso até à Roça Colónia Açoreana, que chegou a ser uma das principais propriedades coloniais, em cacau, café, copra e coconote.  Pena que, ao menos, parte da herança desse património,  não tenha sido preservada  - Enfim, salvou-se o direito à liberdade, que não tem preço.

"Desviamos caminho, a meu pedido, até uma povoação chamada Roça Colónia Açoreana. sim que já foi roça no tempo colonial, agora, enfim, com muitas outras, mera imagem de ruinas de outros tempos - Pena que, a herança herdada dos tempos da escravatura, ao menos não fosse preservada - Mas, vá lá, salvou-se a liberdade.
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(...) Eu simplesmente não consigo andar. As sandálias a sarrafar nas feridas fazem-nas arder loucamente. Saí do carro e estaquei. Mal consigo mexer-me.
“Açoriana” escreve-se atualmente com “i”, mas a roça que aqui existiu é do século XIX, pelo que a povoação ainda tem o nome antigo: “Açoreana” com “e”. Só a partir de 1911 é que se consagrou a grafia “açoriana”, por isso ainda podemos encontrar documentos mais antigos com a palavra assim escrita¹.

Vejo na internet que a roça (agora em ruínas – e que eu não vou ver nem fotografar porque simplesmente não consigo andar), era de proprietários açorianos. Encontro o seguinte na internet:
Apesar de originário duma modesta família de pedreiros e trabalhadores agrícolas de Santo Amaro do Pico, na ilha do Pico, João Jorge da Siveira e Paulo associou-se com quatro dos seus irmãos e formaram uma importante sociedade, proprietária da roça Colónia Açoreana em São Tomé, e foram grandes negociantes de cacau no mercado internacional. Sob a sua direção e influência, a família conseguiu grande prosperidade económica no negócio iniciado por um irmão mais velho, Domingos Machado da Silveira e Paulo.²

A roça possuía um pequeno caminho de ferro com 2 km utilizado na condução do cacau seco para embarque³. Deixo quatro imagens antigas, retiradas deste site: “Roça Colónia Açoreana”. Nele podem ser vistas mais imagens.
João Jorge acabou por assumir a liderança da família, consolidando uma enorme fortuna. Regressou aos Açores, depois de agraciado, no final do século XIX, com uma comenda e o título de fidalgo-cavaleiro da Casa Real. Escolheu fixar-se na cidade de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, tendo para tal adquirido o solar dos Noronhas, junto à igreja da Conceição, que mandou demolir para ali construir o seu palacete. A construção iniciou-se em Abril de 1900, ficando concluído dois anos depois.

Atualmente existe na ilha Terceira o “Palacete Silveira e Paulo”, sede da Direção Regional da Cultura do Governo dos Açores.²

Prossigo caminho no táxi.
Em busca dum multibanco para eu levantar dinheiro. São 13h15 e acabámos de chegar à cidade de São Tomé, eu e o taxista Adosindo. Tenho 210 dobras (8,40€) e quatro dias de férias pela frente. Claro que não chega. Só este táxi que me transporta neste momento, contratei-o por 1.000 dobras (40€). Agora não tenho dinheiro para pagar. E este multibanco não funciona com o meu cartão. Vamos em busca doutro multibanco
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Qualquer pessoa diria que antes de contratar o táxi eu deveria estar na posse do dinheiro. Mas há coisas na vida que têm de ser feitas. Jamais eu colocaria em risco uma ida ao Pico Cão Grande por causa da disponibilidade momentânea de dinheiro. Se calhar nunca mais voltarei a São Tomé e Príncipe. Há tantos destinos no mundo para conhecer, até agora ainda não repeti nenhum. Portanto, primeiro vou ao Pico. Em segundo lugar logo se resolve a questão do dinheiro. Porque felizmente ele está na minha conta bancária, só preciso é de aceder-lhe. Até teria levantado ontem se tivesse havido oportunidade disso. Ontem ainda passei no multibanco de Trindade, mas estavam dois homens à espera, a queixarem-se, dizendo que não estavam a funcionar. Eu fui-me embora, nem perdi tempo.

Os restantes multibancos que encontrámos estão fora de serviço. E no African Bank dizem-me que o Visa não funciona aqui, talvez daqui a um ano. Só se consegue levantar dinheiro com cartão de crédito. Eu entretanto começo a lembrar-me do que li na internet, ainda em Portugal, antes de vir para São Tomé e Príncipe: não existem multibancos. Mas eu estou a vê-los. Pois, mas não dão para os estrangeiros levantarem dinheiro.
Pois claro, Rute. Estiveste-te nas tintas para esta informação. Agora tens aqui um taxista a quem deves dinheiro.
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(...) Expliquei a situação ao taxista Adosindo. Ele compreendeu. Garanti-lhe que não vai ficar sem os 40€, para ficar descansado. Ele sabe onde estou alojada, e eu vou resolver isto.
Ele não se mostrou muito preocupado, felizmente. E deixou-me no resort às duas da tarde. Para já é hora de almoço e vou à Nelta almoçar. Já estou de chinelos, as feridas nos pés ao ar livre, e as sandálias lavadas a secar.

