Por Jorge Trabulo Marques - Jornalista -1º de uma série de artigos - c
Tudo começara na vila da Trindade, com a população nativa a ser perseguida há meses com rusgas permanentes e arrebanho de pessoas para as obras do Estado. Ao anoitecer do dia 3 de Fevereiro de 1953, o tenente Ferreira e o Zé Mulato, acompanhados de soldados armados de espingarda e baioneta, apareceram num jipe em atitude provocatória. Um homem que passava, descuidadamente, na rua principal abatido pelas costas. A população, aterrada com o tiroteio, corre a refugiar-se no mato. E, no dia seguinte, principiaram as prisões em massa, as rajadas de metralhadora, morte de gente indefesa. Com a desculpa, disparatada, de que os nativos, armados machins, se preparavam para marchar sobre a cidade para matar o Governador. E, por fim, nomeariam como governantes personalidades desafetas ao Governo, como o Engº Graça , os professores Januário e Maria de Jesus, os chefes e mentores da revolta. E também alguns brancos-forros, Vergílio Lima, Carlos Soares, Américo Morais - In Crónica de uma Guerra Inventada – por Sum Marki
Tudo começara na vila da Trindade, com a população nativa a ser perseguida há meses com rusgas permanentes e arrebanho de pessoas para as obras do Estado. Ao anoitecer do dia 3 de Fevereiro de 1953, o tenente Ferreira e o Zé Mulato, acompanhados de soldados armados de espingarda e baioneta, apareceram num jipe em atitude provocatória. Um homem que passava, descuidadamente, na rua principal abatido pelas costas. A população, aterrada com o tiroteio, corre a refugiar-se no mato. E, no dia seguinte, principiaram as prisões em massa, as rajadas de metralhadora, morte de gente indefesa. Com a desculpa, disparatada, de que os nativos, armados machins, se preparavam para marchar sobre a cidade para matar o Governador. E, por fim, nomeariam como governantes personalidades desafetas ao Governo, como o Engº Graça , os professores Januário e Maria de Jesus, os chefes e mentores da revolta. E também alguns brancos-forros, Vergílio Lima, Carlos Soares, Américo Morais - In Crónica de uma Guerra Inventada – por Sum Marki
O mesmo se pode dizer em relação aos demais santomenses, vitimas de igual
infâmia, no dominado Massacre do Batepá (não em câmaras de gás ) mas
igualmente sujeitos a idênticos horrores e barbaridades, espancamentos e
atrocidades, que, não obstante toda a hedionda ignominia, heroicamente lograram
resistir e sobreviver, acarretando, ainda na memória dos dias de hoje, a dor
sofrida (no corpo e no espírito) as lembranças de tão inarrável como assombroso
pesadelo - Trágico saldo de centenas de mulheres e homens,
e até adolescentes e crianças, gente pacifica e indefesa, sob a alegada
tentativa de conspiração comunista.
Textos que poderá também consultar http://canoasdomar.blogspot.com/2016/02/s-tome-e-principe-homenageou-hoje-os.html . http://canoasdomar.blogspot.com/2015/02/s-tome-memorias-do-massacre-do-betepa-2.html http://canoasdomar.blogspot.com/2015/02/massacres-dos-batepa-3-hoje-s-tome.html ….http://canoasdomar.blogspot.com/2015/02/s-tome-e-as-memorias-do-batepa-4-ze.html
…http://canoasdomar.blogspot.com/2015/02/s-tome-e-principe-memorias-do-batepa-5.html
Recentemente, recordou-se 0 Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto
lembra o genocídio cometido pelos nazistas, a data da
libertação do campo dos horrores de Auschwitz, pelo exército soviético,
em 27 de janeiro de 1945 - Lugar da
morte de cerca 1,1 milhão de pessoas, entre elas 1 milhão de judeus de vários
países europeus. - Através de entrevistas a alguns dos 300 sobreviventes,
constatou-se que ainda perdura, no coração e no seus olhos, um imenso rosário
de sofrimentos e de lágrimas, que não estão saradas
O mesmo
se pode dizer em relação aos santomenses, vitimas de igual infâmia, no dominado
Massacre do Batepá (não em câmaras de gás ) mas igualmente sujeitos a idênticos horrores e barbaridades, espancamentos
e atrocidades, que, não obstante toda a hedionda ignominia, heroicamente
lograram resistir e sobreviver, acarretando, ainda na memória dos dias de hoje,
a dor sofrida (no corpo e no espírito) as lembranças de tão inarrável como
assombroso pesadelo - Trágico
saldo de centenas de mulheres e homens,
e até adolescentes e crianças, gente pacifica e indefesa, sob a alegada
tentativa de conspiração comunista.
