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terça-feira, 5 de novembro de 2024

Odisseia no Golfo da Guiné numa piroga - 16º dia - Ilhas Tinhosas da Ilha do Príncipe à vista! - A fantasgórica e ruidosa visão da maior colónia de aves marinhas do Atlântico tropical oriental.- Invadido por um bando de aves marinhas e atacado por um enorme tubarão


Jorge Trabulo Marques 

Foi a maior surpresa da  noite do 15º para o 16º dia, quando ali ia arrastado nas proximidades pela corrente que já me puxava  desde a Ilha de Ano Bom, há mais de 300 Km   -  Mas o maior susto ia ser ao fim deste dia com violento novo ataque de tubarão sobre a canoa. 

ROCHEDOS DAS TINHOSAS A SUL DA ILHA DO PRINCIPE - SANTUÁRIOS POVOADOS POR BANDOS DE GRITARIA DE AVES

As Ilhas Tinhosas - Tinhosa Grande e Tinhosa Pequena - ergue-se do fundo de do mar aproximadamente 20 km a sudoeste da ilha do Príncipe.  ilha maior que compõe as tinhosas tem 20 hectares e a pequena tem 3 hectares. Espaço, privilegiado para  poiso e nidificação de mais meio milhão de aves  marinhas - Dizem estudos

FANTASMAGÓRICA E RUIDOSA VISÃO  SOLITÁRIA DE UM OUTRO MUNDO!

Foi  depois do  pôr do sol do 15º dia, que descobria um enorme penedo, terrivelmente solitário, recortando-se, a curta distância de mim, mas já o avistando um pouco a sul,  sobre a vastidão do mar,  quase aos resvés do horizonte. Passei  num dos lados e não me dei conta - Visto esvoaçarem aves por cima da minha cabeça e de todos os lados.

Depois que uma violenta tempestade me fizera perder a maior parte dos mantimentos e apetrechos, tornava-se-me tremendamente difícil navegar com o auxilio de um remo improvisado. Mesmo assim, poderia ter-me aproximado mas hesitei.   - Não ocorreu porque  tive mais medo do penedo que do mar.  Receando que a canoa se despedaçasse de encontro às rochas  e que as aves me pudessem atacar.

Estive lá tão perto, e, todavia, tão inacessível me foi aportar de piroga naquele maravilhoso e fantasmagórico mundo das ILHAS TINHOSAS ! - O mais importante santuário de aves marinhas do Golfo da Guiné - Algumas vinham pousar na minha canoa - Estive lá, muito próximo, ao 15º Dia dos meus 38 dias numa piroga, em Nov de 1975 - . E, todavia, tão inacessível me foi poder aproximar-me daqueles inóspitos e misteriosos rochedos

Impossibilitado de tentar a travessia oceânico, um pouco a sul da Ilha de Ano Bom, uma pequena ilha e província da Guiné Equatorial, localizada no Atlântico Sul, a 350 km da costa oeste do continente africano e 180 km a sudoeste  de S. Tomé, muito por culpa do comandante do pesqueiro americano, Hornet, que me tendo prometido, em S.Tomé, que me largaria a sul de Ano Bom, na influência da corrente equatorial que me arrastaria para o Brasil - rota que pretendia seguir - me trocou as voltas, quando fundeou a Norte e ao largo daquela ilha: ou fica a bordo ou canoa ao mar - 
À popa e ao longe e a sul ia ficando Ano Bom



Optei pelo regresso a S.Tomé  - E, navegar no Golfo, em plena época das chuvas e dos tornados, numa frágil canoa, era opção quase suicida, de vida ou de morte - Apesar de tudo, quis o destino que, mesmo tendo sido atingido por violenta tempestade, logo na primeira noite, que me causaria a perda de quase todos os apetrechos e víveres, fosse um homem de sorte.


