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domingo, 8 de setembro de 2024

FUGA DE ALCOENTRE –VALE DOS JUDEUS - Confissões do autor da maior fuga de Portugal e da Europa –Além de outras fugas - Neste sábado, evadiram-se 5 reclusos. Mas, em julho de 1978, evadiram-se 124 – Da prisão que era então considerada a mais segura do pais.

                                              Jorge Trabulo Marques - Jornalista

Excertos de uma extensa entrevista que me concedeu no interior da sua cela, nos anos 80. Da qual, juntamente com passagens do seu diário, viria a publicar um livro, pela editora Relógio D´´Agua, intitulado “ QUANDO MATO ALGUÉM FICO UM BOCADO DEPRIMIDO”

Cinco reclusos fugiram, neste último sábdo, dia 7 do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, em Alcoentre, no distrito de Lisboa, anunciou a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais - 

Mas, Vale de Judeus, em 1978,   já foi palco da fuga mais "espetacular" do país - 124 fugiram por um túnel, que demorou três meses a escavar. Para trás ficaram apenas 76 reclusos, que não saíram porque "não quiseram". - O Lider da evasão foi Manuel Pedro Ramalho Dias, conhecido como Manuel Alentejano,

Ninguém como ele cumpriu em Portugal tantos anos de cadeia seguidos: esteve preso durante 24 anos ininterruptos – e, quando saiu, em 2002, mercê de um indulto concedido pelo Presidente Jorge Sampaio, ainda tinha mais dez anos para penar. Cometeu assaltos à mão armada de que se perderam a conta e matou. Envelheceu na prisão, roído de remorsos.




A MAIOR FUGA DE SEMPRE
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O túnel começou a ser escavado a partir da cela 20, ocupada por Marcelo Pantaleão, a última do rés-do-chão do pavilhão C – e a mais próxima do espesso muro exterior com oito metros de altura, intransponível, liso como uma parede de vidro.

O trabalho foi penoso. A terra retirada era escondida no forro do telhado, numa espécie de sótão do pavilhão, dois pisos acima – içada de cela em cela, dentro de fronhas de almofada a servirem de balde, através de buracos nos tectos. Os reclusos trabalhavam à noite, por turnos. Durante o dia, tapavam os buracos com posters. Movimentaram cerca de 60 metros cúbicos de terra.

Apenas um reduzido número de presos, a princípio, conhecia os planos de fuga. Mas a notícia começou a espalhar-se, em surdina, entre os reclusos. Uns foram admitidos no grupo – outros não mereceram tal sorte, porque não eram de confiança. Alguns foram castigados pelos fugitivos.


Em finais dos anos 60, quando cumpria serviço militar, num fim-de-semana de licença, levou a cabo um assalto e fez um morto. Não voltou ao quartel. Ao fim de uma semana, é dado como desertor – e tem a Polícia Judiciária atrás.
Acaba por ser preso. É condenado, pelo Tribunal Militar de Lisboa, a 18 anos de prisão. Mas é difícil mantê-lo fechado. Manuel Alentejano foge. Colecciona dezenas de fugas ao longo da carreira no crime.


Uma noite, durante o assalto a uma ourivesaria de Lisboa, Manuel Alentejano matou acidentalmente um dos membros do gang: partiu a montra com a coronha da caçadeira de canos serrados, a arma disparou-se, os chumbos passaram-lhe por cima do ombro – e o amigo, atrás dele, caiu esvaído em sangue.

No fim do assalto, carregou com o morto para um descampado da zona da Malveira para lhe dar uma sepultura. Cavou uma cova à medida , cobriu a cara do defunto com um pano e enterrou o cadáver.

Noutra ocasião, executou um outro do gang com um tiro na cabeça. Já o tinha avisado para não se meter com a mulher de um companheiro. Quando soube que o incorrigível sedutor continuava a cobiçar a mulher do próximo, Manuel Alentejano deu-lhe uma prelecção sobre moralidade – e quando o outro julgava que o assunto ia ficar por mais uma lição sobre bons costumes caiu com uma bala na cabeça.

Em Julho de 1978, aos 31 anos, protagonizou a mais espectacular fuga alguma vez levada a cabo numa cadeia da Europa. Uma noite, evadiram-se 124 reclusos do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus.
Escaparam por um túnel escavado durante dois meses. Manuel Alentejano foi um dos fugitivos e o ‘cérebro’ da operação (ver primeiro número desta colecção).

Esteve pouco mais de um ano a monte.
Lançou-se em dezenas de assaltos – até que foi capturado no final do Verão de 1979 e voltou à cadeia. Em Julho de 1981, Manuel Alentejano, de novo preso, é julgado no Tribunal da Boa-Hora, em Lisboa. Os crimes por que responde, para não variar, é homicídio e roubo.

Matara um barbeiro, Horácio Resende, com cinco tiros de pistola para lhe roubar o carro. Dias depois deste crime, roubou o carro a um casal de namorados, em Lisboa, que utilizou no assalto a uma ourivesaria de Odivelas. Foi condenado a 22 anos de cadeia. Outros crimes que cometeu enquanto andou um ano a monte, entre 78 e 79, apenas foram julgados 15 anos depois, em 1994, no Tribunal de Coimbra – que lhe aplicou mais 20 anos.
Mas a Justiça tem por vezes sortilégios insondáveis. A lei não permite a soma aritmética das penas e obriga os juízes ao chamado cúmulo jurídico: três penas de 20 anos, por exemplo, dão no máximo 20 anos. Manuel Alentejano, se não fosse o indulto, arriscava-se a morrer na prisão.

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