O QUE DIZEM AS "MEMÓRIAS DE UM AJUDANTE-DE-CAMPO E COMANDANTE DA POLICIA" . Capitão Salgueiro Rêgo - No tempo de um dos Governadores mais odiados em S. Tomé e Príncipe
"A forma como o Governador durante o tempo do meu Comando tratava e dirigia a sua obra, "com dinamismo - que o tinha -sob os aspectos de desenvolvimento material e económico era, sendo bem observado, em vários detalhes, como um ditador à maneira da gestapo no tempo de Hitler na Alemanha. Era ele e só ele quem tudo mandava. sentindo que a minha outra função de Administrador do Concelho inerente ao meu comando da Polícia iria ser toda subordinada às suas firmes e despóticas vontades em acionar as suas obras que dia a dia se faziam por toda a parte. Assim, o Governador determinava ao Administrador do Conselho que mandasse apresentar na Repartição das Obras Públicas a quantidade de trabalhadores que desejava para qualquer obra. Mas, como se me tornava impossível por falta de ficheiros e registos de elementos a convocar e a chamar pelos diversos Regedores das Freguesias da Ilha, comunicava isso mesmo - em geral pessoalmente ao Governador - que se admirava da minha ingenuidade nestas coisas já tão sabidas em S. Tomé! ...
O QUE DIZEM AS "MEMÓRIAS DE UM AJUDANTE-DE-CAMPO E COMANDANTE DA POLICIA" . Capitão Salgueiro Rêgo - No tempo de um dos Governadores mais odiados em S. Tomé e Príncipe
"A forma como o Governador durante o tempo do meu Comando tratava e dirigia a sua obra, "com dinamismo - que o tinha -sob os aspectos de desenvolvimento material e económico era, sendo bem observado, em vários detalhes, como um ditador à maneira da gestapo no tempo de Hitler na Alemanha. Era ele e só ele quem tudo mandava. sentindo que a minha outra função de Administrador do Concelho inerente ao meu comando da Polícia iria ser toda subordinada às suas firmes e despóticas vontades em acionar as suas obras que dia a dia se faziam por toda a parte. Assim, o Governador determinava ao Administrador do Conselho que mandasse apresentar na Repartição das Obras Públicas a quantidade de trabalhadores que desejava para qualquer obra. Mas, como se me tornava impossível por falta de ficheiros e registos de elementos a convocar e a chamar pelos diversos Regedores das Freguesias da Ilha, comunicava isso mesmo - em geral pessoalmente ao Governador - que se admirava da minha ingenuidade nestas coisas já tão sabidas em S. Tomé! ...
Como ir arranjar- trabalhadores?!...Muito facilmente pá: como já do antecedente: forma que era já do tempo em que ele tinha tomado posse daquela Grande Propriedade que era do Estado mas que .ele governava à sua maneira de conseguir homens para trabalho, E como era ? Por meio de RUSGAS! Tratando-me por TU, como aliás a toda a gente daquela terra, dizia-me abrindo o mapa, a planta, da Ilha. Tratas de cercar com os teus soldados a zona' tal e tal ... e de manhã vais apertando o cerco e trazes-me para a Cidade essa gente que for saindo de suas casas. Assim se fazia e se entre as mulheres vinha alguma cachopinha bonitinha em isca para o homem grande ... E o resto da caçada era entregue pelos meus soldados sob prisão ao comandante das prisões -miseráveis barracões imundos onde os pobres dormiam pelo chão-um tenente Santos Ferreira que se dizia parente do Ministro do Exército, natural de Viseu" - Excerto - Em próximo post conto retomar as suas memórias.
A MÁRTIR POVOAÇÃO DE BATEPÁ
Batepá, hoje uma pequena vila, porém, há 62 nos, era apenas um conjunto de
algumas modestas casas de madeira – Mas
foi justamente aí, pelo facto dos santomenses se haverem recusado a trabalharem à
força, como escravos, nas obras públicas
e nas plantações do Cacau e do Café das grandes roças, que começaria uma das
páginas mais negras da história da colonização portuguesa neste arquipélago –
Mas também, por outro lado, a lembrança de um período que haveria de ser
marcado pelas mais nobres e corajosas provas de resistência ao repressivo
domínio esclavagista.
O DIA QUE S. TOMÉ E PRÍNCIPE NÃO ESQUECE
Daí que,
todos anos, o 3 de Fevereiro, seja declarado feriado nacional e, um dos locais
onde ocorreram os extermínios em massa, que mataram centenas de santomenses,
seja palco de sentida peregrinação e evocação, com missa solene, deposição de
ramos de flores, e a presença das vitimas sobreviventes, povo
anónimo e as principais entidades das
Ilhas, que é que se espera venha a decorrer, nas cerimónias, previstas
para a próxima terça-feira, dia 3.
20 anos depois, ainda havia quem
tivesse feridas nas pernas por cicatrizar das pesadas grilhetas - Fora as que
sangravam no coração!....que dificilmente se apagam...
SOBREVIVENTE - A DOR QUE O TEMPO AINDA NÃO APAGOU - ESPANCADA À CRONHADA DEPOIS DE LHE METEREM A CABEÇA NUM TANQUE DE ÁGUA - Era menina e estava grávida.
Ainda jovem, e
mesmo grávida, não foi poupada à brutalidade facínora das ordens do
então Governador Carlos Gorgulho:
arrastada à força de sua casa, levada para um calabouço na então Vila de
Trindade, espancada barbaramente, Primeiro deu-se o saque às casas: carregaram
o que puderam dos modestos teres e haveres, após o que as incendiaram.
Maria dos Santos, mais conhecida por Mena, agora com 80 anos, é um dos rostos debilitados, que ainda hoje espelha o testemunho do incomensurável sofrimento, angústia e lágrimas, por que viveu há 62 anos, - É uma das mártires, ainda sobrevivente dos hediondos massacres de Batepá, que tiveram inicio nos horrores da longa e pavorosa noite de 2 para 3 de Fevereiro de 1953 e que iriam prolongar-se nos ignóbeis espancamentos e torturas, até à morte, infligidos a centenas de santomenses, em terríveis interrogatórios, desde brutais choques elétricos, à violenta palmatoada, ao chicote, cacetada e cronhada, a soco e a pontapé, quer no afrontoso cárcere da prisão local, onde os presos, coabitavam exíguos e afrontosos espaços, em deploráveis e nauseabundas condições higiénicas, quer numa das salas da Fortaleza S. Sebastião (a capitania dos Portos), transformada em laboratório ao estilo da Gestapo hitleriana, sob a batuta do famigerado médico Aragão, locais donde partiam para o Campo de Concentração Fernão Dias
NÃO LANÇARAM 12O HOMENS AO MAR PORQUE A TRIPULAÇÃO SE OPÕS
Memórias do hediondo Massacre
do Batepá
Imagens e palavras de um abominável massacre. O
pai de Teresa, esposo de Maria dos Santos, , também vitima da
mesma barbárie, depois de lhe terrem queimado a casa e o carro (que saquearam
antes de a incendiarem) ainda procurou refúgio no mato mas foi apanhado, preso
e enviado para o Campo de Concentração de Fernão, onde acabaria por embarcar,
com mais 120 homens para serem lançados ao mar, no barco António Carlos. Tal porém
não sucederia por a tripulação do navio
se ter oposto, tal como vim a saber
através de outro depoimento, que obrigaram o comandante a deixar os prisioneiros na Ilha do Príncipe, onde acabariam por ficar presos – Um desses homens era o cabo-verdiano, Bernardino Lopes
Monteiro, pai do Coronel Victor Monteiro
Dias, chefe do Gabinete do Presidente Manuel
Pinto da Costa, de cujo episódio conto
vir a referir-me neste site.
Agora,
ao voltar a S. Tomé, 39 anos depois de ter partido numa canoa solitária, não
podia deixar de passar pela martirizada vila do Batepá, que, embora não
tendo crescido muito, no entanto, já tem mais algumas casas de que no meu
tempo. E foi ali que tive oportunidade de falar com uma antiga
sobrevivente, que, juntamente com a filha e netos, ainda teve a amabilidade de
me franquear o portão de sua casa e me mostrar o que resta do carro que ardeu
quando atearam o fogo a sua casa - a única loja comercial que ali havia, naquela
altura, a qual fora saqueada antes de lhe deitarem o fogo - Penso que
esses objetos deviam ser guardados no museu e que não acabassem por se
desfazer com a ferrugem.
Sim, lá
estava ainda a mola de um velho chassi calcinado, assim como a carapaça do
motor, junto às raízes da árvore da fruta pão. E, pelo que me apercebi,
não me mostravam tais memórias como meros souvenires (que julgo, o terão feito
pela primeira vez a um jornalista), dado tratarem-se de peças que têm muito a ver com
um período, muito sofrido, do casal que ali vivia, e que depois passaram também a ser, como que um relicário sagrado
para os filhos e netos., pelo que não deixei de ver nos olhos e nos rostos de
todos, quantos ali se encontravam presentes, como que o perpassar um sentimento, misto de dor, frieza e
de angústia, difícil de apagar e de esquecer.
No termo
desta visita à Vila do Batepá (que também tinha como destino uma peregrinação à Roça Saudade, onde nasceu
Almada Negreiros, na companhia de Manuel
Gonçalves, o português a quem devo a simpatia de me acompanhar no jipe
que alugou) ambos passámos pelo Mercado Municipal, onde fomos bem recebidos,
pudemos almoçar comida típica e um
refrescante vinho de palma, confraternizando e vivendo momentos de franco e amistoso diálogo, tanto
mais que fui ali encontrar santomenses que se lembravam ainda de mim, quer das
minhas aventuras marítimas, quer dos artigos que publicara na Semana Ilustrada,
sobre os massacres do Batepá – De resto, creio que teria sido por esse facto que, aquela velhinha de 80
anos, a Mena, com o rosto que parecia um livro ainda vivo de memórias, me concedera
à porta de sua casa, após o que, já na companhia da sua filha mais
velha, me franqueara o seu quintal para me mostrar testemunhos materiais, que o
passar dos anos ainda não desfez.
De
referir que, inicialmente algo renitente, com expressão dura e não oculta de
alguma desconfiança, como se, porventura,
a memória que os brancos lhe deixaram, naqueles
martirizados dias, ainda pudesse ser estampada num português que agora lhe
batia inesperadamente à porta. Sim, pude ver que há chagas psicológicas, feridas no
coração, que deixam marcas para o resto da
vida – Sobretudo, no seu caso, quando era ainda menina e moça, se bem
que já grávida (pois em África o
fenómeno da procriação manifesta-se mais
cedo que nas regiões frias) e, além de a espancarem, quase a sufocaram quando
lhe meteram a cabeça num tanque de água para a obrigarem a confessar que estava
envolvida na tal fictícia conspiração comunista
CAMPO DE EXTERMÍNIO DE FERNÃO DIAS
Um local
pantanoso, infestado de mosquitos, embora a escassos metros da praia, onde
muitos presos, ou eram imediatamente
acorrentados e lançados ao mar ou, ainda sob o peso de fortes grilhetas, obrigados a carregar pesadas tinas de água ou
grandes blocos de pedra, por forma a que o seu extermínio ainda fosse mais
doloroso, porque física e psicologicamente mais sórdido e lento, quando não
sufocados pelo terreno movediço da lama para onde também eram atirados ou
mortos vivos em valas abertas pelos próprios prisioneiros, que eram obrigados a
cavar a sepultura, sob as prepotências e as arbitrariedades de um contratado
angolano, um tal Zé Mulato, um inqualificável verdugo que que as autoridades foram buscar à cadeia, onde
cumpria pena de assassínio, para chefiar o dito campo de morte.
EM PORTUGAL - NUMA REMOTA ALDEIA - TAMBÉM HOUVE OUTRO MASSACRE
Claro
que não se pode dizer que, em 1953, os tempos também fossem bons para os
portugueses que viviam na “metrópole do império colonial”, muito pelo
contrário: eram tempos de repressão, de fome e de miséria – E a pequena aldeia do Colmeal onde nasceu o meu bisavô paterno, varrida por ação de um processo judicial,
injusto e prepotente, no dia 10 de Junho de 1957, com os seus habitantes
despejados à força, com desfecho trágico
de casas queimadas e algumas mortes por balas da GNR- a guarda pretoriana do
regime colonial-fascista -, é também
outra das páginas negras da História da
Lusitânia moderna –
Conheci pessoalmente a dureza
desses tempo, quando fui trabalhar aos 11 anos, como marçano em Lisboa. Daí que, os criminosos acontecimento que ocorreram em Fevereiro de 1953,
em S. Tomé, sob o comando do próprio governador colonial, tenham que também de ser analisados -não
estritamente por via de ódios raciais –
mas num contexto mais abrangente – O da época colonial e do fascismo que se
servia de todos os meios para defender os interesses de uma certa burguesia
privilegiada – Infelizmente é esta a situação a que estamos assistir através da
ideologia liberal.
Ainda entrevistei algumas das vítimas - "Prenderam-me
durante 45 dias. Houve a ideia de arranjar mão-de-obra gratuita. E daí
surgiram as prisões, mais prisões sem quaisquer razões para isso.
Procurava-se emprego e não se encontrava. No entanto, as rusgas
sucediam-se e as pessoas que encontravam eram presas. É claro que houve
um ou outro que reagiu sobre essas atitudes." Declarações de Bartolomeu Cravid
Pouco depois do 25 de Abril, vi com os meus próprios
olhos essas feridas - Ainda em chagas vivas por sarar! ...
Provocadas por longo cativeiro, no campo de concentração de Fernão Dias, acorrentados
a bolas de ferro, tal como aos escravos nos barcos negreiros. Pude entrevistar
algumas dessas pessoas para a Revista Semana Ilustrada.
Vi
também a fotografia da famosa cadeira onde os presos eram algemados,
submetidos a ignóbeis espancamentos e torturas, até sujeitos a choques
elétricos para os obrigarem a confessar e assinar declarações de factos
forjados para os incriminarem o seu envolvimento numa revolta que pretenderia
matar o governador e os colonos e aproveitarem-se das suas mulheres - Mais tarde a PIDE, enviada por
Salazar, iria negar a existência da conspiração, que depois de ter sido
rotulada de comunista, passar a ser provocada por elementos desafetos ao regime
– Vi também as fotos de outras macabras imagens, que
me foram mostradas - Pasme-se pelo então chefe da Redação de "A Voz de S.
Tomé e Príncipe" e professor de português no Liceu, que, com um
sorriso irónico, chegara ao pé de mim (claro, quando este quinzenário do regime
deixara de se publicar, por foça da revolução de Abril e ele andava um tato ou
quanto com assustado e com o "rabo encolhido", receando que as liberdades
democráticas lhe pudessem tirar os privilégios) vindo junto de mim com esta
surpreendente mas hipócrita sugestão:
"Você
que é amigo dos pretos, veja se tem a coragem de publicar estas
fotografias! Ao mesmo tempo que mas passa algumas para as mãos, pedindo-me, que, logo
que as fotografasse, lhas devolvesse. Com a recomendação: "Mas se o
fizer, acautele-se! Olhe que eles ainda andam quase todos por aí e não vão gostar - Agradeci-lhe o gesto
e a recomendação mas não me amedrontei.
Pelo contrário, tinha ali um bom motivo de reportagem, entre mãos mas, para
isso, precisava de ouvir alguns dos sobreviventes e de fazer as
entrevistas que me fosse possível.
COMETERAM CRIMES HEDIONDOS E NÃO FORAM PRESOS
Ao chegar
a minha casa, olhando com atenção para aquelas fotos (bastantes
mais do que que as hoje se encontram expostas no museu da resistência), sim,
não me foi difícil identificar alguns dos protagonistas envolvidos
nos criminosos acontecimentos. Um dos quais era o chefe de escritórios da
Roça Uba-Budo, onde passei um mau bocado: ia para fazer o estágio do meu
curso de Agente Rural, e, além de me terem dado a categoria mais baixa da
roça, a seguir à dos serviçais contratados, que é a de empregado de mato, ainda
me queriam obrigar a tratar o trabalhador por tu e ao estilo colonial -
Bom, como recusasse, fui enviado de castigo para a Roça Ribeira Peixe, com um
trabalhador cabo-verdiano, a contar cacaueiros velhos e abandonados, na zona
infestada pela cobra preta. Não vou agora contar essa porque, só isso,
daria talvez um livro.
Outro
colono, que também identifiquei, era o “Silva
Pereira Taxista”, um branco que habitualmente estacionava o carro frente ao
Restaurante Palmar - Quando lhe falei no assunto, quase me ia fuzilando
com os olhos: você não tem vergonha de me vir falar de um caso , que já foi
resolvido pelos Tribunais?!... Vás-se f...." - Vi logo que não era pelos brancos
que devia começar - Estava visto que dali não lograva qualquer declaração. De
resto, a primeira vez que ouvira falar dos Massacres do Batepá, foi depois do
25 de Abril
Eu desembarcara,
a bordo do paquete Uíge, em Novembro de 1963, numa altura em que ainda devia
haver bastantes mais feridas por cicatrizar do que após o 25 de Abril de 1974,
mas nem assim nunca ninguém me falou de tais factos. A razão é simples de
compreender: eram das tais conversas, publicamente proibidas, tal como proibido
chegara a ser o livro das “MEMÓRIAS DE UM AJUDANTE-DE-CAMPO”, a que conto vir a falar numa das postagens seguintes.