Podia ter sido o primeiro Robinson Crusoe a lá aportar, mas já se tinha posto o sol, a noite caía pesada e escura: o crepúsculo no Equador é muito rápido; quando a silhueta da Tinhosa Grande, se me desenhou no horizonte, já uma cortina pálida e desmaiada, cobria o céu e o mar - E, à medida, que, com o remo improvisado, me ia dirigindo para lã, cada vez mais sonante e ruidosa era a enorme gritaria dos milhares de bandos de aves, que ali costumam pernoitar e nidificar.
Acabei por desistir, receando que pudesse ser lançado pelas ondas contra as rochas, ou mesmo que, ao lá pernoitar, pudesse vir a ser devorado pelos piolhos, que deverão existir nas sucessivas camadas de excrementos, que matizam toda a superfície rochosa.
Pois, além de aves, também por lá existem bancos de ricos cardumes de peixes em redor das suas águas - O maior problema são os inesperados tornados, que colocam em risco a vida dos pescadores das canoas - E +, por vezes, até dos barcos que fazem a ligação entre S. Tomé e Príncipe


Ilhéus das Tinhosas, eram assim designadas no tempo colonial – E, na verdade, não são ilhas mas pequenos ilhéus. Era para ali que geralmente se dirigia a traineira do Macôco. Único colono que trouxe as artes piscatórias da sua terra e que convivia com os pescadores das Ilhas, taco a taco.

Pois, além de aves, também por lá havia bancos de ricos cardumes de peixes em redor das suas águas - O maior problema eram os tornados - De volta e meia, lá ia o pescado e  vidas!... E hoje?!... 

- Hoje, além dos tornados, há outras ameaças -  Já nem traineiras nem as canoas se safam “Na ilha do Príncipe os pescadores, estão preocupados com a falta de segurança no mar da Região. Tudo por causa da constante presença de navios de origem desconhecida ao largo da ilha «Sempre aparecem barcos que lançam redes e levam todo peixehecida ao largo da ilha «Sempre aparecem barcos que lançam redes e levam todo peixe, referem noticias
Apraz-me saber que os Ilhéus das Pedras Tinhosas, da Ilha do Príncipe, têm sido objeto de estudo por vários biólogos internacionais, que agora as classificam como o principal berço das aves marinhas do Golfo da Guiné.–





EXCERTOS DO DÁRIO DE BORDO - Dias 15 e 16 - Nos dias em que a canoa derivou na zona marítima da Ilha do Príncipe, que cheguei a supor que fosse Fernando Pó
Diário de Bordo - Hoje, 15º dia. Grande deceção!... Um barco cargueiro passa aqui ao meu lado ...Faço-lhe sinais vários de aproximação... mas não correspondeu!... Não há dúvida nenhuma que tenho que contar apenas com os meus modestos recursos. Mais nada!
Diário de Bordo - Devem ser neste momento, cerca das nove horas da manhã. Agora tenho a nítida sensação que devo estar a aproximar-me da Ilha de Fernando Pó. (Bioko) - Ontem tive a impressão, depois de ter enfrentado um violento temporal, que estava próximo da Ilha do Príncipe. Mas não, foi ilusão...Agora há muito calor. Uma calmaria podre... Não há vento nenhum.

Há pouco tive a sorte de pescar outro tubarão!....Pelos vistos, peixes aqui há muitos e até se podem pescar à mão e a machim, se for preciso..

Diário de Bordo - De noite, a dada altura, fui surpreendido por ruídos estranhos dos golfinhos, que andavam aqui a voltear a canoa (às cambalhotas por cima dela) e de um lado para o outro. É curioso, porque deixavam um rasto luminoso e exprimiam uns grunhidos!... Por um lado, aquilo pareceu-me simpático, mas, por outro, atemorizou-me. Depois dei umas apitadelas e consegui afastá-los.
Diário de Bordo - Há uma serenidade!... Só se vê mar!... Absolutamente mar!... Mar e mais nada!... A minha canoa a vaguear, a vaguear!...
Eu não si onde estou!... Não sei!... Mas não estou desesperado!... Não perdi a confiança!... estou emocionado, com certeza!...Mas continuo confiante!...Realmente, o homem!... Eu acho que o homem é nestas circunstâncias que ele se superioriza a si próprio!... O seu espírito se enaltece!...
Há qualquer coisa de místico!....Ontem! no meio daquelas ondas!... Alterosas!!...De vez em quando, uma ou outra entrava com alguma água, dentro da minha canoa!... Eu sentia-me ao mesmo tempo pequeno e gigante!... Pequeno!... No meio de tanta grandeza!.... E gigante!... por vencer tamanha força!...