Estou às 14h15 no restaurante da Nelta onde lhe digo que quero almoçar por 40 ou 50 dobras. Tenho 210 dobras que têm de dar para comer e também para táxis nestes 4 dias. Já estou a jogar pelo seguro.
Hoje o menu é batata doce com atum e legumes cozidos. E vinho de palma. Tudo maravilhoso, 50 dobras.

(...) Não consegui ficar mais tempo com os rapazes porque ando a tratar das coisas do dinheiro, a trocar mensagens com o Célio Santiago, e ainda fui carregar o telemóvel com 20 dobras, no quiosque ao lado do resort. O saldo aqui em São Tomé e Príncipe carrega-se assim, com uma raspadinha. Risquei os números com uma moeda, e enviei um sms para o número que está nela indicado, juntamente com o código que raspei, et voilà.

Deparei-me é com uma dificuldade inesperada na transferência bancária através do eBanking. O meu banco exige um código enviado por SMS para o meu número de telemóvel português. Ora o meu cartão português não tem internet. Eu estou a usar um cartão de São Tomé e Príncipe. Eu até poderia retirar o cartão de São Tomé e Príncipe, e colocar o meu cartão português, ligando-me então ao wifi, para fazer a operação no eBanking. Mas o wifi aqui do resort não está a funcionar, como referi ontem (na crónica 82). Computadores não existem.
Questiono o Célio Santiago sobre onde posso ter wifi. Parece que só há em Trindade. O Célio Santiago diz-me para fazer reset ao router do wifi, a ver se conseguimos resolver isto. Porque terá deixado de funcionar? Pois não sei. E mesmo fazendo reset, continua sem funcionar.

Então lembrei-me de transferir o montante por Mbway para alguém em Portugal (que tenha Mbway) e essa pessoa fará uma transferência bancária ao Célio Santiago. Tudo se resolve. Felizmente o Célio Santiago tem uma conta em Portugal.
Assim foi feito. Foram 110€. Chega para pagar os 40€ ao taxista Adosindo, e ainda fico com dinheiro no bolso para algo que seja preciso.
E o Célio Santiago deu-me então um contacto para dar-me o dinheiro, em dobras, aqui em São Tomé. Tenho que ir levantar as 2.750 dobras amanhã, entre as 8 e as 14h no mercado da cidade de São Tomé.

(O melhor de tudo é que a situação ficou resolvida para mim, para o Célio Santiago, e para o taxista Adosindo, mas não ficou resolvida para a pessoa que fez a transferência bancária ao Célio Santiago, em Portugal. Porque simplesmente eu não consegui transferir-lhe o dinheiro por Mbway. Deu erro. Será porque estou a utilizar um cartão estrangeiro no telemóvel? Bom, mas é preferível ficar a dever a alguém de confiança, em Portugal – que confia em mim, entenda-se – do que aqui em São Tomé e Príncipe! A pessoa em Portugal não se preocupou minimamente, felizmente. E eis que amanhã à noite vou tentar novamente, e já deu!!! Ficou resolvido, portanto! O Mbway funciona no telemóvel, mesmo com um cartão estrangeiro).


Enfim. É hora de tomar banho e pôr pomada nas esfoladelas nos pés. Tenho de voltar a usar pensos diariamente. Os garotos ainda me chamaram para comer a fruta-pão assada, mas eu estava a tomar banho, e cansada com toda esta história da transferência, pelo que eles acabaram por ir-se embora.

A Virgínia descobriu no guarda fato do outro quarto a toalha e a colcha brancas, que eu usei para pôr no chão. Deve ser uma das maiores e melhores toalhas, pelo que a deixou na minha casa de banho. Eu usei-a como toalha de banho, só à noite quando fui ao guarda fato é que descobri. Tive de dar outra mais fina e pequena ao segurança Abílio. Por esta é que eu não estava à espera. Até lhe daria a minha, mas estava ainda molhada, do banho.

Às 18h termino o banho e as arrumações. Spray anti-insetos no quarto. Vou para a mesa das traseiras, no alpendre. Completo os apontamentos do dia, enquanto me lembro das coisas. Seleciono as fotos.
E apago a foto da cobra-preta por engano. Estarreci.

As galinhas comeram as cascas da papaia atrás do meu quarto. Nada mau, heim? Afinal sempre gostam.

Amanhã tenho de ver como planeio o dia. Tenho que ir ao mercado buscar o dinheiro, entre as 8 e as 14h. Às 8 da manhã já estarei a chegar a Agostinho Neto – o destino que escolhi para amanhã. Até às 14h estarei no mercado. Falta-me conhecer Água Izé, mas tirei lá fotos hoje, rapidamente, no táxi, não quero repetir o mesmo caminho dois dias seguidos.
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 VEJA NA ÍNTEGRA E PELA ORDEM EM QUE FORAM PUBLICADAS  em https://rutenorte.com/sao-tome-e-principe/550-km-de-bicicleta-sozinha-29-dias-087/



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