MUSEU
NACIONAL DE SÃO TOMÉ – SITO NA ANTIGA FORTALEZA DE S. SEBASTIÃO - ONDE O
PASSADO HISTÓRICO PORTUGUÊS NÃO DEIXA MUITO A DESEJAR
São Tomé e Príncipe possui um Arquivo Histórico, localizado na
praça de Mártires da Liberdade, na cidade capital, com a
avenida da Independência e Parque Popular, e o Museu Nacional, localizada no
sudeste da mesma cidade, que passou ali a integrar as instalações da antiga
fortaleza de S. Sebastião, desde 1975.
Quem ali for visitar, o vetusto ao edifício, erguida na ponta mais
a oeste da margem direita da Baía Ana de
Chaves, sobretudo se é português e se ali entrar com olhos de ver - que esqueça
os tempos épicos, em que os canhões
tentaram repelir os invasores Olandeses e Franceses ou até mesmo queira ali
lembrar os chamados feitos “por mares nunca dantes navegados” de João de
Santarém e Pero Escobar, cujas estátuas, depois de apeadas dos seus pedestais, se encontram ali à entrada na condição de
miseráveis testemunhas mudas e desprezíveis de um tempo que, por não merecer
ser recordado, à população local, as ostraciza e as vota como que ao rol das pedras
mortas, que, mesmo tendo fisionomias humanas, deixaram de ter qualquer importância
histórica para a posteridade. Não tenho dúvidas que é mesmo assim – Esse o sentimento
que também ali nutre depois de lá entrar – O passado não se pode apagar mas
também só merece ser lembrado, se as boas recordações superarem as más. Não me
parece que seja o caso.
E, embora ao chegar ao local, sendo um dos admiradores dos poemas épicos de Camões
(«Sempre, enfim, pera o Austro a aguda proa/No grandíssimo gôlfão nos metemos, /Deixando a Serra aspérrima Leoa,
/Co Cabo a quem das Palmas nome demos./O grande rio, onde batendo soa) ainda
seja tentado a sentir algum rebate
nostálgico, creio que à saída
deixará de o ter – Por uma simples razão: é que, na sala reservada ao ‘’massacre de Batepá’’ do
Museu Nacional, o que ali constata é uma autêntica câmara de horrores. Mesmo assim, não deixe de testemunhar com os
olhos de ver, até onde chega a barbárie.
Que mais não seja para admirar, ali mesmo ao lado, talvez a praia mais
concorrida pelo colorido e alegria dos
santomenses, sem olhar a idades ou a sexo.
Obviamente,
que, por minha parte, não podia deixar de ali fazer uma vista ao Museu Nacional de S. Tomé e
Príncipe, onde me deparei com algumas das imagens que já conhecia, as quais,
juntas com outros macabros objetos, desde as grilhetas, a implacável
palmatoria, capaz de fazer estalar uma mão, às antigas mauseres,
com baioneta cravada nas pontas, usadas por milícias e forças militarizadas, à
foto e farpela do Homem Cristo, que fora crivada de balas e que, mesmo assim,
milagrosamente, lograra escapar-se aos carrascos prisionais, bem como dos
rostos desfeitos desfigurados, a par de outros rostos, de figuras que pude
conhecer, as quais, conquanto tenham sido poupadas de tais horrores, nem por
isso deixaram de suportar várias barbaridades e sevicias.
Confesso
que também guardo más recordações destas instalações. Era ali a antiga Capitania dos
Portos, e, no seguimento da minha viagem clandestina de canoa ao Príncipe, fui
ali chamado pelo Capitão dos Portos – um tal Elias da Costa - que, além de
me aplicar pesada coima, me deu uns
valentes encontros contra a parede – Isto
já depois de ter sido recebido no aeroporto
de S. Tomé, com um par de socos no estômago e de seguida ter passado pelos
calabouços da Pide, supondo que eu não queria ir para aquela ilha mas fugir
para o Gabão
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