De facto, tal como refiro no registos gravados do meu diário, eu apercebera-me dos bandos de aves a sobrevoarem-me, o que me levou a pensar que não estivesse muito longe de terra.  

Diário de Bordo - Os peixes, aqui ao lado; de vez em quando a saltar!... Pois, são decorridos 15 dias e tal, que me encontro nestas circunstâncias, vivendo numa autêntica banheira, a que eu, pomposamente, dei o nome de hotel.
Diário de Bordo - Pois... não sei!... Não sei!... Estou longe de tudo!... Longe das vistas de toda a gente!... Perdido nesta imensidão!... É de facto uma imensidão!... Eu, se caísse aqui, não me salvaria!.....
Ninguém! Absolutamente ninguém!... Ainda não perdi a confiança... Eu, acima de tudo, acredito em algo... Algo superior a mim... Há uma força qualquer que nos protege, de certeza absoluta!.... Porque, se assim não fosse, estou convencido que não estaria aqui!... Porque eu tenho vencido muitas dificuldades!... Imensas!... Eu, ontem parecia não seu o quê no meio daquela fúria!... Fúria autêntica!... Indescritível!... O vento!...As vagas alterosas!... O mar parecia engolir-me a cada momento!... Eu não teria salvação nenhuma se a canoa se virasse!... Eu continuei!...
Diário de Bordo - Apenas a presença de aves, aqui perto e de peixes, aqui debaixo da canoa.... Peixes de todas as espécies são a minha companhia... Nesta serenidade!...Nesta calmaria!...Não sei se isto é prologo para mais uns momentos como os de ontem....O mar é assim!... Umas vezes sereno, outras furioso!
Ontem, de facto, estive próximo da Ilha do Príncipe. Mais propriamente, do Ilhéu das Tinhosas. Afastei-me... agora ando para aqui!... Não há vento. Há uma calmaria!...Longe de terra, com falta de água!...
Encontro-me muito desanimado!... Não perdi ainda a esperança de que hei-de chegar a terra... Hei-de me salvar!...Mas, sinceramente, sinto-me muito saturado, muito saturado

Calmarias! Decimo Sexto Dia Já são dezasseis dias passados que me encontro numa canoa, em pleno Golfo da Guine. Devem ser três horas da tarde. Sinceramente, encontro-me muito desiludido muito desanimado! cheio de sede!...Não tenho praticamente água!

Ontem, de facto, estive próximo da Ilha do Príncipe. Mais propriamente do Ilhéu das Tinhosas. afastei-me!... agora ando para aqui...Não há vento!... «Longe da terra!...Com falta de agua!...

Encontro-me muito, mesmo bastante, desanimado!...Não perdi ainda a esperança de que hei-de chegar a terra, hei-de-me salvar...mas sinceramente sinto-me muito saturado, muito saturado!

A situação e extremamente difícil! Ponho a vela...a canoa não obedece... Não há vento!

Por outro lado, a falta do leme é que provocou isto tudo! É uma situação delicada! Bastante mesmo!...Perdi ate ate o apetite de comer! Alias eu tenho muita sede! Imensa sede!...Oxalá que chova! 

Quase fim da tarde do l6.Dia.Um dia bastante  aborrecido!...Há bocadinho houve um tubarão que investiu  contra a minha canoa! Andou aqui em volta dela, dando-lhe rabanadas violentas e só consegui afugenta-lo com o auxilio  do machim! Estava a ver que me queria virar a canoa. Realmente foi uma situação bastante desesperada!